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segunda-feira, 31 de maio de 2021

A casta patrimonialista e extratora do funcionalismo federal contra a nação - Demetrio Magnoli

 A casta


Por Demétrio Magnoli
31/05/2021 • 01:00

São “parasitas” que estão matando o “hospedeiro”? A sentença emitida por Paulo Guedes, como quase tudo que fala o já não tão poderoso ministro, é uma generalização estúpida. Nas suas desigualdades internas, o funcionalismo público é quase um microcosmo do conjunto da sociedade brasileira. Mas sua elite forma, de fato, uma casta aristocrática que extrai recursos vitais dos brasileiros comuns, amplificando a concentração de renda.

A casta está incrustada no funcionalismo federal: segundo o Ipea, em 2017, os servidores municipais tinham salário médio de R$ 2,9 mil, contra R$ 5 mil dos estaduais e R$ 9,2 mil dos federais. O Congresso e, especialmente, o Poder Judiciário formam os ecossistemas da casta: no Executivo, o holerite médio era de R$ 3,9 mil, contra R$ 6 mil dos funcionários do Legislativo e R$ 12 mil dos servidores do Judiciário.

Raymundo Faoro iluminou, nos idos de 1958, a relação intrínseca entre o poder estatal e o estamento dos servidores públicos. A conversão patrimonial do bem nominalmente público em propriedade privada — a prática sistemática de “tosquiar” a sociedade — expressa-se, entre tantas formas, na remuneração da casta. Os funcionários federais ganhavam, em média, 96% mais que os trabalhadores de empresas privadas, sempre em 2017. No Judiciário, 4,2% dos funcionários recebiam salários superiores a R$ 30 mil.

Getúlio Vargas esculpiu a transição para a economia urbano-industrial criando a moderna burocracia estatal e lançando as sementes da casta. Os filhos dos fazendeiros tornaram-se bacharéis. O PT, partido apoiado nos sindicatos de servidores, completou a obra varguista. Nos governos Lula e Dilma, o gasto com pessoal saltou de cerca de R$ 200 bilhões para mais de R$ 300 bilhões, já descontada a inflação.

O país existe para servir os servidores? Em 2019, o Brasil gastou 12,9% do PIB com o funcionalismo, um dos maiores dispêndios do planeta, superior ao do Canadá (12,1%) ou da França (11,8%), para não mencionar Reino Unido (9%), EUA (8,7%), Alemanha (7,6%) ou Chile (7,1%). Só o Judiciário — e sem contar o MP — consumiu 1,5% do PIB, um assalto à arca pública que fica evidente no cotejo com Itália (0,18%), França (0,15%) ou EUA (0,14%). Por aqui, terra de fidalgos togados, o vale-refeição dos juízes supera o salário mínimo em 24 das 27 unidades da Federação.

O lulismo impulsionou a casta a um novo patamar — e seus arautos nem sequer admitem a discussão de uma reforma administrativa capaz de limitar as rendas públicas destinadas a sustentar seus privilégios. O sociólogo Jessé Souza, o mais autêntico formulador da visão lulista sobre o Estado e a sociedade no Brasil, sintetizou a alegação da casta na seguinte sentença: “Os bancos querem enxugar os gastos do Estado, para que o Estado possa ter seu orçamento dirigido aos bancos”. Ficamos sabendo, então, que, segundo Jessé, propor uma reforma administrativa implica defender os interesses dos bancos.

A técnica de acusar o interlocutor de nutrir maléficas motivações ocultas, típica de espíritos autoritários, destina-se a circundar a argumentação histórica e factual, substituindo o debate informado por um torneio de insultos. Na maioria das nações democráticas, governos de diversos matizes políticos evitaram que a alta burocracia de Estado abocanhasse parcela da riqueza nacional similar à que alimenta a “nossa” casta. Seriam todos esses governos meros agentes do capital financeiro?

Na base do funcionalismo, especialmente nos níveis estadual e municipal, encontra-se a parcela dos servidores públicos de maior valor social. São, em grande parte, funcionários mal-remunerados da saúde e da educação que atendem à população de baixa renda. É a casta, não os malvados banqueiros, que desvia para si mesma os recursos necessários para a qualificação e modernização dos serviços públicos universais.

