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terça-feira, 8 de agosto de 2006

607) Ameaca as exportacoes brasileiras de carnes

Muito importante e muito grave...

TCU vê falhas graves na vigilância sanitária
Juliano Basile e Mauro Zanatta
Jornal Valor Econômico - pág. A4, 08/08/2006

O Tribunal de Contas da União (TCU) concluiu relatório que pode trazer graves implicações ao comércio internacional do Brasil. Em um documento de 83 páginas, auditores do tribunal comprovaram a existência de sérias falhas na vigilância do trânsito de produtos agropecuários no país. Como principais constatações das falhas, o TCU aponta a falta de pessoal para fiscalizar portos, aeroportos e postos de fronteira. Também vê precariedade na infra-estrutura de laboratórios e salas de análise dedicados a impedir a entrada de pragas e doenças. E, além disso, o governo não consegue gastar todo o dinheiro previsto no Orçamento para vigiar a exportação e importação.

Aprovado pelo plenário do TCU na quarta-feira, o documento obtido pelo Valor pode virar um entrave para a ampliação das exportações brasileiras e fornecer pretextos para o crescente protecionismo dos principais clientes do agronegócio nacional. Problemas sanitários e fitossanitários têm sido cada vez mais usados como barreiras não-tarifárias aos produtos brasileiros no exterior.

O ressurgimento da febre aftosa, em 2005, provocou o embargo de 59 países. Um foco da doença de Newcastle em aves de Vale Real (RS) tem custado caro a produtores e exportadores: 38 países já fecharam suas portas ao frango nacional. O fungo que provoca a ferrugem asiática nas lavouras de soja já custou US$ 8 bilhões ao país em custos de produção mais altos, perda de rentabilidade e menor produtividade do grão.



"Dos pontos de vista econômico e social, podem ocorrer perdas de produção e de mercados para exportação, causando prejuízos significativos aos agricultores, à balança comercial e ao nível de emprego no país. A entrada de espécies exóticas pode colocar em risco a diversidade biológica dos ecossistemas naturais do país", afirmou o relator do processo, ministro Benjamin Zymler. Por outro lado, diz o ministro, procedimentos de fiscalização previstos na legislação básica não têm sido realizados ou são feitos de modo ineficiente, em razão do baixo número de fiscais e da falta de infra-estrutura física para a realização dos tratamentos previstos em lei.

Nas 83 páginas, os auditores do TCU descrevem situações curiosas, como o fato de muitos fiscais simplesmente observarem à distância o trânsito de bagagens nos aeroportos. A fiscalização, segundo o TCU, é feita com base no "achismo" desses fiscais, pois não há detectores de material orgânico nos aeroportos. A compra desses equipamentos foi anunciada há meses pelo ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues, mas nada foi ainda instalado.

Outro fato contraditório apontado pelos auditores: à falta de pessoal, soma-se um excesso de burocracia entre os fiscais da Receita e da Agricultura, o que prejudica a fiscalização. Os fiscais agropecuários são obrigados, por exemplo, a identificar-se para entrar em áreas controladas pela Receita. Realizam o serviço separadamente e não trocam informações.

Essa pouca importância dispensada à vigilância agropecuária fica clara na análise que o tribunal fez do orçamento do Programa Vigilância Agropecuária Internacional (Vigiagro), criado justamente para impedir a entrada de doenças no país. O governo fez a previsão no orçamento de R$ 5,1 milhões para o Vigiagro em 2005. Conseguiu empenhar somente R$ 3,3 milhões desse valor. De gastos efetivos, porém, foram apenas R$ 1,2 milhão. Em 2004, os desembolsos também foram bastante reduzidos: de um orçamento de R$ 1,3 milhão, somente R$ 600 mil foram gastos.

O ministro Zymler diz no relatório que o baixo investimento na fiscalização contrasta com o grande volume de divisas gerado pelas exportações. O ministro cita os saldos comerciais na balança - de US$ 33,7 bilhões, em 2004, e de U$ 44,7 bilhões, em 2005 - para, em seguida, lamentar a proliferação de pragas no país. "Embora a expansão do comércio internacional de produtos agropecuários entre os países tenha proporcionado a abertura de novos mercados, também propiciou o alastramento de pragas e doenças antes confinadas a suas regiões originais", afirmou.

O TCU relatou alguns exemplos dessa proliferação de pragas. No Porto de Itajaí (SC), fiscais identificaram a entrada de madeira infestada pelo besouro asiático - uma praga que pode destruir florestas brasileiras.

Na Amazônia, os fiscais verificaram o ingresso, pelo Amapá, da "sigatoka negra" - uma praga que afeta a produção de bananas. "Vivemos numa situação de risco", comentou outro auditor.

A falta de fiscais atinge os principais focos de entrada e saída de produtos e de passageiros do país. O Porto de Santos deveria ter 42 agrônomos, mas tem apenas 24. O aeroporto de Guarulhos precisaria de 25 veterinários, mas conta com apenas 13.

No total, o Brasil deveria ter 248 agrônomos na vigilância, mas tem somente 167. Deveriam ser 166 veterinários, mas são apenas 108. Também há falta de agentes de apoio administrativo e de inspeção federal.

Os auditores do TCU fizeram inspeções em portos e aeroportos entre 1º de agosto e 25 de novembro de 2005. Também foram realizadas entrevistas com 542 fiscais federais agropecuários que relataram as absurdas dificuldades. Os fiscais contaram que sofrem ações pessoais de exportadores quando impedem a saída de mercadorias do país. "Isso coíbe a atividades dos fiscais. Eles se sentem vulneráveis e acabam liberando mercadorias", disse um auditor do TCU.

A legislação também é bastante ineficiente. O decreto que impõe multas às empresas é de 1934 e desde então os valores não foram atualizados. O importador de produtos de origem animal sem certificado paga, por exemplo, entre "1 mil e 500 cruzeiros", uma moeda fictícia e sem aplicação.



Para Agricultura, responsabilidade é do Planejamento
De Brasília
08/08/2006

Confrontada com o minucioso relatório do Tribunal de Contas da União (TCU), a Coordenação-Geral de Vigilância Agropecuária do Ministério da Agricultura (Vigiagro) confirmou todos as informações e detalhes contidos no documento.

O coordenador-geral Oscar de Aguiar Rosa Filho afirmou que "todos os problemas" apontados pelo TCU tiveram origem nas informações prestadas pelo próprio ministério. "Estes dados foram levantados por nós mesmos. Apresentamos as informações de forma transparente. Temos trabalhado para resolver os problemas, mas isso depende da sensibilidade do Ministério do Planejamento em dotar o sistema de um orçamento correspondente à importância do serviço", disse ao Valor.

Em tom de desabafo, o coordenador do Vigiagro reclamou da demora da área econômica do governo para autorizar a realização de concursos públicos. "Temos um déficit de 340 fiscais federais, 170 técnicos de nível médio e 120 funcionários de apoio administrativo em nossas 110 unidades", afirmou. "Não conseguimos fazer um trabalho minimamente satisfatório do ponto de vista técnico. Trabalha-se demais e nunca se consegue solução. O problema, nós sabemos de cor, é uma resistência grave do Planejamento", disse.

Segundo ele, a questão foi "exposta" ao TCU na "esperança" de que alguma medida fosse tomada pelos ministros da área. E avisa: "Qualquer coisa que aconteça se deve à falta de infra-estrutura. Estamos fazendo mágica. Qualquer país que tem uma agropecuária deste tamanho precisa ter investimentos sérios nessa vigilância".

Embora reforce o coro dos descontentes com os parcos recursos federais investidos na defesa agropecuária, Oscar Rosa admite que o Ministério da Agricultura não tem conseguido "gastar a contento" seu orçamento. "Tivemos um total de R$ 8 milhões para este ano, mas vamos gastar, na melhor das hipóteses, algo próximo de R$ 3,2 milhões por causa de contingenciamentos e limitações orçamentárias impostas pelo governo."

Para 2007, o coordenador calcula que seria necessário um orçamento de R$ 16 milhões. "Mas teremos, no máximo, R$ 4 milhões. Temos tentado mostrar que se gastarmos R$ 16 milhões em 2007 deixaremos de gastar alguns bilhões no caso de entrar uma praga ou uma doença no país", afirmou.

Responsável pela coordenação de 515 fiscais federais localizados em 110 unidades espalhadas pelo país, Rosa não tem dúvidas do risco assumido pelo país ao deixar o sistema sem recursos. "Se tiver um foco de influenza (gripe) aviária, por exemplo, o prejuízo poderia custar US$ 34 bilhões, segundo cálculos de consultores independentes, além de milhares de empregos".

O coordenador afirma que o orçamento do Vigiagro é "incompatível" com as demandas da vigilância e que o quadro de pessoal é "completamente deficitário". E exemplifica: em Santos, onde trabalham 25 fiscais, o déficit funcional é de 20 agrônomos e dez veterinários; em Manaus, onde há dez fiscais, seriam necessários mais 28; e no porto de Itajaí, precisaria ter o dobro dos sete fiscais. (MZ e JB)

Um comentário:

Anônimo disse...

Muito bom este artigo. Explica todo o perigo que o ramo da agricultura e da pecuária tem caso Lula se reeleja.