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sábado, 9 de maio de 2020

O "Jair" que há em nós - Ivann Lago

Recebido de um amigo. Confesso que não conheço o autor e nunca li, nada dele, mas tendo a concordar com vários, se não a maioria, dos seus argumentos.
O capitão expressa o que há de pior no "brasileiro médio", que são seus instintos primitivos que afloram quando ele se sente acuado, e isso é o tempo todo. O capitão apenas aconteceu de recolher os piores instintos que estão um pouco em toda a parte.
Os bons instintos, que também existem na sociedade, passam longe de sua personalidade desequilibrada e perversa.
Quando é que a maioria dos brasileiros vão perceber isso.
Mas, pelo que vejo, todos aqueles que saem à ruas para cultuar a morte e fazer carreata em apoio a capitão primitivo, exibem os mesmos traços de caráter.
Basta ler esta crônica.
Ela é subjetiva? Provavelmente, mas não menos verdadeira...
Paulo Roberto de Almeida

“O Jair que há em nós”
Ivann Lago
Link: https://unidadenadiversidade.com.br/o-jair-que-ha-em-nos/
4.05.2020

O Brasil levará décadas para compreender o que aconteceu naquele nebuloso ano de 2018, quando seus eleitores escolheram, para presidir o país, Jair Bolsonaro.

Capitão do Exército expulso da corporação por organização de ato terrorista; deputado de sete mandatos conhecido não pelos dois projetos de lei que conseguiu aprovar em 28 anos, mas pelas maquinações do submundo que incluem denúncias de “rachadinha”, contratação de parentes e envolvimento com milícias; ganhador do troféu de campeão nacional da escatologia, da falta de educação e das ofensas de todos os matizes de preconceito que se pode listar.

Embora seu discurso seja de negação da “velha política”, Bolsonaro, na verdade, representa não sua negação, mas o que há de pior nela.

Ele é a materialização do lado mais nefasto, mais autoritário e mais inescrupuloso do sistema político brasileiro.

Mas – e esse é o ponto que quero discutir hoje – ele está longe de ser algo surgido do nada ou brotado do chão pisoteado pela negação da política, alimentada nos anos que antecederam as eleições.

Pelo contrário, como pesquisador das relações entre cultura e comportamento político, estou cada vez mais convencido de que Bolsonaro é uma expressão bastante fiel do brasileiro médio, um retrato do modo de pensar o mundo, a sociedade e a política que caracteriza o típico cidadão do nosso país.

Quando me refiro ao “brasileiro médio”, obviamente não estou tratando da imagem romantizada pela mídia e pelo imaginário popular, do brasileiro receptivo, criativo, solidário, divertido e “malandro”.

Refiro-me à sua versão mais obscura e, infelizmente, mais realista segundo o que minhas pesquisas e minha experiência têm demonstrado.

No “mundo real” o brasileiro é preconceituoso, violento, analfabeto (nas letras, na política, na ciência… em quase tudo).

É racista, machista, autoritário, interesseiro, moralista, cínico, fofoqueiro, desonesto.

Os avanços civilizatórios que o mundo viveu, especialmente a partir da segunda metade do século XX, inevitavelmente chegaram ao país.

Se materializaram em legislações, em políticas públicas (de inclusão, de combate ao racismo e ao machismo, de criminalização do preconceito), em diretrizes educacionais para escolas e universidades.

Mas, quando se trata de valores arraigados, é preciso muito mais para mudar padrões culturais de comportamento.

O machismo foi tornado crime, o que lhe reduz as manifestações públicas e abertas.

Mas ele sobrevive no imaginário da população, no cotidiano da vida privada, nas relações afetivas e nos ambientes de trabalho, nas redes sociais, nos grupos de whatsapp, nas piadas diárias, nos comentários entre os amigos “de confiança”, nos pequenos grupos onde há certa garantia de que ninguém irá denunciá-lo.

O mesmo ocorre com o racismo, com o preconceito em relação aos pobres, aos nordestinos, aos homossexuais.

Proibido de se manifestar, ele sobrevive internalizado, reprimido não por convicção decorrente de mudança cultural, mas por medo do flagrante que pode levar a punição.

É por isso que o politicamente correto, por aqui, nunca foi expressão de conscientização, mas algo mal visto por “tolher a naturalidade do cotidiano”.

Se houve avanços – e eles são, sim, reais – nas relações de gênero, na inclusão de negros e homossexuais, foi menos por superação cultural do preconceito do que pela pressão exercida pelos instrumentos jurídicos e policiais.

Mas, como sempre ocorre quando um sentimento humano é reprimido, ele é armazenado de algum modo.

Ele se acumula, infla e, um dia, encontrará um modo de extravasar.

Como aquele desejo do menino piromaníaco que era obcecado pelo fogo e pela ideia de queimar tudo a sua volta, reprimido pelo controle dos pais e da sociedade.

Reprimido por anos, um dia ele se manifesta num projeto profissional que faz do homem adulto um bombeiro, permitindo-lhe estar perto do fogo de uma forma socialmente aceitável.

Foi algo parecido que aconteceu com o “brasileiro médio”, com todos os seus preconceitos reprimidos e, a duras penas, escondidos, que viu em um candidato a Presidência da República essa possibilidade de extravasamento.

Eis que ele tinha a possibilidade de escolher, como seu representante e líder máximo do país, alguém que podia ser e dizer tudo o que ele também pensa, mas que não pode expressar por ser um “cidadão comum”.

Agora esse “cidadão comum” tem voz.

Ele de fato se sente representado pelo Presidente que ofende as mulheres, os homossexuais, os índios, os nordestinos.

Ele tem a sensação de estar pessoalmente no poder quando vê o líder máximo da nação usar palavreado vulgar, frases mal formuladas, palavrões e ofensas para atacar quem pensa diferente.

Ele se sente importante quando seu “mito” enaltece a ignorância, a falta de conhecimento, o senso comum e a violência verbal para difamar os cientistas, os professores, os artistas, os intelectuais, pois eles representam uma forma de ver o mundo que sua própria ignorância não permite compreender.

Esse cidadão se vê empoderado quando as lideranças políticas que ele elegeu negam os problemas ambientais, pois eles são anunciados por cientistas que ele próprio vê como inúteis e contrários às suas crenças religiosas.

Sente um prazer profundo quando seu governante maior faz acusações moralistas contra desafetos, e quando prega a morte de “bandidos” e a destruição de todos os opositores.

Ao assistir o show de horrores diário produzido pelo “mito”, esse cidadão não é tocado pela aversão, pela vergonha alheia ou pela rejeição do que vê.

Ao contrário, ele sente aflorar em si mesmo o Jair que vive dentro de cada um, que fala exatamente aquilo que ele próprio gostaria de dizer, que extravasa sua versão reprimida e escondida no submundo do seu eu mais profundo e mais verdadeiro.

O “brasileiro médio” não entende patavinas do sistema democrático e de como ele funciona, da independência e autonomia entre os poderes, da necessidade de isonomia do judiciário, da importância dos partidos políticos e do debate de ideias e projetos que é responsabilidade do Congresso Nacional.

É essa ignorância política que lhe faz ter orgasmos quando o Presidente incentiva ataques ao Parlamento e ao STF, instâncias vistas pelo “cidadão comum” como lentas, burocráticas, corrompidas e desnecessárias.

