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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

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segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

As relacoes internacionais e a estrutura constitucional do Brasil - ensaios Paulo Roberto de Almeida

Minha mais recente compilação, na sequência desta anterior:  Eleições presidenciais no Brasil: Relações internacionais, política externa e diplomacia brasileira, 1985-2018, plataforma Academia.edu (https://www.academia.edu/s/01644a871c/eleicoes-presidenciais-no-brasil-relacoes-internacionais-politica-externa-e-diplomacia-brasileira-1985-2018), num universo paralelo, aqui:



3240. Estrutura Constitucional e Interface Internacional do Brasil: Relações internacionais, política externa e Constituição, Brasília, 29 janeiro 2018, 146 p. Compilação seletiva de ensaios sobre essa temática, elaborados depois de 1996, como complemento ao livro Parlamento e Política Externa (1996). Disponível na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/s/abb1188ce4/estrutura-constitucional-e-interface-internacional-do-brasil



“O problema brasileiro nunca foi fabricar Constituições, e sim cumpri-las.” 
Roberto Campos, Lanterna na Popa (memórias), 1994.


Índice



Apresentação: A Constituição e as relações internacionais do Brasil , 11

Sumário do livro Parlamento e Política Externa (1996)  , 13



1. Consequências econômicas das constituições brasileiras, 1824-1946 (2015) , 15

2. A estrutura constitucional das relações internacionais (1999) , 39

3. Brasil: um Prometeu acorrentado pela sua própria Constituição (2007) , 73

4. A Constituição brasileira contra o Brasil (2013)   , 95



Apêndices

Relação de trabalhos sobre relações internacionais e constituição, 1986-2015 , 135

Livros de Paulo Roberto de Almeida ,139

Nota sobre o autor , 143



 
Apresentação

A Constituição e as relações internacionais do Brasil





Em 1996, uma vez efetuadas, por iniciativa do governo Fernando Henrique Cardoso, diversas reformas ao texto de da Constituição 1988, sob a forma de emendas constitucionais, eu decidi juntar num único volume, organizado sob a forma de edição de autor, os diversos textos que eu tinha elaborado desde a democratização, em especial no contexto do processo de reelaboração constituição, até meados daquele ano. O volume, montado artesanalmente, praticamente não teve circulação, mas entreguei um exemplar encadernado à biblioteca do Itamaraty. Depois, em formato pdf, resolvi coloca-lo à disposição dos interessados em minha página na plataforma Academia.edu. O sumário desse volume, Parlamento e Política Externa, está transcrito na sequência imediata desta apresentação.

A partir daquele ano, trabalhei pouco no esforço de explicar didaticamente os dispositivos constitucionais relativos às relações internacionais do Brasil, passando a repetir, em artigos de periódicos ou capítulos de meus livros subsequentes muito do que eu já havia escrito anteriormente. Alguns desses trabalhos se encontram coletados neste novo volume, que consolida alguns exemplos da produção ulterior, divulgado em vários veículos em tempos diversos, o que explica, portanto, alguma repetição que será inevitável encontrar nos ensaios compilados. Mas, depois dessas “explicações pedagógicas”, eu, na verdade, dediquei-me bem mais a criticar aquilo que eu chamei de esquizofrenia econômica da Constituição de 1988 (e diversas emendas posteriores), o que também se reflete em algumas repetições nos trabalhos mais recentes.

O que vai aqui, portanto, é uma simples seleção de trabalhos relativos ao mesmo objeto político, as relações internacionais nas constituições brasileiras, com ênfase em seus capítulos econômicos, e, obviamente, na sua crítica. Este volume pode ser lido como um complemento ao imediatamente anterior: Eleições presidenciais no Brasil: Relações internacionais, política externa e diplomacia brasileira, 1985-2018 (Brasília, 25 janeiro 2018, 299 p.), cujo o sumário foi postado no blog Diplomatizzando (http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2018/01/politica-externa-e-eleicoes.html) e o arquivo completo encontra-se disponibilizado na plataforma Academia.edu (https://www.academia.edu/s/01644a871c/eleicoes-presidenciais-no-brasil-relacoes-internacionais-politica-externa-e-diplomacia-brasileira-1985-2018), como aliás este aqui também. Ambos fazem parte de um esforço de recuperação de trabalhos dispersos, por vezes separados por décadas inteiras, mas que oferecem um testemunho da mesma disposição pessoal em analisar questões relevantes de nossa organização política e econômica, sempre com o objetivo de servir de informação didática e de orientação pedagógica aos que estudam a interface relações internacionais-sistema político brasileiro.

