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segunda-feira, 19 de maio de 2014

Rubens Barbosa: E' preciso mudar a politica externa (Site 247)

terça-feira, 25 de março de 2014

Itamaraty marginalizado na politica externa (sic) - Rubens Antonio Barbosa

Sumiço do Brasil e Itamaraty marginalizado

25 de março de 2014 | 2h 05
Rubens Barbosa* - O Estado de S.Paulo
 
Ao contrário da política externa "ativa e altiva" nos oito anos de Lula, o atual governo retraiu-se e evita tratar questões relevantes que o Brasil, pelo seu peso no cenário externo, não pode ignorar.
Nas votações nas Nações Unidas, além do voto afirmativo, do negativo e da abstenção, os diplomatas, sempre criativos, inventaram outra forma de permitir que os países evitem ter de se manifestar em importantes votações, mesmo estando presentes nos debates e na própria reunião decisória: a "não participação".
Recolhi alguns episódios de domínio público - haverá (muitos) outros que não foram tornados públicos - em que fica evidenciada a decisão de não participação brasileira. Na maioria dos casos, o Brasil - contrariando a opinião do Itamaraty - é levado a omitir-se por motivos diversos, inclusive ideológicos ou partidários.
A decisão de não enviar o ministro do Exterior a reunião sobre a Síria em Genebra. O Brasil - muito bem representado pelo secretário-geral, Eduardo dos Santos - foi incluído no encontro, restrito a um grupo limitado de países, a pedido da Rússia, que, juntamente com os EUA, o convocou para tentar discutir uma solução negociada para a crise militar que matou mais de 120 mil pessoas.
A ausência do Brasil na Conferência anual de Segurança realizada em Munique, fórum conhecido pela oportunidade que oferece para conversas informais sobre as crises internacionais e as negociações em curso entre diplomatas e ministros da Defesa de todo o mundo. Entre os participantes estavam o mediador da ONU na Síria, os ministros do Exterior da Rússia e do Japão e os secretários de Estado e de Defesa dos EUA.
A omissão do governo brasileiro no tocante ao asilo de senador boliviano. Depois de concedido o asilo pela Embaixada em La Paz, nada foi feito para que o salvo-conduto fosse concedido por Evo Morales, conforme previsto nos tratados regionais.
O silêncio do governo do Brasil, escondido atrás da posição do Mercosul e da Unasul, favorável ao governo de Nicolás Maduro, apesar do agravamento da atual crise política na Venezuela, com clara violação da cláusula democrática e dos direitos humanos.
A ausência do governo em relação aos acontecimentos na Crimeia.
A ausência do Brasil na negociação e na participação do Acordo sobre Serviços da Organização Mundial do Comércio (OMC), apesar de atualmente, na composição do produto interno bruto (PIB) brasileiro, o setor de serviços representar quase 60%.
A ausência do Brasil nas discussões sobre o impacto das negociações de acordos regionais e bilaterais de última geração negociados fora da OMC.
A ausência de uma posição firme do Brasil no tocante à convocação da reunião presidencial do Conselho do Mercosul. Pela primeira vez em 20 anos o conselho deixou de se reunir no semestre passado e até hoje não existe data para o encontro, que deveria discutir, entre outros temas, as negociações comerciais Mercosul-União Europeia.
