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quarta-feira, 18 de março de 2020

Portugal: presidente declara estado de emergência - um discurso de estadista

Gostei do presidente português, Marcelo Rebelo de Souza, mencionar a história de quase nove séculos do seu país. Os portugueses foram bravos, ao longo de todo esse tempo, foram os primeiros a partir à descoberta do mundo, quaisquer que tenham sido os motivos.
Foram bravos, foram corajosos, continuam corajosos.
Viva Portugal, vivam os portugueses.
Um discurso de estadista como estaríamos a merecer por aqui, mas que não teremos.
Paulo Roberto de Almeida


Estado de emergência por cinco razões
O discurso de Marcelo na íntegra

Mensagem do Presidente da República, a propósito da declaração do estado de emergência na sequência da pandemia de covid-19.
Marcelo Rebelo de Sousa 
18 de Março de 2020, 20:34

Palácio de Belém, 18 de Março de 2020

Portugueses,
Acabei de decretar o estado de emergência.
Uma decisão excepcional num tempo excepcional.
A pandemia do Covid-19 não é uma qualquer epidemia como aquelas que já conhecemos na nossa democracia.
Está a ser e vai ser mais intensa.
Vai durar mais tempo até desaparecerem os seus últimos efeitos.
Está a ser e vai ser um teste nunca vivido ao nosso Serviço Nacional de Saúde e à sociedade portuguesa, chamada a uma contenção e a um tratamento em família sem precedente.
Está a ser e vai ser um desafio enorme para a nossa maneira de viver e para a nossa economia. Basta pensar na saúde, na educação, no comportamento nas famílias, no trabalho, nos efeitos no turismo, nas exportações, no investimento, na fragilização de famílias e empresas, nomeadamente de pequena e média dimensão.
Esta guerra – porque de uma verdadeira guerra se trata – dura há um mês, começou depois dos vizinhos europeus, e, também por isso, pôde demorar mais tempo a atingir os picos da sua expressão.
E o que fizemos nestes últimos 15 dias?
Entendemos – e bem – que, no nosso Estado Social, era e é uma tarefa de todos e não de cada um abandonado à sua sorte.
Apostámos na contenção, para tentar limitar o contágio, ganhar tempo para preparar a resposta e evitar uma concentração muito rápida da procura de cuidados de saúde.
Na contenção, o Serviço Nacional de Saúde, fez e continua a fazer heroísmo diário, pela mão dos seus notáveis profissionais.
E, com eles, todos os que estão a garantir a segurança e a produção e distribuição de bens essenciais para que o país funcione.
E os portugueses, com a experiência de quem já viveu tudo numa história de quase nove séculos, disciplinaram-se, entenderam que o combate era muito duro e muito longo e foram e têm sido exemplares. Numa quase quarentena, que revela o bom senso de respeitar as orientações das autoridades de saúde, e digo-vos, por testemunho próprio, é nosso dever acatar as orientações genéricas e, por maioria de razão, as recomendações específicas das autoridades sanitárias.
O Governo – que tem entre mãos uma tarefa hercúlea – adoptou medidas, tentando equilibrar contenção no espaço público e nas fronteiras e não paragem da vida económica e social, medidas que todos, Presidente, Parlamento, partidos e parceiros sociais, apoiámos, conscientes de que só a unidade permite travar e depois vencer guerras.
Aqui chegados, entendi dever convocar o Conselho de Estado, e, nos termos da Constituição, ouvi o Governo e solicitei autorização à Assembleia da República para decretar o estado de emergência.
Sabia e sei que os portugueses estão divididos. Há quem o reclame para anteontem. Há quem considere dispensável, prematuro ou perigoso.
Sabia e sei que, em plena crise, as pessoas se sentem tão ansiosas, tão angustiadas, que aquilo que pedem um dia ou uma semana, uma vez dado, é logo seguido de mais exigências ou reclamações, à medida que as preocupações ou os temores se avolumam.
Sabia e sei que muitos esperam do estado de emergência o milagre que tudo resolva num minuto, num dia, numa semana, num mês.
Ainda assim, entendi ser do interesse nacional dar este passo. Agradeço aos conselheiros de Estado o terem expresso as suas opiniões, ao primeiro-ministro e ao Governo o terem aderido, solidariamente, e colaborado, de modo decisivo, no conteúdo do presente decreto, e à Assembleia da República o tê-lo autorizado com generosa prontidão e amplo consenso.
Cinco razões essenciais explicam o passo dado.
Primeira – Antecipação e reforço da solidariedade entre poderes públicos e deles com o povo. Outros países, que começaram, mais cedo do que nós, a sofrer a pandemia, ensaiaram os passos graduais e só agora chegaram a decisões mais drásticas, que exigem maior adesão dos povos e maior solidariedade dos órgãos do poder. Nós, que começamos mais tarde, devemos aprender com os outros e poupar etapas, mesmo se parecendo que pecamos por excesso e não por defeito.
O povo português tem sido exemplar. Mas este sinal político, dado agora, e dado não apenas pelo Governo, mas por Presidente da República, Assembleia da República e Governo é uma afirmação de solidariedade institucional, de confiança e determinação, para o que tiver de ser feito nos dias, nas semanas, nos meses que estão pela frente.