Espero que estas compilações, livremente disponíveis, sirvam a objetivos de estudo e debate sobre nossas peculiaridades constitucionais e idiossincrasias conceituais (ou o que passa por), uma vez que considero que o Brasil é um país que encontra-se, como disse num dos meus ensaios, “amarrado pela sua própria Constituição”. Talvez algum dia, a cidadania force os “representantes do povo” a substituir o prolixo texto atual por uma Carta mais enxuta, dando mais liberdade a todos os brasileiros, em especial os homens de negócios, como aos simples trabalhadores. Minha impressão, contudo, é que isso vai demorar, e o Brasil vai continuar como um Prometeu acorrentado por uma Constituição que simplesmente impede uma taxa mais vigorosa de crescimento econômico e, em consequência, de desenvolvimento social.

Alguns de meus ensaios mais recentes, assim como outros do volume anterior, explicam porque estamos nos arrastando penosamente em direção à modernidade com uma bola de ferro amarrada nos pés. Vamos nos libertar? Duvido...





Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 29 de janeiro de 2018



 A íntegra do volume pode ser acessada neste link de Academia.edu: 
https://www.academia.edu/s/abb1188ce4/estrutura-constitucional-e-interface-internacional-do-brasil

domingo, 28 de janeiro de 2018

STF agride a democracia, diz jurista da USP - Conrado Hubner Mendes (FSP)


Na prática, ministros do STF agridem a democracia, escreve professor da USP
CONRADO HÜBNER MENDES
Folha de S. Paulo, Ilustríssima, 28/01/2018

