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quarta-feira, 11 de maio de 2016

Arbitragem sobre o Mar do Sul da China: artigo do embaixador da China no Brasil (CB)

O embaixador da China no Brasil faz apelo à figura de Rio Branco para tentar justificar a posição de seu país sobre as ilhas do Mar do Sul que também são reivindicadas pelas Filipinas. A referência é genérica, e não permite estabelecer de fato os direitos da China, que se refugia em vagos argumentos históricos e à metodologia das negociações diretas para a solução dos problemas existentes.
As Filipinas estão recorrendo à arbitragem internacional para tentar defender seus interesses. Vamos acompanhar o caso.
Paulo Roberto de Almeida

Arbitragem sobre o Mar do Sul da China: farsa política sob capa jurídica

Li Jinzhang

Correio Braziliense, 10/05/2016


Em 23 de janeiro de 2013, as Filipinas solicitaram, unilateralmente, a arbitragem internacional sobre a questão do Mar do Sul da China. Nos últimos dias, o pedido de arbitragem vem despertando a atenção da comunidade internacional. Quem tem mais razão nessa controvérsia? — perguntam-me amigos brasileiros. Por que a China se opõe à arbitragem internacional? Nesse ensejo, gostaria de abordar o histórico dessa questão e as implicações do pedido de arbitragem, revelando e deixando os fatos falarem por si.
Quem vem agitando essas águas? As ilhas do Mar do Sul da China são território chinês desde a antiguidade. Os chineses foram os primeiros a descobrir, nomear, desenvolver e administrar essas ilhas. Ao longo da história, os governos da China afirmaram sua soberania e reforçaram sua gestão de maneiras diversas: definiram os designaram guarnições militares. Até a década de 1970, a soberania chinesa sobre as ilhas era amplamente reconhecida pela comunidade internacional, tanto que nenhum país apresentou qualquer tipo de objeção.
As fronteiras filipinas, por sua vez, foram claramente definidas por documentos internacionais como o Tratado de Paris de 1898, segundo os quais o território filipino é delimitado a oeste pelo meridiano 118ºE, situando-se as ilhas e recifes do Mar do Sul da China a oeste dessa linha. No entanto, após o descobrimento de abundantes recursos de petróleo e gás na região a partir do final da década de 1960, as Filipinas e outros países, ignorando suas demarcações territoriais, invadiram aos poucos os recifes das Ilhas Nansha e, com isso, deram origem às disputas.
Para tirar proveito da situação, a parte filipina acusou a China de empreender uma militarização que, na verdade, nada mais que a necessária disposição de instalações de defesa em seu próprio território. Manila aproveitou a oportunidade para levantar a questão, cortejou as forças de terceiros a fim de aumentar a presença militar na região e solicitou, unilateralmente, a arbitragem internacional sobre o assunto, sem levar em consideração a forte oposição da China. A parte chinesa tem amplas razões para dizer não a isso.
Em primeiro lugar, a não aceitação nem participação da China na arbitragem são justas. De acordo com lei internacional, a escolha dos meios para a resolução de litígios é direito soberano de cada nação envolvida. Por meio de documentos bilaterais e multilaterais, a China e as Filipinas definiram que recorreriam a negociação e consulta para solucionar os litígios em causa. O pedido unilateral de arbitragem de Manila contraria o consenso entre as duas partes e as obrigações internacionais das Filipinas para com a China, ao mesmo tempo que nega à China o direito à livre escolha do meio de resolução de litígio.
Em segundo lugar, a não aceitação nem participação da China na arbitragem são justas. A demanda das Filipinas, na essência, diz respeito à soberania territorial e à demarcação das águas territoriai, que enquadram-se, portanto, no escopo do direito internacional geral e não no da “Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar” (abaixo referida como a Convenção). Como signatária da Convenção, a China emitiu, em 2006, uma declaração, com base no artigo 298 da Convenção, que excluiu a utilização de procedimentos compulsórios como a arbitragem para resolver controvérsias como a demarcação de áreas marítimas. Mais de 30 países já produziram uma declaração semelhante, entre eles o Brasil, que também se reserva esse direito. Ao refutar o caso de arbitragem apresentado pelas Filipinas, o governo chinês é amparado pelo direito internacional e age em conformidade com as normas e práticas internacionais.
Por fim, a não aceitação nem participação da China na arbitragem é legítima. Manila abriu o processo com o intuito de encobrir a sua ocupação ilícita de ilhas da China, dando disfarce “jurídica” a suas ações ilegais. Para tanto, as Filipinas recorrem a uma série de mentiras: por um lado, recusam-se a negociar uma resolução conforme os consensos alcançados entre os dois países e, por outro, alegam ter se esgotado os recursos bilaterais; por um lado, afirmam que o pedido de arbitragem não diz respeito à soberania territorial ou à delimitação de zonas marítimas e, por outro, põem em discussão a soberania e a jurisdição marítima da China. Enquanto levantou o pedido de arbitragem, Manila nunca fez qualquer consulta ao lado chinês sobre a existência e extensão de “controvérsias relativas à interpretação e aplicação da Convenção”. Como disse o chanceler chinês Wang Yi, “uma arbitragem distorcida e desjeitada não merece a participação chinesa”.
No início do século 20, o ilustre Barão do Rio Branco, com sua extraordinária visão estratégica e pragmatismo, resolveu, de maneira pacífica, a demarcação territorial do Brasil com os países vizinhos, consolidando as fronteiras do país. Desde a fundação da República Popular, a China também persiste nos princípios de confiança, boa vizinhança e harmonia, e definiu 90% das fronteiras terrestres por meio de negociações e consultas. Da mesma maneira, a China, respeitando os fatos históricos, encontrará resoluções pacíficas para as controvérsias sobre interesses territoriais e marítimos. Agora, a bola está com as Filipinas. Instamos o lado filipino a suspender, o quanto antes, o processo judicial inconsistente e avesso ao direito internacional, voltar à via negociada para a resolução de disputas, que é o caminho apropriado, mostrar boa vontade e sinceridade para tratar as diferenças de forma adequada e salvaguardar, em conjunto, a paz e a estabilidade do Mar do Sul da China.

Li Jinzhang, Embaixador da China no Brasil

terça-feira, 18 de agosto de 2015

Venezuela-Guiana: o ParlaSul se Bolivarianizou? - Resolucao Aloprada

O que está acontecendo no Parlamento do Mercosul? O que estão fazendo ali os parlamentares brasileiros? Eles estão votando de acordo com as orientações da diplomacia brasileira ou apenas se dobram às manipulações dos representantes do chavismo?
Em todo caso, essa Resolução é uma das coisas mais alopradas já vistas na história do Parlamento.
A despeito de não ter nenhum efeito sobre as condutas dos governos, esse tipo de resolução política dá respaldo ao governo bolivariano-chavista para dizer que conta com o apoio dos demais países.
A Resolução, aliás, peca por uma total falta de bom-senso, a falar de zona de paz e de diplomacia, quando é justamente o contrário o que vem promovendo o governo chavista, contra o seu pequeno vizinho.
O Brasil vai lavar as mãos nessa história?
Paulo Roberto de Almeida

PARLAMENTO DEL MERCOSUR
Montevideo Uruguay
Tel: (598) 2410 9797
www.parlamentodelmercosur.org
presidencia@parlamentodelmercosur.org

MERCOSUR/PM/DECL.03/2015
DECLARACIÓN DE RESPALDO Y SOLIDARIDAD CON LA REPÚBLICA BOLIVARIANA DE VENEZUELA

VISTO:
El Tratado de Asunción, del 26 de marzo de 1991 y el Protocolo de Ouro Preto, del 17 de diciembre de 1994 y la Declaración Presidencial sobre Compromiso Democrático en el MERCOSUR, del 25 de junio de 1996.
El Protocolo de Ushuaia I y II sobre Compromiso Democrático en el Mercosur,
la República de Bolivia y la República de Chile.
El Protocolo Constitutivo del Parlamento del Mercosur y su Reglamento Interno.
La Declaración Política del Mercosur, Bolivia y Chile como Zona de Paz, suscrita en Ushuaia, en julio de 1999.
La Declaración Política MERCOSUR/PM/SO/DECL/04/2014, que Declara al Mercosur como Zona de Paz.
Los principios del Derecho Internacional consagrados en la Carta de las Naciones Unidas.
El Protocolo de Adhesión de la República Bolivariana de Venezuela al Mercosur.

