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terça-feira, 5 de abril de 2016

Estudantes pela Liberdade e suas perguntas intrigantes: minhas respostas - Paulo Roberto de Almeida

Estive neste último fim de semana em Manaus, onde, no sábado, 2/04/2016, participei de um encontro organizado pela seção local dos Estudantes pela Liberdade.
Aqui uma postagem do Marcelo Berger do encontro: https://www.facebook.com/bergerlm/posts/10205614342107101 
Ademais da companhia extremamente agradável dos organizadores -- com meus agradecimentos especiais ao Carlos Renner Cardoso, coordenador regional do EPL e presidente do Conselho Diretor do Clube Ajuricaba -- e do ambiente especialmente acolhedor que tivemos na UFAM, juntamente com outros participantes, entre eles (que pude assistir), os professores Luiz Marcelo Berger e Manoel Gustavo  Neubarth Trindade, ambos do RS, mantivemos um bom debate sobre os temas do momento: direito e economia, e no meu caso a atual situação do Brasil, e o que temos pela frente (sic, se ouso dizer).
Pois bem, ademais das perguntas que pudemos responder, ao final do encontro, recebi uma série de questões por escrito (eu havia solicitado esse procedimento, como geralmente faço quando participo de eventos desse tipo), que pude agora responder, e que já encaminhei aos "perguntadores".
Como considero, entretanto, que tanto perguntas como respostas possam interessar um número maior de participantes ao encontro, assim como outros eventuais curiosos espalhados pelo país, permito-me colocar aqui o que mandei aos alunos questionadores.
Tive muita alegria com esse tipo de evento, inclusive porque, como disse no início de minha palestra, um encontro como esse seria virtualmente impensável em outras épocas, por razões que não são difíceis de perceber.
A juventude atual desperta para o liberalismo, o que é algo ainda raro, mas extremamente auspicioso para o Brasil de amanhã.
Sem mais, as perguntas e minhas respostas.
Paulo Roberto de Almeida 
Brasília, 5 de abril de 2016.



Paulo Roberto de Almeida
[Respostas a perguntas colocadas por ocasião do encontro dos Estudantes pela Liberdade, em Manaus, na UFAM, em 2/04/2016]


Formulo abaixo respostas tentativas a questionamentos de um pequeno grupo de estudantes que me encaminharam perguntas por escrito ao término de uma palestra-debate que mantive na tarde do sábado 2 de abril de 2016, nas dependências da UFAM, no quadro de encontro organizado pelos Estudantes Pela Liberdade, seção Manaus, na sequência de duas palestras de excelente qualidade, a que assisti (tendo perdido a primeira por razões de viagem), a cargo, respectivamente dos professores e advogados Luiz Marcelo Berger e Manoel Gustavo Neubarth Trindade. Nem todas as perguntas foram acompanhadas de e-mail, e nem sempre foi possível identificar corretamente o endereço manuscrito, por isso permito-me veicular publicamente todas as perguntas e minhas respostas, embora não correlacionando autores das primeiras, e não podendo, previsivelmente satisfazer todas as curiosidades.

1) A sociologia pode ser um ramo de estudos isento de ideologia?
Paulo Roberto de Almeida (PRA): Dificilmente. Todas as ciências humanas, ou sociais, são o fruto da chamada teoria social, que é o lento acumular de “explicações”, mais ou menos “científicas”, sobre a organização social, o comportamento humano, a psicologia coletiva, as formas de associativismo, o reflexo de crenças ancestrais (geralmente religiosas), a construção progressiva de um conjunto de “respostas” a problemas inevitavelmente colocados pela ação humana, individual ou coletiva: estrutura familiar, organização social da produção, divisão do trabalho, formas de exploração do trabalho, de dominação política, de padrões de ordenamento institucional, enfim, um conjunto de interações sociais que estão sendo esmiuçadas por filósofos e pensadores sociais desde a mais remota antiguidade. A sociologia enquanto tal é construída no contexto do Iluminismo, da revolução industrial, da revolução francesa e de todos os progressos feitos pelo engenho humano nos terrenos da própria filosofia, do direito, da economia, da política, e mesmo da religião. Seus primeiros “sistematizadores” foram justamente “engenheiros sociais” – ou seja, pessoas interessadas em como melhor organizar o mundo e a sociedade – que, na época da revolução francesa, passaram a ser chamados de ideólogos, ou seja, pensadores de gabinete, reformadores sociais, ou assessores dos líderes políticos que estavam à frente de Estados soberanos na passagem da era moderna para a contemporânea. Geralmente se parte de Saint Simon, para Tocqueville, Marx, Auguste Comte, Max Weber, e vários outros, que escreveram obras de referência no terreno da “teoria social”. Quero crer que, inevitavelmente, esse trabalho de explicação social – em vários casos de propostas de grandes reformas sociais – estará contaminado pelas “teorias” e preconceitos próprios a cada época, pois ninguém consegue ser totalmente isento de seu contexto social, e das ideias-força que marcam cada época: industrialismo, pobreza, conflitos sociais (ou de classe), guerras, sistemas políticos autoritários ou democráticos, preconceitos raciais e concepções sobre a superioridade de certas raças sobre outras, ou qualquer outro problema que se coloque a cada época: descobrimentos, colonialismo, revolução científica, revolução industrial, grande indústria, imperialismo, teorias racistas, liberalismo, fascismo, comunismo, democracia, liberdades, todos esses processos, eventos, ideias são refletidos no pensamento e nas obras de “sociólogos”, que portanto expressam suas próprias ideias e propostas no meio desse caldeirão de concepções teóricas e práticas sobre o mundo que os cerca.
Eu, por exemplo, como sociólogo, mais do que como diplomata, sou um perfeito ideólogo, ou seja, estou sempre lendo, refletindo, expressando minhas opiniões, sobre os problemas de minha época, de meu país. Posso até fazer pesquisas tendencialmente, ou alegadamente, “científicas”, ou seja, dotadas de alguma base empírica, mas também é certo que dificilmente vou escapar das ideias de meus predecessores nessa área: tanto Marx, quanto Weber e vários outros influenciaram meu pensamento, e isso é, de certa forma, inevitável. Melhor ser honesto e reconhecer a validade relativa de nossas ideias e opiniões. Sociólogos são sempre ideólogos, mesmo quando não o reconhecem.