Destruí-las, portanto, em sua visão, não é ameaçar todo o sistema democrático, mas condição necessária para fazê-lo funcionar.

Esse brasileiro não vai pra rua para defender um governante lunático e medíocre; ele vai gritar para que sua própria mediocridade seja reconhecida e valorizada, e para sentir-se acolhido por outros lunáticos e medíocres que formam um exército de fantoches cuja força dá sustentação ao governo que o representa.

O “brasileiro médio” gosta de hierarquia, ama a autoridade e a família patriarcal, condena a homossexualidade, vê mulheres, negros e índios como inferiores e menos capazes, tem nojo de pobre, embora seja incapaz de perceber que é tão pobre quanto os que condena.

Vê a pobreza e o desemprego dos outros como falta de fibra moral, mas percebe a própria miséria e falta de dinheiro como culpa dos outros e falta de oportunidade.

Exige do governo benefícios de toda ordem que a lei lhe assegura, mas acha absurdo quando outros, principalmente mais pobres, têm o mesmo benefício.

Poucas vezes na nossa história o povo brasileiro esteve tão bem representado por seus governantes.

Por isso não basta perguntar como é possível que um Presidente da República consiga ser tão indigno do cargo e ainda assim manter o apoio incondicional de um terço da população.

A questão a ser respondida é como milhões de brasileiros mantêm vivos padrões tão altos de mediocridade, intolerância, preconceito e falta de senso crítico ao ponto de sentirem-se representados por tal governo.

Texto da autoria do Professor e Doutor em Sociologia & Política, Ivann Lago

domingo, 26 de abril de 2020

O macabro presidente - Editorial Estadão

Sob o signo de Tânatos
Jornal  O ESTADO DE S.PAULO
Editorial, Sábado, 25 de Abril 2020

governo de Jair Bolsonaro é conduzido sob o signo de Tânatos, o deus da morte na mitologia grega. Dedica-se desde sempre à destruição – primeiro, dos inimigos, reais e imaginários; depois, dos próprios aliados, inclusive ministros que lhe devotavam lealdade; e, afinal, a si mesmo, inviabilizando-se como presidente. É preciso interromper essa escalada antes que Bolsonaro destrua, por fim, o próprio País.

A  trajetória da Presidência de Bolsonaro até aqui é impressionante. No início, constituiu um Ministério até razoável, capaz de fazer um bom trabalho em quase todas as áreas, e informou que estabeleceria uma nova forma de relação com o Congresso, sem o velho toma lá dá cá. Um ano e pouco depois, Bolsonaro fez de seu gabinete uma grande barafunda, em que ninguém se entende, e, no Congresso, depois de seguidas derrotas por se negar ao diálogo, resolveu entabular negociação com partidos e políticos envolvidos em escândalos de corrupção, oferecendo-lhes cargos em troca de votos.

  Pior: em meio a uma pandemia devastadora, com milhares de doentes e mortos e com o sistema hospitalar público à beira do colapso, Bolsonaro preferiu desdenhar das vítimas e se mostrar mais preocupado com sua popularidade do que com a vida de seus governados.

    Com esse espírito destruidor, trata como intocáveis ministros néscios que se dedicam dia e noite a encontrar comunistas embaixo da cama, enquanto inviabiliza o trabalho dos ministros e assessores que, ao contrário, prezam o cargo que ocupam e têm útil e valiosa colaboração a dar. Bolsonaro substituiu o ministro da Saúde porque este não aceitava desrespeitar as orientações da Organização Mundial da Saúde para enfrentar a pandemia de covid-19; desmoralizou sua equipe econômica ao resistir a fazer reformas e ao flertar com a irresponsabilidade fiscal; permitiu a fritura da ministra da Agricultura porque esta se queixou dos ataques bolsonaristas à China, principal cliente do agronegócio brasileiro; e agora tudo fez para provocar a saída do ministro da Justiça porque este se recusou a permitir que ele interferisse politicamente no comando da Polícia Federal (PF).

     Para perplexidade dos brasileiros, Sérgio Moro, ao anunciar sua demissão do Ministério da Justiça, informou que Bolsonaro lhe disse que “queria ter (na chefia da PF) uma pessoa do contato pessoal dele, que ele pudesse colher informações, relatórios de inteligência”. Para ilustrar a gravidade do caso, Sérgio Moro, com uma pitada de ironia, deu o seguinte exemplo: “Imagine se, durante a Lava Jato, o presidente (Lula), a presidente Dilma ficassem ligando para a superintendência (da PF) em Curitiba para colher informações sobre as operações em andamento”.

  Como resposta, o presidente, em pronunciamento espantosamente desconexo, fez várias acusações contra Sérgio Moro – inclusive a de que exigiu uma vaga no Supremo Tribunal Federal e a de que trabalha para vê-lo fora da Presidência – e também colocou em dúvida o trabalho da PF. Em sua glossolalia, contudo, foi incapaz de explicar a essência da denúncia de Moro, a de que tinha interesse em fazer da PF sua polícia particular.

     Trata-se de comportamento intolerável, que pode dar as condições para a abertura de um processo de impeachment contra Bolsonaro – a Procuradoria-Geral da República já pediu ao Supremo a abertura de investigação sobre a acusação de Sérgio Moro.

Não se pode aceitar como natural que o presidente queira manipular a Polícia Federal, especialmente considerando-se que há investigações em andamento que interessam ao clã Bolsonaro. Se comprovadas as denúncias, o presidente pode ser acusado de crimes de responsabilidade, prevaricação e advocacia administrativa, entre outros.

  As vozes responsáveis do País, inclusive de dentro do governo, têm a obrigação de manifestar seu total repúdio ao presidente Bolsonaro, deixando claro que os limites da lei e da decência há muito foram ultrapassados. “É hora de falar”, disse o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, resumindo a urgência. “O presidente está cavando sua fossa. Que renuncie antes de ser renunciado. Poupe-nos de, além do coronavírus, termos um longo processo de impeachment. Que assuma logo o vice para voltarmos ao foco: saúde e emprego. Menos instabilidade, mais ação pelo Brasil.”

segunda-feira, 20 de abril de 2020

Uma esfinge na Presidência - Miguel Lago (Piaui)


