... que pode descambar irresponsavelmente para a guerra, se o Brasil, e outros países da região, assim como a Unasul, o Mercosul, a OEA, e a própria ONU não atuarem para desativar um imitador dos militares argentinos, que para desviar a atenção da população para a crise econômica no país iniciaram a guerra nas Falklands/Malvinas.
O Brasil tem especial responsabilidade no assunto, pois pelo menos metade do território terrestre reivindicado pelos caudilhos bolivarianos lhe pertencia historicamente, até a arbitragem enviesada conduzida pelo rei italiano em favor da Grã-Bretanha, mais de cem anos atrás.
O Brasil tem do dever de deixar bem claro aos caudilhos bolivarianos que qualquer agressão é inaceitável, sob qualquer critério e sob todos os padrões diplomáticos.
Paulo Roberto de Almeida
Duda Teixeira
Revista Veja, 12/09/2015
Em Georgetown, capital da Guiana, é fácil constatar que o
país não faz parte da América Latina, apesar de estar situado, geograficamente,
na América do Sul. A população fala inglês e o volante fica do lado direito do
carro. O maior grupo étnico é o de descendentes de indianos, trazidos para
substituir os escravos africanos nas lavouras de cana-de-açúcar do século XIX.
Nos arredores da cidade, há mais templos hinduístas e
mesquitas do que igrejas cristãs. Neste ano, a sensação entre os guianenses de
não pertencer ao mundo latino cresceu quando o governo venezuelano reivindicou
dois terços do território da Guiana e uma parte correspondente de seu mar. O
presidente David Granger, eleito em maio, contou à VEJA que espera a arbitragem
da ONU sobre a pendenga.
O presidente Nicolás Maduro tem dito que a região do
Essequibo, na Guiana, na realidade pertence á Venezuela. Faz sentido?
Não. As fronteiras ocidentais de nosso país com o Brasil
e com a Venezuela foram demarcadas por um tribunal de arbitragem em 1899. Isso
foi há 116 anos. Os mapas internacionais reconhecem as fronteiras entre a
Guiana e os vizinhos Venezuela e Brasil. Maduro não tem razão.
Essequibo sempre pertenceu à Guiana?
Depois das guerras napoleônicas, a Inglaterra tomou posse
de todas as colônias holandesas, em 1814, inclusive os três territórios que
hoje compõem a Guiana. O acordo de 1899 resolveu as pendências que surgiram com
os vizinhos e, por cinquenta anos, não houve nenhuma obstrução. Quem for até os
pontos mais ao norte, mais ao leste e mais ao sul do Essequibo vai constatar
que os cidadãos estão sob a jurisdição guianense. Foi somente com a então
iminente independência da Guiana, conquistada em 1966, que a Venezuela começou
a exigir o território para si.
Os moradores do Essequibo gostariam de ser cidadãos
venezuelanos?
Eles sabem muito bem que essa é uma reivindicação
espúria. Esses cidadãos votam nas eleições da Guiana. Têm certidão de
nascimento e passaporte guianenses. Recentemente, ocorreu uma conferência dos
chefes das tribos indígenas, muitas das quais estão localizadas perto da
fronteira. Eles publicaram uma resolução em que expressam solidariedade ao meu
governo na resistência à agressão venezuelana. A ONU também mandou uma
delegação para lá, que conversou com vários habitantes. Ninguém apoiou a
reivindicação venezuelana. Posso dizer com segurança que estamos todos unidos
nisso.
Por que Maduro insiste tanto?
Essa questão voltou à tona principalmente por causa da
exploração de petróleo no fundo do mar pela companhia americana EXXON. Desde
março deste ano, quando a empresa anunciou ter encontrado uma grande reserva
nas nossas águas territoriais (700 milhões de barris de petróleo, o dobro das
reservas comprovadas na Bahia), começamos a ouvir com mais força as batidas dos
tambores. Vale lembrar que a Venezuela perdeu um litígio com a EXXON anos atrás
e foi obrigada a pagar uma compensação por causa da nacionalização de
propriedades da companhia. Isso explica a feroz reação do governo venezuelano à
descoberta feita pela EXXON. Além disso, parte do território reivindicado
também é rica em ouro e diamantes.
Qual o impacto da disputa territorial com a Venezuela em
seu país?