PRA: Não sou do ramo do Direito, mas da sociologia econômica, e minha tendência é a de considerar que o Direito é uma consolidação de certo consenso social, que se expressa contratualmente: Constituição, leis, códigos, normas, etc. Como tal, ele pode, em determinadas circunstâncias, mudar a economia de um país, pela “imposição”, ou pela livre aceitação, de um conjunto de regras e normas para guiar ou enquadrar as relações econômicas que se estabelecem livremente ou naturalmente no quadro da sociedade civil: leis de limitação do trabalho a 8 horas diárias, por exemplo, lei do salario mínimo, de compensações extra (ou seja impostas pela autoridade, não derivadas de contratos livres) por algum tipo de atividade especial, etc. Não quero com isso dizer que tudo isso seja benéfico à economia, à produtividade, ao bem-estar ou acumulação de riqueza por indivíduos ou pela sociedade. Leis que buscam redistribuir renda de forma compulsória podem até ser interessantes do ponto de vista da maioria, mas elas também podem ser poderosas indutoras de baixo crescimento, de evasão fiscal, de informalidade e de economia clandestina. Em economia não existe a “positividade” do direito, ou seja, a norma vale para todos, ela é impessoal e supostamente reguladora de “boas” relações sociais. Economia é uma relação social que tem a ver com a escassez relativa de bens e serviços, em face de necessidades “infinitas” por parte de indivíduos: não se pode obter NENHUM bem econômico sem antes um ato de produção, ou seja, de investimento próprio nos fatores de produção: recursos naturais, trabalho humano, capital (em suas diferentes formas). O Direito não pode, simplesmente, decretar uma forma ou outra de uso ou interação desses fatores, pois isso depende da ação humana voluntária, não coercitiva. Pode até haver formas de coerção, mas elas jamais serão superiores às formas livremente escolhidas pelos indivíduos, que normalmente buscam sua satisfação no atendimento de suas próprias necessidades (não apenas em bens materiais, mas também em poder, prestígio social, reconhecimento coletivo, etc.).
Resumindo meu pensamento: o Direito pode, sim, ajudar a transformar, para melhor, a economia do Brasil, mas ele não pode pretender se substituir à livre interação dos indivíduos buscando sua satisfação pessoal por meio de atividades econômicas. O Brasil, justamente, é um exemplo de leis pessimamente concebidas para distribuir felicidade a todos e a cada um, sem uma adequação dessas normas às realidades imanentes no terreno da economia: distribuir sem produzir é uma delas, e é justamente o que se tentou fazer nos últimos 13 ou 14 anos, com péssimos resultados.

3) Comente o recente episódio de um diplomata alertando colegas sobre um “golpe” iminente no Brasil. Como a diplomacia brasileira é vista no mundo diante de episódios como esse?
PRA: Esse episódio não teria tido a menor importância, e não teria de forma nenhuma afetado a diplomacia brasileira ao redor do mundo, se tivesse sido circunscrito ao terreno que era o seu, originalmente: o de simples circulares internas (ou seja, não dirigidas a outros governos, como são as notas diplomáticas), expedidas a postos do Brasil no exterior, e destinadas a produzir efeitos internos; elas foram prontamente abafadas e anuladas por uma circular superior, que as eliminou da série oficial de circulares expedidas. O fato de que tenham sido “vazadas” para a imprensa ocasionou uma discussão que ultrapassa em muito sua importância real. Seu autor, um diplomata que pode ser classificado literalmente como “diplomata do MST”, foi aparentemente advertido pela chefia da Casa, e proibido de ter acesso ao sistema de expedição de expedientes da Secretaria de Estado. É um fato que ele solicitava, na circular, que os postos indicassem diplomatas para “dialogar” com “movimentos sociais” em cada país, para alertar sobre os perigos ou ameaças desse “golpe” imaginado (que aliás é o mesmo discurso do Executivo, do partido e dos movimentos ditos “sociais” que o sustentam). Mas, é de se imaginar, também, que nenhum chefe de posto sensato, de embaixada, delegação ou consulado brasileiro, fosse levar a sério circulares manifestamente desequilibradas, em total descompasso com as normas e práticas da diplomacia profissional brasileira. Ninguém faria nada: apenas consideraria aquilo algo ridículo, e deixariam passar, sem nenhuma atitude prática: no máximo, seria objeto de risos.
Com essa repercussão externa, é possível que o prestígio da diplomacia brasileira se veja abalado moderadamente, mas na verdade as chancelarias dos demais países iriam certamente considerar que, nos mais respeitáveis serviços diplomáticos, se escondem personalidades bizarras ou militantes fervorosos de uma causa qualquer. Em resumo: eu não daria a menor importância a um episódio como esse no plano externo, a não ser a constatação, lamentável, que mesmo um serviço altamente profissional como o Itamaraty se vê, por vezes, contaminado por essa diplomacia partidária que se apossou até de um órgão de Estado que deveria estar acima de esquizofrenias governamentais.