REvista PIAUÍ, EDIÇÃO 163 | ABRIL_2020

tempos da peste

UMA ESFINGE NA PRESIDÊNCIA

Bolsonaro precisa do impeachment para fazer sua revolução

MIGUEL LAGO

O saldo nas redes: a internet permite falar com um público muito mais diverso, entretanto também traz uma dificuldade extra – a fragilidade e a superficialidade do engajamento ILUSTRAÇÃO: REINALDO FIGUEIREDO_2020
Em um mito grego, um monstro chamado Esfinge aterroriza a cidade de Tebas com um enigma: “Que criatura pela manhã tem quatro pés, à tarde tem dois e à noite tem três?” Ao que adiciona: “Decifra-me ou devoro-te.” O mesmo faz Jair Messias Bolsonaro nos dias que correm: lança um enigma às instituições para ver se elas respondem. Se não o fizerem, serão devoradas.
Nas últimas semanas, o presidente fez acenos aos seus seguidores e os encorajou a participar das manifestações de 15 de março contra o Congresso e o Supremo Tribunal Federal. Ele próprio compareceu em uma delas e cumprimentou o público. Chegou a compartilhar um vídeo em que elogiava a iniciativa ao se dirigir a militares, policiais e empresários. Não fosse o coronavírus, teríamos visto um número muito maior de pessoas manifestando-se a favor do presidente e contra as instituições da República.
A atuação de Bolsonaro foi criticada pelo estamento político. O ministro Celso de Mello, do STF, declarou que o presidente não estava à altura do cargo; o governador de São Paulo, João Doria, criticou aquilo que chamou de “governo de ódio”. No dia da manifestação, Davi Alcolumbre, presidente do Senado, e Rodrigo Maia, presidente da Câmara, criticaram a atuação de Bolsonaro na saúde pública, uma vez que, ao participar dos protestos e saudar os manifestantes, o presidente da República desrespeitou os protocolos do próprio Ministério da Saúde para conter a epidemia de coronavírus.
Em entrevista à CNN Brasil, foi dado ao presidente um largo tempo de tevê para que esclarecesse sua atitude. Bolsonaro provocou Alcolumbre e Maia convidando-os a comparecerem nas manifestações também, dizendo que política se faz por intermédio do povo. Por fim, disse que as negociações políticas não poderiam ser feitas nos bastidores e sim publicamente, com a participação da população. O discurso da ligação direta entre o líder e o povo, que ignora a intermediação das instituições, é a definição mais clássica de populismo.
O fato de o presidente incitar subversão aos poderes instituídos pela Constituição faz parte de um movimento mais antigo, que remonta aos tempos de campanha, quando, repetidas vezes, ele desacreditou os procedimentos, os pesos e contrapesos da República. Esse movimento coloca as instituições diante de um enigma: como evitar que Bolsonaro destrua as instituições sem estimular, com isso, a adesão popular ao presidente?
Repreender exemplarmente Bolsonaro pode aumentar o ódio da parcela da população que o apoia. Deixá-lo falar abertamente contra as instituições democráticas pode levar descrédito a essas mesmas instituições. Mas o enigma de Bolsonaro subiu um degrau quando ele próprio, presidente do país, apoiou manifestações que pedem o fechamento do Congresso e do Supremo. É um ponto-limite que exige uma resposta firme do Congresso.
Do ponto de vista institucional, a resposta mais adequada talvez seja o impeachment, como sugeriu o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel – ex-aliado do presidente, eleito graças ao poderio cibernético do clã Bolsonaro. O Congresso instauraria um processo de impedimento como resposta para mostrar que as instituições não tolerarão qualquer discurso e ação golpista por parte do Executivo.
Tal medida configuraria uma decisão acertada, que reafirmaria o equilíbrio de poderes: impedir que um eleito de perfil totalitário se torne um totalitário de fato. A medida transmitiria em alto e bom som ao país a mensagem de que as instituições de controle são mais fortes do que os arroubos ditatoriais do Executivo, e por conseguinte as instituições sairiam mais fortalecidas. Existe, inclusive, embasamento jurídico para fundamentar o pedido, segundo juristas. No entanto, do ponto de vista político, aos olhos dos simpatizantes do presidente, um pedido de impedimento confirmaria a tese de que o Congresso e o STF querem inviabilizar o seu governo. Consequentemente, esses seguidores se voltariam contra as instituições em definitivo, abrindo ainda mais espaço para a radicalização.
Uma alternativa, que evitaria a radicalização do movimento anti-Congresso e anti-STF, seria criticar publicamente essas posturas, sem tomar qualquer medida concreta contra as ações do presidente – caminho que, aparentemente, os líderes do Congresso decidiram seguir. Dessa maneira, a bandeira principal do séquito bolsonarista não encontraria fundamentação, e o discurso que teima na tese da perseguição ao presidente seria esvaziado. Entretanto, essa medida coloca as instituições numa postura passiva, contribuindo para a normalização do discurso antidemocrático.
O enigma, portanto, não pode ser esclarecido recorrendo às ferramentas clássicas da ciência política. É melhor analisá-lo à luz do ativismo digital.

Ahistória política dirá se Bolsonaro prepara um golpe de Estado, um autogolpe, para ser mais preciso. Como qualquer líder populista, ele cria uma conexão direta com a população, visando colocá-la contra o Congresso, enquanto busca o apoio das Forças Armadas para fechá-lo. O presidente peruano Alberto Fujimori, populista eleito como outsider da política, deu um autogolpe em 1992 e fechou o Congresso.
Mas não acho que Bolsonaro busque um autogolpe, que é um estratagema daqueles que falharam em criar um movimento verdadeiramente popular e precisam recorrer a uma força desproporcionalmente maior que a do regime vigente. Militares dão golpes, pois são politicamente medíocres. Empresários dão golpes, pois também são politicamente medíocres. O udenismo (corrente política relacionada à União Democrática Nacional, legenda de direita que existiu de 1945 a 1965) precisou de golpes para sobreviver, pois sempre foi incapaz de conquistar a maioria da população.
A ciência política nos mostrará, no entanto, que basta olhar o mundo atual para verificar que golpes de Estado não são mais dispositivos úteis para subverter as democracias liberais. No livro Como as Democracias Morrem, os professores Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, da Universidade Harvard, traçam paralelos entre as táticas hoje utilizadas por lideranças iliberais em diferentes partes do mundo. Nas Filipinas, o presidente Rodrigo Duterte persegue jornalistas e prende adversários políticos. Na Índia, o premiê Narendra Modi, oriundo do grupo nacionalista hindu responsável pelo assassinato de Mahatma Gandhi, aproveitou sua reeleição para estimular expurgos e limitar os direitos da minoria muçulmana (que é do tamanho da população brasileira). Na Turquia, o presidente Recep Erdoğan censura acadêmicos que ousam falar do genocídio da população armênia realizado pelo governo otomano na segunda década do século XX. Na Venezuela, Nicolás Maduro mantém seus adversários políticos na prisão. Nos Estados Unidos, Donald Trump avança sobre as regras do bom convívio democrático. No Reino Unido, o premiê Boris Johnson desafia a convenção política, colocando em risco a credibilidade da monarquia. Casos semelhantes ocorrem em El Salvador, Egito, Hungria, Polônia e, é claro, no Brasil. Nenhum desses governantes precisou recorrer ao golpismo militar, bastando a eles ir erodindo pouco a pouco as instituições, com método, rito e calma.
O liberalismo está morrendo em todas as partes, e no Brasil não é diferente. Bolsonaro se diferencia, porém, dos outros líderes iliberais por ter se recusado a estabelecer uma aliança sólida com o estamento político, ainda que esse fosse o desejo mais íntimo desse estamento. Se tivesse comprado o apoio de parte das pessoas que ocupam posições estratégicas, por meio da distribuição de cargos, de emendas ou de doações eleitorais, teria certamente conseguido acelerar de maneira mais eficiente a erosão democrática. Bolsonaro fez isso apenas com o Exército agraciando centenas de militares com cargos comissionados e outros privilégios. O caminho da cooptação do estamento político foi seguido pelas principais lideranças radicais no mundo, menos pela nossa. Há quem atribua falta de capacidade de negociação a Bolsonaro, mas eu concluo que se trata de uma estratégia extremamente calculada da parte dele.
Bolsonaro não quer que a democracia morra como aspiram outros líderes, em diferentes países. Ele apenas busca outro formato de democracia. Bolsonaro não precisa dar um golpe porque pode fazer uma revolução autoritária. A primeira revolução verdadeira da história do Brasil. Muito mais profunda do que a ocorrida em 1930, quando, apesar da bagunça, no fundo tudo se resumia a uma disputa entre elites estaduais. Muito mais verdadeira que o golpe de 1964, em que as Forças Armadas apenas cumpriram o papel daquilo que é esperado de quase todos os Exércitos que, como o brasileiro, não lutam guerras: derrubar regimes democráticos e populares. Trata-se de uma revolução de fato, e não apenas da transformação de um regime democrático em regime autoritário, como ocorre nos países acima citados.

