Estudo mostra que, com guerra comercial, no Brasil só a soja ganha
Assis Moreira
Valor Econômico,
Economistas da UFMG calcularam impacto da alta de tarifas de Trump e da retaliação da China
Uma simulação feita por economistas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) conclui que o Brasil teria um modesto ganho de US$ 428 milhões (R$ 2,497 bilhões) no rastro do tarifaço imposto por Donald Trump e da retaliação anunciada pela China. O resultado aponta a soja como único ganhador. A indústria perderia significativamente.
(Após tarifas nos EUA e retaliação da China)
EXPORTAÇÕES BRASILEIRAS US$
1.Agricultura................... 4.296
1.1Soja ............................ 4.883
1.2Demais agropecuária.. -587
2.Indústria....................... -3.494
3.Serviços........................ -375
TOTAL................................... 428
Fonte: UFMG/Cedeplar/valores em 2017
O levantamento foi feito pelos economistas Edson Paulo Domingues, João Pedro Revoredo Pereira da Costa e Aline Souza Magalhães, da UFMG usando a metolodogia do "Modelo GTAP (cuja base de dados é mantida pela Universidade de Purdue, EUA). É amplamente utilizado em análises de comércio internacional, e adaptado para essas estimativas pela equipe da UFMG. O modelo assume que os mercados respondem aos choques de tarifas e atingem um novo equilibrio de produção e comércio. Serve como uma indicação, no contexto atual.
Na primeira simulação da equipe, levando em conta apenas as tarifas anunciadas por Trump, incluindo taxação adicional de 10% sobre o Brasil, o país perderia cerca de US$ 7 bilhões de exportações, essencialmente de produtos industriais.
Na segunda simulação, somando a imposição das novas tarifas americanas e a retaliação de 34% da China contra os EUA, o modelo mostra que o Brasil ganha leves oportunidades. Em termos de PIB (Produto Interno Bruto), o Brasil teria um pequeno benefício de US$ 350 milhões.
Do ponto de vista setorial, o único setor brasileiro beneficiado seria o de sementes oleaginosas (soja), o qual destinaria boa parte de sua produção para as exportações e geraria o resultado positivo no PIB.
Enquanto soja ganha nas exportações, todos os outros setores sofreriam perdas significativas. O setor industrial seria o mais afetado, com queda estimada de US$ 3,5 bilhões, demonstrando um impacto adverso considerável na economia brasileira. O segmento de serviços também enfrentaria uma diminuição, com uma perda de US$ 375 milhões.
A soja ganha evidentemente no caso em que vende mais para a China enquanto a retaliação chinesa for mantida contra os EUA. A tendência vai ser, mesmo, de um acordo entre americanos e chineses, incluindo compra de mais produtos agrícolas por Pequim, como ocorreu na guerra comercial no primeiro mandato de Trump. Ou seja, o ganho da soja brasileira seria de curta duração.
A equipe da UFMG nota que a elevada perda de exportações e produção da indústria brasileira sugere efeito de “desindustrialização” na economia. Esse fenômeno teria consequências significativas nas perspetivas de crescimento e geração de empregos mais qualificados e com maior remuneração. Acham que esse processo seria desencadeado por políticas protecionistas de outros países, o que torna mais complexa a elaboração de medidas de ajuste e eventuais compensações para setores prejudicados.
Outras simulações tendem a ser feitas, porque o volume de retaliações e acordos bilaterais certamente vai aumentar proximamente.
No geral, todos os países perdem mais do que ganham com a guerra comercial deflagrada por Donald Trump. Só o prejuízo causado pelas incertezas que ele provoca já são enormes. O que o Brasil tem de fazer, em vez de comemorar suposto ganho, é usar esse tipo de simulação para se preparar visando ser mais resiliente nos tempos duros pela frente.