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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

sábado, 9 de janeiro de 2016

Ajuste Fiscal: quem disse que nao passaria? - Pedro Canario (Consultor Juridico)

Mais impostos

Congresso aprovou a maioria das medidas provisórias do ajuste fiscal

Pelo menos no que diz respeito ao aumento de impostos ou de alíquotas tributárias, o ajuste fiscal do governo passou praticamente do jeito que chegou pelo Congresso Nacional. Das nove medidas provisórias que trataram do ajuste, apenas uma foi rejeitada totalmente pelo Legislativo.
A maior derrota do governo foi a da Medida Provisória 685, que dá descontos em multas tributárias aos contribuintes que desistem de seus litígios judiciais ou administrativos. A derrota está na rejeição ao trecho que obrigava as empresas a informarem à Receita Federal sobre seus planejamentos fiscais, sob pena de serem multadas como sonegadoras.
O Congresso entendeu que a medida era inconstitucional por criar obrigação tributária fora das condições autorizadas pelo Código Tributário Nacional e pela Constituição. Também entendeu que, ao tratar as empresas que não dessem informações à Receita como sonegadoras, a MP mexeu em assuntos penais (sonegação fiscal é crime tributário), o que não pode ser feito por meio de medida provisória.
Entre as MPs mais importantes estão a que altera a tabela do Imposto de Renda de Pessoa Física e a que apresenta uma nova forma de cálculo da aposentadoria, em substituição ao fator previdenciário. Ambas foram aprovadas pelo Congresso e convertidas em lei.
Outra comemorada vitória do governo é o fim da isenção fiscal de PIS e Cofins incidentes sobre produtos de informática. O fim da isenção foi proposto pelo governo na MP 690 e mantido pelo Congresso — que havia chegado a um acordo com o setor de instituir uma volta progressiva da tarifa integral dos tributos, o que foi vetado pela presidente Dilma Rousseff.
De acordo com o tributarista Paulo Rogério Sehn, sócio do escritório Trench, Rossi e Watanabe Advogados, o fim da isenção é ilegal. Isso porque o artigo 178 do Código Tributário Nacional só autoriza o corte unilateral de isenções fiscais concedidas sem motivação. No caso dos equipamentos de informática, o desconto em PIS e Cofins era apenas para empresas que investissem 3% de seus faturamentos em pesquisa e desenvolvimento. Portanto, não é uma isenção imotivada. A lei já é alvo de mandado de segurança, impetrado pela Abinee, que representa a indústria elétrica e eletrônica.
Receitas e despesas
Somadas as MPs aprovadas aos cortes de cerca de R$ 80 bilhões em gastos promovidos pelo governo, dá para dizer que o ajuste fiscal passou. O que não quer dizer que acabou a crise. Como lembra o advogado Paulo Sehn, “o governo tinha prometido superávit e fechou 2015 com um déficit absurdo”.
De fato, o Tesouro Nacional prevê que as contas fechem em R$ 110 bilhões negativos. Isso se deu por dois motivos. O primeiro é o atraso nos repasses do Tesouro aos bancos públicos para o custeio de programas sociais, manobra que ficou conhecida como pedaladas fiscais e que foi considerada ilegal pelo Tribunal de Contas da União.
Diante do parecer do TCU, o governo passou a registrar as pedaladas como dívidas, e as pagou ainda no fim de 2015. Ao todo, foram repassados R$ 55,2 bilhões ao Banco do Brasil, ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e ao FGTS. Considerando as demais obrigações do ano, o total pago foi de R$ 72,4 bilhões.
O outro motivo, comenta Paulo Sehn, é que o governo não conseguiu articular a discussão da volta da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentações Financeiras) no Congresso. “Infelizmente, a pauta política dominou o Congresso durante o ano passado e não sobrou espaço para discussões tributárias.”
Porém, a CPMF deve ser levada ao Congresso em 2016 com mais condições de aceitação. A ideia inicial do governo era que a CPMF voltasse com uma alíquota menor, de 0,025% do valor movimentado — antes era de 0,038%. No entanto, em reunião com governadores para discutir as dívidas dos estados, o governo aventou a ideia de voltar à alíquota original, mas deixando só 0,025% com a União. O resto iria para os estados. Isso resultará numa receita de R$ 32 bilhões para este ano, segundo as contas do governo.

Clique aqui para ver a lista de medidas provisórias discutidas pelo Congresso em 2015.

 é editor da revista Consultor Jurídico em Brasília.