Opresidente está conectado, mas difere de outros arquétipos de políticos autoritários. Em um texto que publiquei no site da piauí (“Bolsonaro traz o futuro prometido”) pouco antes do segundo turno da eleição de 2018 e quando já se apontava a dominância eleitoral de Bolsonaro, escrevi o seguinte: “O marco zero do futuro será o dia 28 de outubro de 2018. Um futuro que se desenha também para outras nações, mas do qual os pioneiros somos nós. O Brasil é a vanguarda de um novo modo de fazer política, da concretização de um novo programa de verdade que encerra o ciclo histórico do Iluminismo. A destruição do liberalismo global começa aqui.”
O filósofo Luciano Floridi, da Universidade de Oxford, defende a tese de que sociedades hiperconectadas vivem a transição da história para a hiper-história, uma nova era da humanidade em que as categorias de pensamento e de exercício da política são refundadas à luz das novas tecnologias. De acordo com o pensador, nessa nova era não há mais distinção entre o real e o virtual, entre o offline e o online, e as pessoas já não confiam tanto nas instituições, mas confiam nos perfis das redes sociais. Seguindo essa lógica, afirmei no texto de 2018 que Bolsonaro seria o primeiro chefe de Estado da hiper-história, em todo o mundo.
A ciência política institucional foi incapaz de prever o fenômeno Bolsonaro porque ele não se enquadra em nenhuma evidência que consta da literatura acadêmica, mas acredito que as ferramentas do ativismo digital são úteis para compreender o fenômeno. Sua vitória eleitoral se deu exclusivamente graças às redes sociais, contradizendo os cinco pontos determinantes para o sucesso eleitoral usualmente apontados pelos politólogos. Até 2018, a empiria demonstrava que, para um candidato sair vencedor, precisaria ter uma boa performance durante seu tempo de televisão, firmar-se na memória dos eleitores, saber lidar com a estrutura partidária, construir alianças regionais e obter uma boa estrutura de financiamento da campanha. E de preferência conseguir sair-se bem em todos esses itens.
Bolsonaro tinha muito menos dinheiro, menos tempo de televisão e uma estrutura partidária praticamente nula se comparada à da maioria dos candidatos. Tampouco dispunha de um histórico de gestão memorável que pudesse impulsionar os votos. Dentre os líderes iliberais do mundo, tanto Erdoğan quanto Modi haviam feito gestões de sucesso em governos locais antes de serem eleitos para o Executivo nacional. O húngaro Viktor Orbán tinha uma estrutura partidária formada há décadas e com larga participação em governos locais e no Parlamento. Duterte contava com o apoio de uma ampla coalizão, que incluía até partidos de esquerda.
Donald Trump ao menos tinha financiamento, exposição e alianças durante as prévias do Partido Republicano e fez uso extensivo das redes sociais para vencê-las. Mas a imagem de Trump como empresário bem-sucedido foi construída pela televisão, sendo ele portanto muito mais um depositário da videocracia do que da era digital. Uma vez escolhido nas prévias, Trump foi abraçado pelos republicanos e teve à sua disposição toda a máquina do partido nas eleições gerais de 2016.
Bolsonaro é o primeiro líder a governar exclusivamente por meio das redes sociais. Sua postura beligerante não tem similar, mesmo entre outros líderes iliberais, que acabaram por estabelecer alianças com o estamento político para ir corroendo a democracia por dentro. Se o Partido Republicano ofereceu resistência a Trump durante a campanha de 2016, isso deixou de ocorrer depois que ele assumiu a Presidência. Apesar das barbaridades cometidas por ele, apenas os senadores Mitt Romney e John McCain, este já falecido, foram capazes de enfrentá-lo. O mesmo se pode dizer do estamento político em países como a Turquia e a Hungria.
Ao contrário desses exemplos externos, Bolsonaro não fez essa aliança. E isso ocorreu não por resistência do Congresso ou dos partidos políticos, mas por decisão deliberada dele próprio. O presidente não apenas nunca teve um partido e uma base legislativa sólidos, como atualmente nem sequer está filiado a um partido. Como se elegeu graças ao fenômeno digital, é neste que ele constrói seu modo de governar. Se for bem-sucedido, o Brasil definitivamente será o primeiro país a ter sua vida política determinada pelos parâmetros da hiper-história.

