O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

Meu Twitter: https://twitter.com/PauloAlmeida53

Facebook: https://www.facebook.com/paulobooks

Mostrando postagens com marcador nepotismo. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador nepotismo. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 26 de julho de 2019

Eduardo Bolsonaro: uma exceção à regra? - Ricardo Caiado Lima, Ana Júlia Andrade Vaz de Lima

Eduardo Bolsonaro: uma exceção à regra?

Ricardo Caiado Lima, Ana Júlia Andrade Vaz de Lima
Blogs, Fausto Macedo, O Estado de S. Paulo, 26/07/2019
Ricardo Caiado Lima e Ana Júlia Andrade Vaz de Lima. FOTOS: DIVULGAÇÃO
As recentes notícias de que o presidente da República cogita indicar seu filho e deputado federal, Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), para o cargo de embaixador do Brasil nos Estados Unidos têm provocado diversas discussões de cunho jurídico e moral. Uma das principais questões em debate diz respeito à possibilidade de a nomeação configurar ato de nepotismo.
O nepotismo é caracterizado quando um agente público usa de sua posição para nomear, contratar ou favorecer um ou mais parentes (1), tanto de forma direta quanto de forma indireta (cruzada). Trata-se de prática proibida no Brasil pela Constituição Federal de 1988, principalmente pelo artigo 37, que impõe à Administração Pública o dever de observar diversos princípios, dentre os quais o de impessoalidade e moralidade.
Em linhas gerais, o princípio da impessoalidade é uma expressão do próprio princípio da igualdade. Ele determina à Administração Pública o dever de tratar todas as pessoas de forma igual, sem “favoritismos nem perseguições”. O princípio da moralidade, por sua vez, constitui-se no dever de a Administração Pública e seus agentes atuarem conforme padrões éticos (2). Tamanha é a relevância de tais princípios, que a Lei n. 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa) prevê sanções a agentes públicos por práticas que os violem (3).
Nepotismo, portanto, é prática que viola princípios constitucionais e que deve ser rechaçada e punida nos termos da lei. Apesar da clara vedação ao nepotismo no Brasil, a sua caracterização ainda provoca questionamentos quando se refere à nomeação de familiares para cargos políticos – como é o caso de Eduardo Bolsonaro.
Parte da controvérsia se deve ao pronunciamento do Supremo Tribunal Federal por meio da Súmula Vinculante n. 13 (4), cujo teor afirma haver violação à Constituição Federal em casos de nomeação de companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança na administração pública. A referida Súmula evidencia a proibição do nepotismo para cargos administrativos ou em comissão, mas não disciplina a nomeação de familiares para cargos políticos.
Sempre que provocado, o Supremo Tribunal Federal tem decidido que a Súmula Vinculante n. 13 não se aplica a cargos de natureza política, “ressalvados os casos de inequívoca falta de razoabilidade, por manifesta ausência de qualificação técnica ou idoneidade moral” (5). A Suprema Corte, portanto, tem limitado o espectro de nomeações a cargos políticos para fins de cumprimento do comando constitucional de vedação ao nepotismo.
Definidos os contornos jurídicos do nepotismo, resta avaliar se a nomeação de Eduardo Bolsonaro ao cargo de embaixador nos Estados Unidos corresponderia a uma inequívoca falta de razoabilidade, seja por manifesta ausência de qualificação técnica seja por manifesta ausência de idoneidade moral.
Não há resposta fácil a tal pergunta, mas o ordenamento jurídico brasileiro possui mecanismos que indicam possíveis caminhos. A Lei n. 11.440/2006, que dispõe sobre as carreiras do Itamaraty, por exemplo, determina que poderão ser nomeados como embaixador aqueles que já exerciam atividade de diplomacia e que foram aprovados na carreira mediante concurso público. De forma excepcional, a lei permite que sejam escolhidas pessoas fora do quadro das carreiras do Itamaraty, desde que sejam brasileiros natos, maiores de 35 anos, e de “reconhecido mérito e com relevantes serviços prestados ao País”.
As informações publicadas no site da Câmara dos Deputados indicam que Eduardo Bolsonaro é formado há pouco mais de 10 anos em Direito e atuou como escrivão de Polícia Federal até ser eleito, em 2015 (6). Não constam de seu currículo público informações sobre experiências prévias em atividades relacionadas à diplomacia, tampouco relevantes serviços prestados ao país.
Já o presidente da República se posicionou publicamente sobre a questão em vídeo postado nas redes sociais no dia 18 de julho. Apesar de ter negado a prática de nepotismo na específica questão, Jair Bolsonaro afirmou a possibilidade de beneficiar seu filho, fato que pode constituir violação ao princípio constitucional da impessoalidade, se efetivamente realizado.
Caso a indicação de Eduardo Bolsonaro ao posto de embaixador seja confirmada, a palavra final sobre a regularidade da indicação caberá à Comissão de Relações Exteriores do Senado Federal, órgão que possui atribuição legal para aprovar ou rejeitar os nomes de chefes de missões diplomáticas. Sem sombra de dúvidas, a possibilidade de configuração de nepotismo será objeto de avaliação e debates pelos senadores da República.
(1) Disponível em: https://www.cgu.gov.br/assuntos/etica-e-integridade/nepotismo.
(2) MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 33. ed. rev. e atual. até a Emenda Constitucional 92, de 12.7.2016. São Paulo: Malheiros, 2016. p. 117.
(3) A Lei de Improbidade Administrativa também pune o enriquecimento ilícito de agentes públicos e práticas que ocasionem danos ao erário.
(4) Verbete do STF emitido em 2008 que tem efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/glossario/.
(5) Rcl 28.024 AgR, rel. min. Roberto Barroso, 1ª T, j. 29-5-2018, DJE 125 de 25-6-2018.
(6) Disponível em: https://www.camara.leg.br/deputados/92346/biografia

