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sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Brasil: o Estado como principal fora-da-lei, o grande contraventor da ordem legal...

Populismo no debate dos planos econômicos
Por Cristiano Romero
Valor Econômico, 04/12/2013

Há uma dose considerável de populismo e maniqueísmo no tratamento dado ao tema da correção monetária nos planos econômicos. O caso está sendo analisado, erradamente, como se os bancos tivessem tungado os poupadores.

Na verdade, os bancos cumpriram as leis da época e, se por um lado obtiveram ganhos ao aplicar um redutor na correção dos saldos da caderneta de poupança, por outro sofreram perdas em seus ativos - na correção dos empréstimos imobiliários, concedidos no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação (SFH), com recursos da caderneta.

Se alguém é passível de questionamento na Justiça, é o Estado brasileiro, responsável pelas leis que puseram os planos econômicos de pé. Tentar obrigar as instituições financeiras a bancar uma conta que não é sua cria um precedente perigoso. Os cidadãos passarão a recorrer à Justiça contra empresas toda vez que considerarem que seus interesses foram contrariados, mesmo sabendo que as firmas não criaram as regras, mas apenas as cumpriram.

Responsável por regras dos planos foi o Estado e não os bancos

A caderneta de poupança é um produto financeiro totalmente regulado pelo governo. A correção é fixa e a aplicação dos recursos, idem. O crédito gerado a partir de seus recursos é direcionado: só pode ser destinado a financiamentos habitacionais e da agricultura.

"No caso específico da caderneta de poupança, os bancos realmente não têm nada a ver com isso. Eles recebem do governo ordens claras com relação ao que podem cobrar na captação e na aplicação desses recursos no SFH", diz Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central. "[Os bancos] atuaram de forma casada: ativos e passivos sofreram o mesmo efeito da regra imposta pelo governo."

O argumento usado pelo ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), de que os bancos devem pagar a conta porque já lucraram demais, é despropositado. Baseia-se num preconceito bem brasileiro, segundo o qual, os bancos são entidades diabólicas, sempre prontas a surrupiar dinheiro dos pobres clientes e, o que dirá, dos poupadores. Não deveria ser o raciocínio que se espera de um magistrado da principal corte do país.

"Esse argumento de que não há um problema porque os bancos têm condições de arcar com os custos não me parece ser algo de natureza constitucional", assinala Armínio.

É curioso que não passem pela cabeça dos maniqueístas dois fatos relativos aos bancos: eles são regulados pelo Banco Central e obtêm lucros fabulosos, em grande medida, graças ao desequilíbrio fiscal do Estado.

Os planos econômicos cometeram, de fato, arbitrariedades na tentativa de debelar a inflação crônica que prevaleceu no Brasil nos anos 80 e até meados dos 90 do século passado. Talvez, o mais opressivo de todos tenha sido o Plano Collor 1, que confiscou não só a poupança, mas também as contas correntes e tudo onde havia recursos lastreados em papéis da dívida pública.

"Muitos desses planos econômicos não foram realmente brilhantes, mas o fato é que a questão era bastante complicada. Os governantes têm que tomar providências e, com frequência, tomam decisões sob condições de imensa incerteza e muita pressão e essas decisões têm consequência", observa Armínio, hoje sócio da Gávea Investimentos. "Avaliar tudo com base nas consequências me parece um extremo. Isso vai engessar demais o governo daqui para frente."

O ex-presidente do BC reconhece que dar carta branca ao governo para fazer qualquer coisa e prejudicar o cidadão e não arcar com os custos também é "algo grave". O Brasil deveria tirar lições do passado. Não se deve esquecer, por exemplo, que o STF aprovou o confisco.

"Penso que, a longo prazo, é bom também que o governo tenha que se submeter a uma disciplina e a honrar contratos. É saudável que o Brasil seja um país onde se possa processar o governo, ganhar e receber e não ser perseguido por isso. Em vários dos países emergentes, isso é impensável. Na China e na Rússia, por exemplo", diz Armínio.

O STF adiou o julgamento dos planos econômicos para 2014. O ânimo predominante no tribunal é por dar ganho de causa aos poupadores, mas é provável que, dadas as consequências desastrosas dessa decisão não só para os bancos mas para o país como um todo, opte-se ou por um ganho parcial, limitado a um plano econômico e não a todos, ou por uma solução negociada com o governo, resultando na transferência da conta à Viúva. Em qualquer uma dessas opções, perde o país e ganham uma minoria e seus advogados.