CONSIDERANDO:
El paso firme y el desarrollo de los procesos políticos y sociales de América Latina y el Caribe, en el contexto del siglo XXI, donde se ha consolidado el principio de la paz, como un elemento fundamental para la continuidad y desarrollo del proceso de integración, reafirmado en la II cumbre de la Comunidad de Estados Latinoamericanos y Caribeños (CELAC), realizada en la Habana - Cuba, en enero de 2014, en la cual se declara a Latinoamericana y el Caribe como una Zona de Paz.
El avance histórico e indetenible de los procesos de unidad e integración, que han devenido en la construcción de instancias propias y necesarias para el fortalecimiento del dialogo y la unión política de pueblos y Gobiernos, como Petrocaribe, ALBA, UNASUR, MERCOSUR, CELAC, lo que ha permitido dar respuestas contundentes a temas regionales sin la injerencia de potencias extranjeras.

EL PARLAMENTO DEL MERCOSUR DECLARA:
PRIMERO:
Acompañar la Diplomacia de Paz que desarrolla la República Bolivariana de Venezuela y el Presidente Nicolás Maduro, para que en el marco del diálogo civilizado se busque una solución pacifica, aceptada por ambas partes, a la controversia territorial entre la República Bolivariana de Venezuela y la República Cooperativa de Guyana, razón por la cual se exhorta a esta última a no otorgar concesiones en el territorio en disputa.

SEGUNDO:
Rechazar la política de dominación internacional que protagonizan factores económicos transnacionales petroleros, entre ellos, Exxon Mobil, los cuales pretenden socavar la soberanía de la unidad latinoamericana en función de sus intereses corporativos, generando tensiones políticas ent
re pueblos hermanos obligados a resolver sus controversias preservando la Paz, Unión y la Integración regional.

TERCERO:
Ratificar que los únicos canales adecuados para resolver esta controversia son los del Derecho Internacional, los del Acuerdo de Ginebra de 1966 y proseguir con el mecanismo del Buen Oficiante bajo la figura del Secretario General de las Naciones Unidas.

CUARTO:
Dar amplia publicidad a la presente Declaración en los parlamentos regionales y en los organismos internacionales competentes.

Montevideo, 17 de agosto de 2015
Parlamentario Saúl Ortega Campos
Presidente Parlamento del MERCOSUR
Edgar Lugo
Secretario Parlamentario

Venezuela-Guiana: um conflito artificialmente insuflado pelos bolivarianos - Bloomberg News

Maduro exporta turbulência para a Guiana

Disputa pela região de Essequibo pode ser ‘cortina de fumaça’ política para chavista, mas traz danos reais aos vizinhos