Segunda – Prevenção. Diz o povo: mais vale prevenir do que remediar. O que foi aprovado não impõe ao Governo decisões concretas, dá-lhe uma mais vasta base de Direito para as tomar. Assim, permite que possam ser tomadas, com rapidez e em patamares ajustados, medidas que venham a ser necessárias no futuro. Nomeadamente, na circulação interna e internacional, no domínio do trabalho, nas concentrações humanas com maior risco, no acesso a bens e serviços impostos pela crise, na garantia da normalidade na satisfação de necessidades básicas, nas tarefas da protecção civil, em que, nos termos da lei, todos já são convocados, civis, forças de segurança e militares. O que seria, mais tarde, se fosse necessário agir, num ou noutro caso, neste quadro preventivo e ele não existisse?
Terceira – Certeza. Esta base de Direito dá o quadro geral de intervenção e garante que, mais tarde, acabada a crise, não venha a ser questionado o fundamento jurídico das medidas já tomadas e a tomar.
Quarta – Contenção. Este é um estado de emergência confinado, que não atinge o essencial dos direitos fundamentais, porque obedece ao fim preciso do combate à crise da saúde pública e da criação de condições de normalidade na produção e distribuição de bens essenciais a esse combate.
Quinta – Flexibilidade. O estado de emergência dura 15 dias, no fim dos quais pode ser renovado, com avaliação, no terreno, do estado da pandemia e sua previsível evolução.
É um sinal político forte de unidade do poder político, que previne situações antes de poderem ocorrer, estabelece um quadro que confere certeza, dá poderes ao Governo mas não regidifica o seu exercício, e permite reavaliação na sua aplicação num combate que muda de contornos no tempo.
É também um sinal democrático.
Democrático, pela convergência dos vários poderes do Estado.
Democrático, porque é a democracia a usar os meios excepcionais que ela própria prevê para tempos de gravidade excepcional.
Não é uma interrupção da Democracia. É a democracia a tentar impedir uma interrupção irreparável na vida das pessoas.
Não é, porém, uma vacina, nem uma solução milagrosa, que dispense o nosso combate diário, o apoio reforçado ao Serviço Nacional de Saúde, a capacidade de pessoas e as famílias continuarem a tentar limitar o contágio, para que os números a crescer cresçam menos do que os piores cenários e para que o tratamento possa ser, cada vez mais, em casa. Tudo mais cedo do que mais tarde.
Até porque, num ponto, os especialistas são claros – depende da contenção nestas próximas semanas o conseguirmos encurtar prazos, poupar pacientes e, sobretudo, salvar vidas.
Temos, pois, todos de fazer por contribuir para ir o mais longe e o mais depressa possível nesta luta desigual.
E quanto mais depressa formos, mais depressa poderemos salvar vidas, salvar a saúde, mas também concentrar-nos nos efeitos, a prazo, no emprego, nos rendimentos, nas famílias, nas empresas.
E, mesmo agora, só se salvam vidas e saúde se, entretanto, a economia não morrer.
Por isso, o Estado está a ajudar a economia a aguentar estes longos meses mais agudos. Fazendo o que possa para proteger o emprego, as famílias e as empresas.
Mas nós temos de fazer a nossa parte. Não parar a produção, não entrar em pânicos de fornecimentos como se o país fechasse, perceber que limitar contágio e tratar de contagiados em casa é e tem de ser compatível com manter viva a nossa economia.
Assim é em tempo de guerra, as economias não podem morrer.
Termino com um pedido.
Nesta guerra, como em todas as guerras, só há um efectivo inimigo, invisível, insidioso e, por isso, perigoso.
Que tem vários nomes.
Desânimo. Cansaço. Fadiga do tempo que nunca mais chega ao fim.
Temos de lutar, todos os dias, contra ele.
Contra o desânimo pelo que corre mal ou menos bem.
Contra o cansaço de as batalhas serem ainda muitas e parecerem difíceis de ganhar.
Contra a fadiga que tolhe a vontade, aumenta as dúvidas, alimenta indignações e revoltas.
Tudo o que nos enfraquecer nesta guerra alongará a luta e torná-la-á mais custosa e dolorosa.
Resistência, solidariedade e coragem são as palavras de ordem. E verdade, porque nesta guerra, ninguém mente nem vai mentir a ninguém.
Isto vos diz e vos garante o Presidente da República. Por vós directamente eleito para ser, em todos os instantes, os bons e os maus, o primeiro e não o último dos responsáveis perante os portugueses.
O caminho ainda é longo, é difícil e é ingrato.
Mas, não duvido um segundo sequer, que vamos vencê-lo o melhor que pudermos e soubermos.
Na nossa História, vencemos sempre os desafios cruciais.
Por isso temos quase novecentos anos de vida.
Nascemos antes de muitos outros. Existiremos ainda, quando eles já tiverem deixado de ser o que eram e como eram.
Deixem-me terminar com um exemplo de como somos.
O exemplo da neta, enfermeira, que, no dia em que perdeu o seu avô, a primeira vítima mortal, me dizia: “Presidente, já só faltam nove dias para eu regressar à luta”.
Somos assim. Porque somos Portugal.

