Nota preliminar, importante: Não me classifico como liberal, ou como qualquer outra coisa. Acho que todo rótulo, toda definição sintética, todo e qualquer tipo de classificação conceitual, sobretudo em matérias políticas ou econômica, são necessariamente redutores, quando não simplistas.
Certamente que, tendo vindo do marxismo estatizante, e evoluido com base na simples racionalidade instrumental, nas leituras e nas experiências de vida -- sobretudo depois de ter conhecido TODOS, sublinho todos, os capitalismos realmente existentes, avançados ou atrasados, e todos os socialismos, reais, surreais e esquizofrênicos -- hoje eu sou muito mais liberal em matéria econômica do que era em minha juventude, quando aderia (pelas leituras universitárias, obviamente) às soluções simplistas do socialismo igualitário e estatizante, e reconheço que os mercados livres podem fazer muito mais pela prosperidade dos povos e nações do que os regimes fortemente centralizados.
Mesmo aceitando que algumas soluções podem ter de ser inevitavelmente estatais -- provavelmente em matéria de educação e saúde, mas ainda aqui combinadas a soluções de mercado -- acredito que o Estado deva funcionar o mais possível em condições de competição market-like, ou seja, com abertura e transparência, custo-benefício, preços e retornos aferíveis.
Tendo feito esta longa introdução ao texto abaixo, vou postá-lo, alertando que preparei, preventivamente à pergunta efetuada pelos Estudantes pela Liberdade, como um guia pessoal de conduta, e um esclarecimento preventivo quanto ao próximo pleito.
Ou seja, não espero, e não esperem, muito dele.
As eleições NÃO vão dar o que o Brasil precisa, que seria uma reforma completa de seus fundamentos econômicos, administrativos, educacionais, culturais.
Mas, elas podem pelo menos nos ajudar a AFASTAR o que não serve, e eu digo imediatamente, o que NÃO nos serve: uma máfia totalitária, corrupta e mentirosa, instalada no poder, explorando a ingenuidade dos pobres e a conivência dos espertos e dos muito ricos.
Se ela permitir pelo menos isso, já será um ganho...
Paulo Roberto de Almeida
O que os liberais podem esperar das eleições de 2014?
Paulo Roberto de Almeida
Numa visão preliminar em
torno das propostas apresentadas até aqui pelas três principais candidaturas (ou
seja, as viáveis), a resposta mais realista seria esta: nada, ou muito pouco.
Com efeito, todos os candidatos prometem aprofundar, manter, reforçar os
existentes, e iniciar novos programas com benefícios sociais para todos e cada
um. Todos prometem combater a inflação – uma preocupação que voltou a assombrar
os brasileiros nos últimos três anos, pelo menos – e dizem querer garantir
investimentos e empregos, sempre com a mão visível (já bastante pesada) do
Estado como o principal indutor dessas políticas. Em outros termos, nada que
possa entusiasmar os partidários de menos Estado e mais mercados, como devem
ser os liberais, não é mesmo?
Vistos de perto, porém, os
programas e as propostas desses candidatos possuem matizes entre si, sobretudo
em suas declarações e entrevistas sobre temas específicos da agenda econômica.
Com exceção da candidata governista, que promete manter as mesmas políticas de
benefícios sociais – o que deixa supor que as mesmas ferramentas usadas até
aqui continuarão a ser mobilizadas num eventual segundo mandato, talvez com as
mesmas consequências, de menos crescimento e mais inflação – a candidata
“sustentável” e o candidato socialdemocrata podem corrigir os equívocos mais
nefastos dos atuais proponentes da “nova matriz econômica” (o que seria isso?),
cujo efeito mais importante, na verdade, foi mais intervencionismo
governamental, com cada vez menor eficácia. A razão principal parece residir
num erro de diagnóstico dos keynesianos de botequim encarregados dessa
política: eles acreditam que o principal problema da economia brasileira seja a
insuficiência da demanda – e lá vão eles com nova expansão do crédito ao
consumidor, que deve provocar mais inflação – quando os conselheiros econômicos
da oposição acreditam que ele esteja na insuficiência da oferta, ou seja, a
falta de investimentos (o que, aliás, é notório para quem quer que olhe os
números).
A última novidade criada
pela candidata governista foi prometer criar um novo tipo de crédito, para bicicletas,
com o quê todos sairão felizes com a “bike” comprada em “dez vezes sem juros”.
Os gênios governamentais se esquecem de que foram eles mesmos que criaram o
problema, ao aumentar as tarifas de importação sobre as bicicletas chinesas que
estavam sendo vendidas no mercado brasileiro, a preços bem mais em conta do que
as equivalentes nacionais (mas isso vale para tudo, pois todos sabem que, em
função da voracidade do ogro fiscal, o “custo Brasil” se torna cada vez mais
pesado para todos os produtores brasileiros). Ou seja, o governo tornou as
“bikes” nacionais e estrangeiras mais caras pelo seu protecionismo comercial
desenfreado e agora quer endividar ainda mais os pobres consumidores
brasileiros com oferta de mais crédito para comprar produtos que poderiam ser
mais baratos, seja sem impostos de importação tão elevados, seja mantendo a
esquizofrenia econômica do “custo Brasil”.
Liberais verdadeiros
prometeriam abertura comercial, não é mesmo? Mas os dois candidatos de oposição
prometem apenas “rever o Mercosul” e negociar tratados comerciais com os
principais parceiros do Brasil. O que isso quer dizer? Pouco, ou quase nada. A
liberalização comercial e a abertura aos investimentos do início dos anos 1990
fez mais para a competitividade e a melhoria da oferta interna de bens
industriais do que todas as políticas comerciais e industriais de décadas
passadas, mas elas foram breves e, sobretudo, se esgotaram com o “soberanismo
econômico” dos governos lulo-petistas, que na verdade conseguiram reprimarizar
as exportações brasileiras e reduzir o peso da indústria na composição do PIB. Liberais
verdadeiros fariam políticas setoriais válidas para todos, não os remendos e
puxadinhos que caracterizaram as improvisações econômicas dos companheiros no
poder. Esse keynesianismo rústico só nos conduziu a impasses e a uma situação
deplorável, quando comparada aos países que crescem.
A candidata “sustentável”
surpreendeu a todos prometendo um “independência” para o Banco Central, o que
foi julgado uma heresia perigosa pela candidata governista, que com toda a
má-fé de que são capazes marqueteiros desonestos alertou que isso iria tirar
comida dos pratos dos brasileiros. Não considerando a mentira deslavada, o que
isso teria a ver com uma orientação liberal na economia? Também muito pouco, a
menos que a candidata também prometesse que juros e câmbio iriam ser
determinados essencialmente pelas forças de mercado, mais do que por
considerações de governo. Ou seja, um banco central independente – mas
comprometido com resultados que devem ser fixados por um Conselho Monetário
também independente, com prestação regular de contas ao Congresso – pode,
eventualmente, atuar mais energicamente no combate à inflação, e na defesa do
poder de compra da moeda, como é o seu dever, do que um que ache que
crescimento e emprego são objetivos das autoridades monetárias, e não do
próprio governo, com políticas fiscais e setoriais adequadas.
O candidato
socialdemocrata, por sua vez, já anunciou quem seria o seu ministro da Fazenda,
o mesmo que estabilizou o real em 1999, que reequilibrou as contas externas em
2000, e que preparou as condições para a retomada do crescimento logo após,
perspectiva perturbada porém pela crise argentina, pelos problemas energéticos,
logo em seguida, e pela própria campanha eleitoral de 2002, quando as ameaças
de “mudar tudo” levaram o dólar e a inflação para as alturas e deram um tombo
enorme nos títulos da dívida externa brasileira. Trata-se de uma boa escolha,
mas o candidato a ministro das finanças é realista, e sabe que não poderá fazer
um “choque liberal” na economia, pois as condições não estão dadas para que o
Brasil se torne, rapidamente, um “país normal” no cenário internacional. Sim,
um país que vive à base de “dez vezes sem juros”, no qual o governo arrecada
38% do PIB, gasta 41% e investe menos de 2% não pode ser considerado um país
normal.
Não existem, assim,
condições objetivas para uma transição liberal no Brasil atual, embora se deva
reconhecer que os dois candidatos oposicionistas prometem ser infinitamente
mais “liberais” do que os keynesianos de botequim que hoje presidem aos rumos
da economia brasileira (com os resultados à vista de todos). Uma coisa é certa:
liberais terão bem mais espaços em governos conduzidos por um ou outro oposicionista
do que a continuidade da gestão incompetente atual (aliás, com um ministro
demitido).
A única coisa segura no
cenário político atual no Brasil é que continuaremos com políticas econômicas
intervencionistas, algumas mais distributivas do que outras, mais
produtivistas, mas existem poucas chances de que uma agenda liberal venha a
guiar os próximos dirigentes, capaz de aproximar o Brasil dos países maior
sucesso no contexto internacional. Para que o Brasil tenha políticas econômicas
liberais seria preciso que tivéssemos empresários verdadeiramente adeptos da
competição de mercado (e não drogados nos subsídios e na proteção do Estado) e
que estadistas com visão de futuro propusessem programas partidários
comprometidos com uma nova fase de abertura aos investimentos e de
liberalização comercial, para que os “espíritos animais” dos empresários
pudessem empurrar o Brasil para um processo de crescimento sustentado, com
distribuição social feita essencialmente mediante mecanismos do próprio
mercado, em lugar das irracionalidades estatais da atualidade.
Paulo Roberto de Almeida
Hartford, 28 de setembro de 2014