Uma reforma administrativa equilibrada — que, obviamente, não é a de Paulo Guedes — interessa à maioria dos brasileiros. Pena que, 90 anos depois de Vargas, os representantes políticos da casta ainda consigam se fantasiar como amigos do povo.

https://blogs.oglobo.globo.com/opiniao/post/casta.html

quarta-feira, 18 de novembro de 2020

Paulo Roberto de Almeida no Estado da Arte: Modernismo, patrimonialismo, diplomacia

Meus artigos no Estado da Arte, neste ano de 2020, sob gentil convite do Gilberto Morbach:  


O “modernismo” brasileiro chegando aos 100 anos

“Cem anos depois, o que restou da Semana de Arte Moderna, do modernismo brasileiro, da angústia então ressentida pelos modernistas quanto à necessidade de ‘jogar’ definitivamente o país no futuro?”

Por Paulo Roberto de Almeida, um ensaio sobre nossas contradições, sobre a república que não fomos; sobre déjà vu e desesperança, sobre nosso modernismo e nossa angústia, quase cem anos depois.

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https://estadodaarte.estadao.com.br/modernismo-100-anos-pra/


O patrimonialismo estatal e os novos bárbaros

“O patrimonialismo, nosso velho conhecido, tem um longo passado na história do Brasil. Provavelmente, terá também um brilhante futuro pelos anos à frente. O Itamaraty, que se orgulhava de ser a mais weberiana das corporações de Estado, parece estar prestes a ser submergido por ‘novos bárbaros’, que podem deformar o caráter ‘racional-legal’ de seus métodos burocráticos de trabalho.” A análise de Paulo R. de Almeida sobre o patrimonialismo estatal e os novos bárbaros.

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https://estadodaarte.estadao.com.br/patrimonialismo-novos-barbaros-paulo-almeida/


A diplomacia brasileira na corda bamba, sem qualquer equilíbrio

Os principais temas de uma política externa torturada e tortuosa, em uma tentativa de detectar nossas chances de passar impunemente por uma das fases mais sombrias da história do Itamaraty.

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https://estadodaarte.estadao.com.br/diplomacia-brasileira-corda-bamba/


Outros virão, a seu tempo...

Paulo Roberto de Almeida

quarta-feira, 21 de outubro de 2020

Marcelo de Paiva Abreu: Brasil: patrimonialismo e autarquia, livros de ensaios de história econômica, 2o. volume

 Na sequência da postagem anterior, as mesma informações para esta obra excepcional na historiografia econômica brasileira, por um dos maiores, senão o maior historiador econômico do Brasil, completando  a informação relativa aos dois volumes. Primeiro a ficha catalográfica do 2o. volume, pois o ISBN é específico a cada volume: 


Agora a capa e sumário e apresentação do segundo volume, finalizando pela contracapa. 
























Marcelo de Paiva Abreu: Brasil: patrimonialismo e autarquia, livros de ensaios de história econômica, 1o. volume

Acabo de receber um presente excepcional do autor: os melhores ensaios de história econômica do economista historiador (ou historiador econômico, ele escolhe), Marcelo de Paiva Abreu, professor na PUC-Rio, reunidos pelo autor, traduzidos em Português, aqueles originalmente publicados em Inglês, e enfim divulgados ao público brasileiro. Durante anos andei à cata de todos esses artigos, dispersos numa dúzia ou mais de publicações diversas, agora finalmente compilados nos dois volumes que apresentarei aqui, nos jpgs abaixo.

Primeiro a ficha catalográfica, para os que desejarem adquirir imediatamente: 

Agora, nesta primeira postagem, a capa do primeiro volume, ilustrada, tanto quanto a contracapa, in fine, e as mesmas ilustrações para o segundo volume, com documentos da época (títulos da dívida e outros), depois o índice e a apresentação deste primeiro volume, que permitem conhecer exatamente o conteúdo, as datas e locais de publicações originais e outras informações pertinentes. Em postagem subsequente, colocarei os mesmos arquivos relativos ao segundo volume.

Vou poder agora, finalmente, terminar meu segundo volume da história da diplomacia econômica do Brasil, na década final do século XIX e na primeira metade do século XX, pois tendo já coletado material do Arquivo Histórico Diplomático do Itamaraty no Rio de Janeiro, faltavam-me alguns dados primários que se encontram dispersos em diferentes fontes e bases de dados historiográficas, e que agora passam a estar reunidas nestes dois volumes de utilíssimas compilações. 









