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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

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quinta-feira, 13 de junho de 2024

Crise climática não rima com crescimento - Jorge Arbache (Estadão)

Crise climática não rima com crescimento 

Simulações e estudos mostram que países da AL deverão ser especialmente afetados pelas mudanças do clima 

 

Por Jorge Arbache

 

A região da América Latina e Caribe tem crescido relativamente pouco nas últimas décadas e com um padrão bastante instável. Esse padrão ajuda a explicar o porquê de estarmos ficando para trás com relação à Ásia. Porém, apesar do traço comum, os países da região apresentam especificidades.

A elevada volatilidade do crescimento econômico em torno de uma média baixa é problemática e sugere alta exposição a choques externos e outros fatores desafiadores. O problema é que crescer pouco e com alta volatilidade não é nada indolor. Ao contrário, esse padrão cobra preço alto e, ainda mais complicado, evidências mostram que a própria volatilidade ajuda a explicar a média baixa, e vice-versa. Ou seja, trata-se de uma espécie de armadilha.

Um desses canais é o do investimento. Investidores gostam de ambiente previsível para que possam identificar, avaliar e mitigar riscos. Num ambiente incerto, o investimento tende a ser baixo ou a se dirigir para atividades especulativas. Outro canal é o da produtividade, que também é sensível à volatilidade. Esse padrão também afeta a agenda social. Períodos de alta volatilidade cobram preço alto dos mais vulneráveis e das microempresas, grupos que têm menos condições de se protegerem das tempestades.

governança; aumento da inflação e dos déficits fiscais; sistemas financeiros e mercados de capitais pouco sofisticados; alta volatilidade da taxa de câmbio; alta desigualdade de renda e tensão social; políticas econômicas pró-cíclicas; e excessiva dependência de remessas internacionais, investimento estrangeiro e investimentos de portfólio.

Recentemente, a região experimentou novas fontes de instabilidade que exacerbaram o nosso já complicado padrão de crescimento. A Crise Financeira Global de 2008-2009 levou a recessões severas seguidas por padrões de recuperação variados. Já a pandemia de covid-19 causou interrupções econômicas sem precedentes, levando a uma contração acentuada na atividade econômica seguida por uma recuperação rápida, mas altamente desigual na região.

Para fazer frente aos desafios do crescimento, a região está priorizando o comércio e o investimento estrangeiro. Infelizmente, porém, estão emergindo outras potentes fontes de instabilidade. Uma delas é a geopolítica. As tensões estão tornando os investidores estrangeiros ainda mais cautelosos e limitando o financiamento disponível para projetos de infraestrutura e desenvolvimento. As tensões geopolíticas também trazem volatilidade aos mercados financeiros globais e ajudam a explicar o crescente protecionismo, controle de capitais, restrições comerciais, tarifas mais altas e, especialmente, novas barreiras não tarifárias ao comércio. Tudo isto está contendo ambições da região de aumento das exportações e maior acesso a mercados. Vide, por exemplo, o colapso do acordo Mercosul-UE.

Mas a nova fonte mais preocupante é o clima. A elevação da temperatura e a mudança climática têm potencial de impactar significativamente o crescimento de várias maneiras. Simulações e estudos mostram que países da região deverão ser especialmente afetados pelas mudanças climáticas, o que poderá exacerbar a volatilidade, em especial numa zona com baixa capacidade adaptativa e de proteção. Pense nos efeitos do El Nino.

Na condição de importante produtor agrícola global, as mudanças climáticas poderão afetar safras em razão de alterações nos padrões de chuvas, aumento da incidência de eventos climáticos extremos e surgimento de mais pragas e doenças. Tudo isto poderá resultar em diminuição da produtividade agrícola, aumento dos preços dos alimentos e impacto sobre a segurança alimentar regional e global.