Um questionario sobre a carreira diplomatica: minhas respostas - Paulo Roberto de Almeida

O problema de ficar revirando velhas listas de trabalhos é que se (re)descobre coisas interessantes há muito esquecidas, e que eventualmente não tiveram divulgação suficiente.
O texto que segue abaixo é de 2009, e se trata de respostas livres a um questionário recebido de estudante universitária de uma federal, que pretendia seguir a carreira diplomática, e que portanto me enviou uma série de perguntas para fins de um trabalho acadêmico.
Como acredito que a maior parte das respostas permanece inteiramente válida, mesmo após seis anos de sua escrita, posto novamente, sem necessidade de indicar o questionador.
Deve interessar outros interessados na carreira, que porventura tenham interesse nos meus interesses pela carreira.
Muitos "interesses" não é mesmo?
Em todo caso, vou postar primeiramente as perguntas recebidas, depois minhas respostas.
Divirtam-se os que tiverem tempo e paciência para revisar a totalidade das respostas.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 8 de janeiro de 2016


Msg de 24.04.2009:
Boa tarde!
Sou acadêmica da última fase de graduação em administração na UFXX, e tenho interesse em seguir a carreira diplomática.
Como trabalho da disciplina de planejamento de carreira preciso fazer uma entrevista com profissional da área que pretendo atuar.
Se houver disponibilidade, eu tenho interesse que o entrevistado seja o sr., para tanto solicito que responda as perguntas abaixo.

1. Como você se sente por ter escolhido essa profissão (área de atuação)?
2. Como você descreveria a sua profissão?
3. Qual sua formação acadêmica? Você considera que ela foi fundamental para o sucesso profissional?
4. Quais as principais dificuldades enfrentadas para conseguir passar no concurso?
5. Quando você iniciou sua carreira você tinha definido alguns objetivos e metas de onde queria chegar?
6. Como você integra as diversas esferas de sua vida (trabalho, família, lazer, esporte, cursos, etc.)? Está satisfeito?
7. Quais os períodos de sua carreira que você mais gostou?
8. Quais os períodos de sua carreira que você menos gostou?
9. Dentro da perspectiva de sua carreira tem alguma coisa que você gostaria especialmente de evitar?
10. Você tem objetivo em longo prazo na sua carreira? Você tem uma visão de futuro profissional?
11. Você se considera realmente bom (boa) em quê? Quais são seus pontos fortes? E como você aproveita seus pontos fortes no seu trabalho?
12. Quais são seus pontos fracos?
13. O que você mais deseja na sua carreira?
14. O que você pensa que acontecerá à sua carreira nos próximos dez anos?
15. O que você aconselharia para alguém que estivesse iniciando na mesma área?
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 Agora as minhas respostas: 

Carreira Diplomática: respondendo a um questionário

Paulo Roberto de Almeida (www.pralmeida.org)
Respostas a questões colocadas por:
(...)
graduanda em administração na UFXX.

1. Como você se sente por ter escolhido essa profissão (área de atuação)?
PRA: Bastante bem: de certa forma, a profissão me escolheu, pois que desde muito cedo comecei a viajar, primeiro pelo Brasil, depois pela América do Sul e, finalmente, ao completar 21 anos, decidi estudar na Europa, por meus próprios meios e obtendo meus próprios recursos. Foi uma escolha que me preparou para uma vida nômade e aventureira e nunca me arrependi de ter-me lançado ao mundo em fase ainda precoce e sem sequer ter terminado o segundo ano da graduação. Como minha intenção era estudar fora do Brasil, pode-se dizer que realizei meu intento. Quando regressei ao Brasil, depois de quase sete anos na Europa, eu já estava preparado, digamos assim, para tornar-me diplomata. Mas, antes, não tinha pensado: “tropecei” com a carreira, se ouso dizer. Até então, eu só queria derrubar o governo militar.

2. Como você descreveria a sua profissão?
PRA: Uma burocracia de alto nível de qualificação técnica com ampla abertura para as humanidades e o conhecimento especializado. Trata-se, simplesmente, da mais intelectualizada carreira na burocracia federal, combinando aspectos da carreira acadêmica, da pesquisa aplicada e da elaboração de decisões em ambiente altamente competitivo, tanto interna, quanto externamente. Uma elite, como se costuma dizer.

3. Qual sua formação acadêmica? Você considera que ela foi fundamental para o sucesso profissional?
PRA: Ciências Sociais, ou humanidades, no sentido lato, e acredito que ela foi fundamental no ingresso e sucesso na carreira escolhida. Desde muito cedo inclinei-me para os estudos sociais, com forte ênfase na história, na política e na economia, complementados por uma dedicação similar a geografia, antropologia, línguas e cultura refinada, de uma maneira geral. Sou basicamente um autodidata e creio que isso facilitou-me enormemente o ingresso na carreira, pois quase não necessitei de muito estudo para os exames de ingresso. Aliás, entre a decisão de fazer o concurso (direto, no meu caso) e o ingresso efetivo, decorreram pouquíssimos meses (três).

