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terça-feira, 25 de maio de 2010

Reforma Agraria: chamando as coisas pelos nomes (Katia Abreu)

O Brasil exibe, atualmente, uma completa inversão de valores, e a sociedade assiste, estupefata, a cenas explícitas de ilegalidades, sancionadas pelo governo.
O texto abaixo restabelece algumas verdades que precisam ser ditas.

A esquerda não quer a reforma agrária
KÁTIA ABREU
O Estado de S.Paulo, 25 de maio de 2010

Nada obsta mais a reforma agrária no Brasil que a manipulação político-partidária que dela se faz. A estratégia criminosa de invasões de terras é a ponta de lança desse processo. Transforma o produtor rural em vilão e o invasor em vítima, numa espantosa inversão de valores. A entidade que tudo patrocina, o Movimento dos Sem-Terra (MST), inexiste juridicamente, o que impede reparações judiciais.

O governo, que deveria garantir a segurança dos contribuintes, faz vista grossa, emite declarações simpáticas aos invasores e chega ao requinte de produzir um decreto, o PNDH-3, em que os considera parte a ser ouvida antes de o invadido recorrer à Justiça para reclamar a reintegração de posse. Pior: financia os invasores, via ONGs constituídas com a única finalidade de gerir uma entidade abstrata, embora concreta em seu objetivo predatório. Acumulam-se aí ilícitos: além da invasão, há o ato irregular governamental, denunciado pelo ministro Gilmar Mendes, do STF, de financiar entidades que burlam a lei.

Quanto já foi gasto - sabe-se que são centenas de milhões de reais - a pretexto da reforma agrária, em dinheiro repassado a essas ONGs? E o que de concreto foi feito para realizá-la? Qual a produtividade dos assentamentos do MST? São perguntas sem resposta, que justificaram a instalação de uma CPI mista no Congresso Nacional, sistematicamente sabotada pela maioria governista.

Em vez de respondê-las, os agentes partidários, travestidos de funcionários públicos, empenham-se em difundir a infâmia de que a maioria dos produtores rurais ou é predadora do meio ambiente ou escravagista. A manipulação de causas contra as quais ninguém, na essência, se opõe é um dos truques de que se vale uma certa esquerda fundamentalista, adversária da livre-iniciativa, para manter como reféns os produtores rurais, difamando-os.

Nenhuma pessoa de bem - e a imensa maioria dos produtores rurais o é - é a favor do trabalho escravo ou da destruição do meio ambiente. Mas isso não significa que concorde com qualquer proposta que se apresente a pretexto de defender tais postulados. Não basta pôr na lei punições contra o "trabalho degradante". É preciso que se defina o que é e o que o configura concretamente, princípio elementar da técnica jurídica.

A lei não pode ser meramente adjetiva, o que a torna, por extensão, subjetiva, permitindo que seja aplicada conforme o critério pessoal do agente público. Foi esse o ponto que me fez, como deputada federal e depois como senadora, exigir emendas a uma proposta legislativa de punição por trabalho escravo. Não o defendo e o considero uma abjeção inominável. Quem o promove deve ser preso e submetido aos rigores da lei, sem exceção, sem complacência. Mas tão absurdo e repugnante quanto o trabalho escravo é manipulá-lo com fins ideológicos.

O que se quer é o fim da livre-iniciativa no meio rural, pela sabotagem ao agronegócio, hoje o segmento da economia que mais contribui para o superávit da balança comercial do País.

A fiscalização das propriedades rurais está regulada pela Norma Regulamentar n.º 31 do Ministério do Trabalho (MT), que tem 252 itens e desce a detalhes absurdos, como estabelecer a espessura do pé do beliche e do colchão.

Afirmei, em razão desses excessos, ser impossível cumpri-la em sua totalidade e que havia sido concebida exatamente com essa finalidade. Tanto bastou para que fosse acusada de defender o trabalho escravo, recusando-me a cumprir práticas elementares, como o fornecimento de água potável e condições básicas de higiene. Desonestidade intelectual pura.

A Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), que presido, tem sido bem mais eficaz que o Estado na fiscalização trabalhista nas propriedades rurais. Basta conferir os números: os grupos móveis de fiscalização do MT percorreram, em sete anos - de 2003 até hoje -, 1.800 fazendas. A CNA, em 90 dias, percorreu mil fazendas e já está promovendo o circuito de retorno, para averiguar as providências tomadas.

A CNA, com o objetivo de aprimorar o trabalho no meio rural, vai criar um selo social - uma espécie de ISO 9000 trabalhista - para qualificar as propriedades-modelo, qualificando também sua produção. Esse selo indicará não só zelo social, mas respeito ao meio ambiente e adoção de práticas produtivas adequadas. Não queremos responder às injúrias com injúrias, mas com demonstrações concretas de nosso empenho em contribuir para o desenvolvimento econômico e social do País.

É preciso que se saiba que 80% dos produtores rurais brasileiros são de pequeno e médio portes e não suportam economicamente esse tipo de sabotagem, que se insere no rol de crimes contra o patrimônio, de que as invasões de terras são a ponta de lança.

Em quase todos os casos, os enquadrados como escravagistas não são processados. E por um motivo simples: não o são. As autuações trabalhistas que apontam prática de trabalho escravo são insuficientes para levar o Ministério Público a oferecer denúncias pela prática de infrações criminais. O resultado é que, enquanto isso não ocorre, o produtor tachado de escravagista fica impedido de prosseguir em seu negócio e acaba falido ou tendo de abrir mão de sua propriedade. A agressão, como se vê, não é somente contra o grande proprietário, mas também contra a agricultura familiar, cuja defesa é o pretexto de que se valem os invasores e difamadores.

Diante disso tudo, não hesito em afirmar que se hoje o processo de reforma agrária não avança no País a responsabilidade é dessa esquerda fundamentalista, que manobra o MST, consome verbas milionárias do Estado e proclama a criminalização dos movimentos sociais. Não há criminalização: há crimes, com autoria explícita. O MST, braço rural do PT, não quer a reforma agrária, mas sim a tensão agrária, de preferência com cadáveres em seu caminho, de modo a dar substância emocional a um discurso retrógrado e decadente. Reforma agrária não é postulado ideológico, é imperativo do desenvolvimento sustentado. Por isso a CNA a apoia. Por isso o MST e a esquerda fundamentalista não a querem.

SENADORA (DEM-TO), É PRESIDENTE DA CNA

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Uma reforma agraria as avessas...

Plebiscito às avessas
*André Meloni Nassar
O Estado de S. Paulo - Quarta-feira, 21 de Abril de 2010

Conforme citado no Estado, um bispo da Comissão Pastoral da Terra (CPT) declarou, em recente evento organizado pela entidade, que a CPT tem a intenção de dar apoio a um plebiscito, a ser realizado ainda este ano, para avaliar o que a população brasileira acha de se impor um limite ao tamanho das propriedades rurais no País.

Sem entrar no mérito legal de uma decisão dessa natureza, caso ela viesse a ser adotada como consequência do resultado desse plebiscito, vale a pena discutir as questões econômicas que a ideia de restringir o tamanho das propriedades rurais suscita. O gancho que ela traz é o seguinte: Até que ponto vale a pena analisar a eficiência e a competitividade dos sistemas produtivos agropecuários com base nos diferentes tamanhos de propriedade rural?

As pistas para entender essa questão estão no Censo agropecuário de 2006. Diferentemente dos norte-americanos e europeus, que procuram estratificar tamanhos de propriedade de acordo com diferentes níveis de renda, aqui no Brasil nos acostumamos com grupos de tamanho físico de propriedades (ou grupos de área total, como definido pelo IBGE). Embora possamos adaptar o dado do censo para estratificar as propriedades com um critério de renda, é o critério de tamanho que é apresentado explicitamente nos resultados.

O censo de 2006 é inequívoco ao mostrar que, do ponto de vista de receita e margem bruta por hectare, as propriedades de menor e de maior porte - ou seja, aquelas nos grupos de área total inferior e superior - apresentam melhor desempenho, ao passo que aquelas de porte médio mostram desempenho inferior. Assim, qualquer decisão que viesse a limitar o tamanho das propriedades rurais no Brasil seria uma derrapada econômica tão grande como se houvesse uma proposta de limitar propriedades de pequeno porte.

O censo agropecuário divide as propriedades (ou estabelecimentos, como é definida a unidade produtiva pelo IBGE) em 18 grupos de área total, começando com aquelas inferiores a 0,1 hectare (ha) e terminando naquelas superiores a 2.500 hectares. Dada a dificuldade de entender o que significa um estabelecimento com menos de 0,1 ha, optamos por agregar os grupos em 9 estratos: até 10 ha; 10 a 20 ha; 20 a 50 ha; 50 a 100 ha; 100 a 200 ha; 200 a 500 ha; 500 a 1.000 ha; 1.000 a 2.500 ha; e acima de 2.500 ha (o primeiro estrato é fruto da agregação de nove estratos e, os demais, originais do censo).

Para analisar o resultado de cada grupo, trabalhamos os dados de receita e despesa total por grupo e calculamos receita e despesa por ha, calculando primeiro receita e despesa médias por estabelecimento no grupo e, a partir do tamanho médio em cada grupo (2,68 ha, no grupo de até 10 ha, e 4.129 ha, no grupo de acima de 2.500 ha, por exemplo), em segundo lugar, encontrando o indicador por hectare.

No caso da receita fizemos dois cálculos: a receita média por hectare em cada grupo a partir da receita total e da receita de produtos vegetais. Isso foi feito porque, como se sabe, a receita por hectare da pecuária extensiva de corte é bem inferior à receita das lavouras e tende a reduzir substancialmente a receita por hectare no grupo de área maior quando a receita é analisada pelo total.

Os resultados que encontramos são descritos a seguir. A receita total e a margem por hectare (a margem foi calculada pelo quociente da diferença entre receita e despesa sobre a receita) são mais altas no grupo de menor tamanho (até 10 ha, R$ 3.800/ha de receita) e vêm caindo até o grupo de 100 a 200 ha (R$ 666/ha). Fica constante nas propriedades entre 200 a 2.500 ha, na menor faixa de receita (ao redor de R$ 550/ha), e volta a subir no grupo de área acima de 2.500 hectares (R$ 706/ha).

Fazendo o mesmo raciocínio, mas avaliando apenas a receita oriunda dos produtos vegetais, a magnitude dos números muda um pouco, mas a tendência segue a mesma, ou seja, a receita vem caindo das propriedades de menor porte para as propriedades de porte médio e volta a subir nas propriedades de maior porte, demonstrando que, do ponto de vista de receita por hectare, as propriedades de porte médio são aquelas menos eficientes. Neste caso, no entanto, são as propriedades entre 50 e 1.000 hectares que mostram os níveis mais baixos de receita.

As propriedades entre 50 e 2.500 hectares representam 16,4% do total de estabelecimentos rurais, 57% da área total dos estabelecimentos e 42% do valor da produção total do setor agrícola. Já as propriedades inferiores a 50 ha representam 78% do total de estabelecimentos, 13,4% da área total dos estabelecimentos e 40% do valor da produção. Do outro lado, os estabelecimentos acima de 2.500 hectares são 0,3% do total de estabelecimentos, 30% da área total e 17% do valor da produção.

Esses números mostram que as propriedades que apresentam a menor eficiência, pelo menos em termos de receita por hectare, são aquelas mais importantes em área e valor da produção.

Essa análise revela dois fatos. O primeiro é que existe uma agropecuária de pequena escala e de valor agregado que foi capturada pelo censo agropecuário na elevada renda das propriedades inferiores a 10 hectares. O segundo é que existe uma agropecuária que demanda mais terra e que apresenta economias de escala e, portanto, módulos maiores são necessários para garantir maior competitividade.

Essas agropecuárias não se misturam, porque operam com produtos distintos e atuam em mercados diferentes. No entanto, entre elas existe uma agropecuária que, quando atua no mesmo segmento desse de elevada escala, tende a ser menos competitiva. O censo nos diz que é o segmento de média propriedade que precisa de maior atenção, não somente porque é menos competitivo, mas porque é muito importante. Limitar o tamanho das propriedades, portanto, poderá até agravar o problema.

* Diretor geral do ICONE (Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais). E-mail: amnassar@iconebrasil.org.br