 





sábado, 18 de maio de 2019

O patrimonialismo, antigo e moderno - Paulo R. Almeida, Bolivar Lamounier

Bolivar Lamounier retraça a trajetória prática do patrimonialismo brasileiro, cuja primeira reconstrução teórica-histórica foi feita por Raymundo Faoro, por ironia da História um dos fundadores do PT, justamente o partido que transformou o patrimonialismo parcialmente modernizado na era Vargas em um patrimonialismo gangsterista. Estou seguro que se vivo fosse ele teria se alinhado com Hélio Bicudo, outro fundador do PT, na apresentação do pedido de impeachment contra a organização criminosa em se transformou o PT.
Paulo Roberto de Almeida 

A política brasileira entre dois passados

Somos um país sem elites autônomas, sem classe média e sem partidos políticos

BOLÍVAR LAMOUNIER*, O Estado de S.Paulo
18 de maio de 2019 | 05h00

Em 1958, quando publicou Os Donos do Poder (Editora Globo), mestre Raymundo Faoro introduziu o conceito de patrimonialismo, estabelecendo por meio dele a mais clássica das clássicas interpretações da História brasileira.
Mas, parafraseando Ortega y Gasset, podemos dizer que toda grande obra é ela mesma e sua circunstância. Nós, leitores preguiçosos, lemos o título e deixamos de lado o subtítulo do livro. Neste – Formação do Patronato Político Brasileiro – Faoro esclareceu melhor o sentido de seu trabalho. O Estado patrimonialista deitava raízes na era medieval portuguesa, mas Faoro quis manter a dignidade do substantivo formação. Nós, imbuídos da ideologia desenvolvimentista que à época emergia com todo o vigor, não quisemos perceber o paradoxo que o grande historiador gaúcho ali deixara, de caso pensado. Otimistas, só queríamos pensar no futuro e acreditávamos piamente que a industrialização liquidaria todos os resquícios do passado colonial. Portanto, o próprio patrimonialismo haveria de fenecer naturalmente. Morreria de morte morrida logo que as chaminés das fábricas de São Paulo enchessem o céu com sua espessa fumaça. Não nos passou pela cabeça que o Estado patrimonialista era uma estrutura poderosa, capaz de resistir a pressões contrárias à sua índole.
De nossa incapacidade de perceber a resiliência do patrimonialismo decorreram vários equívocos, o mais óbvio dos quais é que ele simplesmente se recusou a morrer. Está aí, perceptível a olho nu, agigantado e cada vez mais forte. Seu hábitat natural é, obviamente, Brasília, onde, sem dificuldade alguma, seus tentáculos sufocam e interligam os três Poderes. Estado patrimonialista, uma estrutura que vive em função de si mesma, que persegue os objetivos que ela mesmo escolhe, e o faz distribuindo o grosso da riqueza e as melhores oportunidades de ganho entre os “amigos do rei”. É certo que admite novatos, mas por cooptação, não como protagonistas autônomos, como bem explicou Simon Schwartzman no também clássico Bases do Autoritarismo Brasileiro(Editora da Unicamp).
Do equívoco que acima enunciei no atacado, penso que três outros merecem ser abordados no varejo: somos um país sem elites autônomas, sem classe média e sem partidos políticos.
Teríamos elites autônomas se as tivéssemos fora do Estado, capazes de balizar as ações do núcleo estatal, impelindo-o a levar mais em conta o que, para abreviar, chamarei de bem comum. Os poderosos “de dentro do Estado” obviamente não são elites no sentido que acabo de definir; são o próprio Estado, os amigos do rei, vale dizer, de si mesmos. Os que não se deixam balizar por nenhum poder externo, pois detêm em caráter privativo a função de balizar a sociedade, de fixar e aplicar as normas, com a parcialidade que lhes parece adequada em relação a qualquer assunto e a cada conjuntura.
Do ponto de vista histórico, como aconteceu isso? Ora, sabemos todos que a grande atividade econômica do Brasil colonial era a lavoura canavieira. O consórcio colonial luso-brasileiro deteve o monopólio mundial do produto até meados do século 17. Começou a perdê-lo com a invasão holandesa, iniciada em 1624. Expulsos, entre 1654 e 1661, os holandeses pegaram seus volumosos capitais, a técnica dos engenhos e o respaldo da Holanda, então a rainha dos mares, e foram para a América Central, de onde, num abrir e fechar de olhos, destruíram a hegemonia luso-brasileira. Rápida no gatilho, a camada dominante da lavoura açucareira percebeu que dali em diante sua sobrevivência dependeria mais da política que da economia. E pulou para dentro do Estado, onde até hoje se encontra.
Algo semelhante, mas em menor escala, ocorreu com a extração do ouro e dos diamantes em Minas Gerais, mas o caso verdadeiramente instrutivo é o da cafeicultura paulista. Tendo viabilizado a passagem do trabalho escravo ao assalariado, ela também deteve por algum tempo um quase monopólio do mercado mundial do produto. Não menos importante, como esclareceu Celso Furtado, ela permitiu o surgimento de uma elite muito mais qualificada, capaz de pensar grande e de operar com tirocínio no mercado internacional. Mas a História se repetiu, embora por outros caminhos. A superprodução e a competição internacional não tardaram a aparecer e a brilhante elite cafeicultora o que fez? Reuniu-se em Taubaté, em 1906, e pleiteou também seu lugarzinho no colo do Estado. Nos primórdios da industrialização, a elite nem precisou pleitear nada, pois já nasceu aconchegada na estrutura corporativista montada por Getúlio Vargas, encaixando-se no sindicalismo de empregadores.
Demonstrar que tampouco dispomos de uma classe média capaz de sobreviver com os rendimentos da pequena empresa ou de empregos de boa qualidade é uma tarefa bem mais simples. Poucos anos atrás trombeteamos muito o surgimento de uma “nova classe média”, não nos dando conta de que toda série numérica pode ser subdividida em quantas subséries quisermos, e uma delas será “média”. Uma pena que os limites mínimo e máximo de tal subsérie eram constrangedoramente baixos. Nada que ver com uma classe média numerosa, robusta e autônoma, e é por isso, evidentemente, que temos uma das piores distribuições de renda do mundo: nossa “classe média” é um conjunto vazio entre a pífia minoria que maneja o Estado patrimonialista e a massa de miseráveis à qual tal Estado nem uma escolarização decente proporciona.
E os partidos políticos? Ora, um partido político digno de tal designação tem como requisito fundamental a capacidade de se superpor a interesses demasiado estreitos, balizando-os no sentido do bem comum. Os nossos são incapazes de fazer isso porque no fundo eles não passam disto: são meros grupos de interesse, protagonistas do corporativismo desatinado a que nosso país chegou.
* BOLÍVAR LAMOUNIER É CIENTISTA POLÍTICO, SÓCIO-DIRETOR DA AUGURIUM CONSULTORIA, MEMBRO DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS; É AUTOR DO LIVRO "DE ONDE, PARA ONDE – MEMÓRIAS" (EDITORA GLOBAL)

