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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

sexta-feira, 12 de abril de 2013

Comissao da Verdade descumpre a lei - Marco Antonio Balbi

COMISSÃO DA VERDADE DESCUMPRE A LEI
Marco Antonio Esteves Balbi
(Recebido em 10/04/2013)

​Com o título acima o cientista político e especialista em assuntos militares Eliézer Rizzo de Oliveira escreveu na página de opinião de jornal de circulação nacional.

​Fiquei entusiasmado. Não era a primeira pessoa que assim se manifestava. Mas, ledo engano, já no primeiro parágrafo a decepção: o autor afirma que o trabalho é muito relevante para “a construção da memória e da verdade histórica do nosso país.” Se este fosse o real propósito, a comissão deveria ser composta por historiadores isentos e não por ideólogos, todos com pretéritas relações com aqueles que lutaram pela implantação de uma ditadura nos moldes da cubano-sino-soviética.

​Após analisar alguns artigos da lei, o autor vai ao âmago da questão: a comissão não poderia, através de uma resolução, alterar a abrangência do universo dos que devem ser ouvidos, restringindo-se aos agentes do estado. Se apenas para ampliar o número de assessores foi necessário um decreto presidencial, uma limitação do quilate da estabelecida não poderia ter sido tomada por uma medida administrativa!

​Após exemplificar com os sempre citados países onde ocorreram trabalhos semelhantes, o autor aborda a necessidade de se dar publicidade aos atos praticados pelos guerrilheiros, terroristas, bandidos etc.

Entretanto, ao abordar a atuação dos agentes do Estado, o autor comete um grave equívoco. Transcrevo: “O que é mais conhecido é a repressão policial e militar - ilegal sempre, clandestina com frequência.” Na realidade não houve repressão, mas sim uma reação, até tardia e difícil, pois os agentes do estado foram surpreendidos por aquele tipo de guerra e não estavam preparados para ela. O treinamento, o adestramento foi no desenrolar dos acontecimentos. Ilegal? De jeito nenhum. Não deveriam reagir? Permitiriam a implantação da ditadura do proletariado? Clandestina muita das vezes, posto que é assim que se luta aquele tipo de guerra. Estranhas afirmações para um especialista em assuntos militares.

Prossegue: “Estruturas estatais foram criadas ou adaptadas para reprimir e matar, métodos provenientes do exterior associaram-se a práticas nacionais de tortura contra pessoas detidas e imobilizadas.” Realmente, após vários insucessos nas áreas de inteligência e operacional, houve necessidade de se criar estruturas que pudessem responder à nova situação. Mas, soluções nacionais, sem similares estrangeiros, e que muitas persistem até os dias atuais. O que vem a ser os centros de operação hoje praticamente existente em todas as cidades de porte médio e grande do país? Quanto ao matar, bem professor, quando se entra em combate, muita das vezes você tem que optar entre matar ou morrer.

O parágrafo seguinte do artigo é lastimável. Eleva o total dos “crimes” cometidos aos milhares (?), compara a atuação das forças do Estado ao nazismo(?) e afirma que os militares que dela participaram desonraram a farda(?) e que a honra militar só foi recomposta com o fim do regime de exceção. Militar, professor, como o senhor bem sabe, cumpre as ordens e os regulamentos. Achei o seu discurso estranhíssimo. Não sei em que dados ou fatos o senhor se baseou para chegar a estas conclusões.

Mas, alvíssaras, o articulista acerta na mosca ao final. “O motivo da Comissão da Verdade adotar a investigação unidirecional e ilegal é político: a perspectiva de revisão da anistia, objetivo estratégico do III Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3), com o propósito de julgar e punir agentes públicos da repressão. Pois não seria válida a Lei da Anistia nos termos da Justiça de Transição e de deliberações judiciais internacionais.”

Aí está, pois, a conclusão que muitos outros analistas têm observado. Encontra-se em oportuna tramitação na Câmara dos Deputados, o projeto de lei de autoria da deputada petista Luiza Erundina que trata especificamente de alterar artigo da lei, retirando do guarda-chuva protetor os agentes do Estado, mantendo o status quo dos terroristas, guerrilheiros, sequestradores etc. Estes já foram beneficiados, inclusive, com polpudas indenizações pecuniárias, que em muito oneram os cofres públicos e manteriam suas condições de anistiados.

Lastimo que o cientista e especialista tenha apresentado uma opinião tão distorcida para os leitores. Mas, concordo com ele: o trabalho da Comissão da Verdade é ilegítimo, pois descumpre a lei que a criou.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Pausa para... ornitologia politica: de homens e de passaros (em campanha eleitoral...)

Bem, sempre se pode aprender a falar com os passáros, como demonstra este jornalista:

http://www.youtube.com/watch?v=VymDdnA9GEQ

e mais um pouco de ornitologia bolivariana:

http://www.youtube.com/watch?v=Z1BWND0f3TM

Educacao no Brasil: parece que eu era muito otimista...

Confesso que fui otimista. Eu achava que em matéria de educação, o Brasil estava andando para trás.
Como eu fui ingênuo.
Não estamos recuando, isso não.
Estamos é caindo no fundo de um abismo inacreditável.
A situação é muito pior, mas muito mais pior, como diria alguém, do que eu, você, todo mundo, queremos acreditar.
Acho que vai ser difícil consertar...
Paulo Roberto de Almeida 

Ensino de matemática e ciências no país é pior do que o da Etiópia
VEJA.com, 11/04/2013

Um relatório do Fórum Econômico Mundial, publicado na quarta-feira, aponta o Brasil como um dos piores países do mundo nos ensinos de matemática e ciências. Entre 144 nações avaliadas, o país aparece na 132ª posição, atrás de Venezuela, Colômbia, Camboja e Etiópia. Outro dado alarmante é a situação do sistema educacional, que alcança o 116º lugar no ranking – atrás de Etiópia, Gana, Índia e Cazaquistão. Os dois indicadores regrediram em relação à edição 2012 do relatório, em que estavam nas 127ª e 115ª posições, respectivamente.

O estudo indica como uma das consequências do ensino deficiente a dificuldade do país para se adaptar ao mundo digital, apesar dos investimentos públicos em infraestrutura e de um certo dinamismo do setor privado. “A qualidade do sistema educacional, aparentemente, não garante às pessoas as habilidades necessárias para uma economia em rápida mudança”, diz o levantamento.

Em comparação com o ano passado, o Brasil subiu apenas da 65ª para a 60ª posição no ranking que mede o preparo das nações para aproveitar as novas tecnologias em favor de seu crescimento. Apesar de ter galgado posições, os autores do relatório destacam que o lugar ocupado pelo país não condiz com sua economia, entre as sete maiores do mundo. Na América Latina, Chile, Panamá, Uruguai e Costa Rica, por exemplo, são considerados mais bem preparados para os novos desafios da era digital.

O número de usuários de internet no Brasil também não chegava ainda a 45%, o que deixa o Brasil na 62.ª posição nesse critério, abaixo da Albânia. Apenas um terço dos brasileiros tem internet em casa. A taxa despenca para apenas 8% se o critério for o número de casas com banda larga. O Brasil não é o único a passar por essa situação. “Os Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) enfrentam desafios”, diz o informe.

“O rápido crescimento econômico observado em alguns desses países nos últimos anos poderá ser ameaçado, caso não forem feitos os investimentos certos em infraestruturas, competências humanas e inovação na área das tecnologias da informação”, alerta o relatório.

Back to the Future, versao cubana - Rodrigo Constantino

De volta do futuro 

RODRIGO CONSTANTINO

O Globo, 2/04/2013 

“Desesperado com tudo, eu ajustei minha máquina de volta para 2013, decidido a fazer o que estivesse ao meu limitado alcance para impedir um futuro tão maldito do meu país”
 


