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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

A questao da lideranca do Brasil na America do Sul - Reinaldo Alencar Domingues

Raramente, ou nunca, coloco textos já publicados no Mundorama neste blog, pela simples razão de que representaria duplicar um site que já é conhecido suficientemente dos leitores deste blog, que são também, em grande medida, estudiosos de RI e, portanto, conhecedores dos recursos desse campo.
Mas em certos casos, a duplicação se justifica, como neste caso.
Paulo Roberto de Almeida 



A Aspiração de Liderança Brasileira na América do Sul no Governo Lula 

Reinaldo Alencar Domingues

 
 
 
 
 
 
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            O tema da liderança brasileira na América do Sul tem alcançado grande importância nos debates sobre política externa. No governo Lula, a questão ganhou maior destaque ao gerar uma polêmica no início de seu mandato e por permear indiretamente a visão ampla de inserção regional e internacional do país. A compreensão do papel do Brasil na América do Sul e no mundo depende intimamente da autopercepção das grandezas e limitações do país.[1]
            Percebe-se um vínculo entre a identidade internacional do Brasil e as noções de liderança desenvolvidas ao longo da história. O país assumiu consecutivamente diversas identidades: passou progressivamente da ideia de país americano para a de latino-americano e, em seguida, para a atual concepção de país sul-americano (COUTO, 2009). Em cada um dos momentos, a compreensão do papel do Brasil e as suas concepções de liderança variaram. Sob a gestão do Barão do Rio Branco, o Estado brasileiro adotou a identidade de país americano e o papel de subliderança regional ao aceitar a preeminência norte-americana no continente, ampliando sua margem de ação na vizinhança.
Com a Política Externa Independente (PEI), na década de 1960, o Brasil assumiu a identidade de país latino-americano em desenvolvimento, buscando se destacar como uma das principais vozes no movimento terceiro-mundista. A noção de liderança concebida foi de uma liderança temática – sob o signo do desenvolvimento – e que matinha um apelo de ser um movimento conjunto e mutualmente benéfico a todos.
A partir do governo de Itamar Franco e, em especial, no mandato de Fernando Henrique Cardoso a identidade sul-americana do Brasil estava em construção. Durante a gestão de FHC, a concepção de liderança desenvolvida entendia que esta se daria como consequência natural da proeminência econômica, atribuindo à região uma função diferente da conferida no mandato seguinte.
O governo Lula desenvolveu uma noção própria de liderança, inserindo-a junto à estratégia ampla de autonomia pela diversificação (VIGEVANI; CEPALUNI, 2007). Segundo esta, a América do Sul assumiria um papel central nas relações do Brasil com o mundo ao ampliar o poder de barganha e de voz do país no cenário internacional. A concepção apresentada pelo presidente abrangeu diversos valores que permearam a ação externa brasileira no período. O caráter não-hegemônico da liderança, a solidariedade e generosidade, e a ênfase nos objetivos comuns da região nortearam as relações do Brasil com seu entorno geográfico.
Apesar dos governos de FHC e Lula partirem de uma ideia semelhante da identidade internacional do Brasil – reconhecendo-o como país sul-americano –, desenvolveram noções distintas de liderança. Esta divergência sugere que, apesar da relação entre as duas variáveis, a percepção e os valores dos formuladores políticos também influenciam a noção de liderança desenvolvida pelo país.
Ao investigar os elementos de poder do Brasil, lançando um olhar sobre o ambiente doméstico do país e colocando-o em perspectiva com o continente, constatam-se duas assimetrias. A primeira refere-se à crescente assimetria entre Brasil e os demais países sul-americanos, ressaltando as potencialidades de uma liderança brasileira. A segunda representa a enorme assimetria entre a América do Sul (o Brasil, inclusive) e os Estados Unidos, destacando as limitações de uma aspiração de liderança brasileira mais ampla e a necessidade de lidar com a presença norte-americana no continente.
A liderança depende, ademais, de vontade e de mobilização em torno da decisão de liderar (DANESE, 2009). Nesse sentido, a ambição maior de um projeto de liderança mundial dos Estados Unidos e a ausência de ameaças críveis na região retiram dos norte-americanos a motivação ou ambição de exercer uma liderança continental. De outro lado, o Brasil atribui à região uma grande relevância, colocando-a entre suas principais prioridades de política externa (SOUZA, 2009).
