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quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Brasil: congresso aumenta a irracionalidade orcamentaria, contas publicas se deterioram

São dessas pequenas brigas, ou chantagens recíprocas entre executivo e legislativo -- aqui num caso absolutamente paroquial, deputados-vereadores querendo assegurar verbas para seus gastos eleitoreiros -- que provocam consequências danosas não só para as contas públicas (cuja racionalidade é altamente questionável), como também para o chamado "risco-Brasil".
Não tenho nenhuma dúvida de que as agências de risco vão rebaixar a classificação do Brasil, em face de notícias como as que vão abaixo.
Paulo Roberto de Almeida

Base contraria Dilma e aprova Orçamento impositivo

O Estado de S. Paulo, 7/08/2013 

Base aliada ignora trégua e desafia Dilma

Com empenho pessoal do presidente da Câmara, comissão especial aprova texto que obriga governo a pagar todas as emendas parlamentares

Eduardo Bresciani e Tânia Monteiro, Brasília

A base aliada ignorou o pedido de trégua de Dilma Rousseff e confrontou a presidente um dia depois de líderes de bancadas visitarem o Planalto. Comissão Especial da Câmara aprovou ontem proposta de emenda constitucional que obriga o Executivo a pagar todas as emendas parlamentares previstas no ano. Trata-se do Orçamento impositivo, que poderá garantir a cada um dos deputados R$ 10 milhões para obras em seus redutos no ano eleitoral de 2014. O governo é contra a medida.
Agora, o texto da PEC está pronto para ser submetido ao plenário. Depois de votação em dois turnos, terá de ser encaminhado para o Senado, algo que os deputados querem fazer até amanhã.
O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), empenhou-se pessoalmente para fazer o tema tramitar. Ontem, foi duas vezes até à comissão que debatia o projeto para cobrar a aprovação. Para ele, a medida é o fim do "toma lá, dá cá" entre Legislativo e Executivo. Normalmente, as emendas parlamentares são usadas como moeda de troca: o governo libera a verba e o parlamentar aprova os temas de interesse do Executivo e não cria embaraços para o Planalto.
"A matéria está inteiramente amadurecida", disse Alves sobre a emenda constitucional.
Pedidos. Alguns líderes chegaram a sugerir ao presidente da Câmara um adiamento da votação, mas ele disse não ver motivo justificado para postergar. Foi além: procurou o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), para pedir tratamento prioritário à matéria, para que possa entrar em vigor em 2014. A emenda não precisa de sanção presidencial para passar a valer.
O texto prevê a execução financeira, de forma isonômica, das emendas parlamentares com um limite de 1% da receita corrente líquida do ano anterior.
Termos. Em 2014, a estimativa é que o montante das liberações supere R$ 6 bilhões no total.
O texto traz um dispositivo que os parlamentares dizem poder facilitar a vida do governo: nos dois primeiros anos de vigência, será possível usar emendas de anos anteriores para se chegar ao mínimo estabelecido.
Os parlamentares colocaram ainda um gatilho para que caso haja necessidade de contingenciamento a fim de cumprir metas fiscais: as emendas poderão sofrer corte no mesmo porcentual do aplicado pelo governo em seu próprios gastos.
Isolado, o PT tentou ainda apresentar propostas alternativas para reduzir à metade o porcentual ou obrigar também estados e municípios a seguir a exigência. Não obteve sucesso.
Parlamentares argumentam que o anúncio feito na semana passada de liberação de R$ 6 bilhões até o fim do ano para acalmar a base mostram como as emendas tem sido usadas para "chantagem". Reconhecem também que frequentemente propostas de interesse do Planalto acabam paradas pelo mesmo motivo, a barganha por emendas.
A aceleração da proposta do Orçamento impositivo ocorre também de olho no calendário eleitoral. Se conseguirem transformar a proposta em regra constitucional, os parlamentares terão garantidos recursos para suas bases justamente no ano da eleição. Além de auxiliá-los na conquista de um novo mandato, a medida pode ainda dará mais forças a seus partidos, que com garantia de recursos podem se sentir mais liberados na negociação de alianças. Esse tipo de confronto é explicitado pelo fato de que PT e PMDB, por exemplo, dificilmente estarão juntos nos principais colégios eleitorais, como São Paulo, Rio, Pernambuco, Ceará e Rio Grande do Sul.
Vetos. A movimentação do Congresso novamente em direção ao confronto já levou o governo a pautar seu discurso sobre outro tema que o preocupa: a votação de vetos presidenciais. A ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, já antecipou que irá recorrer ao Supremo Tribunal Federal caso o governo seja derrotado. "Todas as matérias que acabam indo para o Judiciário acabam ficando um tempo para ter a decisão. O exemplo mais concreto disso, na distribuição dos royalties, está no Supremo e estamos perto de um ano aguardando. O melhor é evitar (a judicialização). Se não tiver possibilidade de evitar, o judiciário é o recurso legal, constitucional que o Executivo teria para recorrer", afirmou a ministra, após reunião da presidente com líderes no Senado. / Colaborou Rafael Moraes Moura

Lei em debate no Congresso não elimina 'faz de conta' 

 AnáliseGUSTAVO PATU, DE BRASÍLIA

Folha de S.Paulo, 7/08/2013

Texto aumenta poder de parlamentares e mantém truque de 'criar' arrecadação

O texto discutido na Câmara dos Deputados eleva os poderes dos congressistas sobre o Orçamento, mas, retórica à parte, mantém o Legislativo brasileiro livre de novas preocupações com a qualidade dos gastos e a solidez das contas públicas.

No atual faz de conta da elaboração da lei orçamentária, deputados e senadores recorrem a um truque para criar novas despesas sem desagradar a ninguém: inventam arrecadação.
A estimativa de receita para 2013, por exemplo, subiu de um já otimista R$ 1,230 trilhão, no projeto do Executivo, para R$ 1,253 trilhão --o bastante para incluir emendas de R$ 22,7 bilhões.
Encerrado o primeiro semestre, a receita esperada pela equipe econômica já caiu para R$ 1,185 trilhão. E, assim como a arrecadação fictícia, as obras prometidas pelos congressistas a seus redutos eleitorais evaporaram.
O relatório que acompanha a proposta de execução obrigatória das emendas reconhece, em meio a eufemismos, a necessidade de uma nova prática. A solução encontrada foi incluir mais uma declaração de boas intenções na Constituição.
"A previsão de receita e a fixação da despesa no projeto e na lei orçamentária devem refletir com fidedignidade a conjuntura econômica e a política fiscal", dirá o 10º parágrafo do artigo 165, caso a proposta avance.

REGRA IGNORADA
O texto constitucional em vigor já estabelece, no artigo seguinte, uma regra para as emendas sistematicamente ignorada: as despesas criadas pelos congressistas devem ser compensadas com a anulação de despesas propostas pelo Executivo.
Se aplicado, tal modelo submeteria deputados e senadores ao constrangimento político de cortar investimentos em infraestrutura, já escassos, para acomodar uma miríade de despesas miúdas, típicas de prefeituras.
Algo como remanejar verbas da conservação de rodovias --porque a maior parte do Orçamento é tomada por despesas obrigatórias como o pagamento de salários e aposentadorias-- para o calçamento de ruas ou festas folclóricas no interior do país.
Na proposta votada pelos deputados, esse ônus ficará, na prática, com o governo. De concreto, a única salvaguarda oferecida pelo Congresso Nacional é a dimensão relativamente reduzida de suas pretensões.
Os parlamentares contentam-se com pouco mais de R$ 6 bilhões, metade de um centésimo do Orçamento. Ainda assim, é o triplo do dinheiro disponível neste ano para o transporte ferroviário --ou o dobro do reservado à educação infantil.

Impositivo demais

Editorial Folha de S. Paulo, 7/08/2013

Deputados fariam melhor se pusessem freio nos gastos obrigatórios do Orçamento, em vez de tentar fixar cota individual de emendas
Está prevista para hoje na Câmara dos Deputados a votação da proposta de emenda constitucional que instituiria o "Orçamento impositivo" no Brasil. O conceito, inspirado em democracias maduras, predica que todo gasto pactuado na confecção da lei orçamentária anual deve ser de realização obrigatória ao longo do período.
A programação de despesas pode ser alterada apenas diante de imprevistos, como catástrofes ou quebra na receita de impostos. Mesmo nessas hipóteses, o desvio do script está sujeito a limites e à mediação do Legislativo.
A PEC em tramitação na Casa dos deputados, entretanto, tem objetivos mais provincianos. Tenta instituir uma cota anual de emendas por parlamentar, R$ 10 milhões por cabeça, cuja execução pelo Planalto seria obrigatória. Está mais para "bolsa emenda" do que para Orçamento impositivo.
O governo veria diminuído o seu poder de barganha, pois se vale da liberação discriminada de emendas para assegurar apoio em momentos decisivos no Congresso. Ficaria um pouco mais difícil, por outro lado, para o Executivo ajustar a dura realidade da arrecadação aos desejos fiscalmente irresponsáveis de congressistas, impressos na peça de ficção que uma vez por ano entregam ao governo.
A conta da "bolsa emenda" não parece tão salgada. Seriam R$ 6,2 bilhões ao longo de 12 meses, cerca de 0,5% do desembolso da União, que passa de R$ 1 trilhão.
Mas seria um meio ruim, pulverizado e de difícil fiscalização, de aplicar dinheiro dos impostos. O ideal seria privilegiar as emendas coletivas, pactuadas entre os congressistas de cada Estado e mais coerentemente inseridas em planos de desenvolvimento regional.
Emendas tratam sobretudo da despesa na infraestrutura, a rubrica mais sacrificada nos orçamentos, embora decisiva para o crescimento econômico. Quando se fixa uma cota para as emendas paroquiais, obriga-se o governo a sacrificar outros investimentos.
O Orçamento já é bastante impositivo. Despesas obrigatórias com manutenção da máquina, pessoal, juros e seguridade consomem mais de R$ 80 de cada R$ 100 gastos pela União. O quadro reflete escolhas sedimentadas da democracia brasileira ao longo de três décadas. Optou-se pela constituição de um colchão social extenso, mas incapaz de oferecer serviços de boa qualidade --limitado pela renda apenas média do Brasil.

Se os congressistas desejam transformar o Orçamento numa peça importante para o desenvolvimento do país, deveriam começar pela revisão das despesas obrigatórias. De sua diminuição relativa nos próximos anos depende a retomada de um ritmo confortável de aumento na renda nacional.

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