A decisão do governo de não dar à Petrobras uma regra que lhe permita corrigir o preço dos combustíveis de acordo com a flutuação dos preços internacionais está sendo encarada, por investidores pesos-pesados, como o sinal definitivo de que a presidente Dilma Rousseff não pretende voltar atrás em seu modelo de gestão, nem mesmo confrontada com as consequências da deterioração fiscal (com efeitos perversos sobre as taxas de juros cobradas de consumidores e empresas), do baixo crescimento do PIB, do encolhimento do investimento, do aumento da vulnerabilidade externa provocada pela elevação do déficit em transações correntes, da retomada da contabilidade criativa (revelada pela repórter Leandra Peres, do Valor).

A contradição do governo no caso Petrobras é gritante. Foi Brasília quem aumentou as atribuições da estatal ao torná-la monopolista na operação do pré-sal e ao obrigá-la a ter, no mínimo, 30% do capital de cada consórcio. Para fazer frente à nova realidade, a companhia elaborou, para os próximos anos, o que muitos chamam de "maior plano de investimento de uma empresa no mundo". Garroteada pelo controle dos preços dos combustíveis, não gera recursos suficientes para bancar esse plano e pode ter dificuldade para captá-los no mercado.

A decisão contrária à Petrobras tem pelo menos dois significados que vão além do petróleo. Mostra que o governo pretende continuar controlando a inflação por outros meios que não a taxa de juros e o controle dos gastos públicos e enfraquece a presidente da estatal, Graça Foster, que vinha fazendo um elogiado trabalho de saneamento desde que assumiu o posto, em fevereiro de 2012. Para muitos, se a situação não se inverter, Graça não terá condições de permanecer à frente do cargo.

Cristiano Romero é editor-executivo e escreve às quartas-feiras

terça-feira, 11 de junho de 2013

Marajas do Estado continuam gastando irresponsavelmente: CNJ triplica gastos

Depois de construir mais um palácio suntuoso em Brasília, para o que deveria ser meramente um órgão de controle do Judiciário, o CNJ contratou dezenas de funcionários, regiamente pagos, e agora pretende aumentar seus gastos "n" vezes, ao arrepio da lei.
Os principais infratores da legalidade, os grandes foras-da-lei no Brasil são os próprios membros do Estado, os guardiães da Constituição, os marajás do serviço público.
Paulo Roberto de Almeida

Barbosa manobra para estourar limite fiscal e triplicar gasto do CNJ com pessoal

Ministro do STF negocia para que tribunais superiores cedam limites de despesa; manobra contraria o TCU

11 de junho de 2013 | 2h 05
Felipe Recondo e Fabio Fabrini - O Estado de S.Paulo
 
BRASÍLIA - Sem conseguir nos bastidores emplacar no Congresso mudanças na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), o presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Joaquim Barbosa, quer editar resolução que praticamente triplica o limite de gastos do órgão com o pagamento de pessoal. Em valores, Barbosa busca aumentar em R$ 74 milhões o teto do CNJ para contratação de servidores - de R$ 40,4 milhões para R$ 114,4 milhões. A manobra desafia o Tribunal de Contas da União (TCU), que considera obrigatório o aval do Legislativo para as alterações.
Presidente do conselho quer editar resolução para buscar sobras orçamentárias de 4 tribunais
Para não precisar do Congresso, que desde 2009 debate novos parâmetros da LRF para o Judiciário, Barbosa pediu aos presidentes de quatro tribunais superiores (Superior Tribunal de Justiça, Superior Tribunal Militar, Tribunal Superior do Trabalho e Tribunal Superior Eleitoral) que cedam ao CNJ parte dos seus limites de despesas. A proposta de resolução, assinada pelo ministro, precisa ser aprovada pelo plenário do conselho. Sem ela, o órgão estourará o máximo de gastos definido pela legislação e não poderá convocar todos os candidatos já aprovados no concurso feito este ano.
Conforme informações encaminhadas pelo CNJ aos quatro tribunais superiores, às quais o Estado teve acesso, o limite atual de despesas "mostra-se insuficiente para comportar as presentes despesas e os acréscimos decorrentes do provimento de cargos". Os gastos previstos na lei orçamentária já ultrapassariam o limite de despesas com pessoal definido para este ano. Em alguns cenários, incluindo aumento de salário e contratação dos 177 candidatos aprovados em concurso para o CNJ, o limite poderia ser extrapolado em cerca de R$ 9 milhões.
O CNJ foi criado após a aprovação da LRF, sancionada em 2000. Por isso, os limites de gastos do órgão vêm sendo definidos por normas internas - a mais recente é a Resolução 26, de 2006, em vigor atualmente. Segundo o TCU, contudo, a solução é irregular, pois uma lei complementar não pode ser alterada pela caneta dos conselheiros. "Como a divisão interna dos porcentuais entre os diversos órgãos do Poder Judiciário foi feita a partir de um comando expresso contido na LRF, esses valores não ensejam modificação apenas por meio de uma resolução daquele órgão. A via legislativa é o canal indicado para a promoção dessas alterações", diz decisão da corte de contas, que analisou a reivindicação em 2008 e recomendou ao conselho que tomasse providências para que as mudanças tivessem o aval do Congresso.
Desde 2009, um projeto visando à adequação dos parâmetros tramita no Legislativo, mas não foi votado. Diante disso, Barbosa pretende levar adiante a aprovação de mais uma resolução, aumentando as despesas do CNJ, apesar do entendimento do Tribunal de Contas. A restrição feita pelo tribunal foi lembrada aos assessores de Barbosa. Mas, segundo fontes dos tribunais, o presidente decidiu levar o projeto adiante.
Procuradores do Ministério Público que atuam no TCU adiantam que, aprovada a norma no CNJ, cabe representação para que a corte analise novamente o caso. "Se a matéria é tratada por lei, você não pode alterar por portaria ou resolução, a não ser que a própria lei preveja assim", diz um dos representantes do MP, que falou reservadamente com o Estado.
O presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal criticou, nos últimos dias, a proposta de criação de quatro novos tribunais regionais federais e o consequente aumento de custos no Judiciário. No começo de sua gestão, chegou a sugerir no CNJ que uma comissão avaliasse a necessidade da existência Justiça Militar.
Desta vez, Barbosa viu-se compelido a pedir a anuência dos presidentes do Conselho da Justiça Federal (CJF), Felix Fischer, e do Superior Tribunal Militar (STM), general Raymundo Nonato de Cerqueira Filho.
Em documento enviado à presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Cármen Lúcia, e ao presidente do Tribunal Superior do Trabalho, ministro Carlos Alberto Reis de Paula, Barbosa pede que todos se manifestem favoravelmente à nova resolução.

domingo, 17 de fevereiro de 2013

A falencia do Congresso, o Estado fora-da-lei...

No Brasil, o principal infrator da Constituição é o próprio Estado. Sendo mais claro, o governo é um fora-da-lei, um desrespeitador das leis que ele deveria seguir.
O Congresso, que deveria zelar pela legalidade e legitimidade do processo legislativo se exime de cumprir suas funções, e o Judiciário dorme em berço pouco esplêndido.
Ou seja, todo o Estado brasileiro funciona não apenas mal, como não funciona, e quando " funciona", o faz de modo canhestro, enviesado, frequentemente à margem da Constituição, quando não contra as leis em vigor, se não for contra a moral e os bons costumes.
Estou escrevendo uma autobiografia do Estado (se ele me permite a ousadia) e a conclusão é inescapável: quase todas as contravenções de maior importância foram cometidas pelo próprio Estado, ou com a conivência do Estado, a começar pelos crimes contra o patrimônio público, cometidos por funcionários públicos, por representantes eleitos ou por privados infiltrados no Estado, tendo comprado, ou tendo sido "seduzidos", por funcionários do Estado. O resto é ladrão de galinha, que não deve representar nem 10% da subtração patrimonial: o grosso mesmo é feito pelo Estado, com o Estado, contra o Estado (ou seja, contra os nossos ativos), mas com a conivência de representantes do Estado, quando não com a sua indução ativa.
O caso dos vetos é exemplar: ou seja, o executivo pretende fazer algo, o parlamento diz que não, mas o executivo faz ainda assim e espera a leniência, a cumplicidade, a conivência do parlamento (e obtém, por ação ou omissão).
Paulo Roberto de Almeida