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2020

Cafés de Lisboa: os mais antigos e aprazíveis -

Esta Lisboa que eu amo: os mais antigos cafés da cidade…

Esta Lisboa que eu amo | os mais antigos cafés da cidade…
“Beber um cafézinho”, uma expressão tão portuguesa que  continua a ser o mote para combinar encontros na capital mas a verdade é que este ritual não é de agora. Os cafés e pastelarias da capital sempre foram espaços de união e reunião e alguns já o são desde o século XVIII e tiveram uma importância determinante na vida social e política da cidade e do país.

Martinho da Arcada (1782)

 238 anos que o Martinho da Arcada dá vida e aroma a café à Praça do Comércio. Fundado a 7 de janeiro de 1782, foi uma inovação para a época, numa cidade dominada por tabernas, e teve muitos nomes até se ter fixado na nomenclatura “Martinho da Arcada”, apenas em 1845. É café e restaurante e, ao longo de mais de dois séculos, foi porto de abrigo de governantes, políticos, militares, artistas e escritores – porém, o mais ilustre cliente assíduo foi Fernando Pessoaque neste local escreveu alguns dos seus mais conhecidos poemas.

Confeitaria Nacional (1829)

A funcionar desde 1829 (há 191 anos, portanto), na Praga da Figueira a Confeitaria Nacional continua a ser propriedade da família que a fundou. Se no início foi criada à semelhança das patisseries parisienses, depressa passou a fabricar iguarias bem tradicionais – o bolo-rei é, sem dúvida, um dos ex-líbris da casa e consta que foi neste estabelecimento que tal bolo começou a ser vendido em Portugal, no ano de 1870.

Pastelaria Benard (1868)

Em 1868, Élie Benard abriu uma pastelaria na Rua do Loreto e este foi o ponto de partida da emblemática Pastelaria Benard, que se fixou depois na Rua Garrett em 1902. De realçar que o termo “pastelaria” só começou a ser usado em 1926, quando a Câmara começou a taxar as placas dos estabelecimentos em línguas estrangeiras. Nos anos 40, a Pastelaria conhece nova gerência e o espaço recebe eventos memoráveis, destacando-se um jantar para a Rainha Isabel II durante a sua visita a Portugal, em 1957. A estrela da casa continuam a ser os croissants.

A Brasileira (1905)

Depois da abertura da primeira Brasileira no Porto, em 1903, a capital depressa recebeu um espaço similar, inaugurado em 1905. Embora tenha havido outra no Rossio, é a do Chiado que hoje persiste, onde Fernando Pessoa nos recebe na esplanada desde 1988. É, sem dúvida, um dos locais mais emblemáticos do Chiado e foi palco de tertúlias intelectuais e artísticas que marcaram o início do século XX em Lisboa.