A Venezuela tem obstruído consistente e persistentemente
nosso desenvolvimento econômico nos últimos cinquenta anos. Em outubro de 2013,
a Marinha venezuelana mandou uma corveta, a PC 23 Yekuana, para ameaçar o barco
de outra empresa de petróleo que estava conduzindo pesquisas em uma área não
muito longe do campo da EXXON. Com a ameaça de uso da força, os venezuelanos
impediram que o navio Teknik Perdana continuasse a prospecção. Mais
recentemente, em maio, um decreto publicado pela Venezuela deu à Marinha a
autoridade para atuar em nossas águas. Esse tipo de coisa assusta os
investidores. Embora nenhuma empresa tenha deixado a Guiana por essas medidas,
muitas hesitam em vir para cá.
“Venezuela está se comportando de maneira agressiva, o
que é inaceitável neste milênio. Seu governo quer um território que não é do
país. Eu não chamaria isso de imperialismo, mas certamente é algo que vai
contra as leis”
Qual tem sido a posição da EXXON após os decretos de
Maduro?
Nós temos falado com seus executivos. Na minha visão, a
determinação continua porque petróleo é o negócio deles. Foram eles que acharam
as reservas. Por isso, devem continuar por aqui.
Há razões geopolíticas para Maduro ter iniciado essa
pendenga com a Guiana?
A Venezuela não possui litoral no Oceano Atlântico. O
país tem um extenso litoral para o Mar do Caribe (uma fileira de pequenas ilhas
separa o Caribe do Atlântico). Para aumentarem o poder da Marinha, os
venezuelanos têm falado muito de ter um acesso ao Atlântico. Querem usar essa
reivindicação absurda de território para garantir outro direito espúrio, o de
ter um corredor para o Atlântico.
Como o senhor define esse tipo de comportamento?
A Venezuela está se comportando de maneira agressiva, o
que é inaceitável neste milênio. Seu governo quer um território que não é do
país. Eu não chamaria isso de imperialismo, mas certamente é algo que vai
contra as leis.
Essa disputa é uma questão bilateral ou envolve mais
países?
A reivindicação territorial é essencialmente bilateral.
Mas a marítima afeta outros países, como Barbados e Suriname.
Maduro expulsou milhares de colombianos que viviam na
Venezuela acusando-os de ser paramilitares e de fazer contrabando. Isso tem
alguma similaridade com o que está acontecendo com a Guiana?
Não gostaria de comentar as relações entre a Colômbia e a
Venezuela, mas é certo que qualquer distúrbio de fronteira neste continente vai
acabar afetando outras nações. Nós queremos uma região pacífica.
Presidente da República Cooperativa da Guiana, David
Granger
No dia 17 de Julho de 2015, em uma reunião do MERCOSUL a
preidente Dilma Rousseff recebeu o Presidente da República Cooperativa da
Guiana, David Granger. Ao saber disso o Presidente Nicolas Maduro retirou-se
intempestivamente da reunião e partiu de Brasília - DF, 17/07/2015 Foto Palácio do Planalto
O Brasil deveria ajudar a resolver a disputa?
Em 7 de setembro, durante comemoração da Independência,
Lineu Pupo de Paula, o embaixador brasileiro na Guiana, deixou claro para nós
que seu país não tem interesse em turbulências em nenhuma fronteira no nosso
continente. Em julho, eu estive em Brasília e falei com a presidente Dilma
Rousseff. Na ocasião, ela fez a mesma afirmação. Tudo indica que o Brasil não
quer mudanças nas nossas fronteiras.
O que Dilma lhe disse, exatamente?
Ela não falou especificamente sobre a controvérsia. Não
mencionou a Venezuela. Mas Dilma manteve a posição brasileira de rejeitar
distúrbios nas fronteiras.
Como a UNASUL e o MERCOSUL estão lidando com essas
questões?
O MERCOSUL foi feito para ser um bloco econômico. Não é,
portanto, uma questão que o MERCOSUL deva decidir. Também não vi nenhum
envolvimento da UNASUL. A ideia por lá é que se deve aguardar uma posição da
ONU. Tenho falado com o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon. Ele ficou de
marcar um encontro entre os dois lados. Agora, está tudo nas mãos da ONU.
Maduro insinuou que pode usar da força para conseguir o
que quer. A Venezuela tem um contingente militar vinte vezes maior que o da
Guiana. Seu país teria condições de responder a uma agressão armada?
Dependemos da diplomacia, do estado de direito, das
Nações Unidas, das forças multilaterais como a UNASUL e da Organização dos
Estados Americanos (OEA). Temos de confiar nisso porque somos um país pequeno e
sem interesse em um conflito militar com a Venezuela ou outro país. Esse não é
o debate que gostaríamos de ter neste novo milênio. Vivemos em um mundo
civilizado e acreditamos que a comunidade internacional possa atuar para
garantir que a América do Sul seja uma área de paz. Nossa opção tem sido não
investir nossos esparsos recursos em defesa militar.
A reserva de petróleo sob
águas guianenses é estimada em 40 bilhões de dólares, o equivalente a
treze vezes o PIB anual do país. Qual a melhor maneira de usar os royalties?
Somos um país
pequeno, um dos menores na América do Sul, apesar de termos uma área maior que
a da Inglaterra e da Escócia juntas. Nossa população é de apenas 750 000
pessoas. Por razões históricas, temos um nível muito alto de pobreza. Os holandeses
e os ingleses vieram aqui para produzir algodão e depois açúcar. Ainda
exportamos basicamente açúcar, arroz, madeira, ouro e bauxita. A receita do
petróleo nos permitirá diversificar a economia mais rapidamente. Nossa
geografia oferece um grande potencial hidrelétrico. Infelizmente, até agora,
não temos tido recursos financeiros suficientes para construir mais usinas. Com
isso, a energia tem um custo muito alto, o que restringe várias formas de
industrialização. Se essa barreira for superada, a economia ganhará dinamismo e
a pobreza será aliviada.
“Não temos interesse
em um conflito militar com a Venezuela ou outro país. Esse não é o
debate que gostaríamos de ter. Acreditamos que a comunidade internacional possa atuar para garantir que a
América do Sul seja uma área de paz”
Em muitos países, a abundância de petróleo serviu para
financiar governos autoritários. A Guiana corre o risco de seguir esse caminho?
O Brasil produz petróleo e não é uma ditadura. Não acho
que exista essa maldição. Antes de as receitas do petróleo começarem a entrar,
o que deve demorar alguns anos, queremos estabelecer um fundo soberano para ter
certeza de que o dinheiro não será desperdiçado. Queremos deixar algo para a
posteridade. O fundo vai garantir que a riqueza possa ser compartilhada pelas
futuras gerações e manterá a inflação sob controle.
Por que a Guiana tem uma das maiores taxas de suicídio do
mundo?
É difícil saber o que leva uma pessoa a fazer isso,
porque é uma questão individual. Não podemos saber o que se passa na mente
dela. Os fatores podem ser familiares ou econômicos. Muitos casos acontecem em
áreas rurais, com a ingestão de substâncias químicas agrícolas, como
inseticidas. Não é um fenômeno disseminado em todo o país, mas concentrado nas
áreas mais pobres.
Quase não se ouve falar sobre a Guiana no Brasil. Como
mudar isso?
Historicamente, o desenvolvimento do meu país se
concentrou no litoral. Temos relações econômicas mais fortes com o Caribe, a
Inglaterra, os Estados Unidos, o Canadá e a União Europeia. Queremos dar mais
atenção à integração com a América do Sul. Dos três países vizinhos (Venezuela,
Brasil e Suriname), os laços com o Brasil são os mais fortes. Recentemente, o
Brasil construiu uma ponte sobre o Rio Itacutú ligando os dois países. Há um
destino continental para a Guiana.
Como o senhor se define ideologicamente?
Sou nacionalista.
O senhor é membro de um partido que se define como
socialista, o PNC (Congresso Nacional do Povo, na sigla em inglês). Em que o
socialismo do PNC é diferente do "socialismo do século XXI" pregado
por Hugo Chávez?
O socialismo do
PNC nasceu defendendo a ideia de que cidadãos pobres pudessem participar de
cooperativas. Continuamos impulsionando as cooperativas. Também temos, ainda,
algumas poucas empresas estatais no país, mas encorajamos a iniciativa privada.
Queremos garantir que a população tenha uma educação de qualidade, que a
economia possa crescer com energia renovável, que empresários tenham sua
parcela na produção da riqueza e que os cidadãos sejam parte da economia.
Maduro é chavista. Ele segue o seu mentor, Hugo Chávez. Sua ideologia é parte
do chamado socialismo bolivariano. Não sigo esse caminho.
O senhor já foi jornalista. O respeito à liberdade de
expressão também é uma diferença sua em relação ao go-verno venezuelano?
Não posso falar sobre o que acontece em outros países. Na
Guiana, insisto que a liberdade de imprensa deve ser respeitada. Temos tentado
fazer isso da melhor maneira possível. Mesmo nas empresas que são propriedade
do governo, existe liberdade editorial. Vou continuar apoiando isso. ?