Muitos países latino-americanos dependentes de recursos naturais, como água, minerais e energia, poderão enfrentar desafios associados à alteração da disponibilidade e distribuição desses recursos com impactos na produção de energia hidrelétrica, turismo e indústrias com processos produtivos intensivos em água. As mudanças nos padrões climáticos também poderão levar à perda de biodiversidade e degradação de ecossistemas. Eventos climáticos extremos poderão danificar a já escassa infraestrutura e causar perdas humanas e econômicas significativas, tal como vimos recentemente no Rio Grande do Sul. E as mudanças climáticas poderão afetar a saúde das populações, aumentando a incidência de doenças transmitidas por vetores, como malária e dengue, 

As principais fontes da alta volatilidade na região são velhas conhecidas nossas. Ali incluem-se a dependência das exportações de commodities, que são bastante mais sujeitas à flutuações; alta exposição a choques econômicos e financeiros externos, tais como os altos juros dos EUA neste momento; instabilidade política e problemas de reduzindo a produtividade do trabalho.

Para fazer frente a esses desafios, será preciso considerar tanto estratégias de mitigação quanto de adaptação. Essas estratégias deverão considerar, dentre outros, preservar florestas, recuperar áreas degradadas, zerar queimadas e desmatamentos ilegais, preservar mananciais, investir em infraestruturas para mitigar os efeitos do aumento das temperaturas (por exemplo, melhoria na gestão da água e agricultura resiliente ao clima), diversificar a economia e implementar sistemas de alerta antecipado para eventos climáticos extremos.

Os desafios do crescimento futuro na região não serão nada fáceis. Os formuladores de políticas terão que ser criativos para dar conta dos velhos e dos novos desafios, considerando os muitos constrangimentos financeiros e limitações institucionais e de execução que temos. Ali deverão estar agendas potentes e ancoradas nas nossas vantagens comparativas, como o powershoring, o imenso potencial dos mercados de carbono, a industrialização de minerais críticos e de alimentos, a bioeconomia e a agenda de biocombustíveis. E, num contexto em que a ordem liberal internacional está perdendo fôlego, o mercado doméstico e o regional deverão ganhar atenção como fontes de demanda.

A boa notícia é que governos da região já estão conscientes desses desafios e é algo que já estão perseguindo com algum sucesso. Para avançar mais, será preciso uma combinação de políticas públicas robustas e coerentes, muita coordenação, melhoria de estruturas institucionais e de planejamento e muita visão estratégica.