4) De que forma a próxima geração de líderes e de defensores do liberalismo no Brasil pode construir uma organização de Estado e de relação do público e privado de forma a combater a má gestão e a corrupção endêmica no país?
PRA:  Pergunta extremamente complexa, e difícil de responder em poucos parágrafos, pois ela abarca toda a estrutura da organização política e social, e os fundamentos da atividade econômica no país. Para que líderes “liberais” pudessem conduzir tal obra gigantesca em suas dimensões e complexidade seria preciso, em primeiro lugar, que eles ocupassem posições de mando, no mundo político, na esfera econômica, no mundo das ideias, no comando das universidades, das organizações sociais. Ora, essa possibilidade é para mim altamente questionável, senão impossível nas circunstâncias atuais do Brasil, um país fortemente marcado pelo centralismo estatizante de raiz luso-ibérica, pelo patrimonialismo disseminado desde séculos, pelo mandonismo das elites (geralmente identificadas com seus próprios interesses de “casta” ou de corporação), e minimamente identificadas com a construção daquelas condições mínimas que estabelecemos como necessárias para que tais objetivos se realizem: Estado de Direito e economia de mercado.
Por isso mesmo, eu diria que que o principal objetivo dos “liberais” no Brasil – e coloco entre aspas pois lhes falta tradição, aprofundamento doutrinário, um ambiente de debate de ideias tendente ao liberalismo, coisas extremamente raras no país – seria realizar um esforço didático de convencimento das elites, da opinião pública esclarecida (ou seja, universitários em geral), empresários ou simples cidadãos educados, de que uma economia de mercado, com menor peso do Estado é uma condição essencial para que o país disponha de condições para construir aquilo que desejamos, um Estado de Direito (que é aquele que reconhece que as leis e normas impessoais são o fundamento das relações sociais, e não os vínculos privilegiados com detentores de poder político).
Acredito, também, que a atual crise política e econômica, que é também uma crise moral, derivada da descoberta do maior caso de corrupção já ocorrido em nosso país, conduzido pelo próprio partido que ocupa o poder, pode desempenhar, ainda que parcialmente, esse papel didático de conscientizar cidadãos e elites (algumas sendo presas) de que a construção do Estado de Direito e de uma economia de mercado é uma exigência do momento presente e da organização futura do sistema político e da vida econômica em nosso país. Devemos ser especialmente gratos ao pequeno grupo de valentes batalhadores da “República de Curitiba”, que está resgatando o sentido de honradez e dignidade que deveria ser a norma básica do relacionamento social e, sobretudo, do exercício da governança política e econômica no Brasil. Vai ser difícil, mas precisamos vencer essa batalha, se quisermos viver num país “normal”.
Vejam que sequer falei em um país “liberal”, mas apenas em país normal. Apenas isso já seria um avanço. Depois disso vamos lutar por uma economia de livres mercados, de partidos políticos representativos, sem financiamento estatal, e também por um Estado verdadeiramente mínimo, que é a melhor garantia de não haver mais esses tristes episódios de corrupção no país. Eu disse exatamente Estado mínimo, ainda que tenha plena consciência de que se trata de um objetivo distante, quiçá inatingível. Mas, para mim, o Estado mínimo permanece na esfera dos valores e princípios, pois eu não sou um “ideólogo liberal” para acreditar ingenuamente que ele seja aplicável agora.

5) Com o acesso crescente da imprensa internacional aos fatos do Brasil, e vice-versa, nosso acesso à imprensa de fora, qual seria a visão dos estrangeiros sobre a situação do governo no Brasil e de um eventual governo Temer?
PRA: Impossível comentar esses aspectos: a chamada imprensa internacional é extremamente variada, em cobertura e na diversidade de opiniões, assim como na presença, ou não, de correspondentes dos principais órgãos – Economist, New York Times, Financial Times, BBC, agências de notícias, etc. – em nosso país. Todos eles seguem muito profissionalmente o que se passa aqui, e apenas veículos a serviço de certos governos distorcem os fatos que assistimos todos os dias pela televisão. Ou seja, é impossível esconder o que se passa no Brasil. Governos responsáveis, em geral, se abstêm de se imiscuir nos assuntos internos de outros países, mas também assistimos a episódios ridículos de líderes estrangeiros se pronunciando nos mesmos termos que são empregados pelo Executivo e seu partido: direita, golpe, ilegalidade, e outras bobagens.
Grandes órgãos de imprensa – Economist, Washington Post, por exemplo – já se pronunciaram pela saída da presidente (renúncia ou impeachment), mas não depende deles essa saída, ainda que isso possa reforçar as correntes coincidentes com esse tipo de posição no país: quando grandes veículos como esses chegam a esse tipo de “intrusão” nos assuntos internos de um país, é porque a situação realmente chegou a um ponto de ruptura, e a uma percepção de que não existe outra saída. Assim, mesmo aqueles veículos neutros, ou até favoráveis ao governo atual, vão passar a julgar que o final está próximo, e isso pode ser positivo, tanto interna quanto externamente. Todos reconhecem que o Brasil precisa de uma nova direção, um novo governo, para superar a presente crise econômica e a situação de total anomia política, com a virtual paralisia do governo, e a uma grave divisão do país (mas claramente a favor do final do governo, numa proporção aproximada de 80 a favor e 10 contra esse final).
Não creio que esses veículos se pronunciarão agora sobre um eventual governo Temer, pois a especulação seria demasiada nas circunstâncias presentes. A maioria desses órgãos desejam uma saída constitucional e pacífica da atual situação de caos. Consumada a transição, seus correspondentes e as agências de imprensa começaram a enviar informes analíticos sobre as chances de um governo concreto no Brasil, que pode ser Temer, ou qualquer outro arranjo derivado de um entendimento político no país. No momento a situação é a de que uma solução pacífica, ou seja, não venezuelana, seja encontrada para a presente crise econômica e política no Brasil.

6) Quão responsável foi o governo petista por prejudicar a atividade diplomática brasileira?
PRA: Minha posição é “suspeita”, pois eu mesmo sou diplomata, da ativa, ainda que não exercendo atividades vinculadas à atual diplomacia, e isso desde o início do governo petista, uma vez que fui imediatamente percebido como “opositor” do regime lulopetista (com imenso orgulho, aliás, por não ter sido obrigado a defender posições de um governo ao qual sou oposto, e cuja política externa considero equivocada em suas grandes linhas). Levando isso em consideração, devo dizer que essa diplomacia partidária gozou de ampla e imensa aceitação na academia brasileira, e em largos extratos da opinião pública, influenciada por correntes identificadas com o nacionalismo primário, o anti-imperialismo infantil, um terceiro-mundismo ingênuo, que são posturas com as quais o governo lulopetista está claramente identificado.
Na própria diplomacia profissional, o acolhimento dessas posturas ingênuas e claramente equivocadas foi muito discreto, embora muitos tenham saudado, no início, a renovação de algumas posições diplomáticas (supostamente mais independentes, ou “autonômas”, e não “submissas” a um fantasmagórico “Consenso de Washington”, ou às “potências hegemônicas”). Muitos o fizeram por carreirismo, oportunismo, por mero interesse pessoal, pois estar alinhado e servir fielmente a um determinado governo pode sempre render promoções, boas posições de chefia e bons postos no exterior. De modo geral, a diplomacia brasileira se identifica em grande medida com algumas ideias defendidas pelos companheiros no poder: o desenvolvimentismo à la Cepal, o forte papel do Estado na promoção do crescimento, a seleção de investimentos estrangeiros que se “coadunem” com um suposto “projeto nacional” de desenvolvimento, a autonomia na definição de políticas nacionais (os chamados “policy spaces”, pelos quais se deveria lutar, em lugar de liberalizar amplamente, ou abrir-se economicamente) ou quaisquer outras ideias que sempre tiveram o favor de acadêmicos e mesmo de líderes de nossa indústria (geralmente protecionista e demandante de subsídios estatais).
Considero tudo isso profundamente equivocado, mas sou provavelmente parte de uma minoria extremamente reduzida (com perdão pela redundância) que se pauta por ideias liberais, a favor da globalização sem restrições, e amplamente defensor de valores e princípios democráticos, sem qualquer concessão a regimes autoritários e despóticos, como são exatamente aqueles privilegiados atualmente pelo governo companheiro. Por isso mesmo, considero que os governos petistas fizeram muito mal à diplomacia profissional brasileira, à nossa política externa e aos interesses nacionais do Brasil como um todo. Trata-se de uma fase sombria de nosso itinerário político, e não apenas na diplomacia e na política externa, mas sobretudo e principalmente na vida política nacional, com episódios lamentáveis de corrupção e de inépcia comprovada na condução dos negócios públicos. Todos esses episódios lamentáveis foram direta e expressamente provocados por um governo dominado por um partido que se identifica mais com uma organização criminosa do que com um movimento político normal.

7) Qual seria a solução para esse governo mal administrado?
PRA: De fato, não apenas mal administrado, ou seja, incompetente, mas também profundamente corrupto e corruptor, de uma forma como nunca tínhamos visto antes no Brasil. Infelizmente não possuímos o instrumento do “recall”, ou seja, um referendo popular que visa destituir um governo desse tipo. Com mais de 80% de desaprovação, os ineptos e corruptos no poder já teriam sido expulsos do poder, independentemente de também serem julgados e condenados pelos crimes que cometeram. Tampouco possuímos um dispositivo como o existente na Constituição do Paraguai, que simplesmente permite o impeachment de um presidente por simples incompetência, justamente, pelo julgamento político de uma maioria qualificada do Senado, sem necessidade de se comprovar qualquer crime de responsabilidade. Se esses dois expedientes existissem, na institucionalidade brasileira, o governo petista teria provavelmente acabado nos primeiros meses de 2015, mesmo se o Senado poderia resistir (por motivos que adivinhamos) a um tal “julgamento” expedito (o que não ocorreria no caso do “recall” popular (mas que ainda assim precisaria ser aprovado pelo parlamento para que fosse realizado).
No caso do Brasil, onde existe uma nítida e constante tensão entre a maioria presidencial (o voto direto dos eleitores) e a maioria congressual (necessariamente dispersa e sujeita ainda, no caso brasileira, a essa formidável fragmentação partidária), o que sempre foi fonte de instabilidade política, uma saída sem crise é muito difícil, e as rupturas tendem a ser dolorosas, como já experimentamos em diversas ocasiões de nossa história: 1954, 1955, 1961, 1964, 1992 e agora.
Respondendo objetivamente à questão: a resposta para um governo mal administrado é eleição e substituição de lideranças, mas isso em circunstâncias normais. No caso da profunda, extremamente grave crise tripla que enfrentamos – política, econômica e moral – não temos solução a não ser pressão pela renúncia ou condução de um processo de impeachment, na devida forma constitucional. Não será fácil, pois o governo inepto e corrupto dos lulopetistas foi extremamente eficiente no total aparelhamento de toda a máquina estatal (inclusive nos tribunais superiores) e domina amplamente os espectros sindical e dito “social” de organizações de massa, dispondo ainda de vastos recursos “não contabilizados”, para literalmente comprar apoios nessas esferas, como geralmente fazem organizações criminosas (quando não pela ameaça de violência ou de distúrbios sociais). Eles ainda contam com muita simpatia até em altas esferas das elites, por razões ideológicas ou por interesses pecuniários.
Estamos em face, portanto, de um processo extremamente difícil, que pode custar muito ao país para encontrar uma via ulterior de normalização e de estabilidade, e que pode inclusive levar a grandes divisões na sociedade, dada a capacidade de mobilização e de “convencimento” (em suas variadas formas) dessa organização criminosa que passa por ser um partido político.

8) Tendo em vista que o sistema democrático brasileiro ter sido destruído pela plutocracia cleptocrática atual, o que recomenda para o Brasil e para os brasileiros no que tange a reconstrução do sistema democrático-republicano?
PRA: Sempre considerei, e afirmo isso, que nossa democracia é de muito baixa qualidade, por diferentes motivos que não cabe aqui explicar, mas que são facilmente constatáveis quando se observa o funcionamento dos três poderes (eu disse dos três poderes). Reconstruir algo profundamente deformado é muito difícil, inclusive porque o tipo de representação política proporcional no Congresso – inventado, e deformado, pelo “pacote de abril” de 1977, no regime militar, portanto – torna extremamente complicado obter-se maiorias para quase tudo de relevante, sobretudo no plano da própria representação política, da organização partidária, da estrutura tributária, da redistribuição de competências e recursos nos três níveis da federação, das próprias emendas constitucionais que devem regular matérias que NUNCA deveriam estar numa carta constitucional (literalmente esquizofrênica, em especial no capítulo econômico).
Ou seja, os problemas não derivam apenas de termos uma máfia dirigindo o país atualmente, ou de que algumas elites econômicas se tenham prostituído no apoio a essa organização criminosa em troca de vantagens financeiras, mas sim derivam de uma longa acumulação de desacertos construídos nas últimas décadas, desde praticamente a era Vargas (a legislação laboral, por exemplo), o regime militar (extrema centralização e peso excessivo do Estado na economia e em toda a vida da nação), até chegar na fase da redemocratização, quando a esquizofrenia do redistributivismo ingênuo e ignorante se impôs previamente às simples evidências de que era preciso primeiro ficar rico antes de pensar em distribuir benesses estatais (que só poderiam existir com base numa extração crescente de recursos da sociedade).
Os problemas do Brasil são, portanto, estruturais, embora eles tenham sido exacerbados, agravados, levados ao ponto de ruptura pela citada cleptocracia que se apossou do poder e começou a fazer exercícios de “engenharia social” na mais profunda ignorância das boas regras da vida econômica, mas também começou a assaltar o Estado, toda a nação, as empresas públicas e privadas com uma voracidade poucas vezes antes vista na história MUNDIAL. O grau de corrupção existente no Brasil atualmente, aceito e praticado pelo poder central, e rapidamente disseminado em TODAS as esferas da administração pública, encontra poucos paralelos na história do mundo, só existente em outros estados cleptocratas menos importantes ou menos conhecidos. Impossível, na verdade, dimensionar a extensão do assalto ao país conduzido pela horda de bárbaros que tomou conta do Brasil a partir de um certo momento, mas os números já revelados impressionam pela desfaçatez dos atores.
O ideal seria que se conseguisse fazer uma limpeza completa do sistema cleptocrático: de um lado pela expulsão dos bandidos do poder, e numa próxima eleição pelo banimento de todos os corruptos já identificados da vida pública; de outro lado, pela ação eficiente de alguns setores do judiciário (MPF e PF basicamente) que podem e devem julgar e condenar bandidos políticos e empresários promíscuos, assim como todos os personagens envolvidos na gigantesca rede de corrupção atualmente sob investigação. Esse seria o ideal. Não creio, porém, que consigamos atingir uma limpeza completa.
Mas, independentemente dessas tarefas punitivas, o mais importante é justamente o esforço didático para convencer a maioria dos cidadãos de que o Brasil precisa funcionar em outras bases, completamente diferentes das que vêm servindo de base, atualmente e nas últimas décadas, para a governança política e para a organização da vida econômica em nosso país. Se ouso sugerir minha própria lista de reformas INDISPENSÁVEIS para essas tarefas, alinho aqui algumas propostas nesse sentido.

1) Redução radical do peso do Estado na vida da nação, começando pela diminuição à metade do número de ministérios, com a redução ou eliminação concomitante de uma série de outras agências públicas, na linha do que já propus nesta “mensagem” ao Congresso Nacional: http://domtotal.com/colunas/detalhes.php?artId=4955;
2) Fim do Fundo Partidário e financiamento exclusivamente privado dos partidos políticos, como entidades de direito privado que são;
3) Redução e simplificação da carga tributária, com seu início mediante uma redução linear, mas geral, de todos os impostos atualmente cobrados nos três níveis da federação, à razão de 0,5% de suas alíquotas anualmente, até que um esquema geral, e racional de redução ponderada seja acordado no Congresso envolvendo as agências pertinentes das unidades da federação dotadas de capacidade arrecadatória;
4) Eliminação da figura inconstitucional do contingenciamento orçamentário pelo Executivo; a lei orçamentária deve ser aplicada tal como foi aprovada pelo Parlamento, e toda e qualquer mudança novamente discutida em nível congressual; fica também eliminadas as emendas individuais ou dotações pessoais apresentadas pelos representantes políticos da nação; todo orçamento é institucional, não pessoal;
5) Extinção imediata de 50% de todos os cargos em comissão, em todos os níveis e em todas as esferas da administração pública, e designação imediata de uma comissão parlamentar, com participação dos órgãos de controle e de planejamento, para a extinção do maior volume possível dos restantes cargos, reduzindo-se ao mínimo necessário o provimento de cargos de livre nomeação; extinção do nepotismo cruzado;
6) Eliminação total de qualquer publicidade governamental que não motivada a fins imediatos de utilidade pública; extinção de órgãos públicos de comunicação com verba própria: a comunicação de temas de interesse público se fará pela própria estrutura da agência no âmbito das atividades-fim, sem qualquer possibilidade de existência de canais de comunicação oficiais;
7) Criação de uma comissão de âmbito nacional para estudar a extinção da estabilidade no setor público, com a preservação de alguns poucos setores em que tal condição funcional seja indispensável ao exercício de determinadas atribuições de interesse público relevante;
8) Início imediato de um processo de reforma profunda dos sistemas previdenciários (geral e do setor público), para a eliminação de privilégios e adequação do pagamento de benefícios a critérios autuarias de sustentabilidade intergeracional do sistema único;
9) Reforma radical dos sistemas públicos de educação, nos três níveis, segundo critérios meritocráticos e de resultados;
10) Reforma do Sistema Único de Saúde, de forma a eliminar gradualmente a ficção da gratuidade universal, com um sistema básico de atendimento coletivo e diferentes mecanismos de seguros de saúde baseados em critérios de mercado;
11) Revisão dos sistemas de segurança pública, incluindo o prisional-penitenciário, por meio de uma Comissão Nacional de especialistas do setor;
12) Eliminação de todas as isenções fiscais e tributárias, ou privilégios exorbitantes, associados a entidades religiosas;
13) Reforma da Consolidação da Legislação do Trabalho, no sentido contratualista, e extinção imediata do Imposto Sindical e da unicidade sindical, conferindo liberdade às entidades associativas, sem quaisquer privilégios estatais para centrais sindicais; no limite, extinção da Justiça do Trabalho, que é, ela mesma, criadora de conflitos e de extrema litigiosidade, impondo um custo enorme à sociedade;
14) Revisão geral dos contratos e associações do setor público, nos três níveis da federação, com organizações não governamentais, que em princípio devem poder se sustentar com recursos próprios, não com repasses orçamentários oficiais;
15) Privatização de todas as entidades públicas não vinculadas diretamente a uma prestação de serviço público sob responsabilidade exclusiva do setor público.

Eu teria muitas outras propostas de reformas a fazer – como por exemplo a extinção do salário mínimo para permitir pleno emprego no Brasil, a abertura ampla ao comércio e aos investimentos internacionais –, mas me contento no momento com estas quinze reivindicações para a melhoria do Brasil.
Como se pode verificar, nada disso é muito fácil, ou será conduzido de maneira exitosa nos próximos anos, ou décadas. Mas estas me parecem ser ideias mais ou menos condizentes com um Brasil liberal, ou seja, um país totalmente diferente do que tem sido historicamente e até hoje.
Ilusão, utopia da minha parte. Não creio. Nenhuma dessas propostas apresenta dificuldades técnicas, são socialmente prejudiciais ao desenvolvimento do país (ao contrário, elas permitiriam o crescimento e o desenvolvimento) ou apresentam efeitos nefastos do ponto de vista social. Elas são apenas politicamente difíceis, não porque sejam impossíveis de serem conduzidas pela via legislativa, mas porque ainda não nasceram (ou apareceram) estadistas capazes de conduzi-las, ou porque nossa classe política, nossas elites, de forma geral, estão despreparadas para enfrentar esse rol de reformas modernizadoras.
Cada vez me convenço mais que não temos propriamente um problema de atraso material a vencer, mas sobretudo alguns bloqueios mentais a serem superados. O trabalho dos liberais, nos anos e décadas à frente deve contudo orientar-se nessa direção: menos Estado, mais liberdades econômicas, mais responsabilização da classe política, maior participação e consciência cidadã.
O caminho está dado, vamos empreendê-lo.

