O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

domingo, 10 de janeiro de 2016

RBPI: os pareceristas desconhecidos finalmente se tornam conhecidos

09-Jan-2016

Dear Dr. Paulo Roberto de Almeida:

We would like to thank all of the RBPI reviewers from over the past year - http://www.ibri-rbpi.org/?p=14787

Sincerely,

The Editorial Team

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Many colleagues, professors and researchers from several institutions, provided us with their enlightening reviews and supported our Journal in so many ways.

We are deeply grateful for the generous use of their time that helped us to run the Revista Brasileira de Política Internacional (http://www.scielo.br/rbpi) in 2015:

Altemani de Oliveira, Henrique - Universidade Estadual da Paraíba
Alvarez, Luis - University of California, Los Angeles
Asal, Victor - State University of New York at Albany
Barder , Alex - Florida International University
Bertonha, João Fábio - Universidade Estadual de Maringá
Bruneau, Thomas - Naval Postgraduate School
Caixeta Arraes, Virgílio - University of Brasília
Carvalho Pinto, Vânia - University of Brasília
Cepik, Marco - Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Cervo, Amado - University of Brasília
Chaves de Rezende Martins, Estevão - Universidade de Brasília
Chernoff, Fred - Colgate University
Cherry, Robert - Brookly College
Cortinhas, Juliano - Ministério da Defesa
Costa Leite, Iara - Universidade Federal de Santa Catarina
Costa Vaz, Alcides - Universidade de Brasilia
Cunha, Raphael - Ohio State University
de Almeida, Paulo Roberto - Centro Universitário de Brasília
De Matos-Ala, Jacqueline - University of Witwatersrand
de Souza Farias, Rogério - University of Chicago
Duque, Marina - Ohio State University
Esteves Duarte, Érico - Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Flores, Fidel - Universidade de Brasília
Frueh, Jamie - Bridgewater College
Galindo, George - Universidade de Brasília
Goucha Soares, Antonio - Universidade de Lisboa
Guimarães, Maria - Universidade do Minho
Henokl, Thomas - University of Agder
Hochstetler, Kathryn Ann - University of Waterloo
Horovitz, Liviu - ETH Zurich
Hurrell, Andrew - University of Oxford
Inoue, Cristina - Universidade de Brasília
Jackson, Patrick - American University
Kenanoglu, Pinar Dinc - University of London
Kenkel, Kai - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
Krain, Matthew - The College of Wooster.
Kubalkova, Vendulka - University of Miami
Lantis, Jeffrey - The College of Wooster.
Las Casas, Taiane - Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
Lasmar, Jorge - Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
Lessa, Antônio Carlos - University of Brasília
Lightfoot, Simon - University of Leeds
Liu, Tony Tai-Ting - National Chung Hsing University
Owen IV, John - University of Virginia
Mansfield, Andrew - University of Sussex
Mazzuoli, Valerio - Universidade Federal de Mato Grosso
Merke, Frederico - Universidad de San André
Miyamoto, Shiguenoli - Universidade de Campinas
More, Rodrigo - Universidade Católica de Santos
Moreli, Alexandre - Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro
Nolte, Detlef - GIGA Institute of Latin American Studies
O'Mahoney, Joseph - Seton Hall University
Onuki, Janina - Universidade de São Paulo
Ostos, Maria del Pilar - Universidad Nacional Autónoma de México
Palacios Jr, Alberto - Escola Superior de Propaganda e Marketing de São Paulo
Peltonen, Hannes - University of Tampere
Pinheiro, Letícia - Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Platiau, Ana Flávia - Universidade de Brasília
Proença Júnior, Domício - Universidade Federal do Rio de Janeiro
Ramanzini Júnior, Haroldo - Universidade Federal de Uberlândia
Rodrigues, Thiago - Universidade Federal Fluminense
Rosamond, Ben - University of Copenhagen
Roy, Joaquin - University of Miami
Rudzit, Gunther - Faculdades Rio Branco
Santa-Cruz, Arturo - Universidad de Guadalajara
Saraiva, Míriam Gomes - Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Seabra, Pedro - Universidade de Lisboa
Seghezza, Elena - University of Genova
Stuenkel, Oliver - Fundação Getúlio Vargas
Thompson, William - Indiana University
Vermeiren, Mattias - University of Ghent
Villa, Rafael Duarte - Universidade de São Paulo
Viola, Eduardo - Universidade de Brasília
Tickner, Arlene- Universidad de los Andes
Yamato, Roberto - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro

Crise brasileira de 1998-99: Clinton e Blair ajudam o Brasil, a despeito de sermos antiamericanos

Transcrição de ligações de Clinton e Blair nos anos 90 mostram preocupação com crise econômica no Brasil

Jamil Chade, correspondente / Genebra - O Estado de S. Paulo 

Conversas sigilosas divulgadas nessa sexta-feira mostram que líderes temiam o sentimento antiamericanista no País; para Clinton, Republicanos poderiam transformar EUA num 'Brasil melhorado'

GENEBRA - O ex-presidente dos EUA Bill Clinton se queixou do 'antiamericanismo' no Brasil, mas no final dos anos 90 tentou convencer os demais governos ricos a sair ao resgate do País, diante da crise financeira enfrentada na época. Mais de 500 páginas de transcrições de suas conversas confidenciais com o ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair foram publicadas nesta sexta-feira, 8, e revelam diálogos telefônicos dos líderes entre 1997 e 2000, quando ambos estavam no poder. 

Nessas conversas, Clinton chega a acusar os políticos do Partido Republicano de quererem transformar os Estados Unidos num "Brasil melhorado", com "ricos atrás de portões" e "famintos que não poderiam chegar neles". 

Página mostra trecho de conversa entre Bill Clinton e Tony Blair em 1998, quando os dois eram líderes dos EUA e da Grã-Bretanha, respectivamente

Página mostra trecho de conversa entre Bill Clinton e Tony Blair em 1998, quando os dois eram líderes dos EUA e da Grã-Bretanha, respectivamente

As transcrições foram publicadas pelo Clinton Presidencial Library. Num raro mergulho sobre a franqueza de um debate entre dois dos principais líderes de sua geração, os documentos revelam como Londres e Washington multiplicavam ligações a cada semana e como, em dezenas de temas, tentavam adotar uma posição conjunta. 