Nesse contexto, admite-se também a importância das relações entre Brasil e Estados Unidos e suas implicações para a aspiração de liderança brasileira na América do Sul. A política externa norte-americana passou por grandes mudanças na primeira década do século XXI. Abandonou aos poucos a orientação unilateralista da gestão de George W. Bush, para uma orientação mais multilateralista ao aproximar-se do final da década. A crescente indisposição dos Estados Unidos de pagar pelos bens públicos globais (MANDELBAUM, 2002), somada ao endividamento progressivo do país com as duas guerras no Oriente Médio, a crise financeira de 2008 e o caráter transnacional de muitas ameaças em um ambiente internacional globalizado, tornou o cenário favorável ao surgimento de novos atores relevantes internacionalmente.
Apesar disso, a relação entre Brasil e Estados Unidos foi marcada por muitos desacordos ao longo da década. Os desentendimentos estiveram geralmente relacionados a duas questões: a falta de compreensão da tradição de autonomia da política externa brasileira por parte dos EUA e o receio do Brasil referente ao gigante norte-americano. Estes fatores minaram, por vezes, as oportunidades de aproximação entre os dois países. Muitos autores sugeriram enfaticamente os benefícios de uma maior aproximação e coordenação de ambos. Porém, os obstáculos ainda não foram totalmente superados.
A ausência de um projeto claro dos Estados Unidos para a América do Sul, fundamentado em uma agenda mínima relacionada ao narcotráfico, questões energéticas e a estabilidade regional, permitiu que a diplomacia brasileira atuasse com maior liberdade na região.
Porém, a aspiração de liderança brasileira na América do Sul encontra outros obstáculos. Internamente, as mazelas de um país ainda em desenvolvimento geram margem para contestação e dificultam a criação de um consenso interno da decisão de liderar, encontrando maior resistência à mobilização de recursos. Externamente, as suspeitas de um projeto subimperialista brasileiro e os problemas internos do país criam resistência à aspiração nacional e mitigam sua legitimidade.
Em análise dos instrumentos utilizados pelo Brasil na busca pelo exercício da liderança, constata-se que o país procurou exercer uma liderança branda (soft leadership). Destacam-se entre os principais meios do exercício da liderança brasileira, tanto a nível político quanto econômico, a União de Nações Sul-Americanas (Unasul), o Fundo para Convergência Estrutural do Mercosul (FOCEM), o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA) – muitas vezes por meio de empresas nacionais.
As interpretações relativas aos investimentos brasileiros na região foram distintas. De um lado, os formuladores políticos do governo Lula os interpretaram como um exemplo claro do comprometimento do país com o desenvolvimento da região e com a superação de assimetrias (AMORIM, 2010). De outro, os países vizinhos muitas vezes os interpretaram como pífios e insuficientes (SORJ; FAUSTO, 2011). No nível doméstico, há parcelas da população que consideram os investimentos desnecessários e até mesmo imorais ante a miséria encontrada no próprio país. Apesar dos desafios e das críticas, deve-se reconhecer as iniciativas brasileiras que não são de maneira alguma irrelevantes. A criação da Unasul e do Conselho de Defesa Sul-Americano são algumas das importantes iniciativas que foram impulsionadas fortemente pelos esforços brasileiros, cooperando para a construção de uma imagem de liderança conforme a noção desenvolvida pelo governo Lula.
 Como gerenciador de crises na região, a postura do Brasil foi relativamente inconstante. Em casos como o da nacionalização do gás boliviano e da renegociação do Tratado de Itaipu, a diplomacia brasileira agiu – ao menos aparentemente – com certa condescendência com os países que confrontaram seus interesses em nome da generosidade e solidariedade com os mais fracos, reforçando a cordialidade oficial com os vizinhos, para citar a expressão de Cervo (2008). No caso das papeleras, o Itamaraty adotou uma postura reticente, se eximindo do papel de mediador a fim de evitar uma confrontação direta que poderia afetar sua relação com a Argentina, enquanto na crise Colômbia-Equador, agiu com certa discrição, descartando a possibilidade do desentendimento escalar para um conflito armado.
Ao final do período, o crescimento brasileiro resultou em um papel mais relevante no mundo e na preeminência na região. O novo lugar alcançado pelo Brasil no mundo tem gerado dúvidas sobre qual deve ser a orientação da política externa brasileira. A relativa estagnação do processo de integração regional e os problemas políticos enfrentados pelo eixo Brasil-Argentina (apