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sábado, 5 de setembro de 2020

Dia da Amazônia: maior floresta tropical do mundo não tem o que comemorar

Dia da Amazônia: maior floresta tropical do mundo não tem o que comemorar
Levantamento do Inpe indica que desmatamento acumulado na Amazônia entre agosto de 2019 e julho de 2020 cresceu 34,49%. Dia da Amazônia é comemorado neste 5 de setembro

Por Tiemi Osato - iG Último Segundo  Atualizada às 


Nos últimos anos,a Amazônia tem enfrentado um cenário crítico.
Divulgação/Imazon
Nos últimos anos,a Amazônia tem enfrentado um cenário crítico.
Maior floresta tropical do mundo, a Amazônia possui grande relevância devido à enorme biodiversidade e aos povos tradicionais que abriga. Importante também para a estabilidade climática, ela influencia e impacta regiões que ultrapassam as suas fronteiras. Apesar de toda importância, nos últimos anos a floresta vem enfrentando um cenário preocupante  e, neste 5 de setembro, Dia da Amazônia , não tem tanto a comemorar.
Dados do DETER (Detecção de Desmatamento em Tempo Real), levantamento feito pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), indicam que o desmatamento acumulado na Amazônia entre agosto de 2019 e julho de 2020 cresceu 34,49% em comparação ao período anterior — de agosto de 2018 a julho de 2019. Em relação à média dos últimos quatro anos, o aumento foi de 71,80%.

Esforços para conter o desmatamento

Com taxas cada vez mais alarmantes, não há dúvidas de que a Amazônia tem sofrido um aumento considerável no aumento de queimadas e desmatamento. A professora Mariana Vale, chefe do departamento de Ecologia da UFRJ, aponta para o fato de que essa tendência não é exclusiva do governo Bolsonaro e vem desde 2013, durante o governo Dilma Rousseff.
Vale lembra que, no período de 2005 a 2012, o Brasil teve uma redução expressiva, em torno de 70%, do desmatamento na Amazônia . “É um caso de sucesso e reconhecimento internacional no controle de desmatamento de uma floresta tropical”, observa. Claudia Azevedo-Ramos, professora associada do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da UFPA, atribui essa conquista a “pressões internacionais e estratégias federais de combate que envolveram ações de comando e controle, regularização fundiária e promoção de atividades econômicas sustentáveis ”.
Referente a esse período, Vale destaca que a implementação do Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia (PPCDAm), em 2004, durante o governo Lula, “reduziu substancialmente as taxas de desmatamento”. O controle foi realizado com auxílio de diversos elementos, como o monitoramento por satélites pelo Inpe, a fiscalização pelo Ibama e incentivos às boas práticas de pequenos produtores através da Bolsa Verde. “Com esse plano, a gente criou toda uma estrutura institucional”, pontua.
Em 2012, porém, o plano perdeu força e o cenário começou a mudar. “Houve a reforma do Código Florestal Brasileiro e muito do que se considerava antes como desmatamento ilegal passou a ser legalizado”. E, desde 2013, o desmatamento vem aumentando.
Apesar de não ser o pior momento da floresta em termos de devastação  — posto atribuído ao ano de 1995, durante o governo FHC —, Vale pontua que a tendência de alta segue, em grande parte, “em função da postura do governo e do Ministério do Meio Ambiente em relação a questões ambientais”.
Na análise de Vale, a perspectiva governamental considera as questões ambientais como “problema e entrave para o desenvolvimento ao invés de entendê-las como uma grande riqueza e diferencial do Brasil, que pode dar protagonismo ao país em termos de conservação ambiental e explorada de maneira sustentável”.


"Passar a boiada"

Um dos momentos em que mais ficou claro o projeto do governo Bolsonaro para o meio ambiente foi durante a reunião ministerial de 22 de abril. Na ocasião, o ministro do Meio Ambiente,  Ricardo Salles, defendeu utilizar a pandemia de Covid-19 como oportunidade para “passar a boiada” e realizar mudanças infralegais na legislação ambiental brasileira.
“Se o ministro não caiu depois desta fala, só pode sinalizar que ele está fazendo o que foi demandado”, afirma Azevedo-Ramos. Ela também diz que grileiros , desmatadores e garimpeiros ilegais se sentem “confiantes para agir” quando há um discurso nas esferas federal e estadual que estimula a impunidade.


Imagem do Brasil no exterior

Paulo Roberto de Almeida, diplomata e ex-diretor do Instituto Brasileiro de Relações Internacionais (IBRI), explica que, principalmente a partir da Conferência Rio-92, formou-se uma grande consciência ecológica mundial. Almeida ressalta também que o evento marcou o início de um período “bastante positivo” para o Brasil quanto à liderança no cenário ambiental. Ao longo dos anos 90 e 2000, o país mudou consideravelmente sua política de meio ambiente, deixando para trás a perspectiva da ditadura militar.
Até 2018, o Brasil possuía posições avançadas. Almeida aponta que a nação “fez um esforço de cooperação internacional na pesquisa e nos projetos de sustentação”. O resultado das eleições, porém, mudaram o cenário. “A chegada de Bolsonaro e suas concepções primitivas ao poder foi um choque para todos, para os ambientalistas no Brasil e no mundo, para a opinião pública internacional e para o próprio agronegócio”, diz o diplomata.
Ele observa que houve uma deterioração da imagem brasileira durante o governo Bolsonaro. “O Brasil virou um pária internacional, um país marginalizado e desprezado. É uma coisa muito triste para nós”, diz. Almeida coloca Ernesto Araújo e Ricardo Salles, respectivamente ministro das Relações Exteriores e ministro do Meio Ambiente, como “os dois protagonistas dos grandes problemas nas relações internacionais do Brasil”.
Almeida diz que “ainda que de vez em quando se faça um anúncio de que está preservando, isso é muito retórica”. Ele explica que a comunidade internacional “sabe exatamente o que está se passando no Brasil”, pois os dados do Inpe são universais e diferentes países têm satélites através dos quais é possível coletar informações sobre o desmatamento.
O posicionamento do Brasil quanto ao meio ambiente sinaliza, inclusive, possíveis impactos econômicos . No dia 21 de agosto, a chanceler alemã Angela Merkel declarou ter “sérias dúvidas” quanto à implementação do acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul devido ao aumento do desmatamento na Amazônia.
“Há uma chance sim de que esse acordo não entre em vigor e de que novas sanções sejam aprovadas”, analisa o diplomata Paulo Almeida. “E não precisam ser sanções oficiais, porque não são os governos que fazem exportação e importação”, acrescenta. Para ele, a pressão da opinião pública tem um papel relevante nesse âmbito.
“A opinião pública pode pressionar empresas e varejistas inteiros”, afirma Almeida. “Cadeias de importação podem simplesmente boicotar a compra de produtos brasileiros, como grãos, carnes ou qualquer outra coisa que lhes pareça suficientemente ofensivo. Grandes campanhas internacionais podem ocorrer. A opinião pública vai determinar grande parte de movimentos políticos, acordos de cooperação e, sobretudo, fluxos de comércio e de investimento”.
“A nossa imagem atual é muito negativa no mundo do meio ambiente e acredito que, enquanto o governo não mudar a sua postura, não haverá muita condescendência do mundo para com o Brasil”, conclui Almeida.

Luz no fim do túnel?

A professora Claudia Azevedo-Ramos observa que “em um mundo globalizado, as opções políticas internas têm repercussão externa”. Esse fator, aliado às preocupações crescentes com cadeias produtivas sustentáveis e com mudanças climáticas, faz com que a reação internacional pela Amazônia seja “esperada”.
“Quando mega investidores dizem que vão retirar seus investimentos do Brasil ou países compradores de nossos produtos dizem que não comprarão mais, cria-se uma pressão interna para mudanças”, constata Claudia. “É o que se viu em agosto com a carta de 60 assinaturas de organizações brasileiras endereçada a lideranças políticas e investidores pedindo pela moratória do desmatamento e fortalecimento dos órgãos ambientais. Ou com a recente decisão de bancos privados de se unirem para encontrar soluções sustentáveis a seus financiamentos”.
Para além da pressão de questões externas e econômicas, as especialistas afirmam que o Brasil possui capacidade para conter o desmatamento na Amazônia. “Temos sistemas integrados, pessoal qualificado, monitoramento por satélites e ferramentas econômicas para coibir o mal feito e incentivar o bem feito”, diz Claudia.
“A gente foi capaz de controlar o desmatamento de forma exemplar entre 2005 e 2012, a gente tem a capacidade institucional e científica para isso”, destaca Mariana. “Eu acredito que as coisas podem ser revertidas, eu acredito que o eleitorado brasileiro pode ter consciência e votar de maneira adequada nas próximas eleições pensando no país como um todo, com todos os seus problemas econômicos, sociais e também ambientais”, finaliza.


Leia também

quinta-feira, 7 de novembro de 2019

A Amazônia nas páginas da revista Pesquisa FAPESP

A revista Pesquisa Fapesp é uma espécie de Nature brasileira, ou seja, de excelente qualidade, com a peculiaridade que, à diferença da Nature, ela também se ocupa de ciências humanas e sociais (o que a Nature o faz episodicamente).
Paulo Roberto de Almeida

A floresta da chuva
O avanço do desmatamento da Amazônia causaria fortes mudanças no clima das regiões Norte, Sudeste e Centro-Oeste do Brasil, além da Bacia do Prata. A probabilidade de redução de chuvas nessas áreas seria grande. Simulações indicam que, se as três grandes florestas tropicais do planeta (Amazônia, da bacia do Congo na África e do Sudeste asiático) fossem totalmente desmatadas, os impactos climáticos poderiam atingir todo o globo, alterando o padrão de chuvas e prejudicando lavouras importantes, como a produção de grãos no centro-oeste dos EUA e os cultivos no sul da França
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As duas Amazônias
Os padrões de temperaturas e de chuvas já mudaram na região. Estudos mostram que a parte sudeste sofre uma extensão das estiagens na estação seca, enquanto a noroeste recebe um volume maior de chuvas no período mais úmido do ano. Mudanças apontam o risco de a Amazônia se tornar uma fonte de carbono, em vez de sumidouro, e de atingir o ponto em que as mudanças são irreversíveis.
Paulo Moutinho, de pé na floresta
O ecólogo do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) já viajou por recantos distantes da Amazônia. Ao conversar com garimpeiros, agricultores, índios e ribeirinhos, ele busca elementos que permitam construir uma concepção de desenvolvimento sustentável para a região.
Crescer sem destruir
A Amazônia é uma terra de riquezas naturais cuja população, em boa parte, enfrenta privação de recursos básicos. A região Norte produz 5,4% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional e, até hoje, seu crescimento econômico se deu em detrimento da floresta. O desenvolvimento sustentável da região exige mudança na agropecuária tradicional e aprimoramento do extrativismo agroflorestal.
Lauro Barata: A rede da riqueza natural
Estudar o pau-rosa, árvore amazônica que produz um óleo de grande valor na indústria de cosméticos, trouxe ao químico a comprovação dos benefícios de se pensar formas sustentáveis de extrair substâncias produzidas pelas plantas. Hoje, o pesquisador se dedica a conectar produtores, extrativistas em comunidades remotas e empresas centradas no uso de produtos naturais da região.

sábado, 27 de abril de 2019

24 ENERI: palestra de Paulo Roberto de Almeida: notas para desenvolvimento oral


Desafios Globais de Desenvolvimento: Igualdade, Sustentabilidade e Crescimento no Século XXI

Paulo Roberto de Almeida
 [Objetivo: notas para palestra; finalidade: 24ª edição do ENERI, Uberlândia.]

1. Introdução: invertendo a ordem dos conceitos e o seu significado
Peço permissão para revisar completamente os termos sugeridos para minha participação nesta 24ª. edição do ENERI. Em primeiro lugar não existem desafios globais de desenvolvimento. A despeito da preeminência avassaladora da globalização neste século, aliás desde a pré-história, o desafio do desenvolvimento é, continua sendo, e será ainda por muito tempo, eminentemente nacional, quase que exclusivamente nacional. Existem poucos exemplos de países no mundo, se algum, que se tenha desenvolvido pelas mãos de outros países, a não ser que se considerem colônias dominadas por certas metrópoles exemplos de processos globais, ou transplantados, de desenvolvimento. E, de fato, algumas colônias conseguiram galgar alguns degraus no caminho do desenvolvimento pelas mãos das metrópoles que as dominaram, mas entendo que não é este o conceito exatamente pensado pelos organizadores deste encontro, ao sugerir o título que me foi encaminhado para tema desta minha palestra.
Da mesma forma, permito-me alterar a ordem do subtítulo: “igualdade, sustentabilidade e crescimento”, embora aceite o final, “no século XXI”, pois é nele que nos encontramos, objetivamente. Igualdade não é necessariamente um desafio global do desenvolvimento, que ocorre de modo diferenciado entre povos e nações, num formato profundamente assimétrico – como são todos os processos nacionais conhecidos de desenvolvimento – e sequer deveria fazer parte dos objetivos nacionais nesse sentido, mas vou explicar porque mais adiante.
Sustentabilidade, por sua vez, virou o que se poderia chamar de “catch word”, um clichê, a que se recorre desde pelo menos a segunda conferência da ONU sobre o desenvolvimento sustentável, e que se tornou um conceito incontornável, obrigatório e até indispensável em qualquer discurso oficial de burocratas internacionais e de políticos nacionais. Ele serve para tudo: merchandising politicamente correto, sinal de que se está alinhado com a modernidade, respeito pela preservação do meio ambiente e todas essas palavras bonitas que precisam entrar nos discursos de todos e cada um: diplomatas em primeiro lugar, ecologistas obviamente, empresários com certeza, artistas e intelectual alinhados ao politicamente correto, enfim, gente bacana. Virou uma mania, até o ponto de perder qualquer significado concreto: tudo precisa ser sustentável, sob risco de ser execrado, condenado, abjurado, recusado, conspurcado, relegado ao limbo das más intenções, enfim, expurgado dos belos discursos recheados de bullshit.
Quanto ao crescimento, finalmente, esta é uma realidade concreta, com a qual podem trabalhar os economistas, pois ele pode ser medido, mensurado, quantificado, estimado, projetado, colocado numa série histórica, transformado em números e valores, pois que denotando uma realidade que existe como agregação de valor monetário e que se traduz, concretamente, em renda, riqueza, bem-estar, prosperidade, e até felicidade. Sem crescimento não há desenvolvimento, pelo menos no sentido mais prosaico dessa noção mais política do que econômica, pois que denota um processo de acréscimo nas opções abertas à satisfação das pessoas, na sua longevidade, na liberdade de poder dispor de bens e serviços que antes, sem crescimento, estavam mais ou menos tolhidas.
Vou me estender sobre cada um desses conceitos para me deleitar um pouco no meu exercício preferido como acadêmico, ou como simples cidadão consciente: o fato de ser um contrarianista profissional, ou seja, aquele que está sempre encontrando um motivo para contrariar o senso comum prevalecente, para introduzir um pouco de ceticismo sadio, apenas pelo prazer de ser um contestador daquelas verdades estabelecidas, o que Gustave Flaubert chamava de “idées reçues”, ou seja, fatos tidos como de entendimento corrente, mas frente aos quais eu ouso levantar o meu dedinho interrogativo para dizer: “Não é bem assim”. Ou então: Think Again, ou seja, pense duas vezes e revise seus conceitos aceitos até aqui. Não se intimidem em romper o consenso, desde que tenham argumentos bem fundamentados em dados empíricos, em um amplo conhecimento histórico, assim como em sólidas bases teóricas e lógicas.

2. Crescimento: um processo basicamente nacional e endógeno
Gostaria, antes de qualquer outro comentário, de formular duas sugestões de leitura para aqueles interessados em aprofundar o conhecimento teórico e comparado sobre o processo de crescimento econômico, esse objetivo obsessivo de todo e qualquer estadista digno desse nome. A primeira é o manual para iniciantes de qualquer curso de economia nas faculdades americanas, de Robert Barro e Xavier Sala-i-Martin: Economic Gowth (várias edições pela MIT Pess), que discorrem sobre como taxas cumulativas de crescimento, mesmo em valores modestos, podem fazer diferença no longo prazo. O segundo é o livro de James Robinson e de Daron Acemoglu, Why Natins Fail, que examina os fatores responsáveis pelo desenvolvimento de algumas nações e não conseguem mudar a situação em outras.

3. Igualdade: uma aspiração que costuma representar uma aberração
Desde Rousseau, a igualdade é a palavra que mais causou confusão no mundo da política, e das lutas sociais, a partir de meados do século XVIII. Consagrada na Revolução francesa como um dos objetivos máximos do novo regime político e social – liberté, égalité, fraternité –, a igualdade foi igualmente incorporada aos supostos objetivos de qualquer programa econômico de governança no decorrer do século XX, inclusive no tocante aos programas das agências internacionais onusianas, ademais, é claro, de a palavra estar integrada a dez de cada dez discursos políticos em qualquer lugar do mundo. No entanto, esse não deveria ser o objetivo de estadistas responsáveis, uma vez que produzir igualdade pode ser, ou revelar-se, a iniciativa mais violenta que possa existir na face da terra, se esse objetivo é realizado por métodos compulsórios.
Poucos anos atrás, fez relativo sucesso o livro do economista socialista francês Thomas Piketty, O Capital do século XXI, uma evidente referência à obra magna do filósofo social Karl Marx, que tentou dar ares de cientificidade às suas duvidosas elucubrações sobre o capital no século XIX. O livro tenta provar, com o acúmulo de estatísticas rigorosamente selecionadas, que o capital financeiro tende a aumentar mais rapidamente do que os ganhos dos trabalhadores, e até a se multiplicar acima e além da própria taxa de crescimento geral da economia, segundo uma fórmula supostamente mágica, ao estilo da famosa equação einsteiniana (emc2), segundo a qual r > g. Trata-se de uma metodologia questionável, ao considerar unicamente como uma das fontes de riqueza o capital financeiro, que parece pairar acima das sociedades e através dos tempos como um ente metafísico, independente das formas variáveis de criação de riqueza e ao descartar os ativos intangíveis, que também são uma forma de riqueza. Mais grave ainda, as prescrições corretivas apontam todas no sentido da taxação vingativa da riqueza acumulada pelos mais ricos – os megabilionários, os culpados de sempre – e sua redistribuição aos menos ricos, como se essa fosse a forma correta de tornar todos os indivíduos igualmente ricos.
Não é: ao repartir a riqueza acumulada por todos os pobres do planeta, haveria um modesto quinhão adicional de algumas centenas de dólares para cada um, que seriam consumidos em compras imediatas de produtos de primeira necessidade e depois não sobraria mais nada, nem poupança, nem investimento, nem estímulo para que os megarricos, ou os simplesmente ricos, colocassem sua riqueza para operar em novos negócios. A função mais nobre do economista deveria ser enriquecer os mais pobres, não empobrecer os mais ricos...

4. Sustentabilidade: um ideal que mobiliza, e que pode obstruir o crescimento
Trata-se do conceito mais usado e abusado da história das relações internacionais desde várias décadas, praticamente desde os anos 1970, logo após a primeira conferência das Nações Unidas sobre meio ambiente e desenvolvimento. É um catch-word, ou um saco de gatos, onde cabe tudo e qualquer coisa: tudo precisa ser sustentável hoje em dia, do contrário não vende ou não pode ser apresentado ao distinto público. Na verdade, a melhor sustentabilidade é aquela determinada pelo mecanismo de preços dos mercados livres, que consegue aferir, imediatamente e precisamente, a raridade relativa dos bens e ativos disponíveis para consumo humano ou incorporação ao processo produtivo. Nenhuma determinação de preços e valores por burocratas governamentais ou internacionais consegue se sobrepor à clareza, transparência e fiabilidade dos preços de mercado.

5. Crescimento: sustentado, competitivo, com alto capital humano e abertura
Volto ao conceito chave de crescimento, e apenas a ele. As sociedades avançam, progridem, se desenvolvem, se conseguem manter um processo de crescimento sustentado (não sustentável, pois essa condição vem automaticamente numa economia de livres mercados), com transformações produtivas e distribuição social dos benefícios desse crescimento pela via dos mercados, não por indução estatal.
Para que ele se realize, esse crescimento tem de estar mais ou menos baseado em cinco grandes pilares, ou alavancas operacionais: estabilidade macroeconômica, competição microeconômica, boa governança, alta qualidade dos recursos humanos e abertura econômica, liberdade ao capital estrangeiro, sobretudo sob a forma de investimentos diretos estrangeiros, e liberalização comercial, eventualmente até sob a forma de redução tarifária unilateral.
Quanto tivermos esses cinco pilares bem estabelecidos como políticas públicas teremos o desenvolvimento, em bases nacionais, num regime de plena inserção econômica internacional, ou seja, com globalização e globalismo, quaisquer que sejam as restrições que certos gurus e sofistas, totalmente ignorantes em economia, tenham quanto a este último termo. Globalismo não existe, mas se quisermos aceitá-lo como conceito absolutamente normal na atividade diplomática, ele nada mais é do que a vertente propriamente política do processo de globalização.

Paulo Roberto de Almeida
São Paulo, 27 de abril de 2019