Nas conversas, Clinton chama George W. Bush de uma "fraude" que "nunca poderia estar preparado para ser presidente".  O líder americano também rejeita uma proposta para assassinar Saddam Hussein ou Slobodan Milosevic, chama o Congresso do seu país de "reacionário" e não mede palavrões em alguns momentos. Os documentos também mostram como líderes podem se enganar sobre quem seriam seus aliados. Vladimir Putin, por exemplo, é considerado por Clinton como alguém "com potencial". 

O clima entre "Bill" e "Tony" enquanto comandavam seus países era de amizade, com perguntas sobre como haviam dormido e até um pedido inusitado do americano para que o primeiro-ministro continuasse na linha enquanto ele abria a porta de onde estava para que o cachorro pudesse sair ao jardim. Clinton brincou que iria ser cidadão britânico quando deixasse o governo, contou sobre a vida de sua filha e até se ofereceu para ser baby-sitter do novo filho de Blair. 

O que as dezenas de conversas divulgadas nesta sexta-feira também deixam claro é uma preocupação com o Brasil e a aliança com o então presidente Fernando Henrique Cardoso. "Sobre Florença, fico satisfeito que deixamos Cardoso vir", disse Clinton em relação a um encontro de cúpula do G-7 na Itália em 1999 que teve o Brasil como convidado. 

Numa conversa em 31 de julho de 1998, Clinton também se queixa da atitude que existiria no Brasil e na França em relação aos EUA. "França e Brasil são dois países que tem governos permanentes, para o bem ou para o mau, mas têm um antiamericanismo inato que tinge a atmosfera", criticou. Ainda assim, o democrata insistia com frequência sobre a necessidade de ajudar o Brasil. 

No centro do debate entre os dois sobre o Brasil estava a crise financeira que atraía todas as atenções. No dia 2 de outubro de 1998, falando de um avião, Clinton alertou Blair sobre a "crise financeira" afetando os emergentes e apoiou a ideia de linhas de crédito bilaterais. Apesar de indicar que os alemães eram contrários, ele insistiu que essa seria a saída. "Estou muito preocupado com essa crise afetando a América Latina, em especial o Brasil", disse. "Os bancos europeus tem tanta exposição nesses empréstimos que temos um risco de uma recessão mundial. Precisamos de algum tipo de acordo." 

Blair então respondeu: "não acho que tenhamos visto o pior disso ainda". Clinton concordou, mas insistiu em sua proposta. "Não. Mas se agirmos rapidamente poderemos evitar que o Brasil seja levado abaixo", afirmou.  

No dia 6 de outubro, em outra conversa, a preocupação de Clinton era de que a crise econômica não se proliferasse pela América Latina e, para isso, ele planejava acordos no G7 para lidar com a situação. Sua preocupação com o Brasil, porém, era ainda mais nítida.

"O grande teste agora é o que ocorrerá com o Brasil", disse Clinton. O americano lembra que Fernando Henrique Cardoso havia vencido as eleições, dois dias antes, mas que a crise não estava resolvida. "Eles tem menos de US$ 40 bilhões de reservas (em espécie) agora e não acho que ele consegue segurar por três semanas sem dizer qual é sua proposta para reformas", alertou. "Se o Brasil cair, todos nós iremos de lidar com isso."

Menos de dez dias depois, em 14 de outubro, outra vez a crise financeira brasileira aparece no radar dos dois líderes. Ao debaterem estratégias para lidar com a situação nos países emergentes, Clinton defendeuuma ação rápida no Brasil. "Quanto mais esperarmos, maior a chance de um colapso que vai custar muito dinheiro para arrumar", disse. 

"Acho que precisamos de uma linha clara para ajudar o Brasil e evitar que a América Latina caia nessa. Os riscos de não termos sucesso são maiores do que quando ajudamos o México", disse. "Mas os riscos serão minimizados se simultaneamente tivermos uma estratégia completa de curto prazo, incluindo para ajudar esses países, mas não apenas para eles." O ex-presidente americano foi além sobre sua intenção de ajudar FHC. "Precisamos mostrar que estamos sendo sérios sobre o Brasil. 

No dia 21 de janeiro de 1999, a crise voltaria à pauta dos dois líderes. Clinton contou a Blair como Carlos Menem, ex-presidente da Argentina, o havia visitado. "Ele tem uma grande política econômica", disse. Sobre o Brasil, porém, Clinton lamentou. "O país está tremendo."  

Desigualdade. O americano parecia entender bem a situação de desigualdade social no Brasil. Em 18 de junho de 1999, ele se queixou com Blair sobre os Republicanos no Congresso. "Eles simplesmente querem cortar impostos para todos. Querem colocar os ricos atrás de portões para que os famintos não cheguem a eles", alertou. "Basicamente querem um Brasil melhorado para os EUA", disparou Clinton. "É horrível, mas acho que conseguiremos vencer."

Sobre o restante da América Latina, Clinton não economizaria críticas. Falando sobre a disputa comercial relativa às exportações de bananas, o americano ironizou: "a América Central e Caribe parecem garotos de escola se queixando. Ele deveriam pensar em seus interesses comuns", completou. 

Corrupção companheira: tenebrosas transações envolvendo dinheiro do BNDES e o PT

Segundo matéria publicada pela revista ÉPOCA (nas bancas, em 09.01.2016), dinheiro do BNDES foi desviado para a campanha da Dilma em 2014. E há gente que ainda acha que faltam provas do envolvimento direto da Dilma com corrupção para que se justifique o impeachment...
Existem muitos motivos para que o ex-ministro do MDIC, atual governador de MG, insistisse no caráter secreto de muitas dessas operações de "empréstimo" com certos países, provavelmente porque uma boa parte revertesse padrão partido mafioso.

Dilma garantiu empréstimo camarada do BNDES para Andrade Gutierrez em Moçambique 

Documentos revelam que o governo atuou em favor da Andrade Gutierrez na contratação de um financiamento de US$ 320 milhões do banco estatal, com condições especiais, na véspera da eleição de 2014 

THIAGO BRONZATTO 
ESTRATÉGIA Dilma Rousseff e o presidente de Moçambique, Armando Guebuza, em 2013. Segundo a embaixada, a presidente se dispôs a resolver a liberação do empréstimo ao país africano

Em março de 2013, a presidente Dilma Rousseff se reuniu com o presidente de Moçambique, Armando Guebuza, em Durban, na África do Sul, durante um encontro de países subdesenvolvidos. O assunto era urgente: um empréstimo de US$ 320 milhões do BNDES. Guebuza, segundo relato que fez a seus ministros, disse que as exigências impostas para a liberação do crédito estavam travando as obras de infraestrutura em seu país. Depois de ouvir atentamente, Dilma se colocou à disposição para resolver o assunto. O teor da conversa foi transmitido por uma das diretoras da Andrade Gutierrez na África Adriana Ribeiro à então embaixadora do Brasil em Maputo, Lígia Maria Scherer. As negociações, porém, não avançaram. Para receber o dinheiro do banco estatal brasileiro destinado à construção da barragem de Moamba Major, em Moçambique, o país africano deveria topar abrir uma conta bancária numa economia com baixo risco de calote. Esse é um procedimento comum nos financiamentos à exportação do BNDES.