*Ricardo Caiado Lima é especialista em Direito Penal Econômico (Universidade de Coimbra), em Gestão de Riscos de Fraudes e Compliance (FIA) e é sócio do escritório Campos Mello Advogados
*Ana Júlia Andrade Vaz de Lima é Mestra em Direito (PUC-SP), autora do livro Programa de Integridade e Lei Anticorrupção – o Compliance na Lei Anticorrupção Brasileira e é associada do escritório Campos Mello Advogados

sábado, 13 de julho de 2013

Nepotismo, patrimonialismo, fisiologismo: adivinhem de quem estamos falando?

Obviamente do sistema político-partidário brasileiro, que se manifesta num ministério de 39 ministros (e mais um só para propaganda) e mais de uma dezena de partidos...
Paulo Roberto de Almeida

Partidos políticos e nepotismo

Editorial O Estado de S.Paulo, 16 de junho de 2013
O que é um partido político? Numa definição geralmente aceita pelo senso comum, partido político é uma organização de direito privado constituída por cidadãos voluntariamente reunidos em torno de ideias que compartilham e, movidos pelo espírito público, empenhados em conquistar o poder político para implantar essas ideias. No Brasil, o artigo 17 da Constituição Federal estabelece que "é livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos, resguardados a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo e os direitos fundamentais da pessoa humana". Essa é a teoria. Mas a regra geral, com as exceções de praxe, no sistema partidário brasileiro, é a falta de espírito público e o predomínio do "aparelhamento", do fisiologismo, do interesse pessoal ou de grupos. E uma das mais acintosas e deploráveis manifestações dessa distorção é o nepotismo dominante na organização de grande parte dos pequenos partidos políticos.
Levantamento realizado pelo jornal O Globo (9/6), revela que nos 30 partidos políticos registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) foram encontrados pelo menos 150 familiares dos "donos" da legenda em cargos de direção, geralmente remunerados. São cônjuges, pais, irmãos, tios e primos que ocupam os principais postos de comando. Funções remuneradas com recursos provenientes, quase exclusivamente, do Fundo Partidário. Ou seja, é dinheiro público que remunera a atividade privada - partido político, vale a pena repetir, é entidade privada - de membros dos clãs familiares que dominam boa parte dos partidos existentes no País.
O sistema partidário brasileiro é produto do paternalismo e do patrimonialismo que historicamente predominam na organização social e política do País. O paternalismo se manifesta na convicção generalizada, reforçada pelo viés ideológico, de que cabe exclusivamente ao governo resolver todos os problemas do País. Ou seja, a sociedade não precisa, ou melhor, não deve ser agente de sua própria história, ter participação ativa na promoção do bem comum. Basta que aceite passivamente a condição de beneficiária das dádivas dos poderosos.
Desse paternalismo decorre quase que naturalmente o patrimonialismo, entendido como a inexistência de distinção entre o público e o privado, que faz a alegria dos políticos inescrupulosos para quem a atividade pública é facilitadora, quando não apenas um meio eficiente para a acumulação de riqueza material.
Sendo essa a mentalidade predominante na chamada "classe" política - há muitas e notáveis exceções, claro -, é inevitável que ela se reflita na organização partidária, como o demonstram a feudalização e o domínio de muitas legendas por clãs familiares.
A mais nefasta manifestação do paternalismo e do patrimonialismo no sistema partidário brasileiro se explicita no fato de que, basicamente, as legendas sobrevivem à custa de recursos públicos, embora sejam, por definição, entidades de direito privado. O Tesouro patrocina fortemente as campanhas eleitorais, por meio da renúncia fiscal oferecida às emissoras de rádio e televisão para compensar a abertura do chamado horário "gratuito" de propaganda dos candidatos.
Como se essa verdadeira mamata não fosse suficiente, os atuais donos do poder - PT à frente - preconizam a exclusividade do financiamento público das campanhas eleitorais, sob o pretexto de eliminar a "influência do poder econômico" nas eleições.
De fato, é sintomático que sejam as grandes empreiteiras de obras públicas os principais financiadores das campanhas eleitorais. Não é difícil imaginar por quê. Mas a única maneira de eliminar qualquer tipo de influência indesejável nas campanhas é eliminar tanto o financiamento privado, de empresas, quanto o público, do governo.
Quem deve financiar os partidos políticos são seus militantes e apoiadores, por meio de contribuições pessoais. Não é o caminho mais fácil, mas é o mais democrático e o menos sujeito a distorções como o apetite nepotista por dinheiro fácil.

sábado, 23 de março de 2013

Meretissimos se metem (ou sao metidos) onde nao deveriam - Editorial Estadao

Parece que os costumes se flexibilizam, as amizades prevalecem, as regras são esquecidas, a moral vai para o espaço, e o que vale mesmo é o interesse pessoal...
Paulo Roberto de Almeida

Conluios e amizades

22 de março de 2013 | 2h 10
Editorial O Estado de S.Paulo
 
Durante o julgamento, pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que determinou a aposentadoria compulsória de um juiz piauiense acusado de beneficiar advogados, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, recolocou na agenda do Judiciário um problema antigo: o risco de as relações de amizade entre magistrados e advogados resultarem em favorecimento de uma das partes e em tráfico de influência.
"O conluio entre juízes e advogados é o que há de mais pernicioso nos tribunais. Sabemos que há decisões condescendentes, absolutamente fora das regras", afirmou o ministro, depois de defender uma "limpeza" na instituição. Além de afetar o equilíbrio de forças no jogo judicial, a excessiva intimidade entre juízes e advogados é a origem de muitos casos de corrupção na Justiça, disse o presidente do STF e do CNJ. Semanas antes de assumir o cargo, no final de 2012, ele tocou no mesmo tema, criticando os filhos, cônjuges e sobrinhos de ministros dos tribunais superiores que advogam nas mesmas cortes de seus pais, maridos e tios. "Eles são contratados não pela qualidade de seu trabalho, mas pelas ligações de parentesco. Isso divide os advogados em duas classes: os que têm acesso privilegiado, podendo beneficiar os clientes, e os comuns, que não têm laços de sangue para favorecê-los", disse Barbosa na época.
Na última sessão do CNJ, o único conselheiro que discordou do presidente do STF e votou pela absolvição do juiz piauiense foi o desembargador federal Fernando Tourinho Neto. "Fui juiz no interior da Bahia, tomava uísque na casa de um, bebia cerveja na casa de outro e isso nunca me influenciou", afirmou ele, horas antes do vazamento acidental de e-mails que revelaram um pedido pessoal seu a outro membro do CNJ. Pelos e-mails vazados, Tourinho teria solicitado ao conselheiro Jorge Hélio - indicado pela advocacia - que apresentasse, com rapidez, parecer relativo a um pedido de sua filha, que é juíza federal e quer participar de um concurso de remoção. Ela pretende deixar a vara onde atua, no Pará, e transferir-se para Salvador. "Está chegando um requerimento de minha filha, e é urgente. Concedendo ou negando, despacha logo", pediu.
As associações de juízes reagiram às críticas do presidente do STF com evidente irritação. Elas afirmaram que, ao fazer críticas genéricas à magistratura, o ministro Joaquim Barbosa estaria ameaçando o Estado de Direito - o que é um exagero. Elas também fizeram críticas pessoais a Joaquim Barbosa. "Juiz não faz voto de isolamento social. Os juízes se formam em faculdades e ali fazem amizade para a vida toda", protestou o presidente da Associação dos Juízes Federais, Nino Toldo, depois de lembrar que a namorada de Barbosa é advogada em Brasília. "Como fica isso", indagou.
Relações promíscuas entre magistrados e advogados não são um problema novo no Judiciário. Já havia sido abordado, por exemplo, pela então corregedora nacional de Justiça, ministra Eliana Calmon - hoje vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça e diretora da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados. No período em que integrou o CNJ, ela se destacou por condenar o tráfico de influência nos tribunais. Foi ela a primeira ocupante de um tribunal superior a denunciar o "filhotismo" na Justiça. Em várias entrevistas, Eliana Calmon afirmou que o problema não está na atuação de parentes de ministros nos processos judiciais, mas nas relações informais que ocorrem fora dos autos, quando se valem da amizade com um juiz, desembargador ou ministro para fazer lobby em favor de clientes.
É evidente que um familiar de um magistrado não pode ter o direito de advogar limitado pela simples suspeita de que será beneficiado. O problema levantado pela ministra Eliana Calmon, e agora retomado pelo ministro Joaquim Barbosa, é delicado e uma solução objetiva não é fácil de ser encontrada. O que o CNJ pode fazer, além de alertar a magistratura, é continuar aplicando sanções severas quando as denúncias de abusos forem confirmadas - como ocorreu no caso do juiz piauiense.