Resumo: Professor de direito constitucional da USP faz duras críticas ao STF. Afirma que, numa espiral de autodegradação, passou de poder moderador a poder tensionador, que multiplica incertezas e acirra conflitos. Explicações para isso se encontram na atuação dos ministros e no desarranjo de ritos e procedimentos.
*
O Supremo Tribunal Federal é protagonista de uma democracia em desencanto. Os lances mais sintomáticos da recente degeneração da política brasileira passam por ali. A corte está em dívida com muitas perguntas, novas e velhas, e vale lembrar algumas delas antes que os tribunais voltem do descanso anual nos próximos dias.
Se Delcídio do Amaral (PT-MS), Eduardo Cunha (MDB-RJ), Renan Calheiros (MDB-AL) e Aécio Neves (PSDB-MG) detinham as mesmas prerrogativas parlamentares, por que, diante das evidências de crime, receberam tratamento diverso?
Se houve desvio de finalidade no ato da presidente Dilma Rousseff (PT) em nomear Lula (PT) como ministro, por que não teria havido o mesmo na conversão, pelo presidente Michel Temer (MDB), de Moreira Franco (MDB) em ministro?
Se o STF autorizou a prisão após condenação em segunda instância, por que ministros continuam a conceder habeas corpus contra a orientação do plenário, como se o precedente não existisse?
Se a restrição ao foro privilegiado já tem oito votos favoráveis, pode um ministro pedir vista sob alegação de que o Congresso se manifestará a respeito? Pode ignorar o prazo para devolução do processo?
Se lá chegam tantos casos centrais da agenda do país, como pode um magistrado, sozinho, manipular a pauta pública ao seu sabor (por meio de pedidos de vista, de liminares engavetadas etc.)?
Se o auxílio-moradia para juízes, criado em 2014, custa ao país mais de R$ 1 bilhão por ano, como pôde um ministro impedir que o plenário se manifestasse até aqui? Se a criminalização do porte de drogas responde por grande parte do encarceramento em massa brasileiro, como pode um pedido de vista interromper, por anos, um caso que atenuaria o colapso humanitário das prisões?
Se um ministro afirma que Ricardo Lewandowski "não passa na prova dos 9 do jardim de infância do direito constitucional", que Luís Roberto Barroso tem moral "muito baixinha", que Marco Aurélio é "velhaco", que Luiz Fux inventou o "AI-5 do Judiciário", que Rodrigo Janot é "delinquente" e que Deltan Dallagnol é "cretino absoluto", e além disso tem amigos espalhados entre o empresariado e a classe política julgados pelo STF, como expressará isenção nesses casos?
Se a Lei Orgânica da Magistratura proíbe juízes de se manifestarem sobre casos da pauta, como podem ministros antecipar posições a todo momento nos jornais?
A lista de perguntas poderia seguir, mas já basta para notar o que importa: as respostas terão menos relação com o direito e com a Constituição do que com inclinações políticas, fidelidades corporativistas, afinidades afetivas e autointeresse.
O fio narrativo, portanto, pede a arte de um romancista, não a análise de um jurista. Ao se prestar a folhetim político, o STF abdica de seu papel constitucional e ataca o projeto de democracia.
CHOQUE DE REALIDADE
A separação de Poderes conferiu lugar peculiar ao Supremo. O Parlamento é eleito, o STF não. O parlamentar pode ser cobrado e punido por seus eleitores, os ministros do STF não. O presidente da República é eleito e costuma ser o primeiro alvo das ruas, os membros do STF estão longe disso. A corte suprema tem o poder de revogar decisões de representantes eleitos.
É um tribunal que se autorregula e não responde a ninguém. O que justifica tanto poder e a imunização contra canais democráticos de controle?
Há boas respostas teóricas para esse arranjo. Para alguns, a integridade constitucional depende de um órgão capaz de pairar acima dos conflitos partidários, praticar a imparcialidade e assumir o papel de poder moderador. Para outros, mais do que apenas moderar, caberia ao tribunal inspirar respeito por seus argumentos jurídicos, que tecem padrões decisórios e constroem jurisprudência.
A autoimagem construída pelo STF foi ainda mais longe. Apresentou-se como a última trincheira dos cidadãos, incumbido da missão de salvar a democracia de si mesma, domesticar maiorias, amparar e incluir minorias.
No ápice da automistificação, o ministro Barroso imaginou a corte como "vanguarda iluminista que empurre a história" na direção do progresso moral e civilizatório (Vinicius Mota descreveu a ideia no dia 14/1).
A crise política e a erosão de direitos dos últimos anos trouxeram ao Supremo a oportunidade (e o ônus) de atender a suas promessas. A resposta, porém, foi um choque de realidade.
O desarranjo procedimental cobrou seu preço. Despreparado para a magnitude do desafio, o tribunal reagiu da forma lotérica e volátil de sempre. A prática do STF ridiculariza aquele autorretrato heroico, frustra as mais modestas expectativas e corrói sua pretensão de legitimidade.
Por não conseguir encarnar o papel de árbitro, o tribunal tornou-se partícipe da crise. Já não é mais visto como aplicador equidistante do direito, mas como adversário ou parceiro de atores políticos diversos. Desse caminho é difícil voltar.
Atado a uma espiral de autodegradação, o poder moderador converteu-se em poder tensionador, que multiplica incertezas e acirra conflitos. O ator que deveria apagar incêndios fez-se incendiário. Não foi vítima da conjuntura, mas da própria inépcia. A vanguarda iluminista na aspiração descobriu-se vanguarda ilusionista na ação (e na inação).
ILUSIONISMO
Como opera esse poder tensionador? Para decifrar a vanguarda ilusionista, precisamos olhar para além do resultado de cada decisão (se prende ou solta, se anula ou valida). Deve-se prestar mais atenção ao procedimento que gerou tal resultado e ao argumento que o justifica. É no procedimento e no argumento que mora o ilusionismo.
A síntese do desgoverno procedimental do STF está em duas regras não escritas: quando um não quer, 11 não decidem; quando um quer, decide sozinho por liminar e sujeita o tribunal ao seu juízo de oportunidade. Praticam obstrução passiva no primeiro caso, e obstrução ativa no segundo.
A contradição entre as duas regras é só aparente, pois a arte do ilusionismo permite sua coexistência. Manda a lógica do "cada um por si", nas palavras de editorial da Folha (24/12).
O argumento constitucional do Supremo já não vale o quanto pesa e tornou-se embrulho opaco para escolhas de ocasião. Basta olhar com lupa as incoerências na fundamentação de casos juridicamente semelhantes que recebem decisão diversa.
A expressão "jurisprudência do STF" sobrevive como licença poética, pois perdeu capacidade de descrever ou nortear a prática decisória do tribunal. Perdeu dignidade conceitual e até mesmo retórica.
No âmbito da esfera pública, o ilusionismo serve para desviar a atenção, responder o que não se perguntou, jogar fumaça na controvérsia e confundir o interlocutor.
O ministro Gilmar Mendes, por exemplo, é praticante rotineiro dessa técnica. Publicou nesta Folha (17/1) artigo em defesa do habeas corpus (HC). Invoca o direito abstrato à liberdade, do qual ninguém discordará, e se desvia das críticas contra suas decisões recentes.
As críticas às quais Mendes reage nunca miraram o HC em si, mas as evidências de suspeição para julgar, de forma monocrática, pessoas do seu círculo pessoal e político. O ministro se apresenta como defensor da liberdade, mas suas decisões passam a impressão de ser defensor dos amigos. Para dissipar essa impressão, basta que se declare suspeito —o que se recusa a fazer.
Manha ilusionista: discursar sobre o ideal revolucionário da liberdade e silenciar sobre a liberdade concedida a amigos indiciados.
O ilusionismo, nas suas faces procedimental e argumentativa, retira das decisões do STF o selo de integridade institucional.
Por essa razão, tem sido pouco útil aos advogados e analistas da corte perguntar se o texto da Constituição é lido de modo apropriado, se nossas categorias de análise dão conta da tarefa interpretativa e se o tribunal pratica ativismo ou deferência —questões nobres do debate constitucional.
Mais importante é conhecer a biografia do ministro e sua capacidade de atender a ética da imparcialidade, da responsabilidade e da colegialidade.