4. Quais as principais dificuldades enfrentadas para conseguir passar no concurso?
PRA: Direito e Inglês, posto que eu havia estudado amplamente todas as demais matérias, mas não Direito, e todos os meus estudos foram feitos em Francês, que eu dominava amplamente. Mas, meu Inglês era muito elementar, servindo tão somente para leituras. Acho que passei raspando nessas duas matérias, nas outras fui bem.

5. Quando você iniciou sua carreira você tinha definido alguns objetivos e metas de onde queria chegar?
PRA: Não especialmente: nunca fui carreirista, no sentido tradicional do termo, e não me preocupava em ser embaixador ou ocupar qualquer posto de distinção. O que me seduzia era a profissão em si, a mobilidade geográfica, o conhecimento de novos países, a possibilidade de estar sempre aprendendo, estudando, viajando. Sou basicamente um estudioso, um observador da realidade, um “compilador” de informações e análises e um escritor improvisado. Todo o resto me é secundário.

6. Como você integra as diversas esferas de sua vida (trabalho, família, lazer, esporte, cursos, etc.)? Está satisfeito?
PRA: Imenso sacrifício para consegui fazer tudo aquilo que tenho vontade, pela simples razão que eu tenho vontade de ler tudo, o tempo todo, em qualquer circunstância, assim como tenho vontade de viajar, de participar de atividades acadêmicas e intelectuais, tendo ao mesmo tempo de me desempenhar em funções atribuídas pela burocracia no meio de tudo isso. Ora, é praticamente impossível conciliar tantas vontades, e ainda ser um marido perfeito, um pai de família perfeito e outras coisas da vida social e relacional. Em síntese, esses outros aspectos foram de certa forma sacrificados no empenho pessoal em ler, estudar e escrever. Reconheço essas imperfeições, mas não se pode ter tudo na vida: escolhas são inevitáveis, e as minhas estão do lado da leitura, do saber e da escrita. São atividades nas quais eu me realizo plenamente. Em outros termos, ninguém consegue integrar todos os seus interesses perfeitamente, e algum aspecto (ou vários) acaba sempre sendo sacrificado; no meu caso, são horas de sono, de lazer, de simples far niente, e também certa negligência familiar, reconheço. Não pratico esportes, a não ser caminhadas moderadas, já em idade madura. Pratico leituras, com alguma intensidade, eu diria intensíssima, e sobretudo o gosto da escrita. No mais, sou um pouco eremita...

7. Quais os períodos de sua carreira que você mais gostou?
PRA: Todos, pois em todos e em cada um eu fiz aquilo que mais gosto: viajar, muito, intensamente, ler, também intensamente, escrever, observar, aprender, em toda e qualquer circunstância, mesmo em situações difíceis de abastecimento, conforto, restrições monetárias ou outras. Toda a minha carreira me trouxe algo de bom, mesmo em situações temporariamente de sacrifício. Nunca deixei de fazer aquilo que mais gosto, e que já foi descrito anteriormente.

8. Quais os períodos de sua carreira que você menos gostou?
PRA: Numa ou noutra situação, alguns postos apresentam dificuldades materiais, desconfortos psicológicos, desafios razoáveis: por pequenos momentos, chega-se a desejar voltar ao Brasil e retornar à rotina burocrática do cerrado central, onde os atrativos são menores, mas também as surpresas. De toda forma, sempre aproveitei os momentos de dificuldade para refletir e escrever, como sempre, aliás.

9. Dentro da perspectiva de sua carreira tem alguma coisa que você gostaria especialmente de evitar?
PRA: Sim, talvez eu devesse ter dedicado menos atenção aos livros e mais às pessoas, mas essas são escolhas que fazemos deliberadamente, por opções próprias, pensadas ou não. Quem tem a compulsão pela leitura e pela escrita, não consegue acalmar-se a menos de satisfazer o seu “vicio”, daí o sacrifício de outros aspectos da vida social que muita gente valoriza em primeiro lugar. Por outro lado, nunca, na carreira, fui obrigado a assumir obrigações que eu mesmo não desejasse assumir, como por exemplo trabalhar em áreas para as quais eu não me sinto talhado nem tenho a mínima vontade de experimentar: administração, por exemplo, ou cerimonial, ou talvez ainda consular. São áreas nas quais eu provavelmente me sentiria infeliz, pois o meu terreno natural são os estudos, de qualquer tipo: geográfico, político, econômico, cultura, antropológico, no sentido amplo. Todas as áreas funcionais de caráter geográfico, político ou sobretudo econômico me servem perfeitamente. Aliás, nunca me pediram para trabalhar em áreas nas quais eu não gosto, e se me pedissem eu não teria nenhuma hesitação em recusar, mesmo podendo incorrer em alguma falta funcional ou ser sancionado por isto. Sou um pouco anarquista, e não gosto de fazer o que me mandam e sim o que eu decido e gosto de fazer.
Por outro lado, jamais me pediram para escrever ou dizer algo que violentasse minha consciência, e eu não hesitaria um segundo em recusar-me terminantemente, como algumas vezes me recusei a defender determinados pontos de vista, que não eram os meus. Por outro lado, jamais enfrentei a obrigação de escrever naquele estilo clássico, ou chatérrimo, que é o diplomatês habitual, cheio de adjetivos hipócritas e de pura formalidade vazia: não tenho espírito, paciência nem disposição para esse tipo de enrolação. Costumo escrever o que penso, sem qualquer concessão a formalismos. Sobretudo, não costumo produzir bullshits, muito freqüentes nesta profissão...