A ausência de liderança do Brasil no processo de integração sul-americana e de revitalização do Mercosul.
Os episódios recentes envolvendo reuniões para discutir as restrições comerciais na Argentina e a situação política na Venezuela, em que a Presidência da República assumiu a condução do processo, deixando a Chancelaria à margem.
Esses fatos afetam a credibilidade do Brasil e repercutem sobre a percepção externa acerca da atuação do nosso país.
Ao lado do sumiço do Brasil, cresce a marginalização do Itamaraty, sobretudo no tratamento dos assuntos relacionados com os países vizinhos da América do Sul. Exemplo disso foi o afastamento da Chancelaria quando, por motivações ideológicas, a Presidência interferiu na decisão de suspender o Paraguai do Mercosul e na maneira como foi decidido o ingresso da Venezuela no bloco.
Nunca antes na História deste país a Presidência influiu tanto nas questões de competência do Itamaraty de analisar e recomendar cursos de ação para que a presidente possa tomar as decisões. Não são segredo o descaso com que o Itamaraty tem sido tratado nos últimos anos, até mesmo na questão orçamentária, e a pouca importância que tem sido dada às posturas tradicionais recomendadas pela Chancelaria para problemas que afetam diretamente o que seria, de fato, do interesse do Brasil.
Como já assinalei nesta página (Instituição em perigo, 10/9/2013), em razão de interferências indevidas em seu trabalho analítico e em seus processos decisórios, o Itamaraty deixou de ser o principal formulador e coordenador das propostas e temas que têm como finalidade a projeção internacional do País.
A execução de políticas seguindo uma plataforma partidária certamente não estaria agradando ao velho Barão do Rio Branco, que ensinou que "a pasta das Relações Exteriores não é e não deve ser uma pasta de política interna". O Itamaraty não deve servir a um partido político, mas ao Brasil.
Surge agora outra perigosa novidade promovida pelo PT: a Presidência da República quer criar o Conselho Nacional de Política Externa, presidido pelo secretário-geral da Presidência, pelo assessor de Assuntos Internacionais e pelo ministro do Exterior. Discute-se se seria um órgão consultivo ou se teria competência para interferir na formulação e na execução da política externa. Caso criado - esteve a ponto de sê-lo ainda com o ex-ministro Antonio Patriota -, o conselho completaria o processo de esvaziamento do Itamaraty, apesar de representar uma flagrante violação do artigo 87, I, da Constituição, que dá atribuição exclusiva ao Ministério das Relações Exteriores para coordenar os órgãos da administração pública federal em sua área de competência.
Chegou a hora de restaurar o prestígio do Itamaraty e recuperar sua centralidade no processo decisório interno para a execução de uma política de Estado, tendo como único objetivo a defesa do interesse nacional.
*Rubens Barbosa é presidente do Conselho de Comércio Exterior da FIESP.

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

O Brasil e o Mercosul - Rubens Barbosa (OESP)

O BRASIL E OS NOVOS BLOCOS
 Rubens Barbosa
O Estado de S.Paulo, 11.02/2014

Pela primeira vez em vinte anos, os presidentes do Mercosul não realizaram o último encontro semestral e o Conselho do Mercosul, nem tem data para reunir-se neste ano. A crise é tão grave que os presidentes não conseguem fechar uma proposta conjunta para a União Europeia, tema importante que permitirá uma aproximação com um grande bloco comercial. 
O Mercosul, como inicialmente concebido, está agonizante. O Tratado de Assunção de 1991 previa, em seu artigo primeiro, a liberalização comercial e a abertura de mercado entre os países membros.
Hoje por questões politicas e ideológicas, o Mercosul tem sido um impedimento para a inserção externa do Brasil e dos outros países membros.  Amotivação política dos governos fez com que as regras passassem a ser desrespeitadas e medidas protecionistas prevalecessem sem qualquer punição para os países infratores. O Mercosul representa hoje apenas 8.6% do intercâmbio total do Brasil. O bloco está se tornando cada vez menos importante para nossas exportações, mesmo para os produtos manufaturados, que estão perdendo mercado na região pela perda de competitividade da economia brasileira.
O resultado foi um crescente isolamento do Brasil e do Mercosul das novas formas de comércio – cadeias produtivas globais, que representam hoje 56% do comércio global - e das negociações de acordos de livre comércio bilaterais e de mega-acordos regionais.
O Brasil, nos últimos 12 anos, colocou todas as suas fichas nas negociações multilaterais da Rodada Doha, no âmbito da Organização Mundial de Comércio (OMC). A reunião de Bali foi positiva pela preservação da OMC, mas os desafios são enormes para a retomada das negociações de Doha, para a reforma que torne a instituição mais eficaz e ágil, e para tentar incorporar, de alguma forma, os acordos regionais até aqui negociados fora da OMC.Os riscos de nova paralização continuam grandes. Essa estratégia equivocada de negociação comercial fez com quenesse período o Brasil e o Mercosul concluíssem negociação com apenas três países: Israel, Egito e Autoridade Palestina. Enquanto isso, no mundo mais de 500 acordos estão em discussão, sendo que 354 foram notificados na OMC.
Os EUA e a Europa passaram a negociar a abertura de mercados fora da OMC. O alijamento da OMC das discussões das regras que regulamentarão as trocas comerciais no futuro reveste-se de particular gravidade porque os países em desenvolvimento não participarão de sua elaboração e se quiserem associar-se a esse mega grupo em formação terão que aceitar as regras prontas. Essas regras referem-se a serviços, investimentos, compras governamentais, propriedade intelectual e de origem.
Na Asia, os EUA estão em negociações adiantadas com 11paises(por razões politicas, a China não está incluída) para formar a Parceria Trans-Pacífica (TPP, em inglês). Mais recentemente, foi anunciado o inicio de um processo de integração ainda mais ambicioso: o acordo de comércio entre os EUA e a União Europeia que juntos representam  metade do PIB global e quase um terço do comércio internacional. Essas negociações tem implicações ainda mais graves para os países em desenvolvimento e, em especial,para o Brasil pelo fato de que em paralelo aos entendimentos comerciais, os dois gigantes regionais estão discutindo a formulação de regras sobre investimento, serviços, compra governamentais, propriedade intelectual, de origem, competição e sobretudo de padronização (standards) fora da OMC.
O Brasil e os países do Mercosul – grande produtores de produtos agrícolas – sofrerão um impacto adicional. O mercado europeu absorve grande parte desses produtos mesmo com medidas protecionistas e incentivos ilegais. A partir do momento em que o bloco transatlântico passar a existir nossos países terão de enfrentar a concorrência – com preferências negativas – a principal potência exportadora agrícola do mundo, os EUA.
A Aliança do Pacifico, integrada por México, Colômbia, Peru e Chile,  decidiu dar prioridade `as negociações com a Asia e com os EUA. Os quatro países tem acordos de livre comércio com os EUA, a União Europeia e outros países asiáticos, como a Coréia.Evidenciando uma estratégia mais ativa e moderna, a Aliança resolveu aproximar-sedos países desenvolvidos e explorar as possibilidades que se abrem com o intercâmbio com a Asia.
Do ponto de vista comercial, a Aliança terá pouco impacto inicial sobre os países do Mercosul, ao contrário do que ocorre com os outros blocos, pelo fato de que os países do Mercosul serem grande fornecedores de produtos agrícolas. O mercado europeu absorve grande parte desses produtos, mesmo com medidas protecionistas e incentivos ilegais.
Se as negociações do Mercosul com a Comissão Europeia não avançarem, por relutância protecionista de qualquer de seus membros, não haverá alternativa ao Brasil, no âmbito do Mercosul, senão fazer um acordo em separado com a União Europeia, para resguardar nossos interesses.
Por tudo isso, a percepção empresarial a respeito das negociações externas está mudando. No trabalho Agenda de Integração Externa divulgado pela Fiesp, pede-se o aprofundamento dos acordos regionais de comércio para eliminar a erosão das tarifas para os produtos brasileiros e negociações com países desenvolvidos, como UE, EUA, Japão, Coréia e outros que podem aportar conhecimento inovador e novas tecnologias para as empresas brasileiras.
Menos ideologia e mais pragmatismo na área externa é a demanda empresarial para recuperar as oportunidades perdidas nos últimos anos.


Rubens Barbosa, presidente do Conselho de Comércio Exterior da Fiesp

domingo, 26 de janeiro de 2014

quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Eleicoes 2014: a politica externa de Aecio Neves - Rubens Barbosa


A política externa e as eleições

As convenções partidárias que confirmarão os candidatos a presidente da República serão realizadas em junho, pouco antes da Copa do Mundo. A partir de agosto, todas as atenções estarão voltadas para as eleições. Haverá pouco tempo para um efetivo debate sobre os temas maiores que afetarão a economia, políticas sociais, meio ambiente e políticas externa e de comércio exterior no próximo governo, a partir de 2015.
Por isso, parece oportuno que alguns temas comecem a ser discutidos para influir nos programas dos futuros candidatos. Um dos temas que mais suscitaram controvérsia nos últimos 12 anos foi o da formulação e execução da política externa e a condução do Itamaraty, que era considerada uma das instituições de excelência na vida pública brasileira.
O senador Aécio Neves (PSDB-MG), candidato provável da oposição em outubro, foi o primeiro a apresentar suas ideias sobre áreas que considera prioritárias para discussão durante a campanha eleitoral. Dentre os temas ressaltados em sua cartilha e que se espera sejam desdobrados em propostas concretas para consideração da sociedade brasileira, está o papel do Itamaraty, os desdobramentos da política externa e suas implicações para a política de comércio exterior. Como reintegrar o Brasil no mundo e aumentar sua credibilidade e projeção externa são os desafios.
Segundo Aécio Neves, “o viés ideológico imposto à nossa política externa nos últimos anos está isolando o Brasil do mundo. Demos as costas para importantes nações democráticas e abraçamos regimes de clara inclinação totalitária, em flagrante contraste com as melhores tradições da nossa diplomacia. Com visão de futuro, o compromisso é conquistar um lugar privilegiado para o Brasil no mundo. É necessário abandonar a política externa de alinhamento ideológico adotada nos últimos anos e resgatar a tradição de competência e a atuação independente da diplomacia brasileira. O Itamaraty deve servir ao Brasil e defender o interesse nacional, acima de todo e qualquer interesse partidário. Nossa diplomacia deve, também, recuperar no exterior os compromissos que defendemos internamente, como o repúdio às tiranias, o direito à paz, a solidariedade internacional em defesa da democracia, o respeito aos direitos humanos e ao meio ambiente”.
Um dos temas que mais suscitaram controvérsia nos últimos 12 anos foi o da formulação e execução da política externa e a condução do Itamaraty
A cartilha ressalta ainda que “a partidarização da política externa tem consequências severas na política de comércio exterior: acentua o isolamento, ao invés de ampliar a integração; produz atritos, em lugar de cooperação produtiva; empobrece nossa pauta de comércio, ao invés de dinamizar trocas e oportunidades. As decisões equivocadas de política externa fizeram com que, nos últimos anos, o Brasil não negociasse acordos com as principais economias e os principais blocos, de forma a dinamizar nossas relações de comércio. A integração regional está se desfazendo e o Brasil continua a reboque dos acontecimentos. Deixamos de abrir mercados para os produtos brasileiros e de ampliar a modernização da estrutura produtiva interna, pela falta de acesso à inovação e à tecnologia de ponta”.
“Especificamente em relação ao Mercosul, o bloco precisa voltar a ser o que era quando da sua concepção: uma área voltada à liberalização do comércio e à abertura de mercados. O Brasil deve assumir a efetiva liderança regional e propor as mudanças que se fazem necessárias para o crescimento do nosso comércio internacional e o desenvolvimento de nossa economia. A negociação de um acordo abrangente e equilibrado entre Mercosul e União Europeia deve ser concluída, mesmo que, para tanto, o Brasil avance mais rapidamente que outros membros do bloco, para deles não ficar refém. O Brasil precisa voltar a integrar-se num mundo em que, cada vez mais, as relações são interdependentes. Nossas empresas produzem com qualidade, mas com cada vez menos competitividade, dados os altos custos internos. É preciso criar condições para ajudá-las a se integrar nas cadeias produtivas globais, por meio de profunda melhoria, racionalização e simplificação do ambiente econômico interno”.
A cartilha, em três parágrafos, lança o debate envolvendo questões que interessam aos empresários, aos trabalhadores e à sociedade em geral. O principal objetivo é a recuperação do prestígio do Itamaraty e de sua centralidade no processo decisório interno. O trabalho da Chancelaria deveria ter como meta apenas o interesse nacional, acima de plataformas de partidos políticos. Entre outros temas, caberia discutir como aperfeiçoar sua gestão para evitar situações equivocadas e para responder aos desafios atuais; como voltar a projetar o Brasil no mundo por meio de políticas sem preconceitos ideológicos; como ampliar o relacionamento com nossos vizinhos sul-americanos e a integração regional, hoje os maiores problemas da política externa; como voltar a dar prioridade às relações com os países desenvolvidos de onde poderá vir a cooperação para a inovação e tecnologia; como reexaminar a estratégia de negociação comercial externa, paralisada pelo isolamento do Brasil, que em 12 anos negociou apenas três acordos de livre-comércio; como aprofundar os acordos de comércio com Peru, Colômbia e México; como iniciar conversações tendentes a associar o Brasil aos acordos regionais e bilaterais com países desenvolvidos para integrar as empresas nacionais nas cadeias produtivas globais; como completar a negociação com a União Europeia, que se arrasta há mais de 12 anos; como aperfeiçoar o processo decisório interno para fortalecer a Câmara de Comércio Exterior (Camex) e dar mais relevância e apoio ao setor externo, que só conseguiu apresentar superávit em 2013 em razão de manobras petroleiras contábeis.
Esses são alguns dos temas que o futuro governo deverá enfrentar e que em boa hora começamos a debater.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 14/01/2013




SOBRE RUBENS BARBOSA


Rubens Barbosa

Rubens Antônio Barbosa foi embaixador do Brasil em Washington (1999-2004). É presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior (Coscex) da Fiesp. Barbosa é articulista dos jornais “O Estado de São Paulo” e “O Globo”, e editor chefe da revista “Interesse Nacional”. É autor dos livros “Panorama Visto de Londres”, sobre política externa e econômica; “Integração Econômica da América Latina” e “The Mercosur Codes”. É mestre pela Escola Superior de Ciências Econômicas e Políticas de Londres. Foi secretário de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda e representante permanente do Brasil junto à Associação Latino-Americana de Integração (ALADI).

terça-feira, 10 de setembro de 2013

O Itamaraty em perigo - Rubens Antonio Barbosa (Estadao)

INSTITUIÇÃO EM PERIGO
Rubens Antonio Barbosa
O Estado de S.Paulo, 10/09/2013
 No momento em que o Ministério das Relações Exteriores (MRE) é levado a uma das crises mais graves de sua história, não se pode deixar de manifestar preocupação com o que ocorre hoje com uma instituição que, pela qualidade de seus membros e pela coerência de sua atuação externa, sempre soube colocar o Brasil em posição de relevo no contexto internacional.
         O Itamaraty é um dos símbolos do Estado brasileiro. Trata-se de uma instituição dedicada ao serviço dos interesses permanentes do País. Serve a eles cumprindo as diretrizes e prioridades de política externa emanadas do governo livremente eleito pelo povo.
O MRE é um órgão respeitado em todo o mundo. A qualidade da atuação internacional do Brasil tem sido, ao longo dos anos, associada em boa medida à solidez institucional da Instituição, à rigorosa seleção e boa formação de seus quadros, à sua vocação suprapartidária, à capacidade de combinar continuidade e mudança. A diplomacia não é algo que possa sofrer guinadas de 180 graus a cada mudança de governo. Os interesses do Brasil no mundo não são reinventados a cada 4 anos.
         Os integrantes da carreira diplomática são servidores do Estado por excelência. Não se vinculam a partidos, nem procuram transferir para o processo de formulação e execução da política externa os embates normais e saudáveis da competição política democrática. Nessa característica – além do rigor na seleção e treinamento, bem como em políticas administrativas que valorizam a promoção por merecimento e nomeação somente de funcionários de seus quadros para funções n Brasil e no exterior – residem alguns de seus principais atributos.
O Itamaraty, nos últimos anos, deixou de gozar da unanimidade nacional, em função de interferências indevidas em seu trabalho analítico e em seus processos decisórios. 
 A perda da vitalidade do pensamento independente em todos os escalões, pela extrema centralização das decisões, a discriminação ideológica contra vários de seus funcionários, greves - que nunca haviam ocorrido - arranhões no princípio hierárquico e problemas de preconceito racial e assédio e até o questionamento do nível dos salários no exterior não ajudam a recuperar a  imagem de um serviço diplomático até aqui considerado um dos mais eficientes do mundo. A retirada do inglês como língua eliminatória nos exames de admissão ao Instituto Rio Branco, em boa hora re-introduzida diante do clamor de protesto então observado, e a obrigatoriedade de leituras politicamente dirigidas para  os diplomatas que voltavam para Brasília foram exemplos recentes que também contribuíram para desgastar a imagem da instituição, mas que podem ser consideradas relativamente inofensivas se revertidas a tempo. Outro traço recorrente da gestão do Itamaraty é a tomada de decisões de caráter administrativo movida mais por voluntarismo do que para acompanhar as prioridades da politica externa brasileira, deixando de sopesar, por uma análise criteriosa, os custos e benefícios para a Instituição. Quase nada é pensado no sentido do aperfeiçoamento dos métodos de trabalho, da melhora da política de pessoal ou da modernização de suas estruturas.
O esvaziamento da instituição e a fragmentação externamente induzida nas suas posturas e no seu modo de operar decepcionam a sociedade brasileira.
O MRE enfraqueceu-se substantivamente e perdeu a função de ser o primeiro formulador e coordenador  em matéria de  projeção internacional do país. Estão sendo retiradas da Chancelaria áreas de sua competência e são crescentes as dificuldades para a alocação de recursos compatíveis com as novas demandas externas e proporcionais à presença ampliada do Brasil no mundo.
O Itamaraty, como executor primordial das relações exteriores do Brasil, deve poder exercer suas funções institucionais de maneira uniforme e homogênea, pautado nos princípios e valores, de natureza interna e internacional, que sempre asseguraram unicidade e coerência nas posições e opções assumidas, sem qualquer interferência não institucional, quer seja no seu processo decisório, quer seja na implementação das políticas determinadas pelo chefe de Estado.
A hierarquia e a disciplina são vetores inquestionáveis da atuação institucional do MRE, sempre que respeitados os princípios e valores inscritos na Constituição, que obrigam seus funcionários, mas também os  agentes políticos que ocupam temporariamente cargos no Estado.
A política externa brasileira nunca deixou de ser uma política de Estado e foram extremamente raros os momentos de nossa história  em que predominou qualquer tipo de vontade partidária , nem sempre coerente com o interesse permanente do país. Nenhuma consideração de natureza partidária deveria, assim, incidir sobre a condução da diplomacia e sobre a atuação de seus profissionais, ou funcionários.
O Barão do Rio Branco, ao assumir a chefia do Itamaraty deixou uma lição que deveria servir como princípio básico para a sua atuação permanente: "a pasta das Relações exteriores não é e não deve ser uma pasta de política interna. Não venho servir a um partido politico: venho servir ao Brasil”.
 Para voltar a desempenhar o papel de relevo que sempre teve, o Itamaraty terá de adequar a politica externa aos novos desafios internos e externos com dinamismo e inovação. Ao renovar-se e atualizar-se atendendo `as demandas dos novos tempos, terá de deixar para trás formalismos, posturas defensivas e  tendências burocrático-ideológicas,  que estão acarretando a perda de influência do Brasil na região e seu isolamento em um mundo em crescente transformação.
Servir ao Brasil e defender o interesse nacional é o que se deveria esperar do Itamaraty, acima de quaisquer outros interesses.


Rubens Barbosa, ex-embaixador em Washington e Londres.