Jorge Arbache é professor de economia da Universidade de Brasília


segunda-feira, 27 de maio de 2013

Capitalismo de Estado - Jorge Arbache; Paulo Roberto de Almeida


In the times of state capitalism
Jorge Arbache *

Special to The BRICS Post 

May 27, 2013, 4:13 am

In January 2012, the Economist published a provocative special report on State capitalism, which, according to the magazine, is a model that “tries to meld the powers of the State with the powers of capitalism.” Since then, the issue has gained attention around the world and has contributed to the debate on the recent economic crisis and the models of economic development.
The growing clout of the emerging economies on the world stage and their resilience to the financial crisis are, however, the drivers of the buzz that has been generated around ‘state capitalism’.
China's state-backed companies have been under increasing criticism for propagating an unsustainable model. [Xinhua Images]
China’s state-backed companies have been under increasing criticism for propagating an unsustainable model [Xinhua Images]
Contrary to ‘state intervention’ often seen in several developing countries, ‘state capitalism’, according to the magazine, makes use of market instruments and methods to reach its goals. The report justifies its focus on the recent experiences in emerging countries, especially that in China, because “it reflects the future rather than the past”.
State capitalism manifests in several ways and it can be complex as well as sophisticated, such as the public policies aimed at supporting the private South-Korean conglomerates, or the setting up of sovereign wealth funds from Asia and Gulf States with growing influence on capital markets and investments.
There can however be no overlooking the fact that ‘State capitalism’ in emerging countries is mirrored by equally aggressive ‘State intervention’ in the economy in developed countries. The Norwegian State-owned oil company, Statoil, and American and European policies for subsidies in the agricultural sector are familiar examples.
The very large-scale, unprecedented government interventions in the economies of countries at the epicentre of the financial crisis via quantitative easing, bailouts, and other measures have brought about massive repercussions in the allocation of resources and the formation of prices not only on a domestic level, but also internationally. Several other interventionist policies were put in place more recently, such as the reinstatement of the ‘Buy American’ Act by President Obama, the very aggressive Swiss intervention in the exchange rate, and the recently introduced new Japanese economic policy, the “Abenomics”, in reference to prime minister Shinzo Abe, which seeks to undervalue the yen to boost exports.
"The recent election of Mr Roberto Azevedo to the World Trade Organisation reignited the hopes that the Doha Round can still provide the world with a reasonable and fair trade agreement" [AP]
“The recent election of Mr Roberto Azevedo to the World Trade Organisation reignited the hopes that the Doha Round can still provide the world with a reasonable and fair trade agreement” [AP]
Such interventions in the developed economies, many of which are opportunistic, are especially intrusive due to the size of these economies and the fact that their currencies are an international store of value, creating and worsening international macroeconomic imbalances, besides affecting the already highly asymmetric conditions of competition.
Indeed, these policies have been impacting the production mix and the external accounts of several developing and emerging countries. In Brazil, for example, the exchange rate appreciated extensively and the import penetration increased rapidly, thus driving the government to raise the IOF, a tax levied on financial foreign operations aiming at reducing the level of speculative inflow of foreign currency into the country.
Experiences with different hues of ‘State capitalism’ suggest there is a common tension, of varying levels, between pragmatism and ideology.
Using ‘State capitalism’ policies seems to be becoming popular around the world as the economic crisis and uncertainties grow. The failure of the ultra-liberal economic policies, such as some employed by the United States prior to the crisis, and China’s State capitalism, help us understand why one of the likely legacies of the financial crisis for politicians is the lesson that governments should not limit their role in the economy.
While the attractiveness of State capitalism is understandable within the context of economic crisis, its multiplication on a global scale has harmful implications. In fact, it seems to be highly unlikely that many countries will, simultaneously, benefit from State capitalism owing not only to the fallacy of composition, but also to the negative externalities brought on by them, which tend to upset the economic system, encourage trade and currency wars and raise political tensions between countries.
 Brazilian finance minister Guido Mantega has been the fiercest critic of developed countries going for currency manipulation. [Getty Images]
Brazilian finance minister Guido Mantega has been the fiercest critic of developed countries going for currency manipulation [Getty Images]
For these reasons, making these policies popular will likely hinder the recovery of the world economy. It also raises questions on making the choice between national interests and international commitments, such as those made by the G20, with implications for the credibility of the multilateral system. If, in the short term, State capitalism policies are attractive as a policy tool, in the medium and long term everybody is likely to be worse off, especially developing countries and those that embrace and follow more open policies.
To mitigate the proliferation of State capitalism and its potential risks to the world economy, and to trade in particular, renewed support to the multilateral trade and more transparent rules on currency manipulation will be critical.
The recent election of Mr Roberto Azevedo to the World Trade Organisation reignited the hopes that the Doha Round can still provide the world with a reasonable and fair trade agreement. But that won’t be easy, especially under the current uncertainties of the global economy and the prolonged crisis in the Eurozone.
Large economies, especially the United States, the European Union, China, and Japan, will also have to acknowledge the interdependence of national micro and macroeconomic policies and their impacts on other economies, especially the developing nations. It will also be necessary to double the efforts in coordinating policies and managing conflicting interests.
The views expressed in this article are the author's own and do not necessarily reflect the publisher's editorial policy.

* Jorge Arbache is an economist with large experience in the areas of government, academia, international organisations and private the sector. He is an expert on the Brazilian economy with several dozen academic articles and books published. Jorge is currently senior economic advisor to the president of the Brazilian Development Bank (BNDES).

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Agora, meus comentários, mais no plano filosófico do que no plano prático: 


Capitalismo de Estado é uma contradição nos termos. Se é capitalismo, não pode ser de Estado. Se é Estado, não pode ser capitalista.
São duas realidades completamente distintas, que se situam em dois universos distintos da mesma esfera societal, ou seja, sociedades e povos organizados possuem ambas as dimensões, mas cada uma se pauta por regras completamente diferentes, objetivos totalmente diversos, por mecanismos e instrumentos completamente distintos, embora possa haver certo overlapping em determinadas funções.
Estado é uma dimensão das relações sociais que pode, ou deve, abarcar toda a sociedade.
O capitalismo é apenas uma forma das economias de mercado que não necessariamente abarca toda a sociedade, mas apenas uma parte dela, que tem a ver com o modo (mercantil) de produção e distribuição de bens de mercado, ou seja, de consumo.
O Estado é muito mais do que isso, e pode, pelo menos pretende, disciplinar o capitalismo e colocá-lo a seu serviço, mas sendo suas lógicas completamente diferentes, os resultados podem ser altamente indesejáveis.
Por exemplo: a lógica do Estado é a concentração do poder, o total monopólio da força física de constrangimento individual, alegadamente em defesa da propriedade (o que o capitalismo agradece) e da segurança dos cidadãos, o que nós todos agradecemos.
A lógica do capitalismo (se existe alguma, mas não atribuo nenhuma dimensão metafísica a ele, e sim prefiro falar de capitalismos e de capitalistas) não é a concentração de poder, e sim a atomização dos poderes das empresas capitalistas individuais, atuando em concorrência, sempre.
Por isso mesmo, a colusão entre capitalismo e Estado é uma das coisas mais nefastas e perigosas que existem, pois significa dar a capitalistas (que compraram dirigentes estatais) mais poder do que eles deveriam ter, e dar ao Estado poderes de captação de renda dos cidadãos-consumidores que ele não deveria ter; essa osmose é potencialmente nociva a todos, capitalistas, Estados, mas principalmente aos cidadãos, que se tornam indefesos.
É evidente que o Estado também pode fazer coisas que estão além e acima da capacidade do capitalismo, ou do conjunto dos capitalistas, como são as grandes obras de infraestrutura, defesa, relações exteriores, capacitação geral e elementar da mão-de-obra, enfim, essas funções típicas do Estado que nenhum capitalista pode fazer se não existir um mercado muito bem determinado para sua atuação. Ou seja, o capitalismo pode desempenhar algumas das funções do Estado, mas sempre de modo parcial, regulado, específico, se as formas mercantis se apresentarem de modo satisfatório, pois o capitalismo tem de se basear no lucro, no retorno, nos resultados positivos, coisas que o Estado não precisa, ou não tem como prioritário.
Empresas estatais são invariavelmente mal administradas, e nocivas ao próprio Estado e aos cidadãos, pois se apoiando em mecanismos não mercantis para buscarem seus resultados, o que pode, e deve, ser antieconômico, do ponto de vista dos cidadãos, ou da simples eficiência e racionalidade econômica. Como elas servem a objetivos políticos, invariavelmente seus resultados são menos eficientes do que aqueles que seriam obtidos numa pura relação mercantil.

Agora no plano prático: os EUA são o maior país capitalista existente na face da terra, certo?
Quantas empresas públicas possui o Estado americano?
Ou melhor, qual é o capitalismo de Estado nos EUA?
Paulo Roberto de Almeida 
Hartford, 27 de maio de 2013

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Capitalismo de Estado - Jorge Arbache


Crise e o capitalismo de Estado
Jorge Arbache
Valor Econômico, 2 de agosto de 2012

A The Economist publicou um provocativo relatório especial sobre capitalismo de Estado, modelo que, segundo a revista, "combina as forças do Estado com as forças do capitalismo". Desde então, o assunto ganhou atenção mundo afora e tem contribuído para os debates sobre a crise econômica e sobre modelos de desenvolvimento. A crescente influência das economias emergentes na economia mundial e a sua resiliência à crise financeira estariam por detrás do grande interesse pelo assunto. Contrariamente ao dirigismo muitas vezes observado até recentemente em muitos países em desenvolvimento, o capitalismo de Estado se utilizaria, segundo a revista, de instrumentos e métodos de gestão de mercado para atingir seus objetivos. O relatório justifica o foco nas experiências recentes dos países emergentes, notadamente a da China, porque elas "parecem ser cada vez mais a tendência futura".

As manifestações do capitalismo de Estado são variadas e podem ser complexas e sofisticadas, como as políticas públicas de apoio aos conglomerados privados sul-coreanos, ou a montagem de fundos soberanos com crescente influência nos fluxos de capitais e investimentos. Mas as experiências de capitalismo de Estado de países emergentes coexistem com manifestações de forte intervencionismo estatal na economia também nos países desenvolvidos, como no caso da empresa de petróleo estatal norueguesa, Statoil, e das políticas americana e europeia de subsídios ao setor agrícola. As experiências das diferentes vertentes de capitalismo de Estado sugerem haver em comum entre elas uma tensão, em maior ou menor grau, entre pragmatismo e ideologia.
Mais recentemente, as inéditas e massivas intervenções na economia pelos governos dos países no epicentro da crise financeira por meio de "quantitative easing" e "bailouts", por exemplo, têm provocado profundas repercussões na alocação de recursos e formação de preços não apenas no plano doméstico, mas, também, internacional. Essas intervenções, muitas delas oportunistas, são especialmente intrusivas devido ao tamanho dessas economias e ao fato de suas moedas serem reserva de valor internacional, criando e agravando desequilíbrios macroeconômicos internacionais e acentuando as condições já assimétricas de competição.
O emprego de políticas de capitalismo de Estado parece estar se popularizando mundo afora à medida que a crise econômica e as incertezas se agravam. O capitalismo de Estado da China e o fracasso de políticas econômicas ultra-liberais, como algumas perseguidas pelos Estados Unidos até antes da crise, nos ajudam a entender porque um dos prováveis legados dessa crise para os políticos é a lição de que governos não devem limitar os seus papéis na economia.
Embora seja compreensível a atratividade do capitalismo de Estado num contexto de crise econômica, a sua multiplicação em escala global tem implicações deletérias. De fato, parece ser pouco plausível que muitos países possam se beneficiar, simultaneamente, de políticas de capitalismo de Estado devido à falácia da composição e devido às externalidades negativas por elas provocadas, que tendem a desorganizar o sistema econômico, fomentar reações mercantilistas e alimentar tensões políticas entre países. Por isso, é muito provável que a popularização dessas políticas dificulte a recuperação da economia mundial. O emprego de políticas de capitalismo de Estado também suscita questões associadas às escolhas entre interesses nacionais e compromissos internacionais, como os do G-20, com reflexos para a credibilidade do sistema multilateral.
Para que se mitiguem a proliferação do capitalismo de Estado e seus potenciais riscos para o crescimento econômico mundial, será preciso que os países, notadamente Estados Unidos, União Europeia e China, reconheçam a interdependência das políticas micro e macroeconômicas nacionais e seus impactos nos países em desenvolvimento. Será preciso, assim, redobrar os esforços de coordenação de políticas e de gestão de interesses conflitantes. No entanto, experiências como o colapso do Acordo de Doha, crise do Euro e as dificuldades de avanço nos acordos do clima ilustram os desafios de coordenação e de solução de controvérsias em períodos de crise.
Como as políticas de capitalismo de Estado têm significativos impactos adversos na economia brasileira, incluindo valorização cambial, especulação com preços de ativos e barreiras ao comércio e ao investimento, torna-se necessário o emprego de estratégias de desenvolvimento e de inserção internacional que busquem mitigar esses impactos. Tais estratégias deveriam levar em conta a combinação dos benefícios do comércio com os das políticas públicas de promoção da indústria conciliada com o desenvolvimento e a exploração das vantagens produtivas e competitivas nacionais. Deveriam, também, reconhecer as relações entre comércio e variáveis macroeconômicas como câmbio, juros e política fiscal e seus impactos na indústria e no comércio, buscar o reconhecimento internacional dos impactos dos grandes desequilíbrios macroeconômicos e das políticas de outros países na economia brasileira, e intensificar esforços indutores do aumento da competitividade através da redução dos custos de produção e aumento da produtividade e dos investimentos em capital humano e inovação.