O chanceler em campanha
O Estado de S. Paulo, 15/10/2006:
"Nas últimas semanas, o ministro Celso Amorim quebrou uma tradição do Itamaraty e passou a ser visto num lugar que os chanceleres não costumam freqüentar: o palanque de campanha.
Desde o fim de agosto, o ministro das Relações Exteriores aproveitou a suspensão das negociações na Organização Mundial do Comércio (OMC) - sua prioridade máxima neste ano - para estar presente em cinco comícios e acompanhar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, candidato à reeleição, em reuniões com caciques políticos e intelectuais e até mesmo no único debate a que compareceu.
No Itamaraty, onde raros são os diplomatas que escapam de apelidos, Celso Amorim passou a ser chamado de 'ministro das Relações Interiores'.
No Palácio dos Arcos, seu empenho para manter-se no posto no eventual segundo mandato petista fora assimilado há tempos pela diplomacia - em especial depois de Amorim ter se referido ao presidente, em 2005, como 'nosso guia'.
A diferença, hoje, é sua presença em palanques, a despeito da agenda externa nada tranqüila, de sua movimentação limitada nos meios políticos e da feição pouco conhecida pelo eleitorado."
Ministro de Estado das Relações Exteriores
Brasília - DF, 13/10/2006
Entrevista concedida pelo Ministro de Estado das Relações Exteriores, Embaixador Celso Amorim, à Agência Reuters
ENTREVISTA - "Lula faz política externa que povo quer", diz Amorim
por Ricardo Amaral
BRASÍLIA (Reuters) - Pode ser tudo, menos monótona, a vida de chanceler no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que fez da política externa uma referência obrigatória na política interna do país.
Ao final de uma semana de rotina, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, pode ser visto num hotel de luxo no Rio, negociando com um alto funcionário estrangeiro, ou perdido num beco da periferia de Guarulhos (SP), pedindo socorro à polícia para encontrar o caminho do aeroporto, depois de participar de um comício de Lula no início de setembro.
"Este governo pratica a política externa que o povo quer: independente, ousada e equilibrada", disse o ministro à Reuters nesta sexta-feira, explicando o fato de participar de atividades de política interna, inclusive comícios eleitorais, o que não é usual no Brasil.
A atividade de Amorim tem alimentado críticas à política externa do governo Lula, inclusive por expoentes da carreira diplomática. A mais recente partiu do ex-embaixador Rubens Barbosa, que, em artigo no "Estado de S. Paulo" condenou "a tentativa de partidarização dos quadros do Itamaraty".
"Certas pessoas gostariam que o chanceler fosse uma espécie de presidente de um Banco Central independente", diz Amorim, reconhecendo as críticas. "Só que ele é o porta-voz da política externa do presidente eleito pelo povo. Respeito muito o Itamaraty mas fui indicado pelo presidente Lula", rebate.
Aos 64 anos, Celso Amorim está no comando do Itamaraty pela segunda vez. Foi ministro de Itamar Franco, em 1993 e 1994, sucedendo Fernando Henrique Cardoso, que mais tarde seria presidente da República e que nesta eleição é o paradigma de tudo que o governo Lula condena.
"É PO-LÍ-TI-CA"
Além do comício de Guarulhos, Celso Amorim esteve com Lula na Cidade de Deus, a favela mais famosa do mundo; numa reunião política com professores e intelectuais, em São Paulo; e visitando operários nas portas das fábricas DaymlerChrysler e Ford, em São Bernardo, entre outras atividades eleitorais.
"Sou mais reconhecido em São Bernardo do que nos shopping-centers", constata Amorim, um paulista de Santos que passou boa parte da vida no Rio e, extradiplomacia, foi aprendiz de cineasta e diretor da Embrafilme nos anos 70.
"Claro que as pessoas reconhecem em mim a política do presidente, e isso é gratificante", prossegue. "Outro dia me parou um rapaz negro, de uns 18 anos, e disse: Celso, eu ia estudar arquitetura, mas agora vou tentar o Itamaraty".
A defesa da política externa foi considerada por muitos o melhor momento do presidente Lula no debate com o candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, domingo passado, na TV Bandeirantes. No encontro com intelectuais, no final de agosto, Lula ouviu tantas críticas à política monetária e tantos elogios à política externa que pediu a Amorim para falar à platéia, formada por petistas ortodoxos, como a filósofa Marilena Chauí, e dissidentes, como o economista Paulo Nogueira Batista Júnior.
"Tinha uns dez ministros ali, mas só falei eu, o único que não era filiado ao PT", recorda Amorim. Nos anos 80, por influência do ex-ministro Renato Archer, ele foi filiado ao PMDB, mas nem sabe dizer se a ficha de filiação ainda existe.
"Claro que a política externa é de Estado, mas é po-lí-ti-ca, ou não estaria nas plataformas de cada candidato", argumenta, escandindo a palavra-chave. "Não é a primeira vez que ela faz parte do debate nacional, mas há muito isso não acontecia".
Amorim afirma que o breve governo Itamar Franco teve uma política externa "digna", mas até por falta de tempo não desenvolveu um projeto completo "como o que está no discurso de posse do presidente Lula".
"BEM NA FOTO"
O resumo dessa política seria, segundo o chanceler, a defesa dos interesses nacionais em negociações comerciais, buscando a integração da América do Sul e a aproximação com países de dimensões semelhantes (Índia, África do Sul, China), e maior contato com a África e Oriente Médio, sem perder a interlocução com os Estados Unidos e a União Européia.
"O crescimento do comércio e das exportações em todas essas frentes é a expressão mais fácil do sucesso da política externa", diz Amorim. "Mas também há uma dimensão política: o povo gosta de se reconhecer positivamente na relação com o mundo, não quer se ver cabisbaixo, com uma certa subserviência".
"O último presidente vivia atrás de ser convidado para uma reunião do G8 (países mais ricos o mundo) e nunca foi", provoca Amorim. "Lula foi convidado três vezes, sem pedir".
A figura pública do presidente Lula é uma das chaves da interlocução com líderes como o presidentes George W. Bush, dos Estados Unidos, e Jaques Chirac, da França. "Fica bem na foto sair com o Lula, porque mesmo os líderes mais à direita têm consciência de que existe um mal estar com a globalização selvagem", avalia Amorim.
"Lula oferece resposta firmemente ancorada na reforma social e nos preceitos democráticos e não apenas na aparência", prossegue. "Ele é um homem da classe operária, do terceiro mundo e um produto genuíno da democracia no Brasil".
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