 
O ano é 2030. Cheguei aqui com minha DeLorean, na esperança de encontrar um país mais próspero e livre. Qual não foi minha surpresa quando dei logo de cara com uma enorme estátua de Lula!
Curioso, perguntei a um transeunte do que se tratava. Um tanto incrédulo com minha ignorância, o rapaz explicou que era a homenagem ao São Lula, ex-presidente e “pai dos pobres”. Havia uma estátua dessas em cada cidade grande do país. Afinal, tínhamos a obrigação de celebrar os 150 milhões de brasileiros incluídos no Bolsa Família.
Após o susto inicial, eu quis saber quem pagava por tanta esmola, e se isso não gerava uma nefasta dependência do Estado. O rapaz parece não ter compreendido minha pergunta. Disse que estava com pressa para entrar na fila do pão, e que seu cartão de racionamento ainda dava direito a uns bons cem gramas.
Em seguida, vi na televisão de uma loja um rosto conhecido, ainda que envelhecido. Era o ministro Guido Mantega! E pelo visto ele ainda era o ministro. Ele estava explicando o motivo pelo qual sua previsão de crescimento de 5% não se concretizou. A queda de 3% do PIB havia sido culpa da crise em Madagascar. Mas tudo iria melhorar no próximo ano.
Notei então o preço do aparelho de TV: 100 mil bolívares. Assustado, perguntei ao vendedor do que se tratava, explicando que eu era de fora. O homem disse que, em 2022, após a inflação chegar em 20% ao mês, o governo cortou três zeros da moeda. Pensei logo no bigodudo. Como isso não funcionou, o governo decidiu adotar o bolívar, moeda comum do Mercosul.
Descobri que os países “bolivarianos” chegaram a adotar o escambo, depois que suas respectivas moedas perderam quase todo o valor frente ao dólar. A moeda comum foi uma medida urgente, pois estava difícil efetuar as trocas. O criador de gado argentino precisava encontrar um produtor de soja brasileiro disposto a trocar o mesmo valor de gado por soja. Era um caos!
Levantei ainda alguns dados no jornal “Granma Brasil” (parece que o “controle democrático” da imprensa havia finalmente passado, e o governo se tornou o dono do único jornal no país). A inflação oficial era de “apenas” 30%, mas todos sabiam nas ruas que ela era ao menos o triplo disso. Um centenário Delfim Netto desqualificava os críticos do Banco Central como “ortodoxos fanáticos”.
Não havia mais miserável no Brasil, pois a linha de pobreza era calculada com base no mesmo valor nominal de 2010. Mas havia mendigos para todo lado. Um desses mendigos me pareceu familiar. Eu poderia jurar que era o Mr. X! Mas não poderia ser. Afinal, ele era um dos homens mais ricos do país, e tinha ótimo relacionamento com o governo. O BNDES era um grande parceiro seu.
Foi quando decidi ver que fim tinha levado o banco estatal. Soube que, após o décimo aumento de capital na Petrobras (que agora importava toda a gasolina vendida), e vários calotes dos “campeões nacionais”, o BNDES tinha se unido ao Banco do Brasil e à Caixa, esta falida nos escombros do Minha Casa Minha Vida, para formar o Banco do Povo. O símbolo era uma estrela vermelha.
O Tesouro já tinha injetado mais de US$ 2 trilhões no banco, para tampar os rombos criados na época da farra creditícia. Especialistas gregos foram chamados para prestar consultoria.
Com fome, procurei um restaurante. Todos eram muito parecidos, e tinham a mesma estrela vermelha na entrada. Soube então que era o resultado de um decreto do governo Mercadante em 2018. Em nome da igualdade, todos os restaurantes teriam que fornecer o mesmo cardápio pelo mesmo preço. Frango era item de luxo, e custava muito caro. Continuei faminto.
Veio em minha direção uma multidão de mulheres desesperadas protestando. Quis saber o que era aquilo, e me explicaram que, em 2014, quase todas as empregadas domésticas perderam seus empregos por causa de mudanças nas leis. Havia ficado proibitivo contratá-las. Desde então, elas vagam pelas ruas protestando e mendigando, sem oportunidades de emprego. “O inferno está cheio de boas intenções”, pensei.
Um rebuliço começou perto de mim, e uma tropa de choque surgiu do nada e arrastou um sujeito até a cadeia. Descobri que ele foi acusado de homofobia e enquadrado na Lei Jean Willys, pegando 10 anos de prisão por ter dito abertamente que preferia um filho heterossexual a um filho gay. A pena foi acrescida de 2 anos pelo uso do termo gay, em vez de “homoafetivo”.
Desesperado com tudo, eu ajustei minha máquina de volta para 2013, decidido a fazer o que estivesse ao meu limitado alcance para impedir um futuro tão maldito do meu país.

Rodrigo Constantino é economista
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/opiniao/de-volta-do-futuro-8000194#ixzz2QDDjzwGB
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O Stalin sem Gulag se perdeu no caminho da prisao...

“Vou bater à porta da Comissão Internacional de Direitos Humanos para ir ao Tribunal Penal Internacional de San José”.
José Dirceu

Parece que ele perdeu o norte, não consultou um diretório de organizações internacionais e precisa rapidamente ingressar num desses cursinhos rastaqueras de relações internacionais de alguma Faculdade Tabajara Bolivariana...
Se fosse só síndrome de transtorno bipolar, seria curável, talvez.
Mas parece que o mal é muito mais grave...
Acho que não tem conserto, nem concerto, a partir de agora só acertos atrás das grades...

O Brasil e' um pais normal? O Rio tem governantes racionais? Nao acredito

Após estupro de turista, prefeitura do Rio proíbe circulação de vans na Zona Sul
Usuários e motoristas criticaram a decisão porque terão de gastar mais com transporte, os outros meios podem ficar sobrecarregados e porque a medida pode gerar desemprego.


Será que é possível acreditar nesse tipo de "providência"?
Só pode ser um Primeiro de Abril atrasado...
Ou seja, incapazes de resolver um problema de segurança, as "otoridades" resolvem punir toda a população...
Decididamente, não estamos num país normal...
Paulo Roberto de Almeida

Pequeno Manual de Decadencia: para uso dos incautos e alucinados - Paulo Roberto de Almeida

Um trabalho antigo, mas cada vez mais válido:


747. “Pequeno manual prático da decadência (recomendável em caráter preventivo...)”, número especial  sobre “O Brasil que saiu das urnas”, da revista Digesto Econômico, revista da Associação Comercial de São Paulo (ano 62, n. 441, jan-fev 2007, p. 38-47; ISSN: 0101-4218; disponível em duas partes no site da revista; links: (a) http://www.dcomercio.com.br/especiais/digesto/digesto_03/05.htm; (b) http://www.dcomercio.com.br/especiais/digesto/digesto_03/05a.htm). Relação de Trabalhos n. 1717.

(recomendável em caráter preventivo...)

Paulo Roberto de Almeida
Colaboração a número especial da revista Digesto Econômico
Revista da Associação Comercial de São Paulo.
 (ano 62, n. 441, jan.-fev. 2007, p. 38-47; ISSN: 0101-4218)


O conceito de decadência está histórica e usualmente associado às imagens – e também às realidades – de declínio econômico, de disfuncionalidade política, de regressão social, de queda relativa nos padrões de vida, de desordem institucional, de involução moral, quando não ao caos gerador de conflitos exacerbados e possível elemento-motor (“gatilho”) do colapso de toda uma sociedade. No plano histórico, é costume citar os precedentes dos impérios romano, bizantino, chinês, otomano ou britânico como exemplos ilustrativos de decadência – processos que, por vezes, se arrastaram durante décadas, quando não séculos –, levando essas sociedades a fases de crise sistêmica ou de estagnação total, precipitando-as em “colapsos” mais ou menos prolongados e ao seu desaparecimento ou, até, à dominação por povos mais dinâmicos e empreendedores, alguns deles, aliás, suplantando os exemplos citados que tinham brilhado em épocas anteriores. Numa perspectiva recente, costuma-se citar a Grã-Bretanha contemporânea, isto é, pós-imperial e pós-Segunda Guerra, e até mesmo a Argentina pós-1930 como exemplos reais e acabados de processos lentos e agônicos de decadência econômica, pelo menos durante algumas décadas. Exemplos eloquentes de decadência certamente não faltam nos livros de história.
No entanto, não é essa a percepção que possam ter tido as sociedades referidas em relação ao seu próprio itinerário histórico, isto é, os povos e protagonistas contemporâneos dos processos gerais descritos sumariamente acima. Muitas vezes, o declínio econômico e a decadência política se dão em meio a extraordinários surtos de vigor artístico e de fervor intelectual, com intensos debates e mobilização social perpassando todas as categorias e classes da sociedade em questão. O estado de “regressão” nem é percebido como tal, uma vez que: a economia consegue ainda produzir em condições quase “normais”; as trocas materiais e os intercâmbios intelectuais se fazem ainda pelos canais habituais; os indicadores objetivos de padrões de vida continuam a apresentar traços de “progresso” – ainda que de recuo relativo na perspectiva internacional ou regional – e que a sociedade ainda não soçobrou na “anomia” e na “desorganização”, a que são normalmente associados essas noções de decadência ou de declínio.
O fato é que a decadência pode ter elementos difusos de todos esses processos citados acima, mas pode não ser percebida como tal pelos próprios integrantes da sociedade em questão. O sentimento geral dos cidadãos pode ser, simplesmente, de um certo malaise, de um mal-estar vago e indefinido, partilhado por diferentes estratos sociais e percebido como tal por intelectuais, mas raramente expresso de forma direta e cabal nos discursos das autoridades ou traduzidos nas propostas de ação por candidatos alternativos ao poder político. “Entra-se” em decadência muitas vezes sem o saber, como aquele personagem de Molière que fazia prosa involuntariamente.
Proponho-me, neste curto ensaio analítico, traçar os elementos principais de uma pequena radiografia da decadência, de maneira a subsidiar, talvez, diagnósticos mais precisos de situações concretas que possam preocupar os leitores eventuais deste “manual” de identificação dos sinais precursores de uma decadência anunciada (não necessariamente percebida). Assim, pode-se saber que um país, ou uma sociedade, está em decadência quando:

1. O sentimento de mal-estar se torna generalizado na sociedade, ainda que possa ser difuso.
2. Os avanços econômicos são lentos, ou menores, em relação a outros povos e sociedades.
3. Os progressos sociais são igualmente lentos ou repartidos de maneira desigual.
4. A lei passa a não ser mais respeitada pelos cidadãos ou pelos próprios agentes públicos.
5. As elites se tornam autocentradas, focadas exclusivamente no seu benefício próprio.
6. A corrupção é disseminada nos diversos canais de intermediação dos intercâmbios sociais.
7. Há uma desafeição pelas causas nacionais, com ascensão de corporatismos e particularismos.
8. A cultura da integração na corrente nacional é substituída por reivindicações exclusivistas.
9. A geração corrente não se preocupa com a seguinte, nos planos fiscal, ambiental ou outros.
10. Ocorre a degradação moral ou ética nos costumes, a despeito mesmo de “avanços” materiais.