Paulo Roberto de Almeida 
Brasília, 5 de abril de 2016

terça-feira, 29 de março de 2016

José Guilherme Merquior: um dos maiores (senão o maior) intelectuais brasileiros - Estudantes Pela Liberdade

Uma nova oportunidade para assistir ao documentário "José Guilherme Merquior - Paixão pela Razão"! Obra sobre um dos mais importantes liberais que o Brasil já teve.
No documentário, de um lado, destaca-se o traço biográfico determinante do percurso de Merquior: a precocidade. E isso em vários aspectos: existencial, intelectual e profissional. De outro lado, assinala-se o motor de sua obra: o investimento decidido na ideia de razão. Ou seja, a aposta de Merquior na capacidade argumentativa e no diálogo intenso com o texto do outro como forma própria da reflexão crítica. O documentário é enriquecido pelos depoimentos de Alberto da Costa e Silva, Bolívar Lamounier, Celso Lafer, José Mario Pereira, Júlia Merquior, Nélida Piñon e João Cezar de Castro Rocha. Desse modo, cumpre-se o principal propósito do filme: esclarecer a atualidade do pensamento de José Guilherme Merquior, a fim de promover a discussão sobre seu legado.
Assista ao trailer oficial do documentário: https://goo.gl/yQjzRY
Saiba mais sobre José Guilherme Merquior: http://goo.gl/Wo8hYQ
A partir das 19h
É Realizações Espaço Cultural
Rua França Pinto, 498 - Vila Mariana
Próximo ao metrô Ana Rosa
Entrada franca, vagas limitadas
Inscreva-se em: www.erealizacoes.com.br/eventos

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Eleicoes 2014: o que os liberais podem esperar delas? Talvez pouco... - Paulo Roberto de Almeida

Nota preliminar, importante: Não me classifico como liberal, ou como qualquer outra coisa. Acho que todo rótulo, toda definição sintética, todo e qualquer tipo de classificação conceitual, sobretudo em matérias políticas ou econômica, são necessariamente redutores, quando não simplistas.
Certamente que, tendo vindo do marxismo estatizante, e evoluido com base na simples racionalidade instrumental, nas leituras e nas experiências de vida -- sobretudo depois de ter conhecido TODOS, sublinho todos, os capitalismos realmente existentes, avançados ou atrasados, e todos os socialismos, reais, surreais e esquizofrênicos -- hoje eu sou muito mais liberal em matéria econômica do que era em minha juventude, quando aderia (pelas leituras universitárias, obviamente) às soluções simplistas do socialismo igualitário e estatizante, e reconheço que os mercados livres podem fazer muito mais pela prosperidade dos povos e nações do que os regimes fortemente centralizados.
Mesmo aceitando que algumas soluções podem ter de ser inevitavelmente estatais -- provavelmente em matéria de educação e saúde, mas ainda aqui combinadas a soluções de mercado -- acredito que o Estado deva funcionar o mais possível em condições de competição market-like, ou seja, com abertura e transparência, custo-benefício, preços e retornos aferíveis.
Tendo feito esta longa introdução ao texto abaixo, vou postá-lo, alertando que preparei, preventivamente à pergunta efetuada pelos Estudantes pela Liberdade, como um guia pessoal de conduta, e um esclarecimento preventivo quanto ao próximo pleito.
Ou seja, não espero, e não esperem, muito dele.
As eleições NÃO vão dar o que o Brasil precisa, que seria uma reforma completa de seus fundamentos econômicos, administrativos, educacionais, culturais.
Mas, elas podem pelo menos nos ajudar a AFASTAR o que não serve, e eu digo imediatamente, o que NÃO nos serve: uma máfia totalitária, corrupta e mentirosa, instalada no poder, explorando a ingenuidade dos pobres e a conivência dos espertos e dos muito ricos.
Se ela permitir pelo menos isso, já será um ganho...
Paulo Roberto de Almeida


O que os liberais podem esperar das eleições de 2014?

Paulo Roberto de Almeida


Numa visão preliminar em torno das propostas apresentadas até aqui pelas três principais candidaturas (ou seja, as viáveis), a resposta mais realista seria esta: nada, ou muito pouco. Com efeito, todos os candidatos prometem aprofundar, manter, reforçar os existentes, e iniciar novos programas com benefícios sociais para todos e cada um. Todos prometem combater a inflação – uma preocupação que voltou a assombrar os brasileiros nos últimos três anos, pelo menos – e dizem querer garantir investimentos e empregos, sempre com a mão visível (já bastante pesada) do Estado como o principal indutor dessas políticas. Em outros termos, nada que possa entusiasmar os partidários de menos Estado e mais mercados, como devem ser os liberais, não é mesmo?
Vistos de perto, porém, os programas e as propostas desses candidatos possuem matizes entre si, sobretudo em suas declarações e entrevistas sobre temas específicos da agenda econômica. Com exceção da candidata governista, que promete manter as mesmas políticas de benefícios sociais – o que deixa supor que as mesmas ferramentas usadas até aqui continuarão a ser mobilizadas num eventual segundo mandato, talvez com as mesmas consequências, de menos crescimento e mais inflação – a candidata “sustentável” e o candidato socialdemocrata podem corrigir os equívocos mais nefastos dos atuais proponentes da “nova matriz econômica” (o que seria isso?), cujo efeito mais importante, na verdade, foi mais intervencionismo governamental, com cada vez menor eficácia. A razão principal parece residir num erro de diagnóstico dos keynesianos de botequim encarregados dessa política: eles acreditam que o principal problema da economia brasileira seja a insuficiência da demanda – e lá vão eles com nova expansão do crédito ao consumidor, que deve provocar mais inflação – quando os conselheiros econômicos da oposição acreditam que ele esteja na insuficiência da oferta, ou seja, a falta de investimentos (o que, aliás, é notório para quem quer que olhe os números).
A última novidade criada pela candidata governista foi prometer criar um novo tipo de crédito, para bicicletas, com o quê todos sairão felizes com a “bike” comprada em “dez vezes sem juros”. Os gênios governamentais se esquecem de que foram eles mesmos que criaram o problema, ao aumentar as tarifas de importação sobre as bicicletas chinesas que estavam sendo vendidas no mercado brasileiro, a preços bem mais em conta do que as equivalentes nacionais (mas isso vale para tudo, pois todos sabem que, em função da voracidade do ogro fiscal, o “custo Brasil” se torna cada vez mais pesado para todos os produtores brasileiros). Ou seja, o governo tornou as “bikes” nacionais e estrangeiras mais caras pelo seu protecionismo comercial desenfreado e agora quer endividar ainda mais os pobres consumidores brasileiros com oferta de mais crédito para comprar produtos que poderiam ser mais baratos, seja sem impostos de importação tão elevados, seja mantendo a esquizofrenia econômica do “custo Brasil”.
Liberais verdadeiros prometeriam abertura comercial, não é mesmo? Mas os dois candidatos de oposição prometem apenas “rever o Mercosul” e negociar tratados comerciais com os principais parceiros do Brasil. O que isso quer dizer? Pouco, ou quase nada. A liberalização comercial e a abertura aos investimentos do início dos anos 1990 fez mais para a competitividade e a melhoria da oferta interna de bens industriais do que todas as políticas comerciais e industriais de décadas passadas, mas elas foram breves e, sobretudo, se esgotaram com o “soberanismo econômico” dos governos lulo-petistas, que na verdade conseguiram reprimarizar as exportações brasileiras e reduzir o peso da indústria na composição do PIB. Liberais verdadeiros fariam políticas setoriais válidas para todos, não os remendos e puxadinhos que caracterizaram as improvisações econômicas dos companheiros no poder. Esse keynesianismo rústico só nos conduziu a impasses e a uma situação deplorável, quando comparada aos países que crescem.
A candidata “sustentável” surpreendeu a todos prometendo um “independência” para o Banco Central, o que foi julgado uma heresia perigosa pela candidata governista, que com toda a má-fé de que são capazes marqueteiros desonestos alertou que isso iria tirar comida dos pratos dos brasileiros. Não considerando a mentira deslavada, o que isso teria a ver com uma orientação liberal na economia? Também muito pouco, a menos que a candidata também prometesse que juros e câmbio iriam ser determinados essencialmente pelas forças de mercado, mais do que por considerações de governo. Ou seja, um banco central independente – mas comprometido com resultados que devem ser fixados por um Conselho Monetário também independente, com prestação regular de contas ao Congresso – pode, eventualmente, atuar mais energicamente no combate à inflação, e na defesa do poder de compra da moeda, como é o seu dever, do que um que ache que crescimento e emprego são objetivos das autoridades monetárias, e não do próprio governo, com políticas fiscais e setoriais adequadas.
O candidato socialdemocrata, por sua vez, já anunciou quem seria o seu ministro da Fazenda, o mesmo que estabilizou o real em 1999, que reequilibrou as contas externas em 2000, e que preparou as condições para a retomada do crescimento logo após, perspectiva perturbada porém pela crise argentina, pelos problemas energéticos, logo em seguida, e pela própria campanha eleitoral de 2002, quando as ameaças de “mudar tudo” levaram o dólar e a inflação para as alturas e deram um tombo enorme nos títulos da dívida externa brasileira. Trata-se de uma boa escolha, mas o candidato a ministro das finanças é realista, e sabe que não poderá fazer um “choque liberal” na economia, pois as condições não estão dadas para que o Brasil se torne, rapidamente, um “país normal” no cenário internacional. Sim, um país que vive à base de “dez vezes sem juros”, no qual o governo arrecada 38% do PIB, gasta 41% e investe menos de 2% não pode ser considerado um país normal.
Não existem, assim, condições objetivas para uma transição liberal no Brasil atual, embora se deva reconhecer que os dois candidatos oposicionistas prometem ser infinitamente mais “liberais” do que os keynesianos de botequim que hoje presidem aos rumos da economia brasileira (com os resultados à vista de todos). Uma coisa é certa: liberais terão bem mais espaços em governos conduzidos por um ou outro oposicionista do que a continuidade da gestão incompetente atual (aliás, com um ministro demitido).
A única coisa segura no cenário político atual no Brasil é que continuaremos com políticas econômicas intervencionistas, algumas mais distributivas do que outras, mais produtivistas, mas existem poucas chances de que uma agenda liberal venha a guiar os próximos dirigentes, capaz de aproximar o Brasil dos países maior sucesso no contexto internacional. Para que o Brasil tenha políticas econômicas liberais seria preciso que tivéssemos empresários verdadeiramente adeptos da competição de mercado (e não drogados nos subsídios e na proteção do Estado) e que estadistas com visão de futuro propusessem programas partidários comprometidos com uma nova fase de abertura aos investimentos e de liberalização comercial, para que os “espíritos animais” dos empresários pudessem empurrar o Brasil para um processo de crescimento sustentado, com distribuição social feita essencialmente mediante mecanismos do próprio mercado, em lugar das irracionalidades estatais da atualidade. 
Paulo Roberto de Almeida
Hartford, 28 de setembro de 2014

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Conferencia Nacional dos Estudantes pela Liberdade: o Brasil melhora, demora, mas melhora...

Sim, vai demorar mais uns 50 anos para entrar na modernidade, mas aos poucos, quem sabe, as pessoas vão ficando um pouco mais atiladas.
Os Estudantes Pela Liberdade devem ajudar nesse esforço.
Cada vez que vejo uma coisa assim, me lembro da frase imortal de Mário de Andrade, que deve ter sido escrita aí em torno de 1928:
"Progredir, progredimos um tiquinho, que o progresso também é uma fatalidade..."
Pois é, sendo o progresso uma fatalidade, pode ser que a gente chegue lá, algum dia...
Os EPL devem ajudar...
Paulo Roberto de Almeida

Conferência Nacional EPL 2014

EPL Conferência Nacional EPL 2014
A Conferência Nacional dos Estudantes Pela Liberdade (CNEPL) é um evento voltado para os estudantes e organizações pró-liberdade do Brasil. Este ano a conferência vai ocorrer nos dias 13 e 14 de setembro no Comedians, em São Paulo, SP.
A programação do evento inclui os painéis Guerra: Inimiga da Liberdade, com Tom Palmer, e Política e Cultura, com Diogo Costa e Gregorio Duvivier.
 Clique aqui para acessar a programação completa!