10. Você tem objetivo em longo prazo na sua carreira? Você tem uma visão de futuro profissional?
PRA: Acredito que o diplomata deve servir antes à Nação do que a governos, deve defender valores, e não se subordinar a teses momentaneamente vitoriosas que por alguma eventualidade confrontem esses valores. Já escrevi algo a esse respeito, e remeto a meu trabalho: “Dez Regras Modernas de Diplomacia” (Chicago, 22 jul. 2001; São Paulo-Miami-Washington 12 ago. 2001, 6 p., n. 800; ensaio breve sobre novas regras da diplomacia; revista eletrônica Espaço Acadêmico, a. 1, n. 4, setembro de 2001; link: http://www.espacoacademico.com.br/004/04almeida.htm).

11. Você se considera realmente bom em quê? Quais são seus pontos fortes? E como você aproveita seus pontos fortes no seu trabalho?
PRA: Creio que sou capaz de fazer análises contextuais que envolvam conhecimento histórico, embasamento econômico e situação política, ou seja, tenho instrumentos analíticos e amplos conhecimentos que me permitem situar qualquer problema (ou quase) em um contexto mais amplo, e daí extrair alguns elementos de informação para a instrução de um processo decisório que tenha em conta o interesse nacional. Toda a minha vida eu estudei o Brasil e o mundo, visando tornar o primeiro melhor, num mundo que nem sempre é cooperativo. Registre-se que eu não pretendo tornar o Brasil melhor para si mesmo, ou seja, uma grande potência ou qualquer pretensão desse gênero, que encontro simplesmente ridícula. Eu pretendo tornar o Brasil melhor para os brasileiros, ponto. Contento-me apenas com isso. Minha perspectiva, a despeito de ser um funcionário de Estado, não é a do Estado. Não pretendo trabalhar no Estado, para o Estado, com o Estado: minha perspectiva é a dos indivíduos concretos, e meus objetivos são promover os indivíduos, se preciso for contra o Estado. Não tenho nenhum culto ao Estado e nem pretendo torná-lo maior ou mais poderoso, apenas mais eficiente para servir aos indivíduos, não a si mesmo. Desespera-me essas pretensões nacionalistas estatizantes, pois elas se fazem, em geral, em detrimento do bem-estar individual da maior parte dos cidadãos.
Por outro lado, não me considero patriota, no sentido corriqueiro do termo. Sou brasileiro por puro acidente geográfico, pois poderia ter nascido em qualquer outro país ou em qualquer outra época, por puro acaso. Gostaria de reiterar esse ponto, com toda a ênfase que me é permitida. Não sou dado a patriotismos, nem a chauvinismos ultrapassados e ridículos. A nacionalidade, repito, é um acidente geográfico, ou talvez seja a naturalidade, da qual decorre a primeira. Parto do pressuposto da unidade fundamental e universal da espécie humana. Sou brasileiro, como poderia ter sido esquimó, hotentote ou pigmeu, e ninguém seria responsável por esses acasos demográficos, nem mesmo meus pais, posto que ninguém “fabrica” uma pessoa com base em especificações pré-determinadas. Somos em parte o resultado da herança genética (em grande medida, talvez mais do que o indicado ou desejável, mas talvez não a parte mais decisiva de nossas personalidades); em parte o resultado do meio social e cultural no qual crescemos, e das influências que experimentamos involuntariamente em diversas etapas formativas de nosso caráter; e em parte ainda (o que espero mais substancial ou importante), somos o produto de nossa própria formação ativa, dos estudos empreendidos e dos esforços que fazemos nós mesmos para moldar nossas vidas, nosso estilo de comportamento e nossa maneira de pensar, com base em escolhas e preferências que adotamos ao longo da vida. Devemos sempre assumir responsabilidade pelo que somos, e jamais atribuir ao meio ou a qualquer herança genética determinados traços que podem eventualmente revelar-se menos funcionais para nosso desempenho profissional ou intelectual.
Meus pontos fortes, portanto, são minha capacidade analítica, meus conhecimentos acumulados e meu devotamento à causa dos indivíduos, não dos Estados, e sempre tento passar esses pontos à frente de qualquer outra consideração. Não hesito em defender meus pontos de vista, mesmo contra meus interesses imediatos, que poderiam recomendar uma acomodação com a situação presente – a lei da inércia é uma das mais disseminadas na humanidade – ou com autoridades de qualquer tipo. Não costumo fazer concessões a autoridades apenas para obter vantagens pessoais, e acho essa atitude basicamente correta (ainda que a um custo por vezes enorme no plano pessoal). Talvez seja teimosia de minha parte, mas considero isso antes uma virtude, do que um defeito. Enfim, tendo concepções fortes sobre determinados temas, me é muito mais fácil preparar e expor posições do interesse do Brasil, com base em conhecimentos previamente acumulados, o que me dispensa de longas pesquisas ou buscas em arquivos.

12. Quais são seus pontos fracos?
PRA: Devo ter (e tenho) vários, sendo os mais evidentes essa introversão habitual, essa preferência ao convívio com os livros, mais do que a convivência com pessoas, uma certa arrogância intelectual (que reconheço plenamente), derivada de leituras intensas e de uma imensa acumulação de conhecimentos e informações – que em excesso podem ser prejudiciais, dizem alguns – essa pretensão a saber mais do que os outros (o que em parte é verdade, pela simples intensidade de leituras, mas os outros não gostam que se lhes confronte os argumentos, obviamente). Por outro lado, não tenho nenhum respeito pela hierarquia ou pela autoridade, o que muitos consideram um defeito (mas não eu, dado meu anarquismo particular). Não sou de respeitar o argumento da autoridade, mas apenas a autoridade do argumento, a lógica impecável, e a decisão bem formulada, posto que empiricamente embasada, tecnicamente sólida, com menor custo-oportunidade ou a melhor relação custo-benefício. Enfim, sou um racionalista, e detesto impressionismos e subjetivismos, o que é muito fácil de encontrar em quaisquer meios. Daí choques inevitáveis com determinadas pessoas que pretendem mandar a partir de sua vontade exclusiva, não de um estudo aprofundado de situação. Enfim, ser rebelde assim deve ser um defeito...

13. O que você mais deseja na sua carreira?
PRA: Todos somos egocêntricos ou narcisistas em certa medida. Todos queremos reconhecimento e prestígio, por mais que se diga o contrário. Todos queremos ser elogiados e premiados (no meu caso não monetariamente ou em qualquer aspecto material). Assim, desejo ser reconhecido não necessariamente como um bom diplomata, mas simplesmente como um bom cidadão, alguém que cumpre seus deveres e atua conscienciosamente em benefício da maioria (que calha de ser o povo brasileiro, mas poderia ser qualquer outro, pois como disse, eu me coloco do ponto de vista dos indivíduos, não do Estado). Gostaria de ser reconhecido como estudioso, como esforçado e, sobretudo, como alguém comprometido com o bem comum. Pode ser vaidade, mas é assim que vejo minha carreira, que para mim não é uma simples carreira de Estado, mas sim uma atividade que me coloca no centro (ou pelo menos numa das agências) do Estado, ali colocado para servir a pessoas, não a instituições abstratas.
Gostaria que se dissesse de mim, em algum momento futuro: foi um funcionário dedicado, foi um homem bom, esforçado, devotado ao bem comum, sobretudo foi correto consigo mesmo e com todas as instâncias de interação social ou profissional. Praticou a honestidade intelectual e se esforçou para fazer do Brasil e do mundo lugares melhores do que aqueles que encontrou em sua etapa inicial de vida.

14. O que você pensa que acontecerá à sua carreira nos próximos dez anos?
PRA: Nada de muito relevante, posto que não sou carreirista e não faço da carreira o centro de minhas preocupações intelectuais ou sequer materiais. Estou na carreira diplomática, como poderia estar na academia ou em alguma outra atividade que tenha a ver com o estudo, o esforço intelectual, a análise e a elaboração de propostas. Sou basicamente um intelectual e a carreira para mim é secundária. Provavelmente vou me aposentar nos próximos dez anos, e aí dispor de todo o meu tempo livre para me dedicar àquilo de que mais gosto: leitura, redação, um pouco de aulas e palestras, viagens, alguns prazeres materiais (como a gastronomia, ou a gourmandise, por exemplo) e espero ter condições físicas de continuar escrevendo, ensinando e colaborando com a elevação intelectual da sociedade pelo maior tempo possível. Se me sobrar tempo gostaria de consertar algumas coisas que encontro muito erradas no Brasil, como por exemplo: a corrupção (generalizada em todas as esferas), a desonestidade intelectual nas academias, a miséria material de grande parte da população (que decorre, em minha opinião, de políticas erradas e do excesso de poderes conferidos ao Estado), enfim, tudo aquilo que sabemos errado em nosso País.