A ambição do Estado de Direito é produzir um "governo das leis, não dos homens". Soa como slogan a serviço da distorção ideológica, mas o sentido da expressão não tem nada de esotérico.
A mensagem é mais modesta: não quer dizer que o aparato institucional de interpretação e aplicação das leis deva ser composto por sujeitos sobre-humanos, imunes a afetos e interesses, mas apenas que esses sujeitos devem ter compromisso ético para decidir com maior isenção e ponderação analítica, além de gozar de garantias contra a pressão da barganha política. Não requer muito mais que isso.
A prática do STF pede adaptação daquela máxima: a interpretação constitucional deve estar submetida ao "governo do Supremo, não dos ministros". O tribunal, porém, tem sido governado pelo voluntarismo incontinente de seus membros. É muito poder individual de fato (e de legalidade duvidosa) para ser usado com tanta extravagância.
Como disse José Sarney, anos atrás, "um dos maiores desserviços ao país é desprestigiar o Supremo Tribunal Federal". Esse desserviço ao STF vem sendo prestado pelos seus próprios membros. Isso traz consequências.
ARBÍTRIO
O tempo do STF é místico. A corte pode tomar uma decisão em 20 horas ou em 20 anos (como publicou Ivar Hartmann, neste mesmo caderno, em 28/5 de 2017). A duração de um caso não guarda nenhuma relação com sua complexidade jurídica, sua importância política ou o excesso de trabalho do tribunal —alegações usuais de ministros.
É fruto, sim, da idiossincrasia e do instinto de cada julgador. E, às vezes, de negociações nos bastidores palacianos e corporativos.
Ninguém melhor que o ex-deputado Eduardo Cunha para iluminar o problema. Quando afastado de seu mandato pelo STF em 2016, ironizou com a pergunta cínica que muitos se fizeram: "Se havia urgência, por que levou seis meses?" Em outras palavras: por que agora?
Uma ótima questão, que poderia ser aplicada a muitos casos (por exemplo, o pacote natalino de liminares, todas monocráticas e abruptas, tomadas no apagar das luzes de 2017, antes de o Judiciário sair de férias).
Lewandowski, presidente da corte em 2016, desconversou: "O tempo do Judiciário não é o tempo da política e nem é o tempo da mídia. Temos ritos, procedimentos e prazos que devemos observar".
A resposta é mais um artefato ilusionista. Quando diz que o tempo do Judiciário não é o tempo da política nem o da mídia, recorre a um árido lugar-comum para se esquivar do que se queria saber. A resposta também ignora a inteligência empírica que vem sendo construída ao longo dos último anos sobre o STF por um crescente grupo de estudiosos da corte.
A definição arbitrária do seu tempo decisório é mais uma faculdade que o Supremo conferiu a si mesmo e não explicou a ninguém, um dos poderes mais antidemocráticos que um tribunal pode ter.
INSEGURANÇA
Pede-se a tribunais que produzam segurança jurídica e previsibilidade. Esse fim costuma ser entendido apenas como demanda de conteúdo: que pudéssemos estimar, com algum grau de certeza, à luz das decisões passadas da corte, o que decidirá em casos semelhantes no futuro.
Não é um objetivo possível de realizar por completo, pois muitos casos, apesar de sua similaridade de superfície, suscitam variações interpretativas genuínas.
Ainda que frustre expectativas, é desejável que a jurisprudência tenha um grau de elasticidade. Mas existe uma faceta mais básica da segurança jurídica: a expectativa de que tomará uma decisão em tempo razoável ou sabido. Trata-se de previsibilidade de segunda ordem.
O STF, no entanto, não só tirou a credibilidade da noção de jurisprudência como também nos sonega a possibilidade de saber quando uma decisão será tomada. Em certos casos, não estamos seguros sequer de que haverá decisão, qualquer que ela seja.
Se o STF passasse a observar, de modo criterioso e transparente, "ritos, procedimentos e prazos", como quis Lewandowski, já seria um gesto quase revolucionário.
Entretanto, a loteria de agenda, somada ao seu oceano de casos, prejudica a construção de uma esfera pública constitucional, de um espaço em que debates democráticos possam se desenvolver, que atores interessados possam mobilizar energia e recursos para participar. Esperam apenas que seus argumentos sejam respondidos e uma decisão seja tomada em tempo publicamente justificado.