Votem-se os vetos

17 de fevereiro de 2013 | 2h 06
Editorial O Estado de S.Paulo
 
Em petição ao Supremo Tribunal Federal (STF), o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, estima em R$ 471 bilhões o custo aos cofres públicos da hipotética derrubada de vetos presidenciais, acumulados há cerca de 12 anos, por decisões do Congresso. O cálculo, ou melhor, a simulação, foi usado para induzir a Corte a derrubar a liminar concedida em dezembro último pelo ministro Luiz Fux a propósito do veto da presidente Dilma Rousseff à aprovação do sistema pelo qual todos os Estados teriam direito aos royalties do petróleo extraído da camada do pré-sal. A redistribuição dos rateios - na contramão da medida provisória do Planalto sobre o assunto - afetaria até contratos em andamento, em prejuízo das principais regiões produtoras, Rio de Janeiro e Espírito Santo. Os seus municípios ficariam privados de "receita certa", ressaltou a presidente. Argumentando que a intenção do Congresso de avaliar o veto em regime de urgência ignorou a Constituição, parlamentares fluminenses entraram com dois mandados de segurança no Supremo e obtiveram ganho provisório de causa com a decisão de Fux.
O ministro seguiu a Carta ao deliberar que o Legislativo deveria examinar primeiro e em ordem cronológica os cerca de 3 mil vetos à espera de avaliação. Mas o texto constitucional vai além. Determina que, passados 30 dias do recebimento de um veto, sem que as duas Casas do Congresso, em sessão conjunta, tenham se pronunciado a respeito, a omissão trancaria automaticamente a pauta parlamentar. Essa provisão Fux preferiu não contemplar. Em despacho na semana passada, o ministro afirmou que o imperativo do exame dos vetos por ordem de chegada não inibe a apreciação de outras matérias. À época da liminar, o então presidente do Senado, José Sarney, chegou ao extremo de convocar uma sessão conjunta para a votação de todos os vetos de uma tacada só, a fim de abrir caminho para a derrubada daquele dos royalties. A ridicularia fracassou, mas deu a enésima medida da falência - política e moral - do Parlamento brasileiro, onde o interesse nacional é o último a falar e o primeiro a ser ignorado, compartilhando essa perversa primazia com a Constituição da República.
Incontáveis - e inconfessáveis - motivos devem ter se combinado ao longo de um decênio para que os políticos continuassem tocando a vida, como se não tivessem a obrigação de dizer sim ou não, no prazo estipulado de 30 dias, a cada veto de que fossem inteirados oficialmente pelo Planalto. A aberração é tamanha que o próprio ministro Fux, ao acolher a liminar dos royalties, aparentemente não sabia que a fila de decisões do Executivo engavetadas já havia superado a marca de 3 mil. Entre eles, incluem-se sabe-se lá quantos dos chamados "vetos mortos" - cuja razão de ser caducou com o passar dos anos por se referirem a leis que expiraram ou foram suplantadas por outras. Mas nem por isso se sustenta o argumento do governo, expresso pelo advogado-geral da União, de que o Congresso correrá "sério risco de colapso institucional", se o STF respaldar a liminar sobre a apreciação dos vetos em ordem cronológica. Por via das dúvidas, o Planalto instruiu a base aliada a não votar o Orçamento de 2013 enquanto a Corte não se manifestar, apesar de Fux entender que o exame dos vetos é uma coisa e a pauta legislativa é outra.
O conselheiro legal do governo imagina, "numa estimativa singela", que o Congresso levaria no mínimo 153 semanas, ou cerca de três anos, para completar a análise dos vetos pendentes. Adams parece supor que eles devem ser forçosamente examinados em pequenas porções. Na realidade, podem ser votados em bloco todos aqueles sobre os quais, dentro da ordem cronológica, não há controvérsias - decerto uma robusta maioria. Numa fração dos três anos estimados pelo advogado-geral, a questão terá sido resolvida. Mas isso não depende só da escolha do procedimento mais adequado. O fator crítico - o mesmo a que se deve debitar o vexame do crônico descaso do Congresso diante de uma de suas funções essenciais - é a deplorável qualidade do grosso de seus integrantes, a começar daqueles a quem têm escolhido ao longo dos anos para conduzir a instituição.
 

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

O Estado brasileiro como fora-da-lei - Editorial OESP

Na verdade, não se trata bem do Estado e sim do governo dos companheiros, que mantém profundo desprezo pela lei, pelo direito, pelas boas regras, pelos bons princípios econômicos, mas como eles estão (infelizmente) no comando do Estado (e o infelizmente se deve apenas à ilegalidade se seus atos, não à legitimidade estrito senso, que foi dada pelas eleições), eles acabam comprometendo o bom nome do Estado brasileiro para atender suas conveniências políticas (senão econômicas, mas aqui no mau sentido do termo).
Isto apenas confirma minha velha assertiva de que o principal fora-da-lei no caso brasileiro é o próprio Estado, e em primeiro lugar o Estado, o contraventor, o demandado pela maior parte dos casos que sobem ao STF. Lamentável...
Paulo Roberto de Almeida

O TCU e os subsídios ilegais
Editorial O Estado de S.Paulo
26 de novembro de 2012 | 2h 07

Pelo menos R$ 72,3 bilhões devem sair do bolso do contribuinte, entre 2011 e 2015, para cobrir os subsídios embutidos nos empréstimos do Tesouro Nacional ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), de acordo com estimativa do Tribunal de Contas da União (TCU). Esse custo, estimado com base nas hipóteses mais favoráveis, corresponde a operações de crédito de R$ 234,8 bilhões já realizadas. Ficou fora da conta uma operação autorizada, mas ainda sem desembolso, de R$ 55 bilhões. Desde 2008 o governo tem transferido grandes volumes de recursos orçamentários ao banco. Ao realizar essas transferências, o governo tem, segundo o TCU, violado a Lei de Responsabilidade Fiscal. O Executivo tem descumprido as regras de especificação de custos e de outros detalhes financeiros e descuidado da avaliação do impacto nas metas fiscais previstas para cada ano. Essas falhas, de acordo com o documento, são uma "severa afronta" à lei.
Segundo o relator, ministro Aroldo Cedraz, os órgãos responsáveis têm alegado incertezas quanto à evolução dos juros, mas nem por isso ficam dispensados de apresentar os cálculos ou de cumprir as normas de transparência dos gastos governamentais. Uma detalhada análise dessas operações foi apresentada pelo relator e aprovada em reunião plenária no dia 14. Por meio de acórdão, medidas corretivas foram determinadas à Secretaria de Política Econômica e à Secretaria do Tesouro Nacional, órgãos do Ministério da Fazenda. Os ministros cobraram, entre várias providências, estimativas de impacto dessas transações sobre a dívida pública e, naturalmente, a adoção de todas as práticas determinadas pela Lei de Responsabilidade Fiscal para a elaboração das propostas orçamentárias de cada ano. A Secretaria do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) fica obrigada a enviar aos bancos oficiais a lista das obras incluídas na política de subsídios orçamentários.
Ministros do TCU têm chamado a atenção, com frequência, para problemas nos programas de investimento do governo federal - irregularidades nos contratos, falhas nos cálculos de custos, ineficiência na execução e mau uso de recursos financeiros. O relatório sobre os empréstimos do Tesouro ao BNDES explora uma dimensão especialmente importante desses programas - o uso de recursos orçamentários para ampliação do crédito aos investimentos.
O documento menciona, além das irregularidades formais, o risco dessas operações "para o equilíbrio das contas públicas", por causa do enorme volume dos recursos envolvidos e da negligência na explicitação dos custos e das consequências para as metas fiscais. A cuidadosa análise apresentada pelo relator é mais uma confirmação - a mais importante até agora - do estilo voluntarista dominante na administração federal petista e acentuado há alguns anos.
O desprezo pelos dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal, claramente apontado no documento do TCU, é apenas parte de um quadro preocupante. Como já foi mostrado por vários analistas competentes, a forma de transferência de recursos do Tesouro para o BNDES e outros bancos estatais é uma reedição, com pequenas mudanças, de uma prática nefasta seguida por longo tempo e abolida no fim dos anos 80.
Ao realizar esses empréstimos, o governo põe em funcionamento um mecanismo semelhante ao da velha conta movimento e estabelece uma relação promíscua e muito perigosa entre o Tesouro e as instituições financeiras. Enquanto durou, esse tipo de operação foi um fator de constante perturbação, tanto do sistema fiscal quanto da ordem monetária. A extinção dessa conta ocorreu muito antes da elaboração do projeto da Lei de Responsabilidade Fiscal e foi um passo importante para a recuperação dos fundamentos da economia brasileira a partir do Plano Real. A promiscuidade entre o Tesouro e os bancos oficiais havia sido apontada - e criticada com argumentos estritamente econômicos - várias vezes antes da publicação do relatório e do acórdão do TCU. Com esses documentos, a crítica se amplia e ganha uma importantíssima dimensão jurídica.