15. O que você aconselharia para alguém que estivesse iniciando na mesma área?
PRA: Seja estudioso, dedicado, honesto intelectualmente, esforçado no trabalho, um pouco (mas apenas um pouco) obediente, inovador, curioso, questionador – mas ostentando um ceticismo sadio, não uma desconfiança doentia –, tente aprender com as adversidades, trate todo mundo bem (e, para mim, da mesma forma, um porteiro e um presidente), não seja preguiçoso (embora dormir seja sumamente agradável), cultive as pessoas, mais do que os livros (o que eu mesmo não faço), seja amado e ame alguém, ou mais de um... Enfim, seja um pouco rebelde, também, pois a humanidade só avança com aqueles que contestam as situações estabelecidas, desafiam o status quo, tomam novos caminhos, propõem novas soluções a velhos problemas (alguns novos também). No meio de tudo isso, não se leve muito a sério, pois a vida é uma só – sim, sou absolutamente irreligioso – e vale a pena se divertir um pouco. Tudo o que eu falei ou escrevi acima, parece sério demais. Não se leve muito a sério, tenha tempo de se divertir, de contentar a si mesmo e os que o cercam.

Brasília, 21 de maio de 2009.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Varnhagen: diplomacia e pensamento estrategico - seminario no Itamaraty (31/03/2016)

O Bicentenário de Varnhagen

 

Sérgio Eduardo Moreira Lima

Presidente da Fundação Alexandre de Gusmão

 

Comemora-se este ano o bicentenário do nascimento do diplomata oitocentista Francisco Adolfo de Varnhagen (1816-1878). É notória sua contribuição para a historiografia brasileira, tendo sido considerado por Capistrano de Abreu o maior historiador de sua época. O Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) e a Academia Brasileira de Letras, duas instituições às quais está associado, têm previstas homenagens com foco no seu papel na História e na Literatura.  A FUNAG, como braço acadêmico do Itamaraty, em parceria com o Instituto Rio Branco e com a Universidade de Brasília, marcará a efeméride com a realização de seminário sobre Diplomacia e Pensamento Estratégico na Concepção de Varnhagen e sobre sua participação,durante o Império, no projeto de transferência da capital.  

 

2.O propósito desta iniciativa é estimular a pesquisa e o debate em torno de personagens brasileiros que marcaram sua épocadistinguiram-se em suas atividades a ponto de integrar a memória nacional. É importante que se discuta o alcance de sua obra do ponto de vista dos princípios e valores que inspirou e dos interesses maiores da nação a que serviu. Varnhagen teve o mérito de pensar o Brasil de uma perspectiva geopolítica e geoestratégica. Para ele, a ação diplomática deveria orientar-se nessa direção como instrumento na realização de propósitos que levariam ao ideal de grandeza nacional. Sua formação militar e as pesquisas que conduziu a respeito das fronteiras e dos espaços brasileiros ainda em Portugal permitiram-lhe um juízo amadurecido e um conhecimento detalhado de questões cruciais na defesa dos interesses da pátria. 

 

3.Quando visitei recentemente o Memorial Juscelino Kubistchekpude verificar que ali se encontra o barômetro de Varnhagen como a pedir um estudo mais aprofundado sobre aquele instrumento de medição e um maior reconhecimento dos esforços do diplomata na gênese do processo de integração territorial brasileiro. Em sequência ao projeto de José Bonifácio (1823), Varnhagenentão representante do Brasil na Áustria de Francisco I, realizou, em 1877, a primeira expedição ao Planalto Central para a identificação do local para a futura capital. Oficializada pelo Ministério da Agricultura, a aventura, que logrou superar todas as dificuldades da época, visava ao reconhecimento de regiões propícias à participação europeia no esforço de povoamento e desenvolvimento do centro-oeste do País. A viagem foi precursora da Missão Crulscomo era chamada a Comissão Exploradora do Planalto Central do Brasil, formada, em 1892, pelo engenheiro belga Luís Cruls, diretor do Observatório Astronômico do Rio de Janeiro, e outros 21 membros, entre cientistas, técnicos e militares, que seguiu o mesmo roteiro percorrido por Varnhagen.

 

4.Em 2013, a Fundação Alexandre de Gusmão publicou, em trêsvolumes, a obra Pensamento Diplomático Brasileiro, Formuladores e Agentes da Politica Externa (1750-1964), que reúne ensaios de acadêmicos, historiadores e diplomatas. Dentre os personagens selecionadopara figurar no estudo, encontra-se Francisco Adolfo de Varnhagen. Coube ao Presidente do IHGB, Professor Arno Wehling, respeitado historiador e biógrafo do personagem, explicar a contribuição do brasileiro de Sorocaba, filho de pai alemão e mãe portuguesa, ao pensamento da diplomacia brasileira. Trata-se de um dos trabalhos maisreveladores sobre o biografado já elaborados na busca de responder àquestão sobre a contribuição de Varnhagen ao pensamento diplomático brasileiro. A obraassim como o ensaio citado, pode ser consultada na Biblioteca Digital gratuitamente (www.funag.gov.br).

 

5.texto do Professor Wehling é revelador do alcance e da atualidade do pensamento diplomático de Varnhagen. Sua visão estratégica das bacias hidrográficas e dos limites territoriais, relacionada à defesa e precocemente à integração nacional, repercute no próprioconceito orientador da localização da futura capital do País no divisor de águas, ou seja, na confluência dos grandes rios que fluem e aproximam a imensidão do espaço brasileiro. Igual interesse demonstrava no tocante aos povos indígenas, às questões da navegação do rio Amazonas e das fronteiras com potências europeias no norte. Suas concepções e diretrizes contribuíram para a consciência geopolítica da importância desses espaços, mas também para a valorização do direito internacional, na melhor tradição da diplomacia pátria. 

 

6.O Seminário servirá de estímulo à reflexão sobre a atualidade da obra e do pensamento de Francisco Adolfo de Varnhagen. Os temas referidos evoluíram e adquiriram importância econômica, ambiental e de integração regional, cujo impacto se observa também nos planos nacional e global, à luz das preocupações com mudança de clima e compromissos com o desenvolvimento sustentável, sem prejuízo de uma perspectiva geopolítica e estratégica. 

 

Seminário Diplomacia e Pensamento Estratégico na Concepção de Varnhagen

 

Data: 31 de março de 2016  às  15 horas   

Local: Brasília, IRBr

Organizadores: FUNAG, IRBr, UnB, IHGB

 

Projeto de programa:     

 

15.00 hs  - Abertura: Diretor do IRBr, Embaixador Gonçalo Mourão 

​         Professor Jarbas Silva Marques, IHDF

 Presidente da FUNAG, Embaixador Sérgio E. Moreira Lima

 

15.10Pensamento Estratégico e diplomacia na Concepção de Varnhagen 

Presidente do IHGB, Professor Arno Wehling

 

16.00 hs -  Varnhagen entre os primeiros historiadores do Brasil e sua

 contribuição para a formação da nacionalidade

Embaixador Luiz Felipe de Seixas Corrêa

Intervalo 

 

16.50 hsVarnhagen e a América do Sul

Ministro Luis Claudio Villafañe Gomes Santos

 

17. 20 hs Geopolítica de Varnhagen e seus discípulos

Ministro Paulo Roberto de Almeida

17.50 hsVarnhagen e o espaço brasileiro(?)

Embaixador Synesio Sampaio Goes Filho

18.20 hsDebate

 

19.00 hs Encerramento

 

Biografia de Varnhagen

 

Nasceu em 17 de fevereiro de 1816, em Sorocaba, São Paulo, filho do engenheiro alemão - o Coronel Frederico Luís Guilherme de Varnhagen e de . Maria Flávia de Sá Magalhães, de nacionalidade portuguesa. Seu pai, um dos pioneiros da fundição de ferro no Brasil, aqui chegou em 1809, contratado para iniciar os trabalhos da fábrica de São João de Ipanema, onde permaneceria até 1821, quando resolveu retornar à Europa e fixar-se com a família em Portugal. 

Cursou o Real Colégio Militar da Luz (Lisboa), matriculando-se, em seguida, na Academia da Marinha. Aderiu à causa do ex-Imperador D. Pedro I, na disputa pela coroa portuguesa, engajado no 2º Batalhão de Artilharia. Promovido a oficial, ingressou na Academia de Fortificações, onde concluiu o curso de engenheiro militar em 1834. Estudioso da poesia medieval lusitana, frequentador das rodas literárias lisboetas, aproximou-se de Alexandre Herculano e do Cardeal D. Francisco de São Luís, o que lhe valeu uma recomendação para ter acesso aos arquivos da Torre do Tombo. Lá, ele iniciaria suas atividades na pesquisa documental, encontrando um tesouro praticamente intocado, que soube explorar como ninguém, conforme notou Capistrano de Abreu. Dentre inúmeros achados, descobriu por códice o apógrafo do Roteiro do Brasil, de Gabriel Soares de Sousa, cuja edição crítica lhe serviu de proficiência para ser admitido na Academia Real de Ciências de Lisboa. Em 1840, licenciou-se do exército português e viajou para o Rio de Janeiro, a fim de pleitear a nacionalidade brasileira. Na ocasião, foi eleito sócio correspondente do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro – o IHGB, que nessa época havia iniciado um programa de investigação, subsidiado pelo governo imperial, enviando estudiosos aos arquivos europeus, a fim de coletar e extrair cópia de documentos e diplomas para a escrita da história pátria. Entretanto, o primeiro pesquisador comissionado, o diplomata Dr. José Maria do Amaral, não pode dar conta das tarefas que lhe foram confiadas. Para substituí-lo, foi indicado o nome de Varnhagen, de reconhecida experiência no manuseio dos papéis da Torre do Tombo, e que desejava ingressar na carreira diplomática. 

