Durante gerações, a Venezuela reivindicou formalmente a posse de uma grande área de território da sua minúscula vizinha, a Guiana. Muitas pessoas não deram atenção ao caso diante da abundância de petróleo na Venezuela e da penúria da Guiana. O próprio ex-presidente Hugo Chávez deixou a questão de lado, referindo-se aos guianenses como seus irmãos.
Em maio, a Exxon Mobil revelou que, operando mediante contrato firmado com a Guiana, descobriu enormes reservas de petróleo e gás na costa do país. Nicolás Maduro exigiu que a companhia cessasse as perfurações porque a área pertence à Venezuela. E afirmou que o presidente da Guiana é “instrumento da poderosa indústria do petróleo”, acrescentando que as iniciativas da Guiana “podem provocar uma guerra”.
Para a Guiana, a descoberta de 700 milhões de barris promete ser uma revolução, já que o país, de insignificante exportador de alimentos, pode se transformar num fornecedor global de energia. As reservas de gás natural e petróleo equivaleriam a US$ 40 bilhões, dez vezes o PIB do país.
Os guianenses que dependem do petróleo venezuelano estão entusiasmados. De olho em enormes ganhos potenciais, também estão furiosos com Maduro, acusando-o de tentar fugir de seus problemas políticos e econômicos cobiçando o que pertence a eles.
A Venezuela tem a mais alta inflação do mundo, vive escassez crônica de produtos essenciais - como remédios e papel higiênico - e taxas de violência que ultrapassam as do Iraque. As eleições parlamentares estão marcadas para dezembro e a coalizão socialista de Maduro pode perder sua maioria pela primeira vez em 16 anos.
Para os guianenses, a disputa pela região de Essequibo seria uma mera artimanha para camuflar problemas políticos, mas o presidente da Guiana, David Grander, diz que a Venezuela vem causando um problema real. “Investidores estão com medo, o desenvolvimento está bloqueado e os projetos, obstruídos”, disse ele, em discurso em Washington, no mês passado. “É muita coisa para um país com menos de um milhão de habitantes suportar”.
A exploração do recurso, no entanto, não foi interrompida. O governo da Guiana espera a primeira extração para dentro de cinco a sete anos. Para Edward Glab, professor da Universidade Internacional da Flórida, que trabalhou na Exxon por 25 anos, a descoberta tem enorme importância para a Guiana mesmo com o petróleo cotado hoje a menos de US$ 50 por barril.
"Você pode ter investidores que desejarão se manter à frente porque sabem que, num determinado momento, o país terá uma enorme riqueza. E assumirão os riscos, sabendo que o país conseguirá pagar suas contas."
A reivindicação da Venezuela data de mais de um século. Em 1899, um tribunal internacional em Paris decidiu que a região em disputa pertencia à Guiana. A Venezuela rejeitou a decisão. A área equivale a dois terços do território da Guiana.
A posse de Essequibo é questão de orgulho nacional para a Venezuela, em cujo mapa a área é indicada como “zona em disputa”. Apesar de ter uma das maiores reservas de petróleo do mundo, a Venezuela luta para aumentar sua produção em queda.
Há um problema adicional: a Exxon vem cobrando uma indenização de US$ 1,6 bilhão da Venezuela, garantida por um tribunal do Banco Mundial, depois que Chávez nacionalizou ativos da empresa no país.
Segundo Sadio Garavini di Turno, ex-embaixador na Guiana e conselheiro da oposição, a Venezuela não está em boa posição na disputa, diante do sentimento que prevalece na comunidade internacional em relação ao país. Além disso, um tribunal internacional provavelmente não decidirá a seu favor.
"Na comunidade internacional, em geral, e nos tribunais internacionais há profunda aversão à mudança de fronteiras. Pense em quantas fronteiras no mundo são injustas e quantas teriam de ser mudadas".
"A Guiana tem forte apoio internacional", diz Carlos Romero, professor de relações internacionais na Universidade Central da Venezuela. Embora Caracas queira negociações intermediadas, a Guiana prefere que a questão seja decidida por um tribunal onde provavelmente terá decisão mais favorável. Maduro insiste que uma ação militar está fora de questão. Mas, segundo Romero, "ele está encurralado"./TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO
*Andrew Rosati é jornalista do Bloomberg News
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