Pastelaria Versailles (1922)

Inaugurada em 1922, a Versailles serviu de polo cultural e social das Avenidas Novas – foi o primeiro grande café do bairro. Felizmente, mantém-se fiel a si mesma e por aqui ainda são raros os turistas. Toda a pastelaria é divinal mas os croquetes e o bolo rei são qualquer coisa de especial

Café Nicola (1929)

O que começou por ser Botequim do Nicola (italiano que o fundou, ainda no séc. XVIII) passou a Café Nicola, em 1929. Em 1935, o espaço foi finalmente intervencionado com os detalhes que são hoje a sua imagem de marca, com destaque para as pinturas de Bocage em estilo Art déco. Foi, aliás, um dos espaços favoritos do poeta e ele ainda se faz sentir numa estátua presente na sala de refeições. Será sempre lembrado como ponto de encontro de intelectuais e agitadores sociais.

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Faltam agora os bares, as tavernas, as tascas...

sexta-feira, 6 de setembro de 2019

Um “imenso Portugal”? A hipotese de um imperio luso-brasileiro no inicio do seculo XIX - Paulo Roberto de Almeida

Um “imenso Portugal”? 
A hipótese de um império luso-brasileiro no contexto internacional do início do século XIX


Paulo Roberto de Almeida
Colaboração a seminário na Biblioteca Mindlin da USP, em 10-11/09/2019,
sobre o tema: “Oliveira Lima e a (Longa) História da Independência”.
(preliminar; em revisão; formatar referências e bibliografia)

Sumário
1. Poderia o Brasil ter sido o centro de um grande império luso-brasileiro?

2. A importância da colônia brasileira para a atividade econômica da metrópole

3. As condições estruturais de Portugal e Brasil no período anterior à independência
4. A hipótese de uma união imperial no período joanino e na independência
5. As tentativas de Hipólito José da Costa na manutenção da unidade luso-brasileira
6. Independência e morte: uma visão militar do processo de independência
7. Um império luso-brasileiro seria possível a partir de uma unidade americana?
8. Tinha o Brasil condições de assumir a direção de um império multinacional?

Início do paper: 

1. Poderia o Brasil ter sido o centro de um grande império luso-brasileiro?
A hipótese, não de todo descabida, apresentou-se em diversos momentos da turbulenta conjuntura política e diplomática vivida por Portugal entre o final do século XVIII e as três primeiras décadas do século XIX. A possibilidade da junção da metrópole com a sua mais importante colônia – antes um simples vice-reino, depois um reino unido ao da metrópole – foi colocada ainda antes da independência, no momento da transferência da Coroa para o Brasil, retomada por ocasião da união dos reinos, oficializada em 1815, logo depois no decurso do próprio processo autonomista e, finalmente, nos anos imediatamente seguintes à declaração da autonomia política, quando se negociava o reconhecimento da independência e o estatuto que assumiriam os dois soberanos, pai e filho. Recorde-se, desde logo, que, no tratado de reconhecimento, o rei D. João VI foi também distinguido com o título de Imperador do Brasil, e que seu filho era o herdeiro direto do trono português. Mas, nele também havia a proibição de que o Brasil buscasse a sua própria junção com as colônias portuguesas da África, ou seja, uma interdição formal de aliança política e de criação de um novo reino entre os mais importantes parceiros num dos maiores e mais lucrativos negócios internacionais da época: o tráfico escravo.
Qual seria, em todo caso, a natureza do projeto? Ele consistiria na formação de uma grande unidade política de alcance multicontinental, tendo o Brasil como o centro de um vasto império, estendendo-se das Américas até o distante Timor (na Indonésia holandesa), passando por algumas ilhas atlânticas, por várias colônias nas duas costas da África, assim como pela Ásia do sul, notadamente em Goa, na Índia, e por Macau, na China. Esse era o vasto império ultramarino português, tão bem estudado por Charles Boxer, cuja amplitude ainda tinha sido confirmada por ocasião da aclamação do príncipe regente, depois da morte de sua mãe: D. João, até então “príncipe regente” – embora rei de fato, desde a última década do século anterior – tornou-se o sexto do nome, “rei do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, d’Aquém e d’Além-Mar em África, Senhor da Guiné e da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia”. 
(...)

Ler a íntegra neste link: 
https://www.academia.edu/s/085e1aeea0/um-imenso-portugal-a-hipotese-de-um-imperio-luso-brasileiro-no-contexto-internacional-do-inicio-do-seculo-xix