Tudo é suposto, de acordo com os novos tempos de ultracuidados, politicamente corretos (ou temerosos) com supostas acusações sobre supostas ações de supostos diplomatas, nesta postagem que não é suposta apenas porque as coisas estão ditas como são, sem subterfúgios...
Paulo Roberto de Almeida
Documentos supostamente vazados do Itamaraty tratam de assuntos militares
Gabriela Valente e Eliane Oliveira
Globo.com, 3/06/2014
E-mails, circulares e relatórios abordam desde preocupação sobre Coreia do Norte, negociações com a Rússia até acordo com Israel
Brasília - Documentos internos do Ministério das Relações Exteriores hackeados na semana passada pelo grupo cyberativista Anonimous mostram supostos telegramas, circulares, e-mails e relatórios sobre diversos assuntos, como a preocupação crescente com a Coreia do Norte, a negociações de artefatos militares com Rússia e até a costura de um acordo com Israel. Em um dele, o Itamaraty já orienta a reclassificação dos documentos secretos por causa do início do debate sobre o que seria a Lei de Acesso à Informação.
Em outros, trata da diferença do tratamento que o Brasil dá aos militares no exterior. Ao contrário dos diplomatas, esses servidores não teriam dinheiro nem para comprar remédios. O governo brasileiro não confirma a autenticidade desses comunicados. E argumenta que o teor deles pode ter sido modificado pelos hackers.
Num dos documentos, o governo brasileiro alerta para o perigo dos testes militares na Coreia do Norte. Diz que o país tem se aproximado do arsenal que julga necessitar para induzir os Estados Unidos a mudar sua "política hostil". Um teste feito em fevereiro do ano passado representa importante etapa nesse processo.
“O último teste também revelou aumento na capacidade destrutiva dos artefatos norte-coreanos: enquanto o teste de 2006 liberou 1 kiloton de energia explosiva, o de 2013 teria liberado de 6 a 7 kilotons. Discute-se, ainda, se último teste teria utilizado urânio altamente enriquecido, ao invés do plutônio empregado nos testes anteriores”.
Já um documento urgentíssimo de março de 2008 revela que o Brasil estudava um acordo sobre trocas de informações sigilosas com Israel. O telegrama enviado para a embaixada de Tel Aviv diz que o entendimento era costurado pelo Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República e o ministro de Segurança de Israel, General Avraham Dicter, em visita ao Brasil.
Na agenda do israelense, havia encontros com o então vice-governador do Rio, Luiz Fernando Pezão e o secretário de Segurança Pública Mariano Beltrame entre outras autoridades. Entre elas, o ministro da Justiça e os diretores da Polícia Federal e da Abin.
Num outro relatório, está a discussão sobre a penúria dos militares brasileiros que vivem no exterior. Em maio de 2009, o ministro da Defesa convocou para reunião o Conselheiro Militar na Missão Permanente do Brasil junto às Nações Unidas. A preocupação era a situação dos militares que moravam em Nova York.
Eles não recebiam auxílio-moradia, moravam em áreas distantes do trabalho e não tinham plano de saúde. A Defesa até bancava o reembolso das despesas, mas os militares alegavam que não tinham dinheiro para pagar e aguardar o ressarcimento.
Ainda no campo militar, um relatório “altamente confidencial” detalha temas para negociação com a Rússia em 2008. O Brasil queria estreitar laços e desenvolver conjuntamente novas tecnologias.
“Estamos determinados a aumentar a nossa capacidade de lançar e manter os satélites no espaço, e a partir deles para monitorar a superfície da terra e da água . Trabalhar com um país estrangeiro amigável pode acelerar nosso progresso nesta área crucial”, diz o texto. “Gostaríamos de explorar iniciativas binacionais que abordam formas inovadoras de combinar ação governamental e da iniciativa privada na adaptação e transferência dessas tecnologias”
Os papéis não tratam apenas de temas militares. Muito antes da aprovação da lei de acesso à informação, o Itamaraty já alertou a todas suas embaixadas que mudaria a classificação da sua comunicação. Numa minuta de comunicado, já explicava que “adotar-se-á para os documentos ultrassecretos a mesma sistemática até então aplicada aos expedientes secretos-exclusivos”.