>> Saiba mais: Acordo da Andrade Gutierrez com MPF também prevê delação de executivos

Guebuza, porém, recusava-se a aceitar essa condição. Contrariado, em agosto de 2013, o ministro das Finanças de Moçambique, Manuel Chang, encaminhou uma carta oficial ao governo brasileiro. A correspondência tratava das dificuldades políticas em abrir uma conta em moeda estrangeira no exterior para pagar dívidas com o Brasil enquanto recebia doações de outros governos para projetos sociais.Pegaria mal. A ideia era abrir uma conta no país africano. Essa mensagem foi acompanhada de um recado claro da Embaixada do Brasil em Maputo, capital de Moçambique: caso os recursos do BNDES não fossem liberados, dificilmente a construtora Andrade Gutierrez seria escolhida para construir a barragem. Haveria indícios de que o Brasil perderia o projeto para empresas de outros países se a questão do financiamento pelo BNDES não pudesse ser solucionada, afirma a mensagem.

Telegrama secreto do Itamaraty relata que Dilma se dispôs a destravar o empréstimo camarada do BNDES para Moçambique

O alerta surtiu efeito em Brasília. Um mês depois, no dia 9 de setembro de 2013, foi realizada a 97ª reunião do Conselho de Ministros da Câmara de Comércio Exterior (Camex), órgão ligado ao Conselho de Governo da Presidência da República, formado por sete ministérios e presidido naquele momento pelo petista Fernando Pimentel, então ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), fiel escudeiro de Dilma e, atualmente, governador de Minas Gerais. A ata sigilosa, obtida por ÉPOCA, relata uma discussão sobre o pedido de Moçambique de dispensa da exigência da garantia da conta no exterior para a liberação do empréstimo do BNDES. O representante do Ministério da Fazenda, Dyogo Oliveira, reforçou que a abertura de uma conta era muito importante e ainda ressaltou que caso essa premissa fosse descartada surgiriam outros dois problemas. Primeiro, seria difícil controlar a conta dentro de Moçambique. Segundo, o país africano não possuía limite de crédito no Fundo de Garantia à Exportação (FGE), responsável por cobrir um eventual calote. Pimentel discordou e votou pela flexibilização das garantias, abrindo uma clara exceção para Moçambique. Essa opinião foi endossada por representantes da Casa Civil, comandada por Gleise Hoffmann, e do Ministério das Relações Exteriores, sob a gestão de Luiz Alberto Figueiredo, além do ministro interino do Desenvolvimento Agrário, Laudemir André Müller. Com a aprovação da maioria, a posição defendida por Pimentel prevaleceu.

 Fernando Pimentel, Governador Estado de Minas Gerais, durante visita ao jornal Valor Economico (Foto: Silvia Costanti/Valor)

Depois de destravado o empréstimo para a obra em Moçambique, a operação passou por ajustes jurídicos no BNDES. Em 16 de julho de 2014, dez meses depois da reunião da Camex e já durante a campanha para a eleição presidencial, foi assinado um contrato entre o banco, o país africano e a Andrade Gutierrez, ao qual ÉPOCA teve acesso. O acordo, selado pelo ministro das Finanças moçambicano, prevê uma linha de crédito de até US$ 320 milhões. Esse dinheiro foi endereçado a um consórcio formado pelas empreiteiras Zagope Construções e Engenharia, controlada pela Andrade Gutierrez, e Fidens Engenharia, responsáveis pelo projeto de construção da barragem no país africano. A Zagope é uma empresa conhecida pelos procuradores que investigam corrupção no Brasil.

Contrato do BNDES com Andrade Gutierrez e Moçambique (Foto: Reprodução)

>> Saiba mais: Documentos secretos revelam: Lula fez lobby para Odebrecht em licitação na Guiné

De acordo com uma denúncia apresentada pela força-tarefa do Ministério Público Federal (MPF) contra executivos da Andrade Gutierrez, que foi aceita pelo juiz Sergio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, a Zagope usou uma de suas subsidiárias como veículo de pagamento de propina. O dinheiro saía da conta da Zagope Angola para uma empresa sediada no Panamá, administrada pelo operador Mario Goés que, segundo o MPF, repassava pixulecos para Pedro Barusco e Renato Duque, respectivamente ex-gerente e ex-diretor da Petrobras. As operações da Andrade Gutierrez na África e em Portugal continuam na mira de investigadores da Lava Jato, que fizeram um acordo de cooperação internacional para buscar mais informações sobre as transações financeiras da empreiteira no exterior.

No mês seguinte à assinatura do contrato com o BNDES, no dia 20 de agosto, às 8h54, Edinho Silva, então tesoureiro da campanha presidencial à reeleição de Dilma, visitou Otávio Marques de Azevedo no escritório da Andrade Gutierrez, em São Paulo. A conversa durou quase uma hora. Nove dias depois desse encontro, a empreiteira realizou uma transferência no valor de R$ 10 milhões para a campanha de Dilma. Em seguida, do dia 23 setembro a 22 de outubro de 2014, a construtora doou ao todo mais R$ 10 milhões, em três parcelas. Entre as empreiteiras brasileiras, a Andrade foi a principal contribuidora da reeleição de Dilma, desembolsando quase o triplo do total repassado pela UTC. 

>> Exclusivo: Agência ligada ao PT e mulher de Fernando Pimentel faziam lobby no BNDES, diz PF

O responsável por receber essa bolada era Edinho, atual ministro da Secretaria de Comunicação Social e também investigado na Lava Jato em inquérito aberto pelo Supremo Tribunal Federal (STF) sobre doações de campanha em 2014. A Procuradoria-Geral da República apura se Edinho achacou empreiteiros como Azevedo, que tinham contratos com o governo. No fim do ano passado, executivos da Andrade, entre eles Azevedo, presos em Curitiba, fecharam um acordo de delação premiada, em que deverão revelar, entre outras coisas, o esquema de corrupção por trás dos financiamentos de campanhas eleitorais. Policiais e procuradores acreditam que, ao percorrer o caminho do dinheiro movimentado pelas construtoras como a Andrade Gutierrez, poderão, mais cedo ou mais tarde, deparar com os empréstimos liberados pelo BNDES.

Ata da reunião do Camex: Fernando Pimentel votou a favor da dispensa de garantias básicas exigidas pelo BNDES para conceder financiamentos para a exportação, mesmo diante da posição contrária do Ministério da Fazenda e do risco de calote

Questionada por ÉPOCA a respeito da negociação, a Presidência da República informa, por meio de sua área de comunicação, que o governo Dilma Rousseff sempre teve como estratégia expandir as exportações de produtos manufaturados e bens e serviços para os mercados da África e América Latina. Seguindo essa diretriz, com total autonomia e sem nenhuma ingerência de qualquer instituição do governo, o Cofig (Comitê de Financiamento e Garantia das Exportações, colegiado responsável por avaliar as condições de financiamentos do governo federal a operações de exportação) e a Camex tomam suas decisões, afirma a Presidência, por escrito. Cabe ainda ressaltar que as doações feitas à campanha de 2014 não tem nenhuma relação com as ações de governo.

Em nota, o BNDES afirma que o controle na concessão dos créditos à exportação se baseia em critérios técnicos e tem permitido apoio às empresas brasileiras com uma inadimplência extremamente baixa. E também que não é incomum que uma operação seja aprovada na Camex e depois transcorra, até a contratação, um prazo similar ao observado na operação. O banco não divulga o fluxo de desembolsos dos financiamentos à exportação.

Para a Andrade Gutierrez, o procedimento todo foi regular. A Andrade Gutierrez reitera que todos os financiamentos contratados junto ao BNDES obedecem à legislação brasileira e seguem avaliação técnica rigorosa do banco, afirma a empresa, numa nota. A empreiteira informa, na mesma nota, em relação ao empréstimo do BNDES para a construção da barragem, que o valor de US$ 320 milhões foi contratado em julho de 2014 e não foi liberado naquela data. A empresa não respondeu às questões envolvendo as doações da campanha de 2014. Caberá aos investigadores da Lava Jato esclarecer se há relação entre o empréstimo do BNDES e a doação à campanha de Dilma.

sábado, 9 de janeiro de 2016

Teoria geral da fraude, da mentira e da corrupcao - Paulo Roberto de Almeida


Teoria geral da fraude, da mentira e da corrupção

Paulo Roberto de Almeida

Escrevo esta crônica em minha qualidade de cidadão, pagador regular de impostos, plenamente consciente de meus direitos e obrigações, não enquanto funcionário público, da carreira diplomática, servidor do Estado (não necessariamente do governo atual) e plenamente consciente das regras legais que impõem restrições a pronunciamentos relativos à política externa ou ao exercício das funções diplomáticas. Nada do que vou dizer tem algo a ver com essas duas vertentes funcionais, e sou portanto livre de me expressar de acordo com minha consciência e deveres cívicos.
A sociedade brasileira tomou consciência – pelo menos seus setores mais esclarecidos – de que o Brasil vem sendo comandado, desde o início de 2003, por uma organização política especial que tomou posse do poder por meios legais, mas que vem se desempenhando no exercício do poder com a intenção de nele permanecer por todos os meios possíveis, legais e ilegais. Pode ser que, no início de suas atividades políticas essa organização não tivesse ainda adquirido todas as características que são as suas atualmente, mas é um fato que suas ações, desde vários anos, tem sido compatíveis com as atividades de uma organização especial em suas manifestações práticas. Tanto é assim que boa parte dos seus dirigentes ou estão sendo processados, ou já foram condenados e cumprem penas, e vários outros serão provavelmente objeto de novas investigações e possivelmente condenados também.
O motivo pelo qual essa organização especial não foi ainda afastada do poder se explica, principalmente, pelo fato de que certa parte daqueles que deveriam julgá-la e condená-la, no âmbito do legislativo ou do judiciário, se encontra ou envolvida nos esquemas de beneficiamento – legal ou ilegal – promovidos por essa organização, ou então é conivente com ela e com seus propósitos, pelo fato de ocupar cargos e funções justamente concedidos por ela. Não se pode vislumbrar, na presente circunstância, condições para que ela venha a ser constitucionalmente afastada do poder, por faltar, justamente, maioria consistente, nesses dois âmbitos, que pudesse se pronunciar em consonância com os meios constitucionais para lograr esse objetivo, que é o da maioria da cidadania. Não existem essas condições inclusive porque a situação econômica ainda não se deteriorou suficientemente para “obrigar” representantes políticos e funcionários do judiciário a adotar uma resposta decisiva ao quadro de descalabro econômico e de erosão moral que integram o processo que pode ser chamado de “Grande Destruição”.
Os cidadãos conscientes são, portanto, obrigados a conviver, por algum tempo mais, com a fraude, com a mentira e com a corrupção, que já se tornaram, desde vários anos, instrumentos corriqueiros de poder, mecanismos de funcionamento do sistema político e alavancas da hegemonia política ainda exercida pela dita organização. Esta é constituída, basicamente, por representantes de antigas correntes alternativas do movimento sindical – que se profissionalizaram rapidamente no peleguismo habitual nesses meios –, por sobreviventes da antiga guerrilha reciclados na atividade política não armada – mas que adquiriram, preservaram e aperfeiçoaram, alguns por treinamento de conhecidas ditaduras, técnicas das antigas organizações clandestinas a que pertenciam – e por uma grande maioria de militantes ingênuos, mal informados ou oportunistas, que partilham, vagamente, dos antigos ideias de justiça social e de distributivismo estatal que essa organização sempre pregou (no começo, provavelmente de modo sincero, depois como tática de preservação do poder).
O que estamos contemplando, no momento presente, é um sistema de poder que se baseia exatamente no trinômio que figura no título desta crônica: fraude, mentira e corrupção. São três crimes políticos que deveriam ser sancionados pelos poderes do Estado, não estivessem estes cingidos por determinados arranjos e combinações que se originam justamente no governo em vigor, que se utiliza dessas ferramentas para se perpetuar no poder. A cidadania consciente já tentou, por diversas maneiras, pressionar aqueles representantes e funcionários desses poderes do Estado a tomar alguma atitude digna, que pudesse livrar o país e a sociedade do pesadelo que é conviver com a podridão moral do partido no poder, responsável quase exclusivo pela Grande Destruição que atingiu o país e que vai demandar anos de sofrimentos à população para ser contornada e superada. Não estamos vendo, no momento presente, circunstâncias possíveis, e condições favoráveis, para que uma nova situação política se instale.
É muito provável, assim, que o estado atual de deterioração econômica, de erosão institucional e de descalabro moral continue durante mais algum tempo, até que outras condições e circunstâncias surjam e imponham alguma outra solução que não a continuidade do pavoroso quadro social e político que somos obrigados a suportar na presente conjuntura de declínio ético em nosso país. Os cidadãos conscientes – que já formam uma maioria em favor de uma mudança radical nos esquemas de poder em vigor, de acordo com o que as pesquisas revelam – se sentem impotentes ante o quadro descrito, daí o motivo para que alguns mais exasperados, mas equivocados, estejam sugerindo meios extralegais de alteração da situação atual. Não é o caso da maioria dos cidadãos conscientes, e deste servidor do Estado, que continuará a lutar por todos os meios legais para que a dignidade política seja plenamente restabelecida no país.
Esta crônica dos tempos correntes não existiria e não seria necessária fossem outros os personagens de nosso sistema político; ela existe pela simples consciência de um dever cívico.