PS.: Onde Bolivar Lamounier se refere à América Central, no caso dos judeus empenhados na cultura do açucar, deve se ler, preferencialmente, Caribe.

terça-feira, 23 de janeiro de 2018

Paulo Kramer: uma aula sobre patrimonialismo e corrupcao petista

Eu já tinha postado esta "aula" na versão WhatsApp, mas aqui o texto foi revisto por meu amigo Paulo Kramer.
Paulo Roberto de Almeida

PATRIMONIALISMO


Um amigo me perguntou: "Mas, afinal, qual a diferença entre o PT e os outros partidos?" Respondi assim:
Oi, meu caro! Grato pela oportunidade, e vamos lá:
1) Ao contrário da maioria dos meus amigos e conhecidos que ficaram decepcionados e indignados quando começaram a vir à tona os primeiros podres do governo lulopetista, não fiquei nem uma coisa, nem outra, porque já estava cansado de saber, por estudo e observação própria, que a esquerda não democrática É, SEMPRE FOI, NUNCA DEIXARÁ DE SER P-A-T-R-I-M-O-N-I-A-L-I-S-T-A: aqui, em Cuba, na antiga União Soviética e nos seus satélites do Leste europeu, na China, na Venezuela, enfim, em qualquer lugar do mundo seja qual for a época. E, se alguém ainda nutria dúvidas sobre isso, foi porque nunca se deu o trabalho de perceber quais os países que a petralhada sempre teve como modelos.
2) O lulopetismo inventou o patrimonialismo? Claro que não, assim como Ayrton Senna não foi o inventor do automobilismo... Aliás, patrimonialista (i. e., predadora dos recursos públicos para engordar o patrimônio pessoal ou familiar) é toda a nossa cultura política. Patrimonialismo significa sempre e necessariamente atraso e miséria? Não, o patrimonialismo apresenta versões modernizadoras (Marquês de Pombal, em Portugal; Getúlio Vargas e regime militar no Brasil; Pedro, o Grande na Rússia etc., etc., etc.). Agora, corrupto, sempre; base de um regime político e econômico em que o Estado é mais forte que a sociedade, fazendo da segunda refém do primeiro, sempre também.
3) TODOS OS PARTIDOS POLÍTICOS BRASILEIROS SÃO PATRIMONIALISTAS, porque patrimonialista é essa matriz socioeconômica e política comum a cada um deles. Mas, então, em que o lulopetismo se distingue deles? Tentarei esclarecer: os outros partidos que formam a 'base parlamentar aliada' de qualquer governo agem como quadrilhas relativamente independentes (é o grupo do deputado X na previdência, é a panelinha do senador Y no setor elétrico, é o 'esquema' do ministro ou governador Z nesta ou naquela estatal... Enfim, cada quadrilha roubando para enriquecer os clãs familiares e políticos encastelados nas cúpulas dos diferentes partidos, mas que, em razão desse mesmo caráter descentralizado da roubalheira, jamais teve força suficiente, muito menos projeto consistente, para substituir o regime democrático (com todos os defeitos e limitações deste) por um sistema mais monopolizador do poder, de tipo ostensivo (regimes de partido único, a exemplo de Cuba, URSS etc) ou disfarçado (como os governos do PRI mexicano durante sete décadas a fio -- uma única legenda com efetivo controle das alavancas do poder [na mão direita, o Diário Oficial; na esquerda, os sindicatos e movimentos sociais corrompidos e domesticados ], em torno da qual gravitam partidecos sustentamos pelas migalhas caídas da mesa do banquete da sigla hegemônica).
4) O lulopetismo foi o único a atrever-se a um projeto centralizado, tentacular, onipresente de corrupção a serviço da eternização no poder. Nas condições atuais do mundo e do Brasil, o modelo mais viável não seria o despotismo de partido único, mas sim o hegemonismo à la PRI mexicano. 
Entendem a diferença? Para os outros clãs partidários e eleitorais, a corrupção era/é um fim em si; para o PT, um meio de eternizar-se no poder.