Explicava o texto que a classificação mudaria de secreto-exclusivo e secreto para ultrassecreto. O que era confidencial passaria a ser secreto ou confidencial. Já os documentos reservados continuariam assim. O Itamaraty ainda avisou quais papéis deveriam ser reclassificados. Ainda no governo Fernando Henrique Cardoso, vários documentos receberam uma segurança maior, como as negociações sobre ações por causa das mudanças climáticas, inclusive, a gestão chinesa sobre o assunto. Outros que tiveram sua classificação alterada foram sobre a colaboração da Ucrânia na área espacial e de negociações com a Argentina na área de biotecnologia.
Há ainda documentos hackeados ainda tratam sobre tráfico internacional de pessoas. Em 2010, um funcionário do consulado brasileiro em Madri pediu instruções ao Itamaraty porque recebeu informações sigilosas de diligências para desbaratar quadrilha de exploração sexual feminina na Galícia. Várias vítimas eram de nacionalidade brasileira. A preocupação era que várias dessas mulheres não queriam que a situação fosse revelada às famílias no Brasil.
“Ressalvando que só poderá facilitar dados pessoais das mesmas caso haja seu consentimento explícito - pois muitas temem ter sua situação revelada à família no Brasil -, pergunta se o Consulado pode prestar assistência às mesmas de natureza jurídica, social, econômica e psicológica”, diz a correspondência.
RETIRADA DE BRASILEIROS DA LÍBIA FOI TRATADA PELO MRE
As negociações para a operação de retirada de brasileiros da Líbia durante os confrontos da chamada Primavera Árabe em 2011 também foram abordadas pelo Itamaraty, segundo os documentos vazados, mas o órgão não confirma a autenticidade dos relatos.
Num telegrama secreto e urgentíssimo do Itamaraty para a embaixada brasileira em Trípoli, o Ministério das Relações Exteriores revelou que pediu ajuda ao embaixador da Líbia em Brasília, Salem Omar Abdullah Al Zubaidi, para a evacuação de cidadãos brasileiros retidos em Bengazi. Eram funcionários da construtora Queiroz Galvão.
O líbio foi informado que a empresa já teria contatado uma aeronave, que aguardava em Trípoli, à espera de autorização para ir a Bengazi resgatar os trabalhadores. O voo deveria seguir para Roma ou para Malta e não mais de volta para Trípoli, como originalmente previsto por causa do acirramento da situação política de lá.
O Brasil pediu que o embaixador líbio intercedesse para a autorização do voo. E também pela liberação do avião militar português, que também aguardava licença para resgatar nacionais portugueses ligados a mesma empresa.
“Mostrou-se, contudo, cético quanto à possibilidade de que fosse concedida autorização de pouso, pois não haveria, no momento, condições de garantir a segurança de aterragens em Bengazi”, diz o telegrama. “Segundo ele, a situação de instabilidade naquela cidade fora agravada pelo fato de que os opositores do regime teriam invadido instalações militares e policiais e se apossado de armas das forças de segurança”.
Com isso, o embaixador confirmava ao Brasil que o governo central líbio tinha perdido o controle sobre Bengazi, mesmo antes da informação oficial do país.
O embaixador sugeriu ainda que a retirada dos brasileiros se faria mais facilmente por terra. Argumentou que a fronteira egípcia estaria a cerca de 350 km de Bengazi. Segundo ele, isso representaria uma viagem de cinco ou seis horas. “Externou sua opinião de que não interessaria aos sublevados agredir ou atingir estrangeiros”, relata o telegrama.
O Itamaraty solicitou à embaixada na Líbia que traçasse rotas alternativas para evacuação dos brasileiros de Bengazi. Num outro telegrama, Malta disse que não poderia ajudar na operação.
Num outro documento hackeado, o Itamaraty tece comentários sobre a situação no Iraque. Diz que o país obteve progressos importantes em áreas tais como segurança, governança democrática e estabilidade política. No entanto, persistem desafios importantes, sobretudo no que respeita à segurança e à promoção do desenvolvimento socioeconômico.
Informa ainda que o Brasil tem buscado dar sua contribuição para esse desenvolvimento. E contribuiu com US$ 500 mil para o "Plano de Ação Humanitária para o Iraque em 2010". O montante teria sido direcionado ao Programa Mundial de Alimentos das Nações Unidas (US$ 250 mil), ao Fundo das Nações Unidas para Infância - UNICEF (US$ 100 mil), ao Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (US$ 100 mil) e à Organização Internacional para as Migrações (US$ 50 mil).
“Os recursos foram utilizados para a melhoria da alimentação escolar iraquiana e para o financiamento de ações de reparação e reconstrução de escolas, inclusive em campos de refugiados”.