[Anápolis, 23 de novembro de 2015, 3 p.

Ajuste Fiscal: quem disse que nao passaria? - Pedro Canario (Consultor Juridico)

Mais impostos

Congresso aprovou a maioria das medidas provisórias do ajuste fiscal

Pelo menos no que diz respeito ao aumento de impostos ou de alíquotas tributárias, o ajuste fiscal do governo passou praticamente do jeito que chegou pelo Congresso Nacional. Das nove medidas provisórias que trataram do ajuste, apenas uma foi rejeitada totalmente pelo Legislativo.
A maior derrota do governo foi a da Medida Provisória 685, que dá descontos em multas tributárias aos contribuintes que desistem de seus litígios judiciais ou administrativos. A derrota está na rejeição ao trecho que obrigava as empresas a informarem à Receita Federal sobre seus planejamentos fiscais, sob pena de serem multadas como sonegadoras.
O Congresso entendeu que a medida era inconstitucional por criar obrigação tributária fora das condições autorizadas pelo Código Tributário Nacional e pela Constituição. Também entendeu que, ao tratar as empresas que não dessem informações à Receita como sonegadoras, a MP mexeu em assuntos penais (sonegação fiscal é crime tributário), o que não pode ser feito por meio de medida provisória.
Entre as MPs mais importantes estão a que altera a tabela do Imposto de Renda de Pessoa Física e a que apresenta uma nova forma de cálculo da aposentadoria, em substituição ao fator previdenciário. Ambas foram aprovadas pelo Congresso e convertidas em lei.
Outra comemorada vitória do governo é o fim da isenção fiscal de PIS e Cofins incidentes sobre produtos de informática. O fim da isenção foi proposto pelo governo na MP 690 e mantido pelo Congresso — que havia chegado a um acordo com o setor de instituir uma volta progressiva da tarifa integral dos tributos, o que foi vetado pela presidente Dilma Rousseff.
De acordo com o tributarista Paulo Rogério Sehn, sócio do escritório Trench, Rossi e Watanabe Advogados, o fim da isenção é ilegal. Isso porque o artigo 178 do Código Tributário Nacional só autoriza o corte unilateral de isenções fiscais concedidas sem motivação. No caso dos equipamentos de informática, o desconto em PIS e Cofins era apenas para empresas que investissem 3% de seus faturamentos em pesquisa e desenvolvimento. Portanto, não é uma isenção imotivada. A lei já é alvo de mandado de segurança, impetrado pela Abinee, que representa a indústria elétrica e eletrônica.
Receitas e despesas
Somadas as MPs aprovadas aos cortes de cerca de R$ 80 bilhões em gastos promovidos pelo governo, dá para dizer que o ajuste fiscal passou. O que não quer dizer que acabou a crise. Como lembra o advogado Paulo Sehn, “o governo tinha prometido superávit e fechou 2015 com um déficit absurdo”.
De fato, o Tesouro Nacional prevê que as contas fechem em R$ 110 bilhões negativos. Isso se deu por dois motivos. O primeiro é o atraso nos repasses do Tesouro aos bancos públicos para o custeio de programas sociais, manobra que ficou conhecida como pedaladas fiscais e que foi considerada ilegal pelo Tribunal de Contas da União.
Diante do parecer do TCU, o governo passou a registrar as pedaladas como dívidas, e as pagou ainda no fim de 2015. Ao todo, foram repassados R$ 55,2 bilhões ao Banco do Brasil, ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e ao FGTS. Considerando as demais obrigações do ano, o total pago foi de R$ 72,4 bilhões.
O outro motivo, comenta Paulo Sehn, é que o governo não conseguiu articular a discussão da volta da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentações Financeiras) no Congresso. “Infelizmente, a pauta política dominou o Congresso durante o ano passado e não sobrou espaço para discussões tributárias.”
Porém, a CPMF deve ser levada ao Congresso em 2016 com mais condições de aceitação. A ideia inicial do governo era que a CPMF voltasse com uma alíquota menor, de 0,025% do valor movimentado — antes era de 0,038%. No entanto, em reunião com governadores para discutir as dívidas dos estados, o governo aventou a ideia de voltar à alíquota original, mas deixando só 0,025% com a União. O resto iria para os estados. Isso resultará numa receita de R$ 32 bilhões para este ano, segundo as contas do governo.

Clique aqui para ver a lista de medidas provisórias discutidas pelo Congresso em 2015.

 é editor da revista Consultor Jurídico em Brasília.

Um questionario sobre a carreira diplomatica: minhas respostas - Paulo Roberto de Almeida

O problema de ficar revirando velhas listas de trabalhos é que se (re)descobre coisas interessantes há muito esquecidas, e que eventualmente não tiveram divulgação suficiente.
O texto que segue abaixo é de 2009, e se trata de respostas livres a um questionário recebido de estudante universitária de uma federal, que pretendia seguir a carreira diplomática, e que portanto me enviou uma série de perguntas para fins de um trabalho acadêmico.
Como acredito que a maior parte das respostas permanece inteiramente válida, mesmo após seis anos de sua escrita, posto novamente, sem necessidade de indicar o questionador.
Deve interessar outros interessados na carreira, que porventura tenham interesse nos meus interesses pela carreira.
Muitos "interesses" não é mesmo?
Em todo caso, vou postar primeiramente as perguntas recebidas, depois minhas respostas.
Divirtam-se os que tiverem tempo e paciência para revisar a totalidade das respostas.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 8 de janeiro de 2016


Msg de 24.04.2009:
Boa tarde!
Sou acadêmica da última fase de graduação em administração na UFXX, e tenho interesse em seguir a carreira diplomática.
Como trabalho da disciplina de planejamento de carreira preciso fazer uma entrevista com profissional da área que pretendo atuar.
Se houver disponibilidade, eu tenho interesse que o entrevistado seja o sr., para tanto solicito que responda as perguntas abaixo.