Algumas considerações rápidas sobre cada um dos elementos listados, sumariamente, acima são necessárias, se quisermos que este “minitratado” da decadência possa ser efetivamente utilizado como uma espécie de manual para sua prevenção ou para a eventual correção de curso. Serei, tanto quanto possível, conciso, sem ater-me a exemplos conhecidos em processos concretos, mais ou menos identificados pelo leitor ocasional.

1. Malaise generalizado e difuso na sociedade.
Na verdade, o mal-estar que costuma atingir sociedades e povos em decadência efetiva é mais um resultado dos próprios processos de “involução” já em curso, do que um sinal precursor desse itinerário “regressista”. De fato, o sentimento de incerteza quanto ao futuro costuma perpassar de maneira difusa os diferentes estratos sociais mobilizados nas atividades correntes da sociedade em questão. A literatura consegue captar, antes mesmo de diagnósticos “sociológicos”, essa sensação de desconforto em relação aos padrões vigentes, que é também vista e interpretada nas artes em geral, por meio de peças e demonstrações de “ruptura” em relação às normas sociais comumente aceitas e “consumidas” pelos estratos sociais incluídos nas transações correntes. O sentimento de fin d’une époque, ou de esgotamento de um “ciclo”, é geralmente percebido pelos espíritos mais argutos, mas o desconforto com o “estado reinante” das coisas se dissemina de modo generalizado em camadas mais amplas da sociedade. Ocorre uma desafeição em relação à cultura predominante, mas não se consegue propor ou viabilizar padrões ou modelos alternativos que sejam eficientes ou implementáveis. Os custos da transição para “algo mais racional” são considerados por todos como muito elevados, em vista dos pactos vigentes, e a sociedade se acomoda na resignação e no déjà vu.

2. Avanços econômicos lentos, em perspectiva comparada.
A decadência não significa, necessariamente, retrocesso econômico absoluto ou mesmo uma deterioração das condições prevalecentes no plano da organização social da produção. Ao contrário, podem até ocorrer avanços tecnológicos, progressos científicos e melhoras nos padrões vigentes de produção, tendo em vista capacidades técnicas e habilidades gerenciais já acumuladas pela sociedade. Uma sociedade pode avançar, em suas próprias realizações, e mesmo assim ser ultrapassada relativamente por outras, mais dinâmicas, empreendedoras e inovadoras. O declínio relativo é geralmente o resultado de uma queda nos índices de produtividade, a perda progressiva de competitividade, um recuo nos espaços anteriormente ocupados no âmbito internacional e um lento movimento para escalões inferiores em rankings setoriais de classificação de países.
Os processos de divergência entre os povos e sociedades resultam, geralmente, de longas fases de crescimento (ou falta de), mais do que de altas taxas ocasionais de expansão do produto. O desenvolvimento pode ocorrer pari-passu a baixas taxas – mas sustentadas – de crescimento econômico, sendo que expansões rápidas podem ser contrarrestadas por surtos inflacionários ou crises sistêmicas que produzem perdas do produto social e erosão do poder de compra da moeda nacional. O elemento propulsor do processo de desenvolvimento são os ganhos de produtividade, que produzem, no registro histórico, os fenômenos de convergência ou de divergência entre os povos e economias nacionais. As sociedades humanas progrediram muito lentamente durante os milhares de anos de revolução agrícola neolítica e civilizacional-urbana, para conhecer, dois séculos e meio de rápidos progressos nos indicadores de bem-estar a partir da primeira e da segunda revolução industrial. A partir desta, os progressos se tornaram contínuos, autogerados e induzidos pelo próprio avanço científico-tecnológico anterior, configurando aquilo que, em termos marxistas, poderia ser chamado de “modo inventivo de produção”. Este foi, antes de qualquer outra, uma peculiaridade das sociedades ditas “ocidentais”, mas tende a se disseminar ao conjunto do planeta, com o término dos obstáculos políticos ao processo de globalização.
Nem todas as sociedades conseguem replicar ou reproduzir, mesmo por mimetismo, o padrão de progresso tecnológico do Ocidente desenvolvido. Mas todas elas se encontram, hoje, medianamente dotadas de condições mínimas para fazê-lo, a partir dos progressos dos meios de comunicação e de difusão dos conhecimentos científicos (amplamente disponíveis nos veículos existentes, à diferença do know-how e da tecnologia proprietária, estes bem mais restritos). O fato de uma sociedade recuar economicamente, ainda que de modo relativo, pode ser explicado, tão simplesmente, por sua incapacidade em dotar os seus cidadãos dos requisitos mínimos de ensino formal e de educação elementar, suscetíveis de os converterem em “absorvedores” do saber técnico já disponível universalmente nos canais abertos de difusão de conhecimento. Não se trata aqui, necessariamente, de padrões de ensino pós-graduado ou especializado, mas basicamente da existência de ensino fundamental de boa qualidade para o conjunto dos cidadãos.

3. Distribuição desigual dos lentos progressos sociais alcançados.
Comportamentos “rentistas”, isto é, apropriação de bens públicos por grupos organizados que têm acesso aos canais oficiais de distribuição de recursos, geram um desestímulo à inovação e à produção pelos agentes econômicos privados. Isso pode ocorrer, e geralmente ocorre, no caso da disponibilidade de abundantes recursos naturais – terras, minérios, commodities primárias – que passam a ser explorados por via de algum tipo de organização estatal, mesmo indireta. Fala-se da “maldição do petróleo”, por exemplo, como um caso típico de ganhos fáceis apropriados de maneira desigual por elites que se organizam para “redistribuir” esses recursos abundantes, o que desvia a atenção dos agentes privados de investimentos em atividades alternativas: toda a atenção passa a ser focada na “captura” da renda disponível na economia nacional.
Mesmo na ausência de uma fonte abundante de recursos naturais, comportamentos rentistas podem disseminar entre os estratos dominantes – ou dirigentes – na sociedade, se a regulação institucional é feita mais por via estatal do que por meio da própria sociedade. O Estado sempre constituiu um poderoso meio de redistribuição da riqueza social para os grupos que o controlam e manipulam em seu favor. Não há aqui nenhuma prevenção a priori contra o Estado, uma vez que ele é necessário mesmo para criar o laissez-faire, ou seja, lutar contra os trusts e cartéis, assegurar a competição, garantir o cumprimento dos contratos e, de forma geral, defender os direitos de propriedade. Ocorre, porém, que o Estado é também um forte indutor de redistributivismo regressivo, isto é, o recolhimento compulsório de recursos de todos os cidadãos, produtores e consumidores, e o seu “redirecionamento” segundo critérios políticos determinados.
Em todos os casos de declínio conhecidos, o Estado serviu precisamente para esse tipo de redistribuição perversa dos recursos públicos, gerando o fenômeno conhecido pelos economistas como “crowding-out”, isto é, a captura da poupança privada pelo próprio Estado e pelos rentistas profissionais e sua apropriação pelo próprio Estado (e seus amigos), o que provoca deseconomias de escala e erosão do investimento produtivo. Os grupos politicamente mais bem articulados conseguem acesso aos planejadores e legisladores do orçamento público, deixando ao relento os setores menos organizados. Isso geralmente implica em concentração de renda e ausência de um mercado interno dinâmico. Os exemplos de declínio e de estagnação coincidem, justamente, com o que Veblen chamaria de “consumo conspícuo” das elites, em total indiferença em relação ao conjunto dos cidadãos.
Não se pense, por fim, que tudo se faz em benefício do “grande capital monopolista” e em detrimento da “classe trabalhadora”. Sindicatos são máquinas organizadas para criar escassez de mão-de-obra e para produzir desemprego, atuando em perfeita sincronia – nem sempre funcional, é verdade – com os sindicatos de patrões, com vistas a extorquir recursos do resto da sociedade desorganizada. Viceja, nos casos típicos de declínio econômico prolongado, uma espécie de “pacto perverso”, pelo qual ambos sindicatos entram em conluio – algumas vezes de forma involuntária ou até inconsciente – em favor de seus ganhos respectivos, repassando os custos para o resto da sociedade. A desigualdade distributiva nem sempre é “aristocrática”...