Vale a pena observar outras cortes no mundo. Ainda que a comparação tenha limites, pois cada tribunal tem seu próprio desenho, volume de casos e contexto, mostraria, por exemplo, que a discricionariedade com o tempo não é exclusividade do Supremo.
Nem todo tribunal tem a disciplina com o tempo que possuem a Suprema Corte dos Estados Unidos ou a Corte Constitucional da África do Sul. Como ambas decidem poucas dezenas de casos por ano, a tarefa fica menos difícil.
Se olharmos para as cortes espanhola ou mexicana, alemã ou argentina, indiana ou chilena, veremos um mapa muito plural de gestão do procedimento, com problemas particulares. Em nenhuma delas, porém, se consegue encontrar tamanha libertinagem de obstrução individual de ministros.
PERDA DO RESPEITO
Um bom observador do comportamento judicial aprende depressa que "cortes não fazem o que dizem e nem dizem o que fazem". Pelo menos parte do tempo.
Essa máxima é ainda mais certeira quando aplicada a um tribunal de cúpula, que precisa administrar dinamites da democracia. A crônica constitucional só perde a inocência quando está apta a detectar a dissonância entre as palavras e os atos de instituição ainda tão obscura quanto o Judiciário.
Um bom observador do Supremo Tribunal Federal também aprende que o Supremo Tribunal Federal não existe. Pelo menos na maior parte do tempo.
Tornou-se um tribunal de 11 bocas e 11 canetas dotadas de poder para, sozinhas, tomar decisões (ou não decisões) que geram efeitos irreversíveis. A crônica constitucional brasileira vem captando essa lição à medida que a cacofonia do STF fica mais escancarada, e seus custos sociais, mais palpáveis.
O tribunal foi capturado por ministros que superestimam sua capacidade de serem levados a sério e subestimam a fragilidade da corte.
Decidem (ou deixam de decidir) o que querem, quando querem, sozinhos ou em plenário; falam o que querem e quando querem, não só nos autos e nas sessões públicas de julgamento mas também nos microfones de jornalistas.
Ausentam-se das sessões do tribunal sob pretextos pouco contestados (um congresso acadêmico ou casamento de amigo no exterior, uma honraria oferecida por câmara de vereadores de município remoto, a irritação com voto de colega etc.).
Administram terrivelmente a dimensão simbólica (fonte de autoridade) e deixam esvair a dimensão material do poder do tribunal (a capacidade de ser obedecido). Um STF sem capital político pode ser desobedecido sem custos.
Que tenhamos perdido a reverência pelo STF é um ganho de maturidade política. Que estejamos perdendo o respeito é um perigo que o tribunal criou para si mesmo.
Maquiavel sugeriu, em "O Príncipe", que um governante não deve buscar ser amado, mas respeitado. Se não for respeitado, que ao menos não seja desprezado, sentimento político mais nocivo. Um governante torna-se desprezível quando é "inconstante, leviano, irresoluto".
O conselho serve para as instituições democráticas, sobretudo tribunais constitucionais. O STF precisa de anti-heróis, não do contrário. Sua sobrevivência como instituição relevante tem a ver com isso.
Às vésperas dos 30 anos da Constituição de 1988, temos um tribunal constitucional desencontrado. O STF promete mais do que deve, entrega menos do que pode, disfarça o tanto quanto consegue.
Habituou-se à prática do ilusionismo e dela faz pouco caso. Criou uma espécie de zona franca da Constituição, onde reina a discricionariedade de conjuntura e aonde o Estado de Direito não chega.
E não chega por obra dos próprios ministros e ministras, que não promoveram um único aperfeiçoamento digno de nota na última década: nem na forma, nem no conteúdo; nem nos ritos, nem na ética institucional.
Não sabem conjugar a primeira pessoa do plural. Mediocrizaram a tarefa de interpretação constitucional e a própria instituição, cujo status se evapora. Com ele vai a esperança de efetividade da Constituição, a mais avançada que já tivemos.
*
CONRADO HÜBNER MENDES, 40, doutor em direito pela Universidade de Edimburgo e doutor em ciência política pela USP, é professor de direito constitucional da USP e embaixador científico da Fundação Alexander von Humboldt.