1. Como você se sente por ter escolhido essa profissão (área de atuação)?
2. Como você descreveria a sua profissão?
3. Qual sua formação acadêmica? Você considera que ela foi fundamental para o sucesso profissional?
4. Quais as principais dificuldades enfrentadas para conseguir passar no concurso?
5. Quando você iniciou sua carreira você tinha definido alguns objetivos e metas de onde queria chegar?
6. Como você integra as diversas esferas de sua vida (trabalho, família, lazer, esporte, cursos, etc.)? Está satisfeito?
7. Quais os períodos de sua carreira que você mais gostou?
8. Quais os períodos de sua carreira que você menos gostou?
9. Dentro da perspectiva de sua carreira tem alguma coisa que você gostaria especialmente de evitar?
10. Você tem objetivo em longo prazo na sua carreira? Você tem uma visão de futuro profissional?
11. Você se considera realmente bom (boa) em quê? Quais são seus pontos fortes? E como você aproveita seus pontos fortes no seu trabalho?
12. Quais são seus pontos fracos?
13. O que você mais deseja na sua carreira?
14. O que você pensa que acontecerá à sua carreira nos próximos dez anos?
15. O que você aconselharia para alguém que estivesse iniciando na mesma área?
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 Agora as minhas respostas: 

Carreira Diplomática: respondendo a um questionário

Paulo Roberto de Almeida (www.pralmeida.org)
Respostas a questões colocadas por:
(...)
graduanda em administração na UFXX.

1. Como você se sente por ter escolhido essa profissão (área de atuação)?
PRA: Bastante bem: de certa forma, a profissão me escolheu, pois que desde muito cedo comecei a viajar, primeiro pelo Brasil, depois pela América do Sul e, finalmente, ao completar 21 anos, decidi estudar na Europa, por meus próprios meios e obtendo meus próprios recursos. Foi uma escolha que me preparou para uma vida nômade e aventureira e nunca me arrependi de ter-me lançado ao mundo em fase ainda precoce e sem sequer ter terminado o segundo ano da graduação. Como minha intenção era estudar fora do Brasil, pode-se dizer que realizei meu intento. Quando regressei ao Brasil, depois de quase sete anos na Europa, eu já estava preparado, digamos assim, para tornar-me diplomata. Mas, antes, não tinha pensado: “tropecei” com a carreira, se ouso dizer. Até então, eu só queria derrubar o governo militar.

2. Como você descreveria a sua profissão?
PRA: Uma burocracia de alto nível de qualificação técnica com ampla abertura para as humanidades e o conhecimento especializado. Trata-se, simplesmente, da mais intelectualizada carreira na burocracia federal, combinando aspectos da carreira acadêmica, da pesquisa aplicada e da elaboração de decisões em ambiente altamente competitivo, tanto interna, quanto externamente. Uma elite, como se costuma dizer.

3. Qual sua formação acadêmica? Você considera que ela foi fundamental para o sucesso profissional?
PRA: Ciências Sociais, ou humanidades, no sentido lato, e acredito que ela foi fundamental no ingresso e sucesso na carreira escolhida. Desde muito cedo inclinei-me para os estudos sociais, com forte ênfase na história, na política e na economia, complementados por uma dedicação similar a geografia, antropologia, línguas e cultura refinada, de uma maneira geral. Sou basicamente um autodidata e creio que isso facilitou-me enormemente o ingresso na carreira, pois quase não necessitei de muito estudo para os exames de ingresso. Aliás, entre a decisão de fazer o concurso (direto, no meu caso) e o ingresso efetivo, decorreram pouquíssimos meses (três).

4. Quais as principais dificuldades enfrentadas para conseguir passar no concurso?
PRA: Direito e Inglês, posto que eu havia estudado amplamente todas as demais matérias, mas não Direito, e todos os meus estudos foram feitos em Francês, que eu dominava amplamente. Mas, meu Inglês era muito elementar, servindo tão somente para leituras. Acho que passei raspando nessas duas matérias, nas outras fui bem.

5. Quando você iniciou sua carreira você tinha definido alguns objetivos e metas de onde queria chegar?
PRA: Não especialmente: nunca fui carreirista, no sentido tradicional do termo, e não me preocupava em ser embaixador ou ocupar qualquer posto de distinção. O que me seduzia era a profissão em si, a mobilidade geográfica, o conhecimento de novos países, a possibilidade de estar sempre aprendendo, estudando, viajando. Sou basicamente um estudioso, um observador da realidade, um “compilador” de informações e análises e um escritor improvisado. Todo o resto me é secundário.

6. Como você integra as diversas esferas de sua vida (trabalho, família, lazer, esporte, cursos, etc.)? Está satisfeito?
PRA: Imenso sacrifício para consegui fazer tudo aquilo que tenho vontade, pela simples razão que eu tenho vontade de ler tudo, o tempo todo, em qualquer circunstância, assim como tenho vontade de viajar, de participar de atividades acadêmicas e intelectuais, tendo ao mesmo tempo de me desempenhar em funções atribuídas pela burocracia no meio de tudo isso. Ora, é praticamente impossível conciliar tantas vontades, e ainda ser um marido perfeito, um pai de família perfeito e outras coisas da vida social e relacional. Em síntese, esses outros aspectos foram de certa forma sacrificados no empenho pessoal em ler, estudar e escrever. Reconheço essas imperfeições, mas não se pode ter tudo na vida: escolhas são inevitáveis, e as minhas estão do lado da leitura, do saber e da escrita. São atividades nas quais eu me realizo plenamente. Em outros termos, ninguém consegue integrar todos os seus interesses perfeitamente, e algum aspecto (ou vários) acaba sempre sendo sacrificado; no meu caso, são horas de sono, de lazer, de simples far niente, e também certa negligência familiar, reconheço. Não pratico esportes, a não ser caminhadas moderadas, já em idade madura. Pratico leituras, com alguma intensidade, eu diria intensíssima, e sobretudo o gosto da escrita. No mais, sou um pouco eremita...

7. Quais os períodos de sua carreira que você mais gostou?
PRA: Todos, pois em todos e em cada um eu fiz aquilo que mais gosto: viajar, muito, intensamente, ler, também intensamente, escrever, observar, aprender, em toda e qualquer circunstância, mesmo em situações difíceis de abastecimento, conforto, restrições monetárias ou outras. Toda a minha carreira me trouxe algo de bom, mesmo em situações temporariamente de sacrifício. Nunca deixei de fazer aquilo que mais gosto, e que já foi descrito anteriormente.

8. Quais os períodos de sua carreira que você menos gostou?
PRA: Numa ou noutra situação, alguns postos apresentam dificuldades materiais, desconfortos psicológicos, desafios razoáveis: por pequenos momentos, chega-se a desejar voltar ao Brasil e retornar à rotina burocrática do cerrado central, onde os atrativos são menores, mas também as surpresas. De toda forma, sempre aproveitei os momentos de dificuldade para refletir e escrever, como sempre, aliás.

9. Dentro da perspectiva de sua carreira tem alguma coisa que você gostaria especialmente de evitar?
PRA: Sim, talvez eu devesse ter dedicado menos atenção aos livros e mais às pessoas, mas essas são escolhas que fazemos deliberadamente, por opções próprias, pensadas ou não. Quem tem a compulsão pela leitura e pela escrita, não consegue acalmar-se a menos de satisfazer o seu “vicio”, daí o sacrifício de outros aspectos da vida social que muita gente valoriza em primeiro lugar. Por outro lado, nunca, na carreira, fui obrigado a assumir obrigações que eu mesmo não desejasse assumir, como por exemplo trabalhar em áreas para as quais eu não me sinto talhado nem tenho a mínima vontade de experimentar: administração, por exemplo, ou cerimonial, ou talvez ainda consular. São áreas nas quais eu provavelmente me sentiria infeliz, pois o meu terreno natural são os estudos, de qualquer tipo: geográfico, político, econômico, cultura, antropológico, no sentido amplo. Todas as áreas funcionais de caráter geográfico, político ou sobretudo econômico me servem perfeitamente. Aliás, nunca me pediram para trabalhar em áreas nas quais eu não gosto, e se me pedissem eu não teria nenhuma hesitação em recusar, mesmo podendo incorrer em alguma falta funcional ou ser sancionado por isto. Sou um pouco anarquista, e não gosto de fazer o que me mandam e sim o que eu decido e gosto de fazer.
Por outro lado, jamais me pediram para escrever ou dizer algo que violentasse minha consciência, e eu não hesitaria um segundo em recusar-me terminantemente, como algumas vezes me recusei a defender determinados pontos de vista, que não eram os meus. Por outro lado, jamais enfrentei a obrigação de escrever naquele estilo clássico, ou chatérrimo, que é o diplomatês habitual, cheio de adjetivos hipócritas e de pura formalidade vazia: não tenho espírito, paciência nem disposição para esse tipo de enrolação. Costumo escrever o que penso, sem qualquer concessão a formalismos. Sobretudo, não costumo produzir bullshits, muito freqüentes nesta profissão...

10. Você tem objetivo em longo prazo na sua carreira? Você tem uma visão de futuro profissional?
PRA: Acredito que o diplomata deve servir antes à Nação do que a governos, deve defender valores, e não se subordinar a teses momentaneamente vitoriosas que por alguma eventualidade confrontem esses valores. Já escrevi algo a esse respeito, e remeto a meu trabalho: “Dez Regras Modernas de Diplomacia” (Chicago, 22 jul. 2001; São Paulo-Miami-Washington 12 ago. 2001, 6 p., n. 800; ensaio breve sobre novas regras da diplomacia; revista eletrônica Espaço Acadêmico, a. 1, n. 4, setembro de 2001; link: http://www.espacoacademico.com.br/004/04almeida.htm).

11. Você se considera realmente bom em quê? Quais são seus pontos fortes? E como você aproveita seus pontos fortes no seu trabalho?
PRA: Creio que sou capaz de fazer análises contextuais que envolvam conhecimento histórico, embasamento econômico e situação política, ou seja, tenho instrumentos analíticos e amplos conhecimentos que me permitem situar qualquer problema (ou quase) em um contexto mais amplo, e daí extrair alguns elementos de informação para a instrução de um processo decisório que tenha em conta o interesse nacional. Toda a minha vida eu estudei o Brasil e o mundo, visando tornar o primeiro melhor, num mundo que nem sempre é cooperativo. Registre-se que eu não pretendo tornar o Brasil melhor para si mesmo, ou seja, uma grande potência ou qualquer pretensão desse gênero, que encontro simplesmente ridícula. Eu pretendo tornar o Brasil melhor para os brasileiros, ponto. Contento-me apenas com isso. Minha perspectiva, a despeito de ser um funcionário de Estado, não é a do Estado. Não pretendo trabalhar no Estado, para o Estado, com o Estado: minha perspectiva é a dos indivíduos concretos, e meus objetivos são promover os indivíduos, se preciso for contra o Estado. Não tenho nenhum culto ao Estado e nem pretendo torná-lo maior ou mais poderoso, apenas mais eficiente para servir aos indivíduos, não a si mesmo. Desespera-me essas pretensões nacionalistas estatizantes, pois elas se fazem, em geral, em detrimento do bem-estar individual da maior parte dos cidadãos.
Por outro lado, não me considero patriota, no sentido corriqueiro do termo. Sou brasileiro por puro acidente geográfico, pois poderia ter nascido em qualquer outro país ou em qualquer outra época, por puro acaso. Gostaria de reiterar esse ponto, com toda a ênfase que me é permitida. Não sou dado a patriotismos, nem a chauvinismos ultrapassados e ridículos. A nacionalidade, repito, é um acidente geográfico, ou talvez seja a naturalidade, da qual decorre a primeira. Parto do pressuposto da unidade fundamental e universal da espécie humana. Sou brasileiro, como poderia ter sido esquimó, hotentote ou pigmeu, e ninguém seria responsável por esses acasos demográficos, nem mesmo meus pais, posto que ninguém “fabrica” uma pessoa com base em especificações pré-determinadas. Somos em parte o resultado da herança genética (em grande medida, talvez mais do que o indicado ou desejável, mas talvez não a parte mais decisiva de nossas personalidades); em parte o resultado do meio social e cultural no qual crescemos, e das influências que experimentamos involuntariamente em diversas etapas formativas de nosso caráter; e em parte ainda (o que espero mais substancial ou importante), somos o produto de nossa própria formação ativa, dos estudos empreendidos e dos esforços que fazemos nós mesmos para moldar nossas vidas, nosso estilo de comportamento e nossa maneira de pensar, com base em escolhas e preferências que adotamos ao longo da vida. Devemos sempre assumir responsabilidade pelo que somos, e jamais atribuir ao meio ou a qualquer herança genética determinados traços que podem eventualmente revelar-se menos funcionais para nosso desempenho profissional ou intelectual.
Meus pontos fortes, portanto, são minha capacidade analítica, meus conhecimentos acumulados e meu devotamento à causa dos indivíduos, não dos Estados, e sempre tento passar esses pontos à frente de qualquer outra consideração. Não hesito em defender meus pontos de vista, mesmo contra meus interesses imediatos, que poderiam recomendar uma acomodação com a situação presente – a lei da inércia é uma das mais disseminadas na humanidade – ou com autoridades de qualquer tipo. Não costumo fazer concessões a autoridades apenas para obter vantagens pessoais, e acho essa atitude basicamente correta (ainda que a um custo por vezes enorme no plano pessoal). Talvez seja teimosia de minha parte, mas considero isso antes uma virtude, do que um defeito. Enfim, tendo concepções fortes sobre determinados temas, me é muito mais fácil preparar e expor posições do interesse do Brasil, com base em conhecimentos previamente acumulados, o que me dispensa de longas pesquisas ou buscas em arquivos.

12. Quais são seus pontos fracos?
PRA: Devo ter (e tenho) vários, sendo os mais evidentes essa introversão habitual, essa preferência ao convívio com os livros, mais do que a convivência com pessoas, uma certa arrogância intelectual (que reconheço plenamente), derivada de leituras intensas e de uma imensa acumulação de conhecimentos e informações – que em excesso podem ser prejudiciais, dizem alguns – essa pretensão a saber mais do que os outros (o que em parte é verdade, pela simples intensidade de leituras, mas os outros não gostam que se lhes confronte os argumentos, obviamente). Por outro lado, não tenho nenhum respeito pela hierarquia ou pela autoridade, o que muitos consideram um defeito (mas não eu, dado meu anarquismo particular). Não sou de respeitar o argumento da autoridade, mas apenas a autoridade do argumento, a lógica impecável, e a decisão bem formulada, posto que empiricamente embasada, tecnicamente sólida, com menor custo-oportunidade ou a melhor relação custo-benefício. Enfim, sou um racionalista, e detesto impressionismos e subjetivismos, o que é muito fácil de encontrar em quaisquer meios. Daí choques inevitáveis com determinadas pessoas que pretendem mandar a partir de sua vontade exclusiva, não de um estudo aprofundado de situação. Enfim, ser rebelde assim deve ser um defeito...

13. O que você mais deseja na sua carreira?
PRA: Todos somos egocêntricos ou narcisistas em certa medida. Todos queremos reconhecimento e prestígio, por mais que se diga o contrário. Todos queremos ser elogiados e premiados (no meu caso não monetariamente ou em qualquer aspecto material). Assim, desejo ser reconhecido não necessariamente como um bom diplomata, mas simplesmente como um bom cidadão, alguém que cumpre seus deveres e atua conscienciosamente em benefício da maioria (que calha de ser o povo brasileiro, mas poderia ser qualquer outro, pois como disse, eu me coloco do ponto de vista dos indivíduos, não do Estado). Gostaria de ser reconhecido como estudioso, como esforçado e, sobretudo, como alguém comprometido com o bem comum. Pode ser vaidade, mas é assim que vejo minha carreira, que para mim não é uma simples carreira de Estado, mas sim uma atividade que me coloca no centro (ou pelo menos numa das agências) do Estado, ali colocado para servir a pessoas, não a instituições abstratas.
Gostaria que se dissesse de mim, em algum momento futuro: foi um funcionário dedicado, foi um homem bom, esforçado, devotado ao bem comum, sobretudo foi correto consigo mesmo e com todas as instâncias de interação social ou profissional. Praticou a honestidade intelectual e se esforçou para fazer do Brasil e do mundo lugares melhores do que aqueles que encontrou em sua etapa inicial de vida.

14. O que você pensa que acontecerá à sua carreira nos próximos dez anos?
PRA: Nada de muito relevante, posto que não sou carreirista e não faço da carreira o centro de minhas preocupações intelectuais ou sequer materiais. Estou na carreira diplomática, como poderia estar na academia ou em alguma outra atividade que tenha a ver com o estudo, o esforço intelectual, a análise e a elaboração de propostas. Sou basicamente um intelectual e a carreira para mim é secundária. Provavelmente vou me aposentar nos próximos dez anos, e aí dispor de todo o meu tempo livre para me dedicar àquilo de que mais gosto: leitura, redação, um pouco de aulas e palestras, viagens, alguns prazeres materiais (como a gastronomia, ou a gourmandise, por exemplo) e espero ter condições físicas de continuar escrevendo, ensinando e colaborando com a elevação intelectual da sociedade pelo maior tempo possível. Se me sobrar tempo gostaria de consertar algumas coisas que encontro muito erradas no Brasil, como por exemplo: a corrupção (generalizada em todas as esferas), a desonestidade intelectual nas academias, a miséria material de grande parte da população (que decorre, em minha opinião, de políticas erradas e do excesso de poderes conferidos ao Estado), enfim, tudo aquilo que sabemos errado em nosso País.

15. O que você aconselharia para alguém que estivesse iniciando na mesma área?
PRA: Seja estudioso, dedicado, honesto intelectualmente, esforçado no trabalho, um pouco (mas apenas um pouco) obediente, inovador, curioso, questionador – mas ostentando um ceticismo sadio, não uma desconfiança doentia –, tente aprender com as adversidades, trate todo mundo bem (e, para mim, da mesma forma, um porteiro e um presidente), não seja preguiçoso (embora dormir seja sumamente agradável), cultive as pessoas, mais do que os livros (o que eu mesmo não faço), seja amado e ame alguém, ou mais de um... Enfim, seja um pouco rebelde, também, pois a humanidade só avança com aqueles que contestam as situações estabelecidas, desafiam o status quo, tomam novos caminhos, propõem novas soluções a velhos problemas (alguns novos também). No meio de tudo isso, não se leve muito a sério, pois a vida é uma só – sim, sou absolutamente irreligioso – e vale a pena se divertir um pouco. Tudo o que eu falei ou escrevi acima, parece sério demais. Não se leve muito a sério, tenha tempo de se divertir, de contentar a si mesmo e os que o cercam.

Brasília, 21 de maio de 2009.