5) Liberais no Ministério da Fazenda, conforme o script esboçado na Carta ao Povo Brasileira (que prefiro chamar de documento sossega-banqueiro) que Lula divulgou em plena campanha de 2002, com texto de Antonio Palocci. Lembrar que, naquele momento,  a tensão pré-eleitoral estava nas alturas, com o dólar encostando em 4 reais, justamente pelo temor do mercado de que Lula e PT, se/quando chegassem ao poder cumpririam tudo aquilo que prometiam desde a fundação do partido, isto é, a implantação de um regime socialista à la Cuba, ou Angola, ou qualquer outro modelo acalentado por amantes do totalitarismo como Zé Dirceu. Por isso, depois de ganhar aquela primeira eleição, a política econômica do primeiro mandato de Lula seria impecavelmente ortodoxa, fincada no tripé câmbio flutuante, metas inflacionárias e responsabilidade fiscal. Atribuo a manutenção do Meirelles durante oito anos à frente do Banco Central como fruto da superior compreensão do ex-pobre Lula de que as maiores vítimas da inflação são os pobres, que, ao contrário das classes média e alta,  não podem se refugiar em aplicações financeiras indexadas; para o assalariado ou biscateiro pobre, num contexto de inflação alta, o dinheiro vira pó assim que é recebido...
6) No fundo, os lulopetistas jamais se converteram à economia de mercado, permanecendo fiéis ao besteirol intervencionista e estatizante que nem ao menos chega ser original, já que herdado das ditaduras estado-novista e militar. O disfarce liberal ortodoxo da política econômica do primeiro mandato não tardaria a ser abandonado, sob o estímulo de três fatores conjunturais: a maré de prosperidade ensejada pelo boom internacional dos preços das commodities agropecuárias e minerais; o advento da Grande Recessão mundial em 2008/2009, que reanimou as velhas e nunca preenchidas expectativas da esquerda de um colapso planetário e final  do capitalismo; e a descoberta do pré-sal, que, na cabecinha dessa gente, soou como senha para mandar às favas a responsabilidade fiscal e todo aquele receituário econômico 'de direita'.  E vamos enfiar cada vez mais grana no rabo de Joesleys e Eikes, que aventureiros como eles eram os grandes financiadores das campanhas do PT, além de fontes aparentemente inesgotáveis de propina. A esse trinômio, eu acrescentaria uma quarta  eventualidade decisiva para compreender a regressão da política econômica na passagem do 1º para o 2º mandato de Lula: a derrocada do Palocci com o escândalo caseiro-gate. Ele era um dos únicos da cúpula lulopetista a compreender a superioridade infinita da economia de mercado sobre todos os modelos alternativos e, se tivesse a coragem e a lucidez  de livrar-se do abraço sedutor, paralisante e delinquente do patrimonialismo, estaria em condições de liderar a transição do PT do socialismo populista, atrasado, para-bolivariano etc., rumo à socialdemocracia moderna, respeitadora das cláusulas pétreas da economia de mercado e do regime representativo.
Quem quiser saber mais, deve ler, do meu mestre e amigo ANTONIO PAIM, um dos maiores pensadores brasileiros vivos: Momentos Decisivos da História do Brasil; Marxismo e Descendência; O Liberalismo Contemporâneo (3ª edição); A Querela do Estatismo (2ª edição) e O Relativo Atraso Brasileiro e sua Difícil Superação; do saudoso diplomata, humanista e psicólogo junguiano José Osvaldo de Meira Penna: Em Berço Esplêndido e O Dinossauro; e, do historiador das ideias Ricardo Vélez Rodríguez (o mais brilhante discípulo de Antônio Paim): A Grande Mentira.
Um última observação sobre POPULISMO e PATRIMONIALISMO: nem todo patrimonialismo é populista, mas todo populismo é patrimonialista. Demagogos inescrupulosos como Lula exploram as fragilidades intelectuais e a imaturidade cívica de culturas políticas como a nossa, nas quais o entroncamento da herança contra-reformista ibérica com o positivismo de cunho religioso (ração ideológica da qual se fartaram o pensamento militar republicano e o caudilhismo gaúcho de Júlio de Castilhos, Borges de Medeiros, Getúlio Vargas e Leonel Brizola) e o marxismo mais rastaquera formaram o caldo de cultura do coitadismo mais nocivo. Esses falsos messias sabem que, no Brasil e em Nuestra América de maneira geral, basta afetar e exibir esse falso sentimento de compaixão pelos pobres para receber de amplas parcelas da opinião pública, a começar pelos estamentos intelectuais e artísticos um amplo salvo conduto para saquear o erário é enriquecer à custa do suor do contribuinte. 

Paulo Kramer é cientista político.
Este texto reproduz conversa do autor no WhatsApp.

sábado, 20 de janeiro de 2018

Uma aula de Paulo Kramer sobre patrimonialismo e a corrupcao do PT

Patrimonialismo tradicional brasileiro e corrupção petista: uma lição de Paulo Kramer

Paulo Roberto de Almeida
 [Objetivo: considerações sobre patrimonialismo e corrupção; finalidade: introduzir um texto de Paulo Kramer sobre os dois fenômenos no Brasil]


Introdução
Concordo inteiramente com a lição de Paulo Kramer abaixo transcrita: existe uma diferença fundamental, essencial, entre, por um lado, a corrupção "normal" do sistema político, pervasiva, resiliente, tradicional entre os todos os partidos políticos, entre todos os caciques do velho sistema, e a corrupção sistêmica, "científica", organizada no modo bolchevique, do PT e sua liderança mafiosa (um pouco como era o partido nazista na Alemanha hitlerista).
A diferença, para mim (PRA), é esta: enquanto a corrupção tradicional se faz, na terminologia marxista, pelo velho "modo artesanal de produção da corrupção", ou seja, em caráter individual, oportunista, usando os recursos habituais da classe política para assaltar o Estado – emendas parlamentares, superfaturamento em despesas governamentais locais, achaque a empresas que serão protegidas depois, caixa 2 como sempre se fez, já a corrupção no universo petista, ou petralha, se faz pelo "modo industrial de produção da corrupção", sistêmica, organizada, cientificamente organizada pelo partido neobolchevique, destinada não apenas ao enriquecimento individual dos líderes mafiosos, mas correspondendo igualmente, e talvez principalmente, a um projeto coletivo, partidário, de monopólio do poder, o que se dá não apenas pelo assalto a TODOS os recursos do Estado, onde estiverem, mas pelo achaque e a extorsão direta, organizada das empresas, TODAS as empresas, públicas e privadas. Onde houver um emprendimento qualquer, os petralhas irão lá arrancar dinheiro para si e para a causa.
Qual é a causa?
Ora, a manutenção do poder, a todo custo.
Os petistas, os petralhas, os mafiosos do partido neobolchevique não estão minimamente interessados em "construir o socialismo", de qualquer século, do XIX ao XXI, como tentaram fazer os idiotas do socialismo bolivariano chavista, com isso mergulhando a pobre Venezuela na maior crise de sua história. Não, eles têm todo o interesse em preservar o capitalismo, pois sabem que o socialismo é sinônimo de miséria, de pobreza. Eles só querem extorquir os capitalistas – industriais e banqueiros – e viver às custas deles, ou seja, preservando o capitalismo, mas cobrando um alto preço deles e de toda a sociedade, extorquindo TODOS os produtores de riqueza na sua sanha predatória.
Mas vamos ler a lição de Paulo Kramer.


Paulo Roberto de Almeida 
Brasília, 20 de janeiro de 2018

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Patrimonialismo

Paulo Kramer

Um amigo me perguntou: "Mas, afinal, qual a diferença entre o PT e os outros partidos?" Respondi assim:
Oi, meu caro! Grato pela oportunidade, e vamos lá:
1) Ao contrário da maioria dos meus amigos e conhecidos que ficaram decepcionados e indignados quando começaram a vir à tona os primeiros podres do governo lulopetista, não fiquei nem uma coisa, nem outra, porque já estava cansado de saber, por estudo e observação própria, que a esquerda não democrática É, SEMPRE FOI, NUNCA DEIXARÁ DE SER P-A-T-R-I-M-O-N-I-A-L-I-S-T-A: aqui, em Cuba, na antiga União Soviética e nos seus satélites do Leste europeu, na China, na Venezuela, enfim, em qualquer lugar do mundo seja qual for a época. E, se alguém ainda nutria dúvidas sobre isso, foi porque nunca se deu o trabalho de perceber quais os países que a petralhada sempre teve como modelos.
2) O lulopetismo inventou o patrimonialismo? Claro que não, assim como Ayrton Senna não foi o inventor do automobilismo... Aliás, patrimonialista (i. e., predadora dos recursos públicos para engordar o patrimônio pessoal ou familiar) é toda a nossa cultura política. Patrimonialismo significa sempre e necessariamente atraso e miséria? Não, o patrimonialismo apresenta versões modernizadoras (Marquês de Pombal, em Portugal; Getúlio Vargas e regime militar no Brasil; Pedro, o Grande na Rússia etc., etc., etc.). Agora, corrupto, sempre; base de um regime político e econômico em que o Estado é mais forte que a sociedade, fazendo da segunda refém do primeiro, sempre também.
3) TODOS OS PARTIDOS POLÍTICOS BRASILEIROS SÃO PATRIMONIALISTAS, porque patrimonialista é essa matriz socioeconômica e política comum a cada um deles. Mas, então, em que o lulopetismo se distingue deles? Tentarei esclarecer: os outros partidos que formam a 'base parlamentar aliada' de qualquer governo agem como quadrilhas relativamente independentes (é o grupo do deputado X na previdência, é a panelinha do senador Y no setor elétrico, é o 'esquema' do ministro ou governador Z nesta ou naquela estatal... Enfim, cada quadrilha roubando para enriquecer os clãs familiares e políticos encastelados nas cúpulas dos diferentes partidos, mas que, em razão desse mesmo caráter descentralizado da roubalheira, jamais teve força suficiente, muito menos projeto consistente, para substituir o regime democrático (com todos os defeitos e limitações deste) por um sistema mais monopolizador do poder, de tipo ostensivo (regimes de partido único, a exemplo de Cuba, URSS etc) ou disfarçado (como os governos do PRI mexicano durante sete décadas a fio -- uma única legenda com efetivo controle das alavancas do poder [na mão direita, o Diário Oficial; na esquerda, os sindicatos e movimentos sociais corrompidos e domesticados ], em torno da qual gravitam partidecos sustentamos pelas migalhas caídas da mesa do banquete da sigla hegemônica).
4) O lulopetismo foi o único a atrever-se a um projeto centralizado, tentacular, onipresente de corrupção a serviço da eternização no poder. Nas condições atuais do mundo e do Brasil, o modelo mais viável não seria o despotismo de partido único, mas sim o hegemonismo à la PRI mexicano. 
Entendem a diferença? Para os outros clãs partidários e eleitorais, a corrupção era/é um fim em si; para o PT, um meio de eternizar-se no poder.
5) Liberais no Ministério da Fazenda, conforme o script esboçado na Carta ao Povo Brasileira (que prefiro chamar de documento sossega-banqueiro) que Lula divulgou em plena campanha de 2002, com texto de Antonio Palocci. Lembrar que, naquele momento,  a tensão pré-eleitoral estava nas alturas, com o dólar encostando em 4 reais, justamente pelo temor do mercado de que Lula e PT, se/quando chegassem ao poder cumpririam tudo aquilo que prometiam desde a fundação do partido, isto é, a implantação de um regime socialista à la Cuba, ou Angola, ou qualquer outro modelo acalentado por amantes do totalitarismo como Zé Dirceu. Por isso, depois de ganhar aquela primeira eleição, a política econômica do primeiro mandato de Lula seria impecavelmente ortodoxa, fincada no tripé câmbio flutuante, metas inflacionárias e responsabilidade fiscal. Atribuo a manutenção do Meirelles durante oito anos à frente do Banco Central como fruto da superior compreensão do ex-pobre Lula de que as maiores vítimas da inflação são os pobres, que, ao contrário das classes média e alta,  não podem se refugiar em aplicações financeiras indexadas; para o assalariado ou biscateiro pobre, num contexto de inflação alta, o dinheiro vira pó assim que é recebido...
6) No fundo, os lulopetistas jamais se converteram à economia de mercado, permanecendo fiéis ao besteirol intervencionista e estatizante que nem ao menos chega ser original, já que herdado das ditaduras estado-novista e militar. O disfarce liberal ortodoxo da política econômica do primeiro mandato não tardaria a ser abandonado, sob o estímulo de três fatores conjunturais: a maré de prosperidade ensejada pelo boom internacional dos preços das commodities agropecuárias e minerais; o advento da Grande Recessão mundial em 2008/2009, que reanimou as velhas e nunca preenchidas expectativas da esquerda de um colapso planetário e final  do capitalismo; e a descoberta do pré-sal, que, na cabecinha dessa gente, soou como senha para mandar às favas a responsabilidade fiscal e todo aquele receituário econômico 'de direita'.  E vamos enfiar cada vez mais grana no rabo de Joesleys e Eikes, que aventureiros como eles eram os grandes financiadores das campanhas do PT, além de fontes aparentemente inesgotáveis de propina. A esse trinômio, eu acrescentaria uma quarta  eventualidade decisiva para compreender a regressão da política econômica na passagem do 1º para o 2º mandato de Lula: a derrocada do Palocci com o escândalo caseiro-gate. Ele era um dos únicos da cúpula lulopetista a compreender a superioridade infinita da economia de mercado sobre todos os modelos alternativos e, se tivesse a coragem e a lucidez  de livrar-se do abraço sedutor, paralisante e delinquente do patrimonialismo, estaria em condições de liderar a transição do PT do socialismo populista, atrasado, para-bolivariano etc., rumo à socialdemocracia moderna, respeitadora das cláusulas pétreas da economia de mercado e do regime representativo.

Quem quiser saber mais, deve ler, do meu mestre e amigo ANTONIO PAIM, um dos maiores pensadores brasileiros vivos: Momentos Decisivos da História do Brasil; Marxismo e Descendência; O Liberalismo Contemporâneo (3ª edição); A Querela do Estatismo (2ª edição) e O Relativo Atraso Brasileiro e sua Difícil Superação; do saudoso diplomata, humanista e psicólogo junguiano José Osvaldo de Meira Penna: Em Berço Esplêndido e O Dinossauro; e, do historiador das ideias Ricardo Vélez Rodríguez (o mais brilhante discípulo de Antônio Paim): A Grande Mentira.

Um última observação sobre POPULISMO e PATRIMONIALISMO: nem todo patrimonialismo é populista, mas todo populismo é patrimonialista. Demagogos inescrupulosos como Lula exploram as fragilidades intelectuais e a imaturidade cívica de culturas políticas como a nossa, nas quais o entroncamento da herança contra-reformista ibérica com o positivismo de cunho religioso (ração ideológica da qual se fartaram o pensamento militar republicano e o caudilhismo gaúcho de Júlio de Castilhos, Borges de Medeiros, Getúlio Vargas e Leonel Brizola) e o marxismo mais rastaquera formaram o caldo de cultura do coitadismo mais nocivo. Esses falsos messias sabem que, no Brasil e em Nuestra América de maneira geral, basta afetar e exibir esse falso sentimento de compaixão pelos pobres para receber de amplas parcelas da opinião pública, a começar pelos estamentos intelectuais e artísticos um amplo salvo conduto para saquear o erário é enriquecer à custa do suor do contribuinte. 

Paulo Kramer
Brasília, 19 de janeiro de 2018.