Balancos paralelos do lulopetismo economico e diplomatico, para o Brasil Paralelo - Paulo Roberto de Almeida

Esta entrevista foi feita em outubro de 2016, sem que eu soubesse exatamente a destinação ou uso que dela fariam os entrevistadores, de uma entidade até então desconhecida para mim, chamada Brasil Paralelo, mas eu estava atendendo um pedido e a recomendação de um amigo:
A política externa paralela do lulopetismo diplomático

Entrevista gravada em Brasília, em 14 de outubro de 2016, como depoimento ao Brasil Paralelo (https://www.facebook.com/brasilparalelo/), exibido online em novembro de 2016Os dados básicos sobre a entrevista foram consignados por mim no blog Diplomatizzando (15/10//2016: http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2016/10/congresso-brasil-paralelo-como-refundar.html).

Inserido no canal pessoal no YouTube:  
https://www.youtube.com/watch?v=fWZXaIz8MUc 

Um comentário recente, levou-me a verificar os comentários anteriores:

19 comentários

Ae Paulinho um dos poucos economistas brasileiros que sabe economia kkkkk
Grato Nai Sei 123; na verdade não sou economista e não posso me apresentar como tal, embora tenha mestrado em planejamento econômico e tenha feito uma tese sobre o comércio exterior brasileiro, sendo ainda professor de economia política num curso de pós-grado em Direito; minha vertente é economia politica, como as aulas, e minha especialização está em políticas públicas e em relações econômicas internacionais.
Minha melhor entrevista ever...
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Paulo Roberto de Almeida - Por favor Professor, escreva um livro sobre os temas dessa entrevista.
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Pois é, eu já pensei nisso, mas o problema é a falta de tempo para fazer tudo. Eu precisaria parar com várias outras atividades, inclusive escrever no FB, para poder me dedicar à feitura de livros. Vamos ver se consigo me organizar...
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Sugestão de título: "a.C e d.C, antes e depois dos companheiros". Torço para que sobre tempo na sua agenda. Aguardo esperançoso.
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Esse conceito de AC e DC está em meus planos; vou ver se consigo fazer um texto em torno disso.
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Obrigado Professor. Se tornou uma grande inspiração no meio acadêmico para mim.
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Melhor analise do Brasil em uma entrevista que eu ja vi. Parabens.
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Obrigado por disponibilizar essa aula para nós Professor. O senhor é uma grande inspiração para mim e para muitos. Deus abençoe!!!
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Excelente entrevista, professor. Os anos Lula na diplomacia são muito comemorados, mas sem o devido equilíbrio. Sua exposição oferece um contraponto que certamente enriquece o entendimento histórico.
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Apoio a feitura de um livro sobre esse tema!
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cara - esse tipo de informação com essa qualidade tinha que ser divulgada pra todo mundo - em todas as escolas - em todos os meios!
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Excelente. Muito obrigado!

Politica externa e eleicoes: acesso a texto de Paulo Roberto de Almeida

Hi Paulo Roberto, 
Congratulations! You uploaded your paper 2 days ago and it is already gaining traction. 
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Thanks,
The Academia.edu Team

sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

Joao Almino sobre Guimaraes Rosa: Itamaraty, 7/02, 15hs


Palestra-debate “O Itamaraty na cultura brasileira: Guimarães Rosa”, com o embaixador João Almino, em 7 de fevereiro, às 15h, no auditório Paulo Nogueira Batista, anexo II do Itamaraty, Brasília. Inscreva-se: