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segunda-feira, 31 de agosto de 2020

Os delírios e mentiras de Bolsonaro isolaram o Brasil da América Latina, China, Europa e até dos EUA - João Filho (The Intercept)



Os delírios e mentiras de Bolsonaro isolaram o Brasil da América Latina, China, Europa e até dos EUA

Da Amazônia aos direitos humanos, passando pelo coronavírus, Bolsonaro transformou o Brasil em pária do mundo.
The Intercept, 14 de Junho de 2020, 1h02
Se antes o Brasil era uma referência em diplomacia internacional e almejava ser protagonista nas relações com o mundo, hoje o país é rejeitado até mesmo pelos seus vizinhos.

O BEM-SUCEDIDO projeto de destruição da democracia do governo Bolsonaro está promovendo uma lenta e dolorosa morte da reputação do país. Com a chegada da pandemia, ficou claro para o mundo que o Brasil está nas mãos de conservadores xucros, fundamentalistas religiosos e psicopatas dispostos a empurrar compatriotas para o cemitério em nome da salvação da economia. Se antes já havia motivos de sobra para a desconfiança internacional, agora a coisa ficou escancarada.
Bolsonaro é, sob qualquer ponto de vista, o pior presidente do mundo no enfrentamento ao coronavírus. A extrema direita avançou no mundo inteiro, mas no Brasil esse avanço está se dando com requintes de crueldade. Mesmo Trump e Orbán, dois presidentes extremistas que são referências para Bolsonaro, basearam suas ações na ciência e determinaram o isolamento social como fundamental para a contenção da infecção. Já Bolsonaro, com base em misticismos forjados no WhatsApp e nos delírios do vovô da Virgínia, trabalha na direção contrária.


O enterro está sendo agora, mas o velório começou antes mesmo do bolsonarismo tomar posse. Ainda em novembro de 2018, a xucrice bolsonarista já exibia suas credenciais para o mundo: desrespeitaram abertamente a China, nosso principal parceiro comercial. Atacaram o Mercosul. Criaram atrito com os países árabes ao anunciar mudança da embaixada de Israel para Jerusalém. Ameaçaram sair do Acordo de Paris. Tudo isso aconteceu ainda faltando um mês para a posse. O estrago feito em poucos dias já era um indicativo da tragédia que viria nesse ano e meio de mandato.
A política internacional bolsonarista é guiada exclusivamente pela ideologia barata de Steve Bannon, o promoter da extrema direita no mundo. É uma ideologia que considera razoável o filho do presidente, que mal sabe falar inglês, se tornar o embaixador brasileiro nos EUA. Estar preparado para o cargo não é uma condição para assumi-lo. Para isso basta ser reaça. As ações internacionais desse governo, portanto, não são pensadas para trazer bons negócios para o país e melhorar a vida do povo brasileiro, mas para cumprir a agenda “anti-globalista” de uma turminha delirante. A expectativa era fazer nosso comércio exterior se aproximar dos capitalistas dos EUA e se afastar dos comunistas chineses. A realidade está sendo outra: EUA e China se afastando cada vez mais do Brasil.
Essas patacoadas internacionais foram se acumulando e atingiram o pico com a maneira esotérica como enfrentamos o coronavírus. A comunidade internacional está nos isolando progressivamente. Mesmo o principal aliado, Trump, tem criticado reiteradamente o Brasil e proibiu a entrada de brasileiros em seu país. Este 2020 pode ser considerado o ano em que o Brasil se transformou em pária internacional.
O bolsonarismo prometeu acabar com a política internacional ideologizada dos governos do PT, ignorando que a relação política entre Brasil e EUA, por exemplo, já foi tão boa que Lula quase virou amigo do direitista George Bush. Ainda antes de tomarem posse, Eduardo Bolsonaro esteve nos EUA com Steve Bannon e desfilou com um boné da campanha Trump 2020. Essa vergonhosa puxação de saco com Trump foi, por óbvio, uma tragédia em termos diplomáticos. Trump não é o dono dos EUA e praticamente todas as importantes decisões do governo precisam de aprovação da Câmara, que hoje é composta por uma maioria democrata.
Na semana passada, uma comissão da Câmara americana declarou que rejeitará qualquer parceria econômica com “o Brasil do presidente Jair Bolsonaro”. Sim, a rejeição não é ao país, mas especificamente ao país presidido por Bolsonaro. Em carta enviada ao principal negociador comercial dos EUA, o embaixador Robert Lighthizer, a Câmara justifica a rejeição: “há um completo menosprezo (do governo Bolsonaro) por direitos humanos básicos, pela necessidade de proteger a floresta amazônica e pelos direitos e dignidade dos trabalhadores (…) O aprimoramento do relacionamento econômico entre os EUA e o Brasil, neste momento, iria minar os esforços dos defensores dos direitos humanos, trabalhistas e ambientais brasileiros para promover o estado de direito e proteger e preservar comunidades marginalizadas”.
Outra razão para a rejeição de acordos comerciais com o Brasil: “as declarações depreciativas sobre mulheres, populações indígenas e pessoas identificadas por gênero ou orientação sexual, além de outros grupos”.  É claro que também há interesses econômicos por trás dessa rejeição dos democratas, mas é inegável que a imagem manchada do país atrapalha os negócios.
Na Europa, há uma enxurrada de países rejeitando parcerias comerciais com o Brasil. Na última quarta, o parlamento holandês se colocou contra o acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul, que ainda depende da aprovação de países participantes. Motivos? A devastação da Amazônia e o descaso com os povos indígenas comandados por Jair Bolsonaro.
Em fevereiro, um parlamento regional na Bélgica rejeitou por unanimidade o mesmo acordo, usando as mesmas justificativas. Além desses países, França, Irlanda e Alemanha também já deram sinais claros que não vão assinar acordos comerciais com o Brasil pelos mesmos motivos.
Mês passado, Yasmin Fahimi, deputada alemã que preside o Grupo Parlamentar Brasil-Alemanha, afirmou que não sabia como seria possível conciliar as políticas de Bolsonaro com as exigências para o acordo União Europeia-Mercosul. E completou: “Bolsonaro representa um perigo para a democracia, para o estado de direito e para a existência da floresta amazônica”. O bolsonarismo está descobrindo na prática que se apresentar ao mundo como inimigo do meio ambiente e dos direitos humanos não é bom para os negócios — uma obviedade que nem o chimpanzé mais esperto do bando, o Paulo Guedes, conseguiu enxergar.
Além dos EUA impedirem a entrada de brasileiros no país pelo descaso do governo no combate à pandemia, outros países estão fazendo o mesmo. Nossos vizinhos de continente temem que o descaso do governo brasileiro respingue em seus países. O Paraguai fechou as fronteiras do país por temer, segundo uma autoridade paraguaia, que a “situação caótica” vivida pelo Brasil chegue ao país. Argentina e Uruguai também reforçaram o controle nas fronteiras com o Brasil, levando motoristas de caminhão brasileiros a sofrerem discriminação pelas autoridades estrangeiras.
Na Colômbia, o maior número de casos de coronavírus está em uma cidade amazônica que faz fronteira com o Brasil. O ministro da Saúde colombiano atribuiu o problema à falta de diálogo com as autoridades brasileiras.  Na Bolívia, o quadro se repete. As cidades que fazem fronteira com o Brasil estão entre as que  mais têm casos no país. O sistema de saúde da região boliviana na Amazônia já entrou em colapso.
Apesar da profunda recessão econômica, o governo que prometeu ultraliberalismo na economia vem implodindo todas as pontes comerciais do país. A nossa diplomacia não está a serviço dos brasileiros, mas de uma agenda global da extrema direita. Em nenhum outro momento da República, o Brasil esteve tão isolado. Se antes o país era uma referência em diplomacia internacional e almejava ser protagonista nas relações com o mundo, hoje é rejeitado até mesmo pelos seus vizinhos. A transformação do Brasil em pária internacional é consequência direta do até aqui muito bem-sucedido plano de destruição progressiva da democracia.
Hoje, nós somos vistos pelo mundo como uma republiqueta das bananas cujo líder é um homem autoritário que renega a ciência, esconde dados fundamentais para a segurança sanitária e faz ameaças semanais de golpe de estado. Esse é o paiseco que nós viramos.

domingo, 1 de março de 2020

Olavetes e bolsonetes em novas boquinhas no cerrado central - The Intercept

Todos nessa foto prometeram jamais receber dinheiro do governo. A maioria recebeu.


A maioria dos presentes nesta foto recebe ou recebeu, direta ou indiretamente, dinheiro público após a posse de Bolsonaro.
Reprodução: Twitter
No dia em que Bolsonaro tomou posse, os principais expoentes da militância virtual que disseminaram mentiras durante a campanha foram recebidos no Planalto com tapete vermelho. Foram credenciados como “mídia alternativa” e tiveram acesso VIP, podendo circular por várias áreas do evento. Enquanto isso, os jornalistas da imprensa ficaram em áreas restritas, sem acesso à comida, água e banheiro.
Allan dos Santos do site Terça Livre, o influenciador digital mais próximo do presidente, juntou seus colegas para publicar o primeiro ataque e a primeira mentira com o intuito de descredibilizar a imprensa. Enquanto pipocavam os relatos de jornalistas sobre o tratamento recebido no Planalto, Santos gravou um vídeo dizendo que eles estavam “mentindo descaradamente”. Mostrou bebedouros, a mesa do café e os banheiros. Mas, claro, era só mais uma mentira para jogar a tropa contra a imprensa. Allan mostrou apenas o espaço que havia sido reservado para a imprensa bolsonarista, ao qual os jornalistas não tinham acesso.
Depois de fabricar a sua primeira mentira após a chegada de Bolsonaro no poder, Allan dos Santos publicou o seguinte tweet:

Viemos para ficar e nossa fonte de renda NÃO É E NUNCA SERÁ o Governo.
Na foto: @terca_livre, @brasilparalelo, @conexaopolitica, @reaconaria e @pauloap.

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Percebam que o Allan usou letras maiúsculas para reforçar que aquela turma jamais receberia dinheiro do governo. Passado pouco mais de um ano de bolsonarismo no poder, é possível confirmar a promessa dele? Como você já deve suspeitar, é claro que não. Direta ou indiretamente, todas as arrobas citadas nesse tweet foram de alguma forma beneficiadas pela eleição de Jair Bolsonaro. Todos eles se deram bem com a extrema direita no poder, seja com uma parceria, uma viagem para o exterior, uma propaganda grátis feita pelo presidente ou um carguinho esperto.
O canal Brasil Paralelo (@brasilparalelo) é um projeto alinhado ao bolsonarismo que foi para outro patamar depois da última eleição. A especialidade do grupo é produzir documentários sobre filosofia, política e economia, sempre deturpando a História e fazendo abordagens com viés de extrema direita. A divulgação incessante dos vídeos pela máquina bolsonarista ampliou o alcance do site. O Brasil Paralelo hoje, além de faturar com a monetização dos vídeos no YouTube, onde conta com mais de 1 milhão de seguidores, está vendendo cursos a preços bem salgados. O grupo conta com uma plataforma própria, exclusiva para assinantes. Durante a última campanha presidencial, o canal ajudou na tática bolsonarista de descredibilizar as eleições, publicando um vídeo repleto de informações falsas que supostamente comprovariam uma fraude nas eleições de 2014. A mentira foi desmascarada pelo Projeto Comprova, mas já tinha sido vista por mais de 2 milhões de pessoas.
Com Bolsonaro no poder, o Brasil Paralelo passou a ganhar muito espaço no MEC. A TV Escola, aquela que Bolsonaro pretendia fechar, tem transmitido o conteúdo do canal em sua programação. A série “Brasil: a última cruzada”, do Brasil Paralelo, foi transmitida na íntegra pela TV Escola. O bolsonarismo aparelhou uma emissora pública para divulgar revisionismo histórico de quinta categoria, sempre com o viés católico e reacionário ensinado por Olavo de Carvalho.
O fundador do site Reaçonaria, Osmar Bernardes Jr., tentou ser deputado federal pelo PSL em São Paulo, mas não se elegeu. Para não ficar de mãos abanando, ganhou um carguinho esperto no Ministério da Educação. Mas o que era bom durou pouco tempo. Osmar, que é aluno de Olavo de Carvalho, foi exonerado do cargo de assessor executivo do MEC quando uma turma de olavistas foi colocada para correr logo nos primeiros meses.
Paulo Roberto de Almeida Prado Junior, o @pauloap, é um influenciador digital do bolsonarismo. Antes da vitória de Bolsonaro, ele agitava as redes como um aguerrido militante na luta contra as mamatas no serviço público.


Nós estamos acordados por um bom motivo. Mas imagina os milhares de FDP sem sono, sabendo que vão perder a boquinha e o $ público HAHAHAHAHA

See Paulo's other Tweets
Mas, apesar das dúvidas de Olavo de Carvalho, o mundo é esférico e dá voltas. É claro que com a eleição do seu mito, Paulo conseguiu o espaço que lhe cabia. O rapaz foi agraciado com o cargo de secretário parlamentar de Eduardo Bolsonaro, recebendo em torno de R$ 12 mil por mês. É verdade que esse dinheiro não vem do Executivo (o “Governo”), como Allan escreveu no tweet. Mas não deixa de ser dinheiro público pago pelo gabinete do filho do presidente. Antes da eleição do seu candidato, Paulo choramingava por não ter grana para ir até Brasília para acompanhar a posse do presidente. Mas esse tempo acabou. Hoje, o influenciador digital pode realizar sonhos grandiosos:

Não é todo dia que você conhece alguém que realmente mudou a história...

Nigel Farage, responsável pelo Brexit e gente boa demais 🇬🇧

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Dois pastores evangélicos são os responsáveis pela Gospel Prime, que se diz um site de notícias voltado para evangélicos. Mas basta uma breve visita ao sitepara atestar que se trata também de mais um espaço de propaganda bolsonarista. Praticamente todas as notícias são sobre política, sempre com viés bolsonarista e com uma linguagem sedutora para o público evangélico. Jarbas Luiz Lopes de Aragão, um dos pastores que comandam o site, conseguiu um cargo na pasta de Damares. Ele foi nomeado como secretário comissionado da Secretaria Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial.
Com ascensão do governo extremista, o jornalista Allan dos Santos viu seu pequeno blog começar a bombar em audiência e se transformar em um site que hoje comercializa cursos dos mais variados. Segundo ele, o Terça Livre se tornou “o maior canal conservador de informação e cultura da América Latina”. A amizade com o presidente e seus filhos foi a melhor coisa que poderia ter acontecido na vida profissional de Allan. O Terça Livre é o canal reacionário mais divulgado pelos filhos de Jair, principalmente por Eduardo Bolsonaro, que vive compartilhando conteúdo do site.
A divulgação da família do presidente ajuda a elevar a audiências dos seus vídeos, que costumam ser monetizados no YouTube. Não restam dúvidas de que Allan dos Santos se beneficiou com o bolsonarismo no poder. Hoje, além do aumento de audiência e da venda de cursos, ele tem livre acesso a vários integrantes do Planalto, é convidado a viajar para o exterior e ainda conta com a família presidencial para ajudar na divulgação do seu trabalho. Ano passado, Allan foi convidado para ir aos EUA com Eduardo Bolsonaro e lá pôde entrevistar o guru da extrema direita internacional Steve Bannon que, até pouco tempo atrás, era diretor-executivo do site de extrema direita americano Breitbart News, dedicado a publicar conteúdo racista, xenófobo, mentiras e teorias da conspiração.
Assim como o Terça Livre, o Conexão Política (@conexaopolitica) também é um site pró-Bolsonaro. Depois de militar muito durante a campanha, o responsável pelo site, Davy Albuquerque da Fonseca, de 20 anos, ganhou um cargo no serviço público. Ele foi agraciado pelo deputado Alexandre Knoploch, um bolsonarista eleito pelo PSL em 2018 e que hoje integra a “bancada pitbull” do partido no Rio de Janeiro. Fonseca virou assessor parlamentar do deputado, um cargo que lhe garantia R$ 3.331,05 por mês. Durante todo esse tempo em que seu chefe de redação esteve como assessor, o Conexão Política, claro, continuou atuando em defesa do bolsonarismo. Não se trata, como no caso do Paulo Almeida Prado Jr., de verba vinda do Executivo, mas não deixa de ser grana pública paga pelo partido pelo qual o presidente foi eleito. Fonseca ficou no cargo até junho do ano passado, quando foi exonerado.
Como se vê, a promessa de que todos citados naquele tweet jamais receberiam verba do governo era tão verdadeira quanto as mamadeiras de piroca que o PT distribuía para as crianças. Todos ali, de uma forma ou de outra, foram beneficiados pela eleição de Bolsonaro depois de terem militado durante anos ao seu lado. Todos esses veículos hoje têm mais audiência, privilégios para entrevistar políticos do governo e são tratados com muito respeito por um presidente que odeia o jornalismo. Os bolsonaristas da informação são beneficiados, direta ou indiretamente, por ações do governo federal e da família do presidente.

terça-feira, 24 de setembro de 2019

O discurso na ONU que poderia ser feito e não foi - Adriana Erthal Abdenur, Maiara Folly (The Intercept)

Um discurso do Brasil na ONU que não será lido por Bolsonaro

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Ilustração: Rodrigo Bento/The Intercept Brasil
A Assembleia Geral das Nações Unidas é um dos principais órgãos da ONU. Tradicionalmente, cabe ao Brasil abrir a sua reunião anual. É um momento importante, em que o presidente reafirma os compromissos do país nas relações internacionais. Frente às drásticas mudanças que ocorrem na política externa brasileira, decidimos escrever o discurso que acreditamos que o Brasil deveria apresentar aos chefes de Estado reunidos em Nova York.
É um discurso que projeta um ideal de nação e justiça. Guarda o tom dos discursos diplomáticos, com referência a órgãos e tratados que existem, com propostas fictícias, criadas por nós, mas que acreditamos serem viáveis e necessárias. Somos duas especialistas em relações internacionais, com pesquisas sobre paz, segurança e políticas públicas.

O discurso está baseado em pilares centrais defendidos pela diplomacia brasileira desde o retorno à democracia. Entre eles, destacam-se a promoção da integração regional e o acolhimento de migrantes e refugiados, além da defesa do meio ambiente, dos direitos humanos, da resolução pacíficas de conflitos e do multilateralismo, em contraste com o atual foco no nacionalismo, que enxerga a soberania nacional e a cooperação multilateral como mutuamente excludentes. Também reforçamos em nosso discurso a histórica demanda do Brasil em favor da reforma das instituições que compõem a governança global, incluindo o Conselho de Segurança da ONU e o Banco Mundial, de forma a dar maior voz aos países em desenvolvimento.
Também traz iniciativas inovadoras que ainda não existem, mas também retoma compromissos anunciados na última década, como o fortalecimento da Organização do Tratado de Cooperação da Amazônia, a criação de um fundo soberano voltado à educação e à pesquisa, e o lançamento de um Livro Branco de Política Externa formulado com grande participação da sociedade civil, promessa anunciada em 2014, mas jamais concretizada pelo Ministério das Relações Exteriores. O discurso termina anunciando o lançamento do Museu da Escravidão, no Rio de Janeiro, um projeto que idealizamos a ser criado em cooperação com outros países de língua portuguesa.
É um lembrete de que um dia poderemos ter uma política externa proativa e criativa, coerente com os valores democráticos e com o objetivo de melhorar nossas vidas.
Ilustração: Rodrigo Bento/The Intercept Brasil
Bom dia a todas e todos. É uma honra estar aqui e dar continuidade à longa tradição que o Brasil mantém de abrir a Assembleia Geral das Nações Unidas.
Senhoras e senhores, enfrentamos crises sem precedentes no mundo. Novas tecnologias, transformações geopolíticas e o impacto das mudanças climáticas são apenas três dos desafios complexos que nos trazem novas incertezas.
O Brasil tem longa trajetória de contribuir para o multilateralismo, tradição que perpassa governos democráticos e militares, seja por meio de esforços globais como a Liga das Nações e as Nações Unidas; ou por meio das organizações regionais, como a Organização dos Estados Americanos e o Mercosul.
O multilateralismo e o respeito pelo direito internacional são fundamentais para que possamos enfrentar e prevenir os problemas cada vez mais urgentes do mundo atual. Rejeitamos os discursos nacionalistas e populistas que se aproveitam das novas incertezas para esvaziar as instituições da governança global e para enfraquecer a democracia e os direitos humanos.
O passado nos mostra que problemas globais não podem ser resolvidos por um só país. Ao invés de trazerem prosperidade, o unilateralismo e o isolacionismo provocam instabilidade e, até mesmo, guerras.
O Brasil tem colhido os frutos concretos de sua tradição multilateralista, dentre os quais os avanços logrados por meio da Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável e o reconhecimento do seu território marítimo através da Convenção da ONU sobre o Direito do Mar.
Portanto, acreditamos que, longe de serem mutuamente excludentes, o multilateralismo e a soberania nacional reforçam-se mutuamente.
Defendemos a multipolaridade cooperativa, por meio da qual poderemos construir uma ordem internacional mais equânime e democrática, com maior representatividade dos países em desenvolvimento. Essa ordem deve ser pautada pelo multilateralismo e pelo direito internacional, e não por rivalidades geopolíticas ou ambições hegemônicas.
A política externa brasileira retoma o seu viés universalista, fundamentado na ideia de que o diálogo é necessário especialmente quando discordamos. Por isso o Brasil continua, através da Agência Brasileira de Cooperação, fortalecendo os laços de cooperação Sul-Sul. Aprofundamos as trocas não apenas através de agrupamentos tais como o IBAS e o BRICS, mas também bilateralmente com parceiros na América Latina, na África e na Ásia com base nos princípios de amizade, horizontalidade e reciprocidade. Para tal, o Brasil assume o compromisso de expandir seu orçamento para atividades de cooperação internacional, sempre considerando a responsabilidade fiscal e o impacto social e ambiental de tais projetos.
Os países latino-americanos são nossos vizinhos e temos todos a ganhar com uma maior integração regional. Reconhecemos nossa dívida histórica para com nossos antepassados africanos e nos orgulhamos das nossas raízes. Os laços entre o Brasil e o Oriente Médio são históricos e continuaremos expandindo as trocas. Acompanhamos com grande interesse a iniciativa do Cinturão e Rota e buscaremos aprofundar nossos intercâmbios com parceiros asiáticos.
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Também devemos trabalhar juntos pela inovação. Além de desenvolver tecnologias de ponta em áreas tais como aviação e energia nuclear para fins pacíficos, o Brasil também é referência em tecnologias sociais no combate à fome e à pobreza. Na nossa cooperação solidária, iremos privilegiar os esforços em saúde pública, compartilhando nossas experiências no desenvolvimento de um sistema único de saúde de acesso universal e resguardado pela Constituição federal, buscando também aprender com nossos parceiros.
Sociedade civil e setor privado têm seu papel a desempenhar nas políticas públicas e na cooperação – mas isso não quer dizer que os estados devem abdicar da sua responsabilidade perante os desafios atuais.
As instituições de Bretton Woods e outros componentes da governança global econômica devem atentar para a pauta comercial que, na ausência de um arcabouço global efetivo, se afunda em um bilateralismo sem rumo. Esse panorama produz trocas que são altamente assimétricas, prejudicando os países em desenvolvimento.
Igualmente preocupante é a tendência de financeirização da economia global. O fenômeno vem exacerbando as profundas desigualdades socioeconômicas já existentes, alimentando uma super elite com poder político desproporcional e fomentando novas tensões sociais. Precisamos inovar nos esforços de regulamentação do setor financeiro e no combate à precarização do trabalho.
O Brasil segue comprometido com a reforma do Fundo Monetário Internacional, Banco Mundial e Organização Mundial do Comércio, de forma a torná-las mais eficazes. E isso requer maior representatividade da ordem mundial atual, na qual países em desenvolvimento contribuem significativamente para o crescimento mundial, mas carecem de poder decisório. Enxergamos essas mudanças como urgentes, sobretudo diante de ameaças protecionistas e guerras comerciais que se acirram em meio à falta de respeito pelas normas internacionais.
Os arranjos regionais também têm um papel fundamental na promoção da multipolaridade cooperativa. A América Latina não pode se tornar um cemitério de organizações regionais. Além de propor a reforma da OEA de forma a fortalecer seu papel na prevenção e resolução de conflitos, o Brasil irá lançar novas iniciativas para reforçar a Organização do Tratado de Cooperação da Amazônia, que enxergamos como um espaço cada vez mais estratégico para a região.
Reafirmar a soberania brasileira sobre a nossa parte da Amazônia e rechaçar a ideia da sua internacionalização não exclui reconhecer sua importância global. O Brasil permanece à disposição para cooperar com parceiros em busca da preservação da floresta amazônica, da proteção dos povos indígenas e tradicionais, e do desenvolvimento sustentável e inclusivo de toda a Amazônia.
Senhoras e senhores, o Antropoceno demanda soluções cooperativas e fundamentadas em pesquisas e evidências. Face à emergência climática que o mundo enfrenta, o Brasil reitera seus compromissos para com o Acordo de Paris. A comunidade científica no Brasil trabalha em estreita colaboração com contrapartidas em outros países no desenvolvimento de mecanismos de monitoramento da floresta, desde satélites até o uso da inteligência artificial. Nos orgulhamos dos nossos centros de excelência como o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, o Inpe.
A valorização da ciência, do conhecimento e da educação é primordial na promoção do desenvolvimento sustentável e inclusivo. É por isso que garantiremos a realização do nosso Censo Demográfico em seu formato original. Além disso, criaremos um fundo soberano cujos recursos serão dedicados exclusivamente ao fortalecimento da educação pública, incluídas a pesquisa e a inovação. O Fundo Paulo Freire contará com ampla participação social na elaboração de um modelo de gestão inovador, além de estar aberto à cooperação com empresas e países parceiros.
O Brasil lidera esforços climáticos internacionais desde que sediou a Rio 92 e a Rio+20. Mantendo a tradição, iremos sediar a próxima Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. Tais esforços irão fortalecer a governança climática inovadora que estamos desenvolvendo no Brasil em parceria com governos estaduais e municipais, atores da sociedade civil e entidades do setor privado.
Reafirmar a soberania brasileira sobre a nossa parte da Amazônia e rechaçar a ideia da sua internacionalização não exclui reconhecer sua importância global.
Além disso, o Brasil convida a comunidade internacional a apoiar e participar da Conferência Internacional da Juventude e do Clima que iremos sediar no ano que vem em Teresina, no Piauí.
A cooperação internacional é essencial para o avanço do desenvolvimento sustentável e inclusivo. Iremos fortalecer nossos laços de cooperação para repensar modelos de infraestrutura de grande porte, identificando e promovendo boas práticas na redução dos impactos socioambientais do deslocamento das populações locais. Essas e outras iniciativas de mitigação e adaptação demandam não apenas maior engajamento de países em desenvolvimento, mas também maiores compromissos por parte dos países que deram saltos históricos em desenvolvimento causando fortes impactos ambientais. Nesse sentido, enxergamos no diálogo de alto nível que estabelecemos em abril com a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico um canal importante de troca de ideias, respeitando nossas diferenças.
Para que possamos redobrar os esforços de cooperação, solicitei à nossa Ministra das Relações Exteriores, que convoque uma reunião extraordinária da Organização do Tratado de Cooperação da Amazônia.
Nesse encontro, iremos lançar novos esforços colaborativos de proteção das florestas e dos seus habitantes, promovendo uma abordagem sustentável em toda a Bacia do Amazonas.
Senhoras e senhores, o Brasil tem longa tradição de prevenção e resolução pacífica dos conflitos, dentro e fora da sua região. Nosso país tem orgulho de estar entre os membros fundadores da Zona de Paz e de Cooperação do Atlântico Sul, livre de armas nucleares, que constitui uma das nossas maiores credenciais como ator na paz e segurança internacional.
O Brasil lamenta o desgaste do regime internacional de desarmamento, com o recente colapso do Tratado de Forças Nucleares de Alcance Intermediário, e se compromete a ratificar e a promover a universalização do novo Tratado sobre a Proibição das Armas Nucleares.
No mesmo espírito, anunciamos uma moratória nacional na produção de munições de fragmentação e irá aderir à Convenção de Oslo sobre a proibição desses artefatos, que provocam danos desproporcionais à população civil.
O Brasil opõe-se a intervenções militares salvo em caso de aprovação pelo Conselho de Segurança e, mesmo assim, defendemos o uso responsável da força. Casos de instabilidade aguda requerem uma abordagem pacífica priorizando os meios políticos e diplomáticos. O Brasil rejeita o uso da força para lidar com a crise venezuelana, posto que recorrer às armas poderia gerar instabilidade na Venezuela e em toda a região por décadas.
Entendemos, ainda, que sanções econômicas têm impacto imediato e desproporcional sobre a população civil. Portanto, o Brasil opõe-se a sanções unilaterais, enxergando-as como medidas de último recurso que devem ser aprovadas no âmbito das Nações Unidas. O Brasil acredita que a crise apenas poderá ser resolvida pelos próprios venezuelanos, sem ditames externos. Iremos colaborar com os esforços imparciais de mediação entre o governo e a oposição, como Grupo Internacional de Contato, o Mecanismo de Montevidéu, e os Diálogos de Oslo.
O Brasil apoia o acordo de paz assinado entre o governo da Colômbia e as FARC e permanece à disposição para apoiar as partes para que retrocessos sejam evitados na implementação do acordo.
Estamos prontos a desempenhar atividades de mediação no Oriente Médio, caso sejamos convidados pelas partes.
Também reiteramos nosso apoio à resolução pacífica dos conflitos no Oriente Médio. Mais especificamente, assinalamos a necessidade de preservar o acordo sobre o programa nuclear iraniano. Reafirmamos o compromisso do Brasil com a solução de dois Estados para Palestina e Israel, com base nas linhas de 1967 e nos parâmetros do direito internacional, inclusive em relação ao status de Jerusalém. Estamos prontos a desempenhar atividades de mediação no Oriente Médio, caso sejamos convidados pelas partes.
Acreditamos que os mecanismos de paz e segurança das Nações Unidas podem e devem ser modernizados e aprimorados. Sob a liderança da nossa ministra da Defesa o Brasil retoma seu papel junto às operações de paz da ONU. Setecentos dos nossos militares, policiais e de civis serão enviados para a Missão das Nações Unidas na República Centro-Africana. No início do ano, lançamos uma campanha que busca aumentar a participação de mulheres brasileiras em todos os componentes, inclusive em postos de liderança.
No plano político, também continuaremos contribuindo para os esforços de resolução pacífica dos conflitos. É por isso que propomos a criação de uma Rede de Mediadoras Latinoamericanas, que reunirá conhecimentos valiosos adquiridos em contextos de conflitos e violência. Essa iniciativa reforça nosso compromisso com a agenda sobre Mulheres, Paz e Segurança.
Ressaltamos que a eficácia da ONU em paz e segurança requer maior representatividade. Em que pese a fadiga com o tema de reforma, insistimos que, sem repensarmos o Conselho de Segurança, a arquitetura de paz e segurança permanecerá distorcida e pouco eficaz. É por isso que lançamos, mês passado, uma nova proposta, sob o título O Conselho dos Capazes. Vislumbramos um órgão cujos membros seriam eleitos a cada cinco anos com base em avanços demonstráveis, durante o período prévio, em pautas tais como: implementação e promoção das Agendas de Mulheres, Paz e Segurança e de Juventude, Paz e Segurança; contribuições concretas para a prevenção de conflitos, incluídos os esforços de desarmamento e de não proliferação de armas nucleares; e iniciativas em mediação de conflitos. Critérios de representatividade também seriam adotados de forma a assegurar a presença dentre os membros do conselho de países de diferentes regiões geográficas e níveis de renda.
Na mesma linha, o Brasil também defende a ampliação dos trabalhos e responsabilidades da Comissão de Consolidação da Paz, mais apta a liderar esforços preventivos e de reconstrução em contextos pós-conflito.
Finalmente, o Brasil continua contribuindo para os debates sobre as normas da intervenção, razão pela qual iremos relançar, com novo vigor, o princípio de Responsabilidade ao Proteger. Iremos também organizar novo debate, no âmbito desta Assembleia, sobre o tema “o Imperativo de Prevenir”.
Senhoras e senhores, como tantos outros países aqui representados, o Brasil foi constituído através da migração, seja por meio da vinda de trabalhadores e comerciantes, seja devido ao tráfico de escravos. Seria incoerente com a nossa própria identidade fechar as portas àqueles que atravessam nossas fronteiras.
A crise de refugiados na Venezuela já tornou-se a segunda maior do mundo e apresenta desafios sem precedentes para os países da região. O Brasil já recebeu cerca de 168 mil migrantes e refugiados da Venezuela e continuará recebendo mais. Diante da situação de graves e generalizadas violações de direitos humanos na Venezuela, nos comprometemos a processar as solicitações de refúgio de venezuelanos de maneira prima facie, ou seja, em grupo.
Assim, o Brasil abrirá mão do prolongado processo de análise individualizada, garantindo proteção internacional aos venezuelanos de maneira coletiva e agilizada.
Também expandiremos nosso programa de interiorização de venezuelanos que chegam através de nossa fronteira terrestre, de forma a promover sua efetiva integração à sociedade brasileira.
Consideramos que a migração é um direito humano e rechaçamos a visão de que migrantes constituem ameaças à segurança nacional. Problemas de segurança podem surgir quando nossas instituições e marcos legais não estão devidamente adequados a receber e garantir os direitos de pessoas migrantes e refugiadas.
A nova Agência Brasileira de Migração está encarregada de coordenar esforços voltados para os solicitantes de refúgio e de residência temporária. Ela também lidera o primeiro mapeamento em nível nacional dos deslocados internos, tendo em mente que milhões de brasileiros já se viram forçados a deixarem seus lares devido a fatores tais como desastres, projetos de infraestrutura e violência.
A agência irá coordenar esforços com o Ministério das Relações Exteriores para aprofundar a cooperação regional em torno da migração, notadamente por meio de uma iniciativa que pretendemos criar, a Coalizão Sul-Norte em defesa dos Pactos Globais da ONU para migração e sobre refugiados.
Temos a honra de anunciar a retomada do programa brasileiro de reassentamento, que terá como medida inicial o reassentamento assistido de 500 refugiados advindos do Oriente Médio, da África e da América Latina. O Brasil também se compromete a fazer contribuições humanitárias anuais e previsíveis para os refugiados palestinos, através da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina. Além disso, ampliaremos nossa contribuição para o Alto Comissariado da ONU para Refugiados e para a Organização Internacional de Migração.
Continuaremos trabalhando com essas agências em busca da plena integração local de migrantes, refugiados e solicitantes de refúgio no Brasil.
Sem a defesa dos direitos humanos não há democracia.
Senhoras e senhores, não podemos permitir que a agenda dos direitos humanos se esvazie. Sem a defesa dos direitos humanos não há democracia. O Brasil é um país diverso onde as mulheres, indígenas, portadores de necessidades especiais e grupos LGBTI devem poder efetivamente exercer sua plena cidadania, com todas as garantias de um estado laico.
Assassinatos como o da vereadora Marielle Franco, no Rio de Janeiro, nos lembram o quão vulneráveis estãos os defensores de direitos humanos, mas também o quão urgentes são essas pautas. Temos avançado no plano interno e internacional para garantir as liberdades individuais e a proteção de defensores, jornalistas e lideranças sociais.
Como parte dos esforços visando à inauguração do Conselho Nacional de Política Externa, lançamos em fevereiro, com ampla participação social, nosso primeiro Livro Branco de Política Externa. O livro marca o início da Política Externa Inclusiva, que incorpora não apenas a igualdade de gênero mas também o anti-racismo e o combate à homofobia, à perseguição étnico-religiosa e à discriminação em geral, promovendo uma sociedade mais igualitária.
Nossa política externa inclusiva tem como âncora o princípio de angatu, que na língua tupi se refere ao bem-estar, bom espírito. Seguindo o angatu, o Brasil busca promover o desenvolvimento sustentável e inclusivo que irá assegurar a felicidade e a dignidade da população. Isso requer atenção não apenas às questões econômicas mas também o respeito ao meio ambiente, à cultura e à diversidade.
Mas não basta falar de princípios; é necessário agir. Junto à ONU, iremos redobrar os esforços na defesa dos direitos sexuais e reprodutivos, assim como promover novas iniciativas para que a privacidade digital seja reconhecida como um direito humano.
Nas Américas, lançaremos em breve uma campanha de fortalecimento do Sistema Interamericano de Direitos Humanos, de forma agilizar a implementação de decisões e recomendações proferidas em seu âmbito.
Em que pese nosso histórico de resolução de conflitos, o Brasil, como muitos outros países, é palco de níveis elevados de violência. Os crimes violentos afetam desproporcionalmente os negros e as mulheres. Tais crimes estão, em boa parte, relacionados ao combate ineficaz ao crime organizado e ao tráfico de drogas através da repressão hostil e da militarização da segurança pública. Vamos priorizar uma abordagem preventiva e que retire o consumo de drogas da esfera criminal, tornando o sistema carcerário mais eficaz e reduzindo a violência. Também iremos trabalhar com parceiros internacionais na desarticulação de redes criminosas transnacionais, que também alimentam a
corrupção e lavagem de dinheiro, através do Diálogo Multi-setorial contra o Crime Organizado Transnacional e sempre respeitando o Estado democrático de direito. Não acreditamos que os fins justificam os meios utilizados para combater crimes.
Senhoras e senhores, sem refletirmos sobre quem somos e para onde queremos ir, não encontraremos as soluções. Com isso, gostaria de compartilhar que, através de esforços da nossa Cooperação Solidária, no final deste ano daremos início à construção do Museu da Escravidão, em colaboração com outros Estados do Atlântico. Além da sua sede no Cais do Valongo, no Rio de Janeiro, o museu irá contar com uma Exposição Navegante, a bordo do antigo Aeródromo São Paulo, cedido para este fim pelo governo federal, que irá se alternar entre os principais portos do Atlântico.
Longe de ser apenas um lembrete dos abusos cometidos no nosso passado, essa nova instituição será um marco no pensar sobre o futuro. A melhor solução para a intolerância, o ódio e a desesperança é pensarmos juntos sobre o mundo que queremos construir através do angatu e da multipolaridade cooperativa.
Muito obrigada.