Na sua primeira edição, em 2012, a conferência teve 150 ouvintes, a CNEPL cresceu rapidamente para incluir 280 participantes em 2013. Mais do que uma conferência estudantil, a CNEPL está se tornando o evento imperdível do movimento libertário para organizações e indivíduos que visam mostrar seu trabalho, ganhar atenção da mídia e conectar-se com outros defensores da liberdade.

sábado, 16 de novembro de 2013

Estudantes Pela Liberdade recebem premio da Atlas Network

EPL recebe prêmio de melhor grupo estudantil do mundo em 2013!

Em fevereiro de 2012, tratava-se de um pouco mais de uma dúzia de estudantes brasileiros. Eram todos jovens, sonhadores, vindos de vários estados do país. Estavam reunidos em Petrópolis/RJ, durante evento do Instituto Ordem Livre. Ali, decidiram reeditar uma ideia surgida um pouco antes, em 2009, no Rio Grande do Sul: uma organização estudantil que conectasse outros jovens, sonhadores, de várias partes do país. Inspirados no Students For Liberty, que surgira nos Estados Unidos, talvez eles conseguissem juntar várias dezenas de jovens, quem sabe até centenas deles.

E então cada um voltou pra sua casa. Mantiveram contato constante pelas redes sociais. Alguns meses depois, tiraram do papel o primeiro projeto. Era o Diagrama de Nolan, hotsite que ajuda o usuário a identificar a sua própria posição política. Feito de modo completamente colaborativo e financiado através de plataformas de crowndfunding. A ideia não deu simplesmente certo. O que se viu ali foi um sucesso absoluto, estrondoso. Simplesmente o projeto liberal de melhor desempenho já feito no Brasil no quesito número de pessoas alcançadas/custo de implementação.
A integração surgida com força na internet gerou uma empolgação em todos aqueles jovens – e nos vários outros que passaram a sonhar juntos aquele mesmo sonho. As atividades online passaram a se multiplicar na vida real. E os amantes da liberdade começaram a se encontrar pessoalmente e mudar a rotina de universidades Brasil afora. Às vezes em grupos reduzidos, de 3 ou 4 pessoas. Às vezes em grupos expressivos, de 40 a 50 estudantes debatendo ideias de liberdade. Outras, como se viu em Fortaleza na última semana, atraindo centenas de curiosos para ouvir o que a liberdade tem a dizer.
Aquela dúzia de sonhadores cresceu. Agora são quase 20 mil seguidores em todo Brasil. E, hoje, agora há pouco, no Liberty Forum, evento promovido por uma das maiores organizações internacionais em defesa da liberdade, a Atlas Network, os Estudantes Pela Liberdade venceram o Smith Student Outreach Prize, o prêmio de melhor organização estudantil do ano.
Um reconhecimento fantástico por todo o trabalho desempenhado até aqui. Mas muito mais do que isso: um combustível para avançarmos ainda mais, melhor e mais rapidamente na construção de nosso objetivo. Estudantes Pela Liberdade – Academia livre, sociedade livre.

Obrigado a todos os estudantes, professores, profissionais e admiradores que compõem e colaboram com a rede Estudantes Pela Liberdade!

domingo, 20 de outubro de 2013

O que eu faria se fosse presidente por um dia? Boa pergunta... - Estudantes pela Liberdade

Recentemente deparei-me na internet com o anúncio deste encontro promovido pelos Estudantes pela Liberdade, um movimento que marcha contra a corrente atual no Brasil, que considero ser a da construção do fascismo, com o apoio ativo dos movimentos "sociais" em geral, e da União Nacional dos Estudantes em particular (todos eles na folha de pagamento do lulo-petismo, justamente o poder que está construindo o fascismo no Brasil):

O cartaz do evento, já realizado, encontra-se neste link:
http://epl.org.br/files/2013/10/1371371_668276043183990_800365458_n.jpg

Conheço os palestrantes, mas desconheço o que eles disseram. Procurei na página do epl.org.br, mas não encontrei nada sobre o encontro.

Mas, no meu caso, o que eu poderia dizer?

Bem, começaria dizendo que um dia é pouco para realizar o imenso rol de tarefas para consertar o Brasil, uma tarefa gigantesca não só em virtude dos impedimentos, barreiras e obstáculos constitucionais, mas também em função da mentalidade atualmente em curso no Brasil, um verdadeiro complô generalizado, em todas as classes, em favor de mais Estado, de mais políticas públicas, de mais favores governamentais, enfim, de mais dirigismo, o que eu reputo totalmente contrário ao que seria preciso fazer para começar a consertar o Brasil.
Tarefa difícil, portanto, inclusive porque o presidente pode muito mas não pode tudo, e depende do Congresso para aprovar inclusive mudanças no âmbito do próprio poder executivo, o que parece normal (menos normal é o fato de o Congresso e o Judiciário administrarem seus orçamentos em total independência, impondo gastos crescentes ao país e ao próprio poder executivo).

Acredito que eu começaria reduzindo a máquina pública, ou seja, de uma penada reduziria os ministérios à metade, voltando ao padrão normal dos anos 1970, e extinguiria dezenas, senão centenas de entidades estatais criadas nos últimos anos pelo poder lulo-petista. Demitiria sumariamente dezenas, centenas, milhares de contratados sob cargos de confiança, pois eles podem ser tudo, menos de confiança, justamente, e são absolutamente desnecessário. Eles estão ali para recolher dinheiro para o partido totalitário que tenta controlar a sociedade, e ainda não conseguiu seu intento (mas já se apossou da máquina do Estado).

Não daria para fazer mais, em um dia, mas tentaria encaminhar ao Congresso algumas dezenas de novas emendas constitucionais redutoras, ou seja, extinguindo metade dos absurdos e esquizofrenias ali constantes, e remetendo tudo à legislação ordinária (quando houvesse estrita necessidade, pois muitos dispositivos poderiam ser extintos, deixando a própria sociedade resolver questões de bens e serviços pela via do mercado).
Não creio que haveria aprovação congressual, mas pelo menos suscitaria debate em torno da questão principal, que é o fato de o Brasil possuir uma Constituição que simplesmente impede o crescimento do Brasil.
Formulei algumas dessas críticas num artigo recente, que vou disponibilizar neste espaço:


A Constituição brasileira aos 25 anos: um caso especial de esquizofrenia econômica”, Digesto Econômico (vol. 68, n. 474, Julho-Agosto 2013, p. 64-74; ISSN: 0101-4218). Relação de Originais n. 2505b; Relação de Publicado n. 1105. 

Paulo Roberto de Almeida