Designado para levantar documentos relativos aos tratados de limites da América Portuguesa, nos arquivos de Simancas, ele desempenhou com sucesso suas primeiras missões em Portugal e na Espanha. Regressando ao Brasil em 1851, ocupou o cargo de Primeiro Secretário do Instituto Histórico. Diligente, organizou a biblioteca e o rico acervo documental do grêmio. A par disso, conquistou a simpatia do Imperador D. Pedro II, assíduo frequentador daquele reduto letrado, o que lhe possibilitou pleitear postos, condecorações e honrarias, além da proteção de Sua Majestade. Sem negligenciar as atribuições do serviço diplomático, continuou dedicado às pesquisas e publicações. Encarregado de negócios do Brasil na Espanha (1852-1858), estendeu suas investigações aos arquivos de Amsterdam, Paris, Florença e Roma. Data dessa temporada na Europa, o lançamento da sua História geral do Brasil antes da sua separação e independência de Portugal (Madri, 1854-1857). Promovido ao posto de ministro residente, representou a chancelaria imperial em diversos países da América do Sul (1859 e 1867). Durante a permanência no Chile, casou-se e constituiu família com uma jovem da sociedade local. Em 1868, foi nomeado para a legação brasileira em Viena. Realizou, ainda, uma última viagem de estudos ao Brasil em 1877, ocasião em que percorreu o interior das províncias de São Paulo, Goiás e Bahia. Regressando à Viena, veio a falecer em 26 de junho de 1878. Sepultado no Chile, por exigência da esposa, um século mais tarde, os despojos do historiador seriam trasladados para Sorocaba, onde hoje se encontram, atendendo à sua vontade expressa em testamento. Pertenceu ao quadro social de importantes associações científicas internacionais: Academia de Ciências de Munique, Sociedade de Geografia de Paris e Instituto Histórico e Geográfico do Rio da Prata além da já citada Academia Real de Ciências de Lisboa. Membro do Conselho do Imperador, Grande do Império, Comendador da Ordem da Rosa, Cavaleiro da Ordem de Cristo. Agraciado com a Grã-Cruz das Ordens de Santo Estanislau, da Rússia; da Coroa de Ferro, da Áustria; de Isabel, a Católica e de Carlos II, da Espanha. Como reconhecimento aos seus méritos, D. Pedro II concedeu-lhe o título de Barão de Porto Seguro, em 1872. Dois anos mais tarde, elevou-o a Visconde com honras de grandeza.

Deixou uma extensa e variada bibliografia, composta por dezenas de títulos, entre livros, opúsculos, artigos e memórias, abrangendo estudos literários, etnográficos, filológicos e históricos. Sua obra máxima foi, sem dúvida, a História geral do Brasil antes da sua separação e independência de Portugal, trabalho de fôlego, que contrastava com a escassa historiografia nacional da época. Deve-se notar que a contribuição pretendia não apenas reconstituir o passado do país recém-emancipado, dando-lhe unidade e coerência, mas também concorrer para a consolidação das instituições monárquicas. É bem verdade que o livro foi recebido com frieza no Brasil, devido ao tratamento pouco simpático dispensado aos gentios e aos jesuítas, apesar dos elogios que recebeu dos maiores brasilianistas de então, o bibliotecário francês Ferdinand Denis e o naturalista alemão Von Martius. No âmbito do Instituto Histórico, onde prevalecia uma visão romântica das origens da Nação de viés indigenista, o trabalho mereceu réplicas do Cônego Fernandes Pinheiro e de Gonçalves de Magalhães, tendo este último sustentado um áspero debate com Varnhagen, que na arena acadêmica costumava pôr de lado a proverbial cortesia de diplomata, transformando-se num polemista intransigente, incapaz de absorver qualquer apreciação crítica. Dentre suas memoráveis discussões, cabe ainda lembrar o litígio com José Inácio de Abreu e Lima, autor do Compêndio de História do Brasil, a quem chamou de plagiário difamador que se intitula general, a propósito das fontes utilizadas na elaboração daquela obra. Outro que também não escapou da sua pena afiada foi o geógrafo francês M. D´Avezac, que censurou a História geral do Brasil pela ausência de uma descrição prévia do país e de seus primitivos habitantes, tópicos privilegiados pelo inglês Robert Southey, na sua History of Brazil (1811-1819). Revidando o questionamento, Varnhagen desautorizou o trabalho de Southey, reduzindo-o a uma simples Memória para escrever-se a história do Brasil e dos países do Prata. Polêmicas a parte, não se pode negar que o Visconde de Porto Seguro foi o maior historiador de sua época, pela extensão da obra, dos fatos que revelou, das fontes que descobriu, pela publicação de inéditos, enfim, pelo seu enorme esforço e determinação, como bem assinalou Capistrano de Abreu, no necrológio que lhe dedicou.