Durante gerações, a Venezuela reivindicou formalmente a posse de uma grande área de território da sua minúscula vizinha, a Guiana. Muitas pessoas não deram atenção ao caso diante da abundância de petróleo na Venezuela e da penúria da Guiana. O próprio ex-presidente Hugo Chávez deixou a questão de lado, referindo-se aos guianenses como seus irmãos.
Em maio, a Exxon Mobil revelou que, operando mediante contrato firmado com a Guiana, descobriu enormes reservas de petróleo e gás na costa do país. Nicolás Maduro exigiu que a companhia cessasse as perfurações porque a área pertence à Venezuela. E afirmou que o presidente da Guiana é “instrumento da poderosa indústria do petróleo”, acrescentando que as iniciativas da Guiana “podem provocar uma guerra”. 
Para a Guiana, a descoberta de 700 milhões de barris promete ser uma revolução, já que o país, de insignificante exportador de alimentos, pode se transformar num fornecedor global de energia. As reservas de gás natural e petróleo equivaleriam a US$ 40 bilhões, dez vezes o PIB do país.
Os guianenses que dependem do petróleo venezuelano estão entusiasmados. De olho em enormes ganhos potenciais, também estão furiosos com Maduro, acusando-o de tentar fugir de seus problemas políticos e econômicos cobiçando o que pertence a eles.
A Venezuela tem a mais alta inflação do mundo, vive escassez crônica de produtos essenciais - como remédios e papel higiênico - e taxas de violência que ultrapassam as do Iraque. As eleições parlamentares estão marcadas para dezembro e a coalizão socialista de Maduro pode perder sua maioria pela primeira vez em 16 anos.
Para os guianenses, a disputa pela região de Essequibo seria uma mera artimanha para camuflar problemas políticos, mas o presidente da Guiana, David Grander, diz que a Venezuela vem causando um problema real. “Investidores estão com medo, o desenvolvimento está bloqueado e os projetos, obstruídos”, disse ele, em discurso em Washington, no mês passado. “É muita coisa para um país com menos de um milhão de habitantes suportar”.
A exploração do recurso, no entanto, não foi interrompida. O governo da Guiana espera a primeira extração para dentro de cinco a sete anos. Para Edward Glab, professor da Universidade Internacional da Flórida, que trabalhou na Exxon por 25 anos, a descoberta tem enorme importância para a Guiana mesmo com o petróleo cotado hoje a menos de US$ 50 por barril.
"Você pode ter investidores que desejarão se manter à frente porque sabem que, num determinado momento, o país terá uma enorme riqueza. E assumirão os riscos, sabendo que o país conseguirá pagar suas contas."
A reivindicação da Venezuela data de mais de um século. Em 1899, um tribunal internacional em Paris decidiu que a região em disputa pertencia à Guiana. A Venezuela rejeitou a decisão. A área equivale a dois terços do território da Guiana.
A posse de Essequibo é questão de orgulho nacional para a Venezuela, em cujo mapa a área é indicada como “zona em disputa”. Apesar de ter uma das maiores reservas de petróleo do mundo, a Venezuela luta para aumentar sua produção em queda.
Há um problema adicional: a Exxon vem cobrando uma indenização de US$ 1,6 bilhão da Venezuela, garantida por um tribunal do Banco Mundial, depois que Chávez nacionalizou ativos da empresa no país.
Segundo Sadio Garavini di Turno, ex-embaixador na Guiana e conselheiro da oposição, a Venezuela não está em boa posição na disputa, diante do sentimento que prevalece na comunidade internacional em relação ao país. Além disso, um tribunal internacional provavelmente não decidirá a seu favor.
"Na comunidade internacional, em geral, e nos tribunais internacionais há profunda aversão à mudança de fronteiras. Pense em quantas fronteiras no mundo são injustas e quantas teriam de ser mudadas".
"A Guiana tem forte apoio internacional", diz Carlos Romero, professor de relações internacionais na Universidade Central da Venezuela. Embora Caracas queira negociações intermediadas, a Guiana prefere que a questão seja decidida por um tribunal onde provavelmente terá decisão mais favorável. Maduro insiste que uma ação militar está fora de questão. Mas, segundo Romero, "ele está encurralado"./TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO
*Andrew Rosati é jornalista do Bloomberg News

sexta-feira, 24 de julho de 2015

Contencioso territorial Venezuela-Guiana: uma disputa que interessa tambem ao Brasil

O contencioso não tem razão de ser, de existir, ou de prosseguir. Mas se for discutido, abordado, falado, tratado em reuniões formais ou informais, diplomáticas ou não, seria bom ter presente o seguinte aspecto.


O contencioso Venezuela-Guiana tem um agravante ainda mais preocupante do que o mencionado neste editorial do Estadão, com implicações para a nossa diplomacia, ainda que por motivos puramente históricos atualmente: o fato de envolver território "brasileiro". Explico. Ao adjudicar à Grã-Bretanha boa parte do território disputado naquela região com o Brasil, que atuou no diferendo por arbitragem por meio de Joaquim Nabuco (mas com base nos excelentes estudos de cartografia histórica feitos por Rio Branco), o rei italiano (presidente) acabou concedendo aos britânicos território que o Brasil considerava como seu, com base nos memoráveis esforços de penetração feitos pelos portugueses na era colonial. Ora, se a Venezuela contesta as fronteiras atuais, ela de fato está querendo avançar sobre território "brasileiro", ou que deveria sê-lo, se por acaso as fronteiras históricas forem contestadas segundo uma cronologia que antecede a arbitragem do final do século 19. A diplomacia brasileira não pode ficar indifente a esse avanço ilegítimo dos venezuelanos sobre terras que poderiam ser brasileiras, e que só estão atualmente sob a soberania da Guiana porque o rei italiano queria agradar e ficar com os ingleses mais de um século atrás.
Paulo Roberto de Almeida 

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Uma disputa sob encomenda
Editorial O Estado de S. Paulo,. 22 Julho 2015

Nada como um bom contencioso internacional para alimentar o discurso nacionalista e patriótico do presidente Nicolás Maduro, que tenta com isso aliviar a pressão exercida pela crise profunda que o chavismo provocou na Venezuela. A secular reivindicação territorial sobre um pedaço da vizinha Guiana está sendo retomada agora com renovado vigor, em razão da anunciada descoberta de petróleo naquela região. É uma combinação perfeita para a retórica rastaquera de Maduro: ao suposto roubo do território no século 19, patrocinado pelo Império Britânico, soma-se a exploração “imperialista”.
A reivindicação sobre o território conhecido como Essequibo é um tema que une os venezuelanos. Mesmo uma parte da oposição ao chavismo considera válido exigir a devolução da área, embora tal demanda tenha remotíssimas chances de ser atendida – pois o Essequibo representa nada menos que 62% do território da Guiana. É, portanto, um assunto capaz de mexer com o sentimento do país, razão pela qual, de tempos em tempos, serve a todo tipo de interesse.
O contencioso sobre o Essequibo remonta ao século 19. A atual fronteira entre Venezuela e Guiana foi estabelecida pelos britânicos em 1840. Mas a Venezuela considerava que seus limites se estendiam até o Rio Essequibo, incorporando uma área de 160 mil quilômetros quadrados – em seus mapas atuais, o país chama essa área, que hoje pertence à Guiana, de “Guayana Esequiba”, dizendo tratar-se de região “disputada”.
Em 1894, os Estados Unidos, a pedido dos venezuelanos, sugeriram uma arbitragem internacional – na qual os americanos serviram como advogados da Venezuela. Sem a defesa feita pelos Estados Unidos, que tinham interesse em evitar a expansão britânica na região, a Venezuela teria perdido território até o Rio Orinoco, isto é, metade de sua área atual. Portanto, o resultado da arbitragem, proclamado em 1899, foi razoável para a Venezuela – tanto é assim que os venezuelanos só voltaram a reivindicar o Essequibo em 1949.
Nesse meio tempo, porém, o território já estava ocupado por guianenses de fala inglesa, que hoje não têm intenção de se tornarem cidadãos venezuelanos. Essa realidade, além do fato de que é bastante improvável que a comunidade internacional decida dar a um país mais da metade do território de outro em razão de um suposto erro de arbitragem cometido há mais de um século, torna o pleito venezuelano ainda mais implausível.
Em 1966, Venezuela e Grã-Bretanha (e posteriormente a Guiana independente) se comprometeram a resolver o diferendo em negociações, mas não houve avanços. Em 1980, a Guiana incorporou formalmente o Essequibo a seu território.
Em todo esse tempo, o contencioso foi retomado ou esquecido ao sabor das conveniências políticas. A situação voltou a ficar tensa em março deste ano, quando a Guiana anunciou que a Exxon Mobil começaria a explorar petróleo em águas da região disputada. A Venezuela reagiu, e Maduro, bem a seu estilo, estendeu por decreto a soberania venezuelana às águas da área que reivindica. Com razão, a Guiana protestou, alegando violação do direito internacional e do princípio de que todos os Estados devem respeitar a soberania e a integridade dos demais.
Na última cúpula do Mercosul, o presidente da Guiana, David Granger, queixou-se das provocações venezuelanas e, num encontro bilateral, pediu à presidente Dilma Rousseff que ajudasse na mediação. Maduro quis participar do encontro, mas Dilma não permitiu – no que fez muito bem.
O chefão venezuelano, como se sabe, não se preocupa muito com leis, ordenamento jurídico e rituais diplomáticos quando se trata de preservar as fantasias chavistas. A retomada retumbante do contencioso do Essequibo – em que Maduro diz defender a Venezuela do “imperialismo” americano, mas age ele mesmo como imperialista – expõe toda a sua truculência, inadmissível no concerto das nações civilizadas.