Bolsonaro provou haver uma nova forma de ser eleito, e agora tateia na busca de uma nova forma de governabilidade própria à era digital. Sua estratégia – típica do ativismo – é tentar converter o apoio que tem nas redes online em mobilização offline e constante. Existem três grandes desafios para quem pratica o ativismo em tempos de mídias sociais: primeiro, a formação de uma base de apoio que chamaremos de constituency; segundo, de canal; e terceiro, de continuidade e profundidade do engajamento.
No tempo da tevê e da comunicação de massa, o importante era falar para o maior número de pessoas, seguindo a lógica do broadcasting – de um para muitos. As redes sociais funcionam a partir da lógica do multicasting – de muitos para um. Ou seja, o que importa é conseguir falar com constituencies específicas. É complexo chegar nelas, pois as redes sociais replicam a atomização da sociedade em uma plataforma. Cada pessoa é um perfil que se relaciona a distância e transacionalmente com outro perfil – um e outro refletindo os seus gostos particulares, sua personalidade e sobretudo sua opinião. A arquitetura de redes sociais está desenhada de tal modo que elas estimulam a hiperindividualização: por um lado, o perfil (a pessoa) é estimulado a revelar constantemente suas preferências, por outro tende a apenas se comunicar com aqueles que pensam de forma parecida com ele – fenômeno chamado pelo empresário e ativista Eli Pariser de filter bubble (bolha de filtro).
Do ponto de vista do ativista que quer formar um movimento, as redes sociais são difíceis de penetrar. Mas existem duas estratégias para romper a filter bubble e alinhar audiências diferentes. A primeira é conquistar seguidores a partir de suas opiniões. Sabe-se que algumas plataformas de redes sociais privilegiam o conteúdo que gera mais interação logo depois de sua postagem. Isso favorece postagens que chamem muito a atenção, entre outros motivos por serem sensacionalistas ou contrariarem o “senso comum” e o “politicamente correto”. Quanto mais absurdo o conteúdo da mensagem, mais interações ela gera. Quanto mais interações, maior o seu alcance. Quanto mais numerosa a audiência, maior a capacidade de reunir seguidores.
A segunda estratégia é fidelizar esses seguidores, criando proximidade com ele. A partir do momento em que obtém muitos seguidores, o perfil se torna um influencer, isto é, um perfil seguido por muitos perfis. Manter esses seguidores ativos e sempre em interação é fundamental. De modo que o melhor a fazer é compartilhar tudo que se pode, o tempo todo, trazendo o seguidor para mais perto, quase como se ele assistisse a um reality show do qual o influencer é a estrela, capaz de dar opiniões instantâneas sobre tudo que está sendo debatido, de compartilhar momentos íntimos de sua vida e aproximar os seguidores cada vez mais de seu dia a dia.
Bolsonaro se constituiu como um brilhante influencer, e foi assim que se elegeu. Para fidelizar o público e mantê-lo constantemente engajado foi necessário criar uma trajetória de herói que as pessoas pudessem acompanhar: com adversários, obstáculos, provações e grandes emoções. Mas não basta ser apenas um influencer extraordinariamente ativo: o segredo é fundir diversas filter bubbles em uma só, cujo único denominador comum é o influencer. Assim, este se transforma em canal de comunicação e principal fonte de informação. É como se fosse um mundo paralelo, um simulacro de realidade, em torno do qual giram uma miríade de blogs, perfis e influencers. Durante as eleições, Bolsonaro se constituiu como um canal assim e soube habilmente fundir bolhas diferentes: dos neoudenistas da luta contra a corrupção aos neopentecostais e aos fascistas.
Desde sua eleição, Bolsonaro tem como meta se constituir como canal dominante de uma parcela importante da população. Cada ato seu na Presidência é pensado como um modo de consolidar e expandir uma gigantesca filter bubble que dele dependa. Para isso foi necessário abrir uma guerra contra a imprensa e contra as instituições, transformando qualquer crítica ou denúncia de corrupção a ele dirigida em mensagem inválida para seu público. O objetivo da Presidência com suas “pautas-bomba” não é aprová-las, mas apenas gerar discórdia.
Todas seguem sempre o mesmo fio lógico: quanto mais propostas absurdas são apresentadas, mais a imprensa e as demais instituições são obrigadas a criticar e tentar impedir os atos do presidente. Dessa maneira, a narrativa de Bolsonaro de que é perseguido pela mídia e as instituições se confirma o tempo todo para o público de seus canais na internet. Dentre todas as pautas-bomba, talvez a mais reveladora tenha sido a tentativa de nomear Eduardo Bolsonaro embaixador dos Estados Unidos. Não acredito, sinceramente, que Bolsonaro quisesse nomear o filho embaixador: queria apenas forçar uma enxurrada de críticas de seus previsíveis opositores. Fato é que nenhuma das “pautas-bomba” foi aprovada pelo Congresso, o que leva a nossa elite intelectual e a imprensa a elogiarem a resistência das instituições.

Alguns analistas políticos dizem que as instituições estão resistindo, dado que Bolsonaro não conseguiu emplacar nada além de parte da agenda econômica – e isso é verdade. Outros afirmam que as instituições não estão aumentando o custo do golpismo de Bolsonaro: as declarações do presidente e de seus ministros não costumam surtir nenhum efeito prático – e estes também têm razão. As instituições estão bloqueando as ações concretas, mas deixando passar declarações totalmente absurdas. Ou seja, exercem o contrapoder de um lado, e deixam de exercê-lo de outro.
O ano de 2019 foi marcado por esse estranho equilíbrio geral. Detrás das aparentes batalhas se justapuseram confortavelmente dois conceitos diferentes de comunicação e dois conceitos diferentes de poder. As instituições saíram ganhando nesse conflito, mas Bolsonaro também foi vencedor. O importante para Bolsonaro não é aprovar políticas públicas, apenas autorizar um horizonte aspiracional às suas bases políticas. Bolsonaro ganha apenas propondo. O Congresso ganha apenas impedindo que seja aprovado. Todos ganham.