4. Não acatamento da lei pelos cidadãos e pelos próprios agentes públicos.
A decadência, como já afirmado, nem sempre se traduz em pobreza material, ao contrário, pois sociedades decadentes são, igualmente, sistemas de relativa abundância, pelo menos para os privilegiados. Mas, a decadência verdadeira sempre implica em miséria moral, a começar por um sistemático, no começo sutil, depois disseminado, desrespeito à lei e às boas normas de convivência. Uma sociedade não começa a decair com o aumento da delinquência comum e com a expansão da criminalidade de baixa extração, mas justamente com o desprezo pela lei por parte dos poderosos e dos próprios encarregados de manter a ordem. Sociedades patrimonialistas são naturalmente mais propensas a esse tipo de corrupção moral, como evidenciado na trajetória do império otomano, mas nem mesmo sistemas “tecnocráticos” estão imunes a esse tipo de evolução involutiva, se é possível este tipo de trajetória. O império chinês, com seu imenso corpo de mandarins bem treinados, talvez tenha conhecido itinerário semelhante, antes mesmo de o país ser invadido e humilhado pelos imperialistas ocidentais (e depois japoneses).
O desrespeito à lei, ou mesmo a contravenção pura e simples por parte dos poderosos, constituem o traço mais visível do declínio moral de uma sociedade. Quando as suas elites, em especial o seu corpo dirigente, recorrem a expedientes escusos, quando não a práticas claramente criminosas, para extrair benefícios para si, pode-se constatar que a sociedade caminha célere para a sua decadência. Não se deve, porém, confundir, artifícios ilegais, ou no limite da legalidade, empregados por algumas elites econômicas – como caixa dois, elisão ou evasão fiscal ou ainda pagamentos por fora – como representando necessariamente sinônimo de decadência. O setor produtivo pode ser especialmente competitivo e gerencialmente capaz, apenas que penalizado por um Estado voraz, por dirigentes políticos de comportamento predatório, sendo levado a utilizar-se do recurso a esse tipo de expediente como uma forma de “defesa patrimonial”. É, aliás, o que fazem a maioria dos cidadãos que buscam evadir o fisco, uma vez que adquiriram a consciência de que os impostos pagos diretamente e os tributos recolhidos indiretamente não retornam proporcionalmente sob a forma de serviços públicos.
A ilegalidade se dissemina paulatinamente na sociedade e se converte em uma “segunda natureza” do cidadão comum e do empresário: ninguém se “arrisca” a ser totalmente honesto, uma vez que isto representaria a inviabilidade do seu negócio ou a “extração compulsória” seria demais onerosa no plano das rendas individuais. Pouco a pouco, a corrupção e a contravenção se instalam em todos os poros da sociedade e ela, sem perceber, caminha rapidamente para o que chamamos de decadência.

5. Elites distantes da sociedade e focadas no seu benefício próprio.
Esta é uma outra manifestação do mesmo comportamento descrito acima, apenas que os meios são absolutamente legais, ainda que ilegítimos, e redundam quase sempre nos mesmos efeitos já referenciados no rentismo perverso e no redistributivismo desigual. Responsáveis políticos se ocupam não tanto de legislar para a sociedade, mas em causa própria. Os meios passam a absorver uma proporção crescente dos recursos voltados para determinados fins. Isto geralmente se dá no setor legislativo, mas pode perfeitamente ocorrer nos meios judiciários e, igualmente, em corporações de ofício que se organizam burocraticamente no âmbito do poder executivo. A representação política deixa de constituir um mandato conferido pela sociedade para o desempenho das funções que lhe são próprias para converter-se em um fim em si mesmo.
Esses traços de comportamento não são exclusivos da representação política, embora eles sempre se reproduzam no estamento político. Elites rentistas, de modo geral, desenvolvem essa indiferença em relação à sociedade, cuja simbologia mais famosa – ainda que provavelmente equivocada – é historicamente representada pela frase de Maria Antonieta sobre os brioches que o povo deveria comer, no lugar do pão comum. Elites aristocráticas do ancien Régime, na França e na Rússia czarista, foram em grande medida responsáveis pela desafeição do povo em relação às suas elites, contribuindo para a derrocada dos respectivos regimes políticos ao se operar um claro divórcio entre suas concepções do mundo. O apartheid social, mais até no plano mental do que no âmbito material, costuma ser construído por minorias ativas, nem todas elas privilegiadas, mas sempre elitistas em relação à massa da sociedade.
Por vezes, uma elite “subversiva” se apossa do poder e passa a exibir os mesmos traços de comportamento que o das elites antes privilegiadas, numa típica reprodução da fábula contida em Animal Farm, segundo a qual “todos são iguais, mas alguns são mais iguais do que outros”.

6. Corrupção disseminada nas transações sociais de maneira geral.
O cimento mais poderoso em todas as sociedades organizadas é a confiança: não só na palavra dada, no plano individual, mas também na moeda, na observância da lei em caráter impessoal, no cumprimento dos contratos e, sobretudo, na certeza da punição em caso de ações “desviantes”. O que mantém o poder de compra de uma moeda, por exemplo, não é tanto a força absoluta de uma economia, mas a confiança de que seu valor de face não será abalado por atos arbitrários das autoridades emissoras, medidas intervencionistas que afetem sua liquidez ou alguma ameaça de confisco, mesmo indireto.
A incerteza jurídica – por vezes trazida pelos próprios juízes, que não se contentam em interpretar a lei, preferindo criá-la, ou colocá-la a serviço de alguma causa “social” – está na origem do desrespeito aos contratos e, portanto, no aumento dos custos de transação. Setores da sociedade passam a desenvolver formas próprias, geralmente informais, de intercâmbio, que podem englobar um volume crescente de atividades. Sociedades decadentes são, geralmente, sociedades nas quais a informalidade recobre grande parte da população economicamente ativa e uma fração significativa do produto social. Um Estado “extrator” pode também ser o responsável direto pela “expulsão” do mercado formal de agentes econômicos privados que não encontram nenhuma vantagem em se colocar à margem da legalidade, mas que não conseguem se enquadrar nas regras existentes. Na verdade um cipoal de regulamentos estabelecido justamente para vigiar o cumprimento de uma legislação barroca no plano regulatório.
A sociedade como um todo passa a se acostumar com a modalidade informal de se completarem as transações e, ao fim e ao cabo, os intercâmbios legais passam a cobrir uma fração cada vez menor do conjunto das trocas sociais. A sociedade de “desconfiança” afeta a todos os participantes do mercado, gerando graus crescentes de anomia e de deterioração dos costumes básicos. A sociedade em questão está “pronta” para aprofundar seu processo de decadência.

7. Avanço dos corporatismos e particularismos, em detrimento das “causas nacionais”.
A fragmentação da representação política e social nos diversos corpos constitutivos da sociedade cria uma colcha de retalhos de difícil administração institucional. Para que grandes reformas estruturais se façam – e toda sociedade requer, periodicamente, adaptação às novas condições ambientais externas e às suas próprias transformações internas, demográficas e outras –, as diferentes partes da sociedade precisam estabelecer um pacto de convivência, no qual todos cedem um pouco para que as mudanças possam ser implementadas. A perseguição de objetivos particularistas por grupos sociais organizados, geralmente com vistas a se alcançar metas setoriais e exclusivas, inviabiliza qualquer “projeto nacional” digno desse nome (ainda que essa figura seja antes um mito do que uma realidade, pois “projetos” bem executados geralmente resultam da ação decisiva de uma pequena elite de “iluminados”, quando não de um líder carismático atuando como estadista).
O fato é que os processos de decadência também são caracterizados pela existência de “projetos fragmentários”, condizentes com o perfil já fortemente sindicalizado dessa sociedade. Não é incomum a representação política passar da dominância de próceres cosmopolitas, da elite, mas dotados de uma visão do mundo não provinciana, para “delegados de categoria”, eleitos por um grupo de interesse restrito (de caráter sindical, setorial ou religioso). O processo legislativo se divide então em uma miríade de demandas particularistas, que esquartejam o orçamento nacional e transformam o planejamento público em uma assemblagem de partes heteróclitas. Congela-se a possibilidade de atuar nas grandes causas, pois o mercado político converte-se num bazar de compra e venda de projetos setoriais e fragmentários. Um indicador fiável dessa tendência é dada por meio de consulta a um calendário-agenda: a sociedade estará tão mais próxima da decadência quanto mais dias do ano são dedicados a homenagear categorias profissionais...

8. Grupos sociais particulares pretendem distinguir-se do conjunto da sociedade.
A chamada “identidade nacional” – um conceito difuso e frequentemente mal interpretado – constitui um dos traços mais conspícuos da psicologia de massas. Uma sociedade dinâmica ostenta um forte sentimento de inclusividade e de identificação com os símbolos nacionais, sejam eles realidades históricas tangíveis, sejam eles simples mitos criados para fortalecer o processo de Nation building. Em qualquer hipótese, o sentimento de pertencimento – status de appartenance ou membership – a um corpo social ou humano relativamente homogêneo é um poderoso cimento da identidade nacional, o que não impede, obviamente, particularidades regionais, traços étnicos ou especificidades culturais próprias a sociedades complexas, racialmente diversas e dotadas de origens “multinacionais”. O ideal de toda sociedade integrada e orgulhosa de sê-lo é, justamente, conseguir passar do estágio simplesmente “multinacional” para o de “sociedade multirracial”, o que deveria ser o objetivo de toda comunidade inclusiva, uma vez que tal característica destrói as próprias bases de qualquer manifestação de racismo ou apartheid.
A desafeição em relação à fusão dos particularismos raciais ou culturais no mainstream social e humano nacional enfraquece a noção de identidade nacional e reforça a noção artificial de aparteísmo. Este tipo de divisor precisa ser construído politicamente, uma vez que se adota como suposto básico a unidade fundamental do gênero humano. A divisão é, geralmente, obra de ativistas e militantes de uma causa que se julga legítima, cujas raízes encontram fundamentação histórica em opressões seculares, que se pretende transplantar para o presente, como forma de preservar antigas particularidades raciais, linguísticas ou religiosas, que já estavam prontas a se fundir no poderoso molde nacional. A conformação política de uma cultura distinta da nacional reforça manifestações de racismo ao contrário, pois que as propostas são geralmente feitas para eliminar supostos focos de “racismo”. O apartheid também pode ser construído por minorias...

9. Irresponsabilidade intergeracional, nos terrenos fiscal ou ambiental, entre outros.
O desejo de preservar o status quo, ou a inconsciência quanto à constante necessidade de ajustes e adaptações às condições “ambientais”, nacionais ou internacionais, sempre cambiantes, fazem com que gerações do presente eventualmente atuem de maneira irresponsável em relação àquelas que as sucederão. Historicamente, o problema sempre esteve associado à depredação do meio ambiente e à extinção de espécies animais, alterando o equilíbrio natural e ameaçando a sustentabilidade de sistemas econômicos inteiros. Contemporaneamente, a questão tende a se revestir de características econômicas bem marcadas, tendo a ver com a trajetória avassaladora do Estado moderno e sua voracidade fiscal, não em benefício próprio, obviamente, uma vez que o Estado é uma entidade impessoal, mas em favor de grupos ou categorias dispondo de condições de acesso e de manipulação dos mecanismos de intervenção pública.
Nos casos mais graves, o conjunto da sociedade pode atuar de maneira irresponsável, ao sustentar escolhas que representam uma clara preferência pelo bem-estar presente, em detrimento do amanhã. Seja nos esquemas de previdência social, seja nas instituições educacionais, ou ainda em matéria de déficits orçamentários e dívida pública, opções erradas e a visão imediatista dos responsáveis políticos, sustentados pela inconsciência da maioria, criam pesadas hipotecas de médio e longo prazo que deverão, em algum momento, ser resgatadas pelos sucessores, aqui entendidos como o conjunto da sociedade de uma ou duas gerações mais à frente. O declínio pode até não ser visível no próprio momento das decisões, mas o que se está fazendo, na verdade, é “contratar” a decadência futura.

10. Degradação ética e moral, independentemente de “progressos” técnicos.
Edward Gibbon, em seu justamente celebrado História do Declínio e Queda do Império Romano, tende a ver a decadência de Roma como o resultado da perda de “valores cívicos” por parte dos cidadãos do império, a começar pelos patrícios, que delegaram aos bárbaros tarefas que eles deveriam ter assumido diretamente. Ele também atacou a influência do cristianismo, como possível fator de afastamento do antigo espírito marcial e guerreiro, que tinha feito, no início, o sucesso da república e do império. Seja como for, a perda de objetivos claros quanto ao futuro, certa resignação em face das dificuldades do presente e a busca de prazeres imediatos em lugar da frugalidade produtiva e empreendedora podem ser sinais precursores da decadência.
Curiosamente, nenhum dos exemplos históricos tidos como ilustrativos ou emblemáticos desse tipo de processo pode ser considerado um insucesso absoluto na cultura ou nas artes. O vigor da produção cultural continua a todo vapor no momento mesmo em que essas sociedades passam a enfrentar problemas na economia e na inovação. Não há um elemento singular ou único que “anuncie” a decadência, mas um conjunto de comportamentos sociais e de reações que indica forte deterioração da solidariedade social e uma crescente anomia em relação aos valores básicos da sociedade. A falta de confiança nas instituições políticas e a forte desconfiança das motivações de outros grupos sociais fazem com que líderes e liderados não mais se sintam comprometidos com o mesmo conjunto de valores, passando a ocorrer manifestações de introversão e de egoísmo que logo superam a identificação com a pátria e a nação.

Em síntese, existe um “espírito” de decadência quando os setores produtivos, em especial os empresários mais politicamente ativos, se mostram resignados ante a presença avassaladora do Estado, que lhes tolhe os movimentos, impõe regras e lhes retira a substância da atividade econômica, que é o lucro e os excedentes para investir. Existe decadência quando os intelectuais e os universitários, de uma forma geral, se conformam ante o culto à ignorância exibido por certos grupos sociais ou líderes supostamente carismáticos ou “salvacionistas”. Existe decadência quando autoridades nacionais, a começar pelos encarregados da preservação da ordem jurídica e institucional, deixam de lado suas obrigações profissionais para cuidar de prosaicos interesses pessoais, pecuniários antes de tudo. Existe decadência quando o cidadão comum não vê qualquer motivo para preservar o patrimônio coletivo, demonstrando total inconsciência quanto ao dever de respeitar a herança das gerações precedentes e a necessidade de repassar às que seguirão a sua própria um ambiente melhor do que aquele recebido dos ancestrais.
Em suma, os sinais materiais, ou externos, da decadência nem sempre são os que contam na avaliação dos “progressos” dessa inacreditável marcha para trás na jornada das sociedades. A insensatez quanto aos rumos da história também se manifesta, antes de tudo, por uma pura e simples inconsciência. Manuais práticos de decadência podem ser um preventivo útil na inversão da trajetória. Basta saber consultá-los...

Brasília, 31 janeiro 2007.

Falsos verdadeiros: os cadernos de memorias de Hitler - Der Spiegel

Real Fakes

'Hitler Diaries' Reporter Wants Them Back

Der Spiegel, 04/09/2013

In 1983, Stern magazine stunned the world by saying it had found Adolf Hitler's diaries. Unfortunately, they were fake. Now Gerd Heidemann, the reporter who discovered them, wants the diaries back, citing a clause in his original contract.
It has been 30 years since Germany's Stern magazine ran what it thought was the scoop of the century, stunning the world with the claim that it had found Adolf Hitler's diaries. Lots of them, in fact. The reporter who unearthed them, Gerd Heidemann, acquired 62 volumes for 9.3 million deutsche marks ($6.1 million) from Konrad Kujau, an antiques dealer and painter.
What happened next is history. The diaries turned out to have been penned not by Hitler but by Kujau, Stern took years to recover from the embarrassment, Heidemann spent time in jail for embezzlement and Kujua was jailed for fraud.
But now Heidemann wants the diaries back, citing a clause in his original contract with Stern's publisher, Gruner & Jahr, that states that the original manuscripts would be handed back to him 10 years after they had been published.
"If I had the financial means, I would sue the publisher for their release. I can only hope that the publisher will honor the contract," Heidemann told Bild newspaper on Tuesday.
Heidemann could not be reached for comment.
An Amusing Read
Gruner & Jahr said it still has most of the volumes, and that some are on display in a history museum in Bonn and will go on show at Hamburg's police museum, Bild reported.
Heidemann said that if he got the diaries, he would make them available to Germany's national archive.
It is unclear what price the forged diaries could fetch if they were sold. Some of them make for entertaining reading. Kujau's Hitler wrote this passage about his girlfriend Eva Braun, for example:
"I've really got to have a serious talk with Eva. She thinks that a man who leads Germany can take as much time as he wants for private matters." An entry dated June 1935 reads: "Eva now has two dogs, so she won't get bored."
One entry during the 1936 Berlin Olympics reads: "Eva wants to come to the Games in Berlin, have had tickets delivered to her and her girlfriends. Hope my stomach cramps don't return during the Games."

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Onde Margareth Thatcher errou, economicamente - Murray Rothbard

Mrs. Thatcher's Poll Tax
by Murray N. Rothbard
The Mises Daily, April 10, 2013
[This article is featured in chapter 62 of Making Economic Sense by Murray Rothbard and originally appeared in the June, 1990 edition of The Free Market]

Riots in the streets; protest against a hated government; cops arresting protesters. A familiar story these days. But suddenly we find that the protests are directed, not against a hated Communist tyranny in Eastern Europe, but against Mrs. Thatcher's regime in Britain, a supposed paragon of liberty and the free market. What's going on here? Are anti-government demonstrators heroic freedom-fighters in Eastern Europe, but only crazed anarchists and alienated punks in the West?

The anti-government riots in London at the end of March were, it must be noted, anti-tax riots, and surely a movement in opposition to taxation can't be all bad. But wasn't the protest movement at bottom an envy-ridden call for soaking the rich, and hostility to the new Thatcher tax a protest against its abstention from egalitarian leveling?

Not really. There is no question that the new Thatcher "community charge" was a bold and fascinating experiment. Local government councils, in many cases havens of the left-wing Labour Party, have been engaging in runaway spending in recent years. As in the case of American local governments, basic local revenue in great Britain has been derived from the property tax ("rates" in Britain) which are levied proportionately on the value of property.

Whereas in the United States, conservative economists tend to hail proportionate taxation (especially on incomes) as ideal and "neutral" to the market, the Thatcherites have apparently understood the fallacy of this position. On the market, people do not pay for goods and services in proportion to their incomes. David Rockefeller does not have to pay $1000 for a loaf of bread for which the rest of us pay $1.50. On the contrary, on the market there is a strong tendency for a good to be priced the same throughout the market; one good, one price. It would be far more neutral to the market, indeed, for everyone to pay, not the same tax in proportion to his income, but the same tax as everyone else, period. Everyone's tax should therefore be equal. Furthermore, since democracy is based on the concept of one man or woman, one vote, it would seem no more than fitting to have a principle of one man, one tax. Equal voting, equal taxation.

The concept of an equal tax per head is called the "poll tax," and Mrs. Thatcher decided to bring the local councils to heel by legislating the abolition of the local rates, and their replacement by an equal poll tax per adult, calling it by the euphemism, "community charge." At least on the local level, then, soaking the rich has been replaced by an equal tax.

But there are several deep flaws in the new tax. In the first place, it is still not neutral to the market, since--a crucial difference--market prices are paid voluntarily by the consumer purchasing the good or service, whereas the tax (or "charge") is levied coercively on each person, even if the value of the "service" of government to that person is far less than the charge, or is even negative.

Not only that: but a poll tax is a charge levied on a person's very existence, and the person must often be hunted down at great expense to be forced to pay the tax. Charging a man for his very existence seems to imply that the government owns all of its subjects, body and soul.

The second deep flaw is bound up with the problem of coercion. It is certainly heroic of Mrs. Thatcher to want to scrap the property tax in behalf of an equal tax. But she seems to have missed the major point of the equal tax, one that gives it its unique charm. For the truly great thing about an equal tax is that in order to make it payable, it has to be drastically reduced from the levels before the equality is imposed.

Assume, for example, that our present federal tax was suddenly shifted to become an equal tax for each person. This would mean that the average person, and particularly the low-income person, would suddenly find himself paying enormously more per year in taxes--about $5,000. So that the great charm of equal taxation is that it would necessarily force the government to lower drastically its levels of taxing and spending. Thus, if the U.S. government instituted, say, a universal and equal tax of $10 per year, confining it to the magnificent sum of $2 billion annually, we would all live quite well with the new tax, and no egalitarian would bother about protesting its failure to soak the rich.

But instead of drastically lowering the amount of local taxation, Mrs. Thatcher imposed no such limits, and left the total expenditure and tax levels, as before, to the local councils. These local councils, Conservative as well as Labour, proceeded to raise their tax levels substantially, so that the average British citizen is being forced to pay approximately one-third more in local taxes. No wonder there are riots in the streets! The only puzzle is that the riots aren't more severe.

In short, the great thing about equal taxation is using it as a club to force an enormous lowering of taxes. To increase tax levels after they become equal is absurd: an open invitation for tax evasion and revolution. In Scotland, where the equal tax had already gone into effect, there are no penalties for non-payment and an estimated one-third of citizens have refused to pay. In England, where payment is enforced, the situation is rougher. In either case, it is no wonder that popularity of the Thatcher regime has fallen to an all-time low. The Thatcher people are now talking about placing caps on local tax rates, but capping is scarcely enough: drastic reductions are a political and economic necessity, if the poll tax is to be retained.

Unfortunately, the local tax case is characteristic of the Thatcher regime. Thatcherism is all too similar to Reaganism: free-market rhetoric masking statist content. While Thatcher has engaged in some privatization, the percentage of government spending and taxation to GNP has increased over the course of her regime, and monetary inflation has now led to price inflation. Basic discontent, then, has risen, and the increase in local tax levels has come as the vital last straw. It seems to me that a minimum criterion for a regime receiving the accolade of "pro-free-market" would require it to cut total spending, cut overall tax rates, and revenues, and put a stop to its own inflationary creation of money. Even by this surely modest yardstick, no British or American administration in decades has come close to qualifying.

Murray N. Rothbard (1926–1995) was dean of the Austrian School. He was an economist, economic historian, and libertarian political philosopher. See Murray N. Rothbard's article archives.
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Brasil: um pais condenado 'a decadencia economica e social

Não vou nem discutir o conteúdo dessas novas regras e disposições constitucionais, que certamente vão provocar profundas mudanças na vida das pessoas e no mercado de trabalho menos capacitado (digamos generosamente).

Brasil: Congresso Nacional promulga emenda constitucional que estende todos os direitos trabalhistas aos empregados e empregadas domésticas.

Vou simplesmente observar que o simples fato de constitucionalizar regras aplicáveis a empregados domésticos é, em si, uma demonstração bizarra de decadência institucional, que não pode deixar de refletir-se nas políticas econômicas, nas políticas setoriais, nos orçamentos familiares.
O Brasil encontra-se numa trajetória de crescimento medíocre, de deterioração educacional, de desvios econômicos e de distorções políticas e sociais, e ele vai pagar um preço por isso.
Pena que os pequenos erros vão se acumulando no consenso da mediocridade, e só no longo prazo se descobre que o país ficou para trás.
Assim ocorreu com a China, com a Inglaterra, com a Argentina, ou seja, países que atravessaram espetaculares (por vezes seculares) processos de decadência, exemplares no plano macrohistórico, períodos dos quais apenas os dois primeiros países conseguiram se safar, e onde o terceiro se afunda cada vez mais, aliás há mais de 80 anos. O Brasil segue pelo mesmo caminho, desde 1988, e mais acentuadamente desde 2003.
Não gostaria de ser profeta da decadência, mas não poderão acusar-me, no futuro, de não ter avisado.
Paulo Roberto de Almeida

P.S. 1: Vou republicar aqui um trabalho sobre a questão.
P.S. 2: Alerto que não sou contra direitos laborais, e sou contra, sim, a escravidão moderna representada pelos trabalhos domésticos; apenas acho ridículo constitucionalizar a matéria.

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Comissao (dita) da "Verdade" descumpre a lei - Eliezzer Rizzo de Oliveira

Comissão da Verdade descumpre a lei 

Eliézer Rizzo de Oliveira

Estado de S.Paulo, 8 de abril de 2013.
A Comissão Nacional da Verdade é muito relevante na construção da memória e da verdade histórica do nosso país. A Lei n.º 12.528, de 18 de novembro de 2011, aprovada pelo voto unânime de lideranças na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, define, no artigo 1.º, a sua finalidade: "Examinar e esclarecer as graves violações de direitos humanos praticadas no período fixado no artigo 8.º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, a fim de efetivar o direito à memória e à verdade histórica e promover a reconciliação nacional".

Os objetivos da lei (artigo 3.º) detalham a finalidade geral. E, a exemplo desta, não contêm restrições quanto aos sujeitos e às organizações a serem pesquisados. A única limitação é temporal: as datas de promulgação das Constituições que inauguram os regimes democráticos de 1946 e 1988. Portanto, a Comissão da Verdade é obrigada a investigar os âmbitos da sociedade e do Estado, os dois lados no tocante ao regime militar, seu foco central, mas não exclusivo. Ou seja, os delitos contra os direitos humanos cometidos por agentes públicos - policiais, militares, juízes, promotores, etc. - e também os delitos do mesmo tipo cometidos por atores da sociedade que combateram o regime militar, mas igualmente os que o apoiaram.

Onde ocorreu tal violação dos direitos humanos, lá deve operar a investigação histórica. Somente o cumprimento dessa obrigação legal possibilitará à Comissão da Verdade elaborar um "relatório circunstanciado contendo as atividades realizadas, os fatos examinados, as conclusões e recomendações" (artigo 11) tão verdadeiro quanto possível, uma contribuição efetiva para a construção de uma cultura de paz e dos direitos humanos, no respeito à Lei da Anistia de 1979 (artigo 6.º) e à deliberação do Supremo Tribunal Federal de 2010. Para tanto é indispensável abrir todos os arquivos, convocar pessoas de todos os espectros a fim de contribuírem para o esclarecimento da violência política.

Entretanto, a Comissão da Verdade afastou-se da obrigação legal ao adotar a Resolução n.º 2, de 20 de agosto de 2012, de modo a investigar exclusivamente as "graves violações de direitos humanos praticadas (...) por agentes públicos, pessoas a seu serviço, com apoio ou no interesse do Estado". Em consequência, a sua vontade política se sobrepõe à vontade política do governo federal e do Poder Legislativo.

É discutível tal autonomia. Recentemente, foi ampliado o número de assessores da Comissão da Verdade mediante decreto presidencial, uma vez que a comissão não poderia fazê-lo por conta própria. Que dirá modificar a sua finalidade!

Dois argumentos frágeis foram empregados para justificar essa inflexão na finalidade da Comissão da Verdade.

O primeiro afirma que nenhuma comissão do mundo teria examinado os dois lados. Simplesmente não é verdade. Se a da Argentina se dedicou ao tema exclusivo dos desaparecidos, certamente em razão da sua gravidade, houve comissões que enfocaram os lados opostos dos conflitos sangrentos, como ocorreu na África do Sul, no Chile, no Peru e na Guatemala. Fiquemos com o exemplar Relatório Rettig, produzido pela comissão chilena, que analisou as estruturas, as ideologias, os tipos de ações criminosas contra os direitos humanos de autoria de agentes públicos e de agentes privados, das Forças Armadas e também dos partidos armados, tendo apontado as vítimas e as condições de seu padecimento, tanto de um lado como de outro.

O segundo argumento diz que os delitos cometidos pelas esquerdas não precisam ser investigados porque são conhecidos e os seus autores foram punidos. Verdade parcial, já que muitos foram julgados, punidos e anistiados. Seus atos não são, assim, do domínio histórico e público.

O que é mais conhecido é a repressão policial e militar - ilegal sempre, clandestina com frequência -, que produziu vítimas em número muito maior do que foram as vítimas das ações dos grupos armados de esquerda e de direita. Estruturas estatais foram criadas ou adaptadas para reprimir e matar, métodos provenientes do exterior associaram-se a práticas nacionais de tortura contra pessoas detidas e imobilizadas.

Os milhares de crimes da ditadura são execráveis e hediondos. Devem ser revelados os seus autores - inclusive os seus cúmplices da sociedade -, as suas estruturas e os seus métodos, bem como as suas vítimas. O terrorismo de Estado que vigorou entre nós, com trágicos resultados, fazendo lembrar o nazismo, desonrou a farda dos que tinham a missão constitucional da defesa nacional. A honra militar somente foi recomposta na democracia.

Milhares de opositores combateram o regime militar com a arma da convicção, da solidariedade, da organização da sociedade com métodos pacíficos. E houve militantes de grupos revolucionários de esquerda que assaltaram bancos, sequestraram, promoveram atentados terroristas, mataram sem possibilidade de reação das vítimas. Seus delitos contra os direitos humanos, as estruturas e as ideologias de suas organizações, o nome dos autores e de suas vítimas, tudo isso deve ser investigado e esclarecido pela Comissão da Verdade.

Pois bem, qual o motivo da Comissão da Verdade para adotar a investigação unidirecional e ilegal? O motivo é político: a perspectiva de revisão da anistia, objetivo estratégico do III Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3), com o propósito de julgar e punir agentes públicos da repressão. Pois não seria válida a Lei da Anistia nos termos da Justiça de Transição e de deliberações judiciais internacionais.

É a isso que se presta a Resolução n.º 2, com suas consequências. Esse é o papel da Comissão da Verdade.

Em outras palavras, trata-se de refundar o Estado Democrático de Direito.
Eliézer Rizzo de Oliveira é cientista político, especialista em assuntos militares e foi diretor do Núcleo de Estudos Estratégicos da Unicamp.

Paranoia: se voce nao tem, passe a ter, pois este é o clima de Brasilia... - Jorge Serrão

Palácio do Planalto é invadido por espiões que buscavam documentos contra Erenice, Rose, Lula e Dilma
Jorge Serrão
Edição do Alerta Total, 10 de abril de 2013

Exclusivo - Sede imperial do nada republicano governo capimunista do Brazil, o Palácio do Planalto foi alvo fácil de um inédito esquema de espionagem. Quatro ou cinco dias atrás, de madrugada, criminosos invasores vasculharam computadores e tiraram cópias de documentos sigilosos da Casa Civil e da Presidência da República. Há informações de que fotos pessoais de Dilma foram levadas.

Até uma agenda pessoal da Presidenta Dilma chegou a ser levada. Mas o livro foi encontrado na garagem do Palácio. Há o temor de que o Palácio da Alvorada – onde a Dilma mora com a mãe – também tenha sido invadido. Mas não havia evidências disto até ontem. O caso de espionagem é abafado pelo governo – que recomendou ao comando da mídia amestrada que nada publique sobre o que se suspeita ser um golpe de espionagem internacional.

O serviço foi de profissional. As câmeras de segurança não registraram a invasão. Foram detectados indícios de grampos telefônicos e hackeagem nos computadores – para desespero do pessoal do Gabinete de Segurança Institucional. A Agência Brasileira de Inteligência (Abin), a Polícia Federal e o GSI investigam o incidente que será providencialmente desmentido. O raro evento pode fazer cabeças rolarem dada a fragilidade na segurança palaciana.

Nos bastidores de inteligência, acredita-se que a intenção principal dos invasores do Palácio do Planalto, além de intimidar o governo, foi obter provas materiais que incriminem duas pessoas, pelo menos, atingindo também a Presidenta Dilma Rousseff e seu antecessor Luiz Inácio Lula da Silva. O fato concreto é que o governo está sob ataque, em processo de desestabilização política, no momento em que Lula será investigado no Mensalão e a inflação volta a subir – com desgaste para a reeleição de Dilma.

O primeiro alvo da espionagem seria Erenice Guerra (amiga e ex-assessora de confiança da Presidenta Dilma). Depois de demitida por evidências de irregularidades, tendo um processo arquivado sobre tráfico de influência, Erenice foi recentemente denunciada pela revista Veja de usar seu escritório de advocacia em Brasília para oferecer serviços a quem precisa se aproximar do poder. Mexeu com Erenice, atingiu Dilma.

A segunda alvejada seria Rosemary Nóvoa Noronha (melhor amiga do ex-Presidente Lula e chefe de gabinete exonerada do escritório presidencial em São Paulo – investigada na Operação Porto Seguro da Polícia Federal. O caso anda em trâmite de cágado na 5ª Vara da Justiça Federal em São Paulo. Tudo no mais alto e injustificável “segredo judicial”. Rose é foi indiciada pela PF por tráfico de influência, corrupção passiva, falsidade ideológica e formação de quadrilha. A queridinha de Lula e José Dirceu é suspeita de comandar o esquema que favorecia empresas e pessoas interessadas em obter vantagens ilícitas junto a órgãos federais e agências reguladoras. Mexeu com Rose, acertou o “Tio” Lula.

Lula, Dilma & cia que se cuidem, porque quando o ataque a eles atinge tamanho grau de espionagem é um sinal claro de que coisas piores estão programadas para acontecer. O certo é que a espionagem não foi um ato criminoso realizado a pedido da oposição política interna – que não coragem nem competência para um ato tão ousado. O mais provável é que o governo tenha sido vítima de um sofisticado sistema de espionagem contratado por grandes investidores transnacionais – profundamente descontentes com prejuízos que acumulam em estatais de economia mista, como a Petrobrás e Eletrobras.

Uma coisa parece bem objetiva: a patralhada está com os dias contados no poder até a eleição presidencial de 2014.

Good-bye Maggie - Alvaro Vargas Llosa

Goodbye, Maggie


Margaret Thatcher’s death caught up with me in the worst of places: a speech in Argentina. What to do? Should I follow my conscience and say a few words in memory of her—and risk offending an audience sensitive to the legacy of the Falklands War—or should I keep silent? I opted for saying a couple of words, asking them not to take offense and expressing respect for their feelings. Some disapproving noises came back from the audience. After I finished speaking, I faced some aggressive reproaches.
In death, as in life, Thatcher is a polarizing figure. There are classical liberals who object to her excessive conservatism and conservatives who judge her to have been too libertarian; the left hates everything about her and Argentines consider her a war criminal. I spent a few years in London during her time in office. There are some things everyone, left or right, should value.
First, she transformed the British right, which was an oligarchic club, into a association in which merit rather than origin, and effort rather than lineage, became the dominant features. When she took over the leadership of the Conservative Party in 1975, being a grocer’s daughter from Grantham was a stigma among Tories; self-made success and social mobility were anathema to them. By 1990, those were emblems of a new Tory Party.
Thatcher brought back ideas into politics. Neither the left, which had been dominant since the end of WWII and accelerated Britain’s decadence, nor the right, which had accepted the fundamentals of a socioeconomic model imposed by the left, believed in ideas anymore. We can debate whether she went as far as she could in applying hers, but there is no debating her love of ideas. The ones she absorbed at the Institute of Economic Affairs and the ones she learned reading everything from Edmund Burke to Friedrich Hayek shaped her discourse and many, many of her actions.
Because her mission was not to do away with the state, she did not do so. In some areas, such as defense, she enlarged it. But she launched a process that devolved the responsibility for wealth creation and the pursuit of happiness from the state to civil society. In so doing, she transformed the right and the left. She instilled idealism and a reformist zeal into the political right; she helped modernize part of the left. Although Tony Blair’s Labor Party made government somewhat bigger, on the whole he maintained her legacy and reaped the benefits. This fostered the rebirth of the left under the banner of the “third way”, which impacted Europe, the United States (under Bill Clinton) and Latin America (with Brazil’s Lula da Silva).
Contributing to the implosion of Soviet communism, something that is often attributed to her, was no small feat. It required going up against vested interests and widespread perceptions in a democratic Europe that had lost all hope of change on the other side of the Iron Curtain. She was accused of being blinded by ideology; but when she understood that Mikhail Gorbachev was seriously interested in reform, she declared that the West could “do business with him” (and caused whispers among the American right). Thatcher was not an ideological animal, but a political animal with ideas. Both the right and the left owe much to what she did, in peaceful combat, to tear down the Berlin Wall. The right defeated an enemy, of course, but the moderate left shook off a dead weight.
Thatcher mistrusted European integration. Many of us thought she did so primarily for nationalistic reasons (and later a discomfort with a unified Germany) rather than because she feared the bureaucratic aspects. Time has shown she was right about some of what she said. The European construct has many flaws; the crisis of 2007/8 brought them into the open.
She was a rare politician. It will be decades before Europe produces anything like her. Rest in peace, Maggie.

Otimismo e desespero dos libertarios: sempre esperando muito, e conseguindo pouco -

Não sou um libertário, no sentido ideológico do termo, quero dizer, ainda que eu possa me dizer um libertário por princípio, individualmente, mas não como parte de um movimento. Acredito na plena autonomia do indivíduo, e acho, sim, que a sociedade estaria muito melhor com menos Estado e mais responsabilidade individual, mais mercado, mais competição, mais liberdade, enfim. O Estado é uma máquina que aprisiona, impõe, determina e proibe, regulando até aspectos mais íntimos da vida cidadã. Por isso sou libertário.
Mas tenho plena consciência que a maioria das pessoas (digamos 95% da população) gostaria de ter um baby-sitter particular, para cuidar das suas coisas, dizer o que fazer, evitar perigos, garantir emprego e lazer, enfim, tomar conta do bebê que todo mundo gostaria de ser (pelo menos para as coisas chatas da vida). Por isso, as pessoas estão dispostas a trocar um pouco (às vezes muito) de sua liberdade, entregar um pouco (em vários casos muito) do seu dinheiro para esse ente que todos consideram imparcial e bondoso que se chama Estado (que via de regra é privatizado pelos mais espertos, e retira dos contribuintes bem mais do que devolve em bens e serviços).
O que mais se aproximou da versão radical do dirigismo estatal foi o marxismo, que falhou, sabemos todos, fez chabu e já não atrai muita gente (com exceção de acadêmicos alucinados e mais da metade dos "clientes" das universidades brasileiras).
O que sobrou então, no seu lugar, mais distributivista do que igualitarista radical, foi o keynesianismo, que comanda nossas vidas e vai continuar comandando por um bocado de tempo mais, enfim, até que suficientes desastres se acumulem para provocar uma mudança, e o surgimento de uma nova teoria estatizante com algumas variantes em relação ao que temos hoje.
Uma coisa é certa: 95% da população vai continuar pedindo um Estado-babá, e os políticos oportunistas vão continuar servindo de intermediários entre a riqueza coletiva e as prebendas que podem ser distribuídas a esses bebês chorões (com uma comissão importante reservada para si mesmos, isto é evidente).
Por isso, mesmo sendo libertário em espírito, não participo de nenhum movimento libertário. Aliás, não faço parte, e nunca farei, de nenhum grupo que me retire um grama, um centímetro de liberdade, e pertencer a um grupo libertário, mesmo de livre afiliação, já me parece uma concessão terrível que teria de fazer no plano de minhas liberdades pessoais.
Por isso concordo com a maior parte dos argumentos desse autor.
Não se desesperem! A maior parte das pessoas gosta desse fascismo participatório do qual ele fala.
Paulo Roberto de Almeida

Libertarian Wishful Thinking


As a rule, libertarians incline toward wishful thinking. They constantly pluck little events, statements, and movies from the flow of life and cry out, “Eureka! Libertarianism is on the march!” With some of my friends, this tendency is so marked that I have become amused by its recurrent expression—well, there he goes again!
Some of this tendency springs, I believe, from their immersion in abstract thought and writing. Many of them have read hundreds of books and articles on libertarianism itself or on closely related ideas and personalities. They love to point out that ideology controls everything and to remark that as soon as we can bring a substantial minority over to our way of thinking, the whole social and political apparatus will tip from tyranny into liberty—rather as the old Eastern European satellites of the USSR (seemingly) abandoned their Communist regimes and substituted much less oppressive regimes almost overnight, in most cases with little bloodshed.
Although I agree that ultimately ideology controls many other elements in social and political affairs, I do not agree that ideology in the Western welfare-warfare states is nearly as fragile as Communist ideology was in the old Soviet satellites. Libertarians rarely invest much time in the detailed study of how the dominant ideology is generated and maintained in the contemporary West. Even fewer of them dig into the detailed composition and operation of the many economic, social, and political institutions that are tied in countless ways into reliance on and support of the politico-economic status quo. Hundreds of thousands of such organized efforts go on day in and day out all over the country at every level. One has only to thumb through the telephone directory for the Washington, D.C., area to gain an impression of the amazing array of well-organized, well-funded, special-interest groups now working ceaselessly, in effect, to keep all attempts to restore liberty at bay and if possible to bind individuals down by additional legal restraints and obligations. Participatory fascism in the contemporary USA and other advanced Western countries is an arrangement so vast and far-reaching that it defies the grasp of any single researcher. Specialists can easily work full-time in simply trying to understand the workings of one tentacle among the thousands that the beast possesses.
To suppose that an overnight ideological conversion or “tipping” can remove all of these organizations from the scene or lead them to alter their objectives and modus operandi is fanciful beyond imagination. To borrow from the vernacular, it just ain’t gonna happen. For it to do so would amount to the most preposterous instance of the tail wagging the dog in human history. Communist regimes could be (seemingly) tipped because Communism was widely recognized as a failure, as a recipe for societal backwardness and a low level of living. After its initial revolutionary surge of support, its ideological underpinnings grew weaker and weaker with each passing year and, by the 1980s, not many true believers remained.
Such is not at all the case in the West today. Here nearly everybody is held tightly in the system by countless seemly beneficial ties that few people can imagine doing without: Who’ll send grandma a monthly check to keep her in groceries? Who’ll provide medical care for the scores of millions of lower-income people whose care now comes via Medicaid? Who’ll cover the huge medical bills the elderly now expect Medicare to pay? Who’ll subsidize the college loans on which millions of students rely? And so on and on. One has only to wade through the Code of Federal Regulations and ask on each page: if this particular regulation were scrapped today, how would its corporate and union beneficiaries react? Can one really imagine that these powerful institutions would simply shrug their shoulders if liberty should break out, after having fought for more than a century to forge the fetters that now bind the populace in the service of almost innumerable special interests?
One who maintains, as I do, that the existing system may crumble little by little, having heedlessly sowed thousands of poisonous seeds of its own destruction, but almost certainly will never just roll over and admit defeat, may seem to be a defeatist. But nothing is gained by entertaining an unrealistic view of what liberty lovers are up against. Even if one believes, as I do, that the existing system is not viable in the very long run, it may last in episodically patched-up forms for a long, long time. There are no magic bullets, such as abolishing the Fed. The state can use other means in the highly unlikely event that it should no longer have the Fed in its arsenal. The same can be said about most of the system’s other key elements.
In truth, the time for liberty lovers to make a stand that had a fighting chance of success was a century ago. But that chance was squandered, if indeed it ever packed much punch. Powerful economic, institutional, and ideological currents were working against it even then, and by now those currents, swelled by the self-interested efforts of several generations of statists in positions of great power and influence, have grown into a mighty river. This fascistic Rome wasn’t built in a day, and it wasn’t built by accident, either. It is not so flimsy that it will collapse because someone gives a libertarian-sounding speech in the Senate, because thousands of powerless college students turn out to hear Ron Paul speak, or because a writer embeds a libertarian sentiment in a film script. These things, however much they may cheer the libertarian heart, are the equivalent of the proverbial sparrow pecking at a pyramid. Wishful thinking about the impending triumph of liberty may be uplifting for libertarians, but it avails neither them nor the world anything of real importance.