No ativismo digital, trabalha-se com a noção de “curva de engajamento”: sabe-se que para manter as pessoas engajadas e a audiência atenta é necessário oferecer ações sempre mais profundas para seus seguidores. Se no início um seguidor curtiu os posts de Bolsonaro, ele rapidamente passou a assistir todos os vídeos de Bolsonaro, para em seguida se informar unicamente por meio de blogs bolsonaristas, e por fim ir às ruas no dia 15 de março defender o presidente. Essa foi a curva traçada por Bolsonaro: começar como influencer, que em seguida se torna canal dominante para, ao final, galvanizar esse canal em uma infraestrutura de mobilização constante. “Infraestrutura de mobilização” é aquilo que permite conformar maiorias políticas. Na revolução bolsonariana, as eleições não servem para conformar maiorias, apenas para legitimar institucionalmente a capacidade de organização e mobilização dessas infraestruturas armadas na internet. É por meio delas que pretendem viabilizar uma nova forma de governo que não passe pelas instituições, mas apenas pela vontade de minorias politicamente organizadas. Governar para aqueles que gritam mais alto.
As bases às quais Bolsonaro acena são sempre as compostas por pessoas em posição de poder: brancos, homens, heterossexuais e gente armada, como militares e policiais. O denominador comum desses grupos é o poder que exercem sobre a sociedade.
De um lado, Bolsonaro se aliou aos pequenos poderes; de outro, aos grandes, como o empresariado e o mercado financeiro. Ele teve a inteligência de entender que seria necessário deixar os grandes poderes agirem livremente, de modo que não impedissem a sua revolução. Apesar de nacionalista e intervencionista, Bolsonaro entregou as chaves da economia a esses grandes poderes como jamais nenhum governo liberal e conservador foi capaz de fazer. A aliança dos pequenos poderosos da sociedade com os grandes poderosos do capital, numa sólida formação de maioria política conectada e engajada 24 horas por dia, tornou-se um movimento impossível de ser detido.
A crise do coronavírus abriu uma possibilidade extraordinária para o presidente expandir a sua bolha para camadas mais populares. Consciente de que a única chance de o país não viver um colapso na saúde pública são as medidas de distanciamento social implementadas por governos locais, Bolsonaro faz uma aposta arriscada porém certeira: criticar essas medidas para tomar a frente da revolta popular que, na ausência de uma política assistencial para compensar as perdas de renda provocadas pelas medidas de contenção ao vírus, inevitavelmente emergirá. Bolsonaro joga com essa convulsão e, quando ela ocorrer, poderá dizer que ele sempre alertou para os perigos da “histeria” dos governadores e da imprensa, canalizando a onda de revolta em favor de sua figura. Os vilões que causaram a crise econômica serão as instituições e a imprensa que exageraram e agiram com paranoia.
O equilíbrio geral de 2019 não pode se sustentar em 2020, pois todo engajamento de rede social é superficial e efêmero. Se a internet permite falar com um público muito mais diverso, também traz uma dificuldade extra: a fragilidade e a superficialidade do engajamento. Como manter as pessoas engajadas ao longo do tempo? Para engajar seus seguidores de maneira concreta e profunda, Bolsonaro precisa subir mais um degrau.
Uma lição básica de todo ativismo digital é que, para converter uma audiência passiva em um movimento ativo, é necessário que exista um ponto de tomada de decisão real. Esse ponto imprime urgência e gera no público o que os ativistas chamam de “medo de perder”, isto é, o medo que as pessoas têm de ver uma situação se deteriorar, seja por uma perda de direito, de status ou ainda de poder. No ativismo, as pessoas se cansam quando são instadas a se mobilizar em cima de suposições e teorias conspiratórias. Para fazer o caldo entornar, é preciso uma ameaça concreta e urgente. Bolsonaro perderá tração sobre sua filter bubble se ficar repetindo o mesmo discurso em que se faz vítima da perseguição do Congresso, do STF e da mídia sem ter nenhuma fundamentação concreta. É necessário que um fato novo emerja e gere urgência nas bases do bolsonarismo.
A instauração de um processo de impeachment é o ponto de decisão urgente que Bolsonaro precisa para conseguir mobilizar de maneira profunda e constante a integralidade de seus apoiadores. Com isso, ele ganhará seis meses de intensa mobilização de suas bases, com engajamento cada vez mais profundo dos seguidores. Terá vilões perfeitos que estarão explicitamente engajados em derrubá-lo. Com o impeachment, Bolsonaro coloca as instituições contra a parede e põe em marcha a revolução.
Assim deve ser lido o pronunciamento de Bolsonaro da noite do dia 24 de março: como um apelo desesperado à instauração do processo de impeachment contra ele. A sua atuação na crise do coronavírus, contrariando as recomendações das autoridades sanitárias e científicas, segue o mesmo vetor estratégico das pautas-bomba, das suas declarações anti-democráticas, da convocação de manifestações contra as instituições. A cada nova polêmica, ele elege um novo adversário e o instiga a uma atuação mais enérgica. Se suas ameaças contra as instituições democráticas ou nosso patrimônio ambiental não foram motivos suficientes para o impedimento, Bolsonaro dobra a aposta agora e se apresenta como uma ameaça sanitária. Desse modo, obriga os adversários que ele mesmo escolhe – o Congresso, o Supremo, a imprensa, e agora também os governadores – a tomarem uma medida mais drástica contra a sua atuação.
O enigma colocado ao Congresso e ao Supremo Tribunal Federal é ingrato. Se estes promoverem o impedimento de Bolsonaro, fortalecerão o movimento revolucionário do presidente, levando o país ao caos geral. Se não instaurarem logo um processo de impeachment, terminarão por normalizar mais uma medida autoritária de Bolsonaro, deteriorando a credibilidade das instituições e pavimentando o solo para a construção orgânica da revolução. Não há outro desfecho possível do bolsonarismo que não a guerra. Se for derrotado em 2022, Bolsonaro não aceitará o resultado das urnas. Qualquer que seja a resposta dada pelas instituições, o presidente-esfinge as devorará.
O ano de 2020 parece um remake do 1938 europeu, com atores de qualidade inferior. A ambição colonial de Hitler e Mussolini na Europa já estava clara quando o primeiro-ministro inglês Neville Chamberlain concedeu à Alemanha nazista a anexação da Tchecoslováquia em troca da paz no continente. Naquele momento, o então parlamentar Winston Churchill fez uma afirmação que se confirmaria: “Entre a desonra e a guerra, eles [os ingleses] escolheram a desonra e terão a guerra.” Resta saber se Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre estão mais para Chamberlain ou Churchill.

Miguel Lago

MIGUEL LAGO

Cientista político, é cofundador da rede Meu Rio e diretor da ONG Nossas

sexta-feira, 27 de março de 2020

Psicopatologia de um narcisista masoquista - Reinaldo Azevedo

Fantasia narcísica: Bolsonaro implora pelo impeachment. Merece ser atendido... 

Reinaldo Azevedo
Colunista do UOL
26/03/2020 08h20
Freud em sua mesa de trabalho. Ele não teve como analisar Jair Bolsonaro, mas deixou uma vasta teoria para entender a alma profunda mesmo de alguém como o nosso presidente
Depois de muitos anos dedicado a seu objeto de estudo, Freud tentou responder: "Mas, afinal, o que querem as mulheres?" Leiam. Não é para iniciantes, hehehe.
Infelizmente, o sujeito da minha indagação é bem mais vulgar: "Mas, afinal, o que quer Bolsonaro?"
BOLSONARO QUER SER DESTRUÍDO
Já que evoquei Freud, teria de dar uma resposta que atine, deixem-me ver, a dois eixos distintos de saber, duas categorias. Começarei por aquela que pode intrigar muitos leitores. E não! Jamais desculpem Bolsonaro por aquilo que há em sua mente e que nem ele pode controlar. Todos temos esses escuros, não é? Quando buscamos desenvolver a empatia e ver o outro com um mínimo de generosidade, mesmo as variáveis que não são do nosso controle acabam, aos olhos alheios, amansadas por nossa bonomia.
Observação rápida para continuar: ocorre que Bolsonaro tem desprezo por isso a que chamamos genericamente "bondade". Ele não está nem aí. Se preciso, para justificar um equívoco, ele é capaz de especular sobre a morte de sua mãe, como fez em conversa com Ratinho. Quem põe a própria mãe no meio de um debate que tem natureza política, referindo-se a ela como eventual cadáver a provar uma tese, expressa um juízo sobre os idosos, lhes antevê um destino, mas também fala muito sobre si mesmo. "Ah, Reinaldo, todos vamos morrer um dia..." É verdade. Mas é preciso ter uma alma muito perturbada e um grave defeito no aparelho psíquico para não sentir compaixão.
Volto ao eixo. Mas o que quer Bolsonaro? Ele quer ser impichado. Sua fantasia narcísica é ser punido, é ser apeado do poder, porque só desse modo ele pode recuperar o território da vítima excluída do sistema, de onde ele tonitruava seus anacolutos incompreensíveis contra inimigos que nem reais chegavam a ser porque, de fato, ninguém lhe dava bola.
O mundo contra o qual se batia era muito maior do que ele poderia compreender. E quem tem um pouco de experiência social consegue perceber a sua absoluta inadequação ao cargo. Tomemos como exemplo dois de seus antecessores, em si antípodas em muitos aspectos, mas absolutamente iguais num quesito ao menos: FHC e Lula. Os dois se sentiam plenamente à vontade no poder. Quem olhasse para um e para outro no cargo via estampada no rosto a satisfação: "Mereci estar aqui".
Com história pessoal e formação tão distintas, a fantasia narcísica de ambos — e todos a temos, que fique claro — era o reconhecimento. E isso é bastante convencional e, parece-me, saudável. Críticos podem objetar que aquilo que pensavam de si mesmos não correspondia à realidade. O ponto não é esse. Para o tema de que trato aqui, importa que o sujeito se olhe no espelho e goste do que vê. Sobre o petista, até brinquei certa feita, no auge de seu poder, que Lula chegava até a sentir um pouco de inveja de... Lula
Sim, este analista amador, um rábula legítimo também da psicanálise, ousa dizer que Bolsonaro se detesta e deseja ardentemente ser punido porque ele não sabe fazer o discurso do vitorioso. Até porque aquele que vence precisa conviver com os derrotados porque é a existência destes que justifica a sua vitória. O presidente que temos, se pudesse, eliminaria seus inimigos porque eles provam todos os dias a sua inadequação ao cargo, a sua incompetência, a sua incapacidade de entender o que está à sua volta e, acima de tudo, a sua indisposição para aprender qualquer coisa.
Bolsonaro quer que o coloquem para fora porque, assim, terá fim a sua angústia. E ele não precisará mais ser testado em salões em que, claramente, sente-se deslocado, com os ombros duros, o sorriso (quando há) plastificado, o olhar perdido. Até o seu anticomunismo é tomado de empréstimo, uma vez que fica evidente que ele nem sabe direito do que está falando. Bolsonaro está implorando para que ponham um fim a seu sofrimento. Esse particularíssimo Narciso quer ser punido.
JÁ SE PERGUNTARAM POR QUÊ?
Vocês já se perguntaram por que Bolsonaro decidiu armar essa quizumba sobre a pandemia? Inexiste uma resposta racional. Sim, está cercado de extremistas de direita de quinta categoria, cuja ignorância foi lixada e envernizada por Olavo de Carvalho, sem, no entanto, esconder a madeira ordinária de que é feita. Eles lhe sopram teorias alopradas aos ouvidos que simplificam brutalmente o mundo -- e, com efeito, não é complexidade o que ele quer.
Isso revela bastante da política, mas nada da psique bolsonariana. E ele tem uma. Afinal, também há alguns sensatos à volta que lhe dizem: "Por aí, não; por aí, você quebra a cara e vai ser alvo da crítica até de alguns aliados".
Ah, meus caros! Mas é tudo o que ele quer! Quando Bolsonaro rompe com um aliado, é a tal fantasia narcísica se exercendo na sua potência quase máxima — ela só atingirá mesmo o auge com o impeachment. Aguardem: é grande a chance de o governador Ronaldo Caiado (DEM), de Goiás, entrar na fila de seus vitupérios. Do que ele acusou, aos berros, João Dória (PSDB), governador de São Paulo? Em síntese, de traição. É o seu prazer.
E Bolsonaro jamais vai se colocar como o corno político à moda Nelson Rodrigues, dizendo a um ex-aliado: "Perdoa-me por me traíres". Porque isso quebraria a tal fantasia narcísica. A culpa está sempre com os outros; a culpa está sempre com aqueles que fizeram um mundo muito mais nuançado e complexo do que ele pode alcançar; a culpa está sempre com aqueles que o levam a sentir-se inferiorizado apenas porque existem.
LÍDER NA CRISE
Poucos governantes tiveram a chance -- dramática, sim! -- que tem Bolsonaro de ser um líder na crise. Obviamente, ele reúne os elementos para que alguém se aposse do clichê "sangue, suor e lágrimas", posto que, por óbvio, culpado pelo coronavírus ele não é.
Foi presenteado com uma barafunda que tem implicações verdadeiramente planetárias, mais grave e mais ampla do que o estouro da bolha imobiliária de 2008, que colheu Lula do poder e ameaçou transformá-lo numa lenda. O petista arrumou uns culpados, sim, lembram-se? Os "louros de olhos azuis". Mas, naquela hora, falou a seus "morenos de olhos marrons" e, convenham, pode-se concordar com as medidas que adotou ou delas discordar, mas é fato que liderou o país.
FHC e Lula têm vocação para o gozo — o que é saudável. Bolsonaro, simbolicamente, prefere o martírio. Não chega ao gozo nem se concilia com o sono porque, intimamente, julga não merecer a distinção. E certamente as vozes íntimas que o atormentam lhe dizem que outros poderiam fazer aquele trabalho com muito mais competência e desenvoltura.
A sua absurda agressividade deriva da sua escandalosa insegurança. Daí que, diante de interlocutores que ele sabe que podem afrontá-lo com os fatos, escolhe a agressão, o vitupério, a grosseria.
Bolsonaro implora que o derrubem. E só assim a sua fantasia narcísica lhe dirá: "Viu? Você estava certo!"
Ah, sim: alguns leitores poderiam perguntar se ele sabe disso tudo. Não! Ele sente isso tudo, o que deve ser devastador.
E isso que escrevo me dá uma certeza: ele não vai mudar. Responderá sempre a uma crise com ainda mais crise.
Na dimensão em que trato aqui, Bolsonaro não precisa nem de conselheiro. Precisa de um analista. Como é certo que não irá procurar ajuda, parece-me que é caso de satisfazer, sim, a sua fantasia narcísica.
Ele merece um pouco de paz.
O Brasil também.

segunda-feira, 16 de março de 2020

Política brasileira: carta de Bebbiano ao capitão (fevereiro 2019)

CartaBebbianoBolsonaroDemissao

Um documento histórico, reproduzido no Antagonista:

Exclusivo: “Meu amado Capitão, só há uma forma de isso tudo acabar bem. O senhor precisa romper esse ciclo de ódio”, diz Bebianno em carta a Bolsonaro
Por Claudio Dantas
Brasil, 15/03/2020

Gustavo Bebianno escreveu uma carta para Jair Bolsonaro logo depois de ser demitido do governo. Ele enviou o texto a alguns amigos, para que o divulgassem caso lhe acontecesse algo.
Na mensagem, Bebianno não faz ‘revelações comprometedoras’ sobre o presidente. Trata-se de um desabafo contra as acusações de traição e uma leitura, como espírita que era, do que ele chama de relação de ódio construída por Bolsonaro com todos a sua volta – relação alimentada por Carlos.
“O senhor está obsediado. Obsediado pelo próprio filho. Carlos precisa de ajuda e só o senhor tem esse poder. Não estou falando com rancor. Meu sentimento não é de raiva, acredite. Não tenho uma só gota de raiva do Carlos (a que tive, já passou, graças a Deus), porque ele precisa de ajuda. Isso é visível aos olhos de TODOS.”
Na opinião de Bebianno, “por melhores que possam ser as circunstâncias, Carlos continua odiando e sofrendo”.
“Mesmo o senhor tendo alcançado o objetivo de ser eleito, ele permanece odiando. Ele aprendeu a ser assim e não sabe fazer de outra forma.”
“E o senhor tem alimentado essa situação. E isso só vai mudar quando o senhor RECONHECER A VERDADE.”
O ex-ministro, que morreu de um infarto fulminante na madrugada de sábado, encerra a missiva com palavras de “amor hétero”. Pede a Bolsonaro que “reconheça seus erros (para si próprio). Faça um profundo exame de consciência. Limpe o seu coração”.
“Recupere o Carlos pelo seu exemplo. Ele vai aprender. Ele é um bom garoto. Só precisa da sua ajuda. Fique com Deus e um beijo no seu coração (hétero). O senhor continuará a ser o meu Mito.”

Leia abaixo a íntegra da carta:

“E conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará“
João 8:32

Meu Capitão,
Ao longo de dois anos, ouvi essa frase sair da sua boca quase todos os dias, como que de forma automática.
Isso, além de outras coisas, fazia-me acreditar que o senhor era um homem justo, bom, leal e amigo. Acima de tudo, corajoso!
Dediquei dois anos da minha vida para defender uma causa apelidada de Mito. E eu acreditei nesse Mito com todas as minhas forças, com todo o meu coração.
O senhor SABE disso. Por mais que, agora, o senhor tente banalizar tudo o que fiz, para alívio da própria consciência, o senhor SABE que não chegaria até aqui sem o trabalho que fiz (trabalho que só deu certo porque fiz, acima de tudo, com AMOR — amor que intensamente desenvolvi por você. Amor hétero, como costumávamos brincar).
O senhor mesmo costumava verbalizar essa verdade para algumas pessoas do nosso convívio. Essas pessoas também sabem, também conhecem essa verdade. Mas o que importa, de fato, é que o senhor, homem Jair Bolsonaro, SABE: sempre estive ao seu lado, e do seu lado, durante toda essa jornada, sem importar o preço a ser pago.
Ainda que o senhor bata a cabeça, tome remédios, se encha de raivas criadas por fantasias exóticas e curiosas, o FATO, a VERDADE, continuará lá no fundo da SUA consciência, impressa na SUA alma.
Por isso, não vou tomar o seu tempo dissertando sobre as coisas que fiz, acreditando estar, principalmente, trabalhando para o bem do meu país.
Mas, Meu Capitão, o senhor precisa acordar e cair em si.
O senhor está obsediado. Obsediado pelo próprio filho. Carlos precisa de ajuda e só o senhor tem esse poder. Não estou falando com rancor. Meu sentimento não é de raiva, acredite. Não tenho uma só gota de raiva do Carlos (a que tive, já passou, graças a Deus), porque ele precisa de ajuda. Isso é visível aos olhos de TODOS.
Falando dessa forma direta, o senhor talvez não entenda. Por isso, tentarei lhe explicar um pouco mais esse meu sentimento.
Carlos vive em uma prisão mental e emocional. Ele sofre intensamente em função do próprio ódio. Ele cultiva esse ódio contra tudo e contra todos, principalmente contra as pessoas por quem o senhor demonstra AFETO. E o senhor também sabe dessa VERDADE. Ele é consumido pelo ódio 24 h por dia, independentemente do que esteja acontecendo no mundo real.
A despeito do que, de fato, esteja acontecendo no mundo real, por melhores que possam ser as circunstâncias, Carlos continua odiando e sofrendo. Mesmo o senhor tendo alcançado o objetivo de ser eleito, ele permanece odiando. Ele aprendeu a ser assim e não sabe fazer de outra forma. Não é por mal, ele não tem culpa, simplesmente não sabe fazer diferente.
E o senhor tem alimentado essa situação. E isso só vai mudar quando o senhor RECONHECER A VERDADE.
Para manter o vínculo afetivo com ele, para manter a conexão física e emocional, o senhor embarca nessas fantasias, nessas paranoias, nas eternas teorias de conspiração.
Carlos aprendeu a ser assim com o senhor. Foi o senhor que o ensinou, desde pequeno, a viver em confronto. Vide o que assumiu contra a própria mãe, ainda quando jovem. Essas experiências deixam marcas, Capitão. A mente humana é muito profunda e complicada. É bom estar preparado para confrontos. Viver em permanente estado de beligerância nubla a mente e a existência.
O seu erro tem sido fazer exatamente o contrário daquilo que prega. O seu pecado é, nesse caso, não RECONHECER A VERDADE. E, portanto, não se libertar (nem libertar o próprio filho, que é o que mais sofre).
Ao agir assim, o senhor se mantém preso, mantém o seu filho preso, e gera um rastro terrível de destruição à sua volta. O senhor destrói os seus principais amigos e aliados. O senhor se torna uma pessoa injusta com os outros. Além disso, alimenta e incentiva o comportamento viciado do filho, impedindo-o de se libertar do ódio.
Tenha certeza de que, daqui a pouco tempo, o problema envolverá outra pessoa, e depois outra, e depois mais outra, num rastro interminável de ódio e destruição. Leia a Bíblia e veja as consequências invariáveis decorrentes do ódio. O ódio é uma energia terrível e incontrolável que tudo destrói. O ódio abre o canal de sintonia com o que há de pior no mundo espiritual.
Acredite: sem saber, sem querer e sem perceber, Carlos se tornou um canal aberto para influências espirituais negativas. Ele se tornou obsediado. E, por consequência, obsedia o senhor. Isso é um círculo vicioso terrível! O mal opera por aí. Ao contrário do que muita gente pensa, o mal nem sempre age pelas mãos de Adelios. Na maioria das vezes, age de forma ardil e sub-reptícia, pela mente de pessoas próximas a nós, que nos amam e a quem também amamos. Acredite nisso, Capitão.
O mal opera utilizando as fraquezas de cada um (ou, como se diz no jargão religioso, pelo pecado). Se a pessoa tem a tendência de beber, será influenciada a beber. Se a pessoa tem a tendência a sentir ciúmes, será colocada em circunstâncias propícias a sentir ciúmes. Se a pessoa tem a tendência de odiar, essa será a ferramenta usada).
No seu caso, essa é a chave por meio da qual o mal opera. É por meio do seu próprio pecado. O senhor cultiva e alimenta teorias de conspiração, intrigas e ódio, e ensinou seus filhos a fazerem o mesmo. O melhor discípulo foi o Carlos, pois é o que tem maior conexão espiritual com você. O problema é que ele é muito forte, muito intenso, e o senhor perdeu o controle sobre o “pitbull”. Hoje, ele morde aleatoriamente as pessoas, sem que o senhor consiga segurá-lo. Pior do que isso, quando o senhor tenta segura-lo, ele se vira e morde o senhor mesmo.
E, com esse canal aberto, o mal segue operando. Os obsessores instigam vocês dois a desconfiarem das pessoas e sentirem o ódio. Vocês ficam cegos e sentem o ódio contra alguém injustamente — como no meu caso — e atacam. A vítima do ataque também passa a sentir ódio, pois foi atacada (no meu caso, fui atacado injustamente em público). Ao sentir ódio, eu também tenho vontade de atacar, de retribuir a agressão. E, assim, o círculo vicioso se amplia, num rastro sem fim de destruição, cumprindo a missão dos obsessores que pretendem manter o BRASIL no mesmo padrão moral inferior.
Portanto, meu amado Capitão, só há uma forma de isso tudo acabar bem, em benefício do nosso BRASIL.
O senhor precisa romper esse ciclo de ódio. Do fundo do seu coração, do fundo da sua alma, com toda a sua força. O senhor é um homem bom, justo, permita que isso venha à tona. Quebre os padrões negativos. Só o AMOR pode fazer isso. Só o amor tem o poder de salvar o Brasil e livra-lo das influências negativas que o prejudicam.
Peço perdão ao senhor pelos maus sentimentos que tive nos últimos dias.
O senhor pode ficar tranquilo. Vou embora em paz. Quero apenas que dê certo. Não posso crer que tudo o que foi feito tenha sido em vão.
Tenha a certeza que nunca o traí. Nunca fiz nada pelas costas. Nunca plantei nota desfavorável ao senhor ou a seus filhos, nunca vazei áudio. Não há complô algum. Talvez o senhor nunca enxergue isso. Mas minha consciência sabe. Isso é o que basta.
Minha missão chegou ao fim aqui. A sua, não. Reconheça seus erros (para si próprio). Faça um profundo exame de consciência. Limpe o seu coração. Recupere o Carlos pelo seu exemplo. Ele vai aprender. Ele é um bom garoto. Só precisa da sua ajuda.
Fique com Deus e um beijo no seu coração (hétero).
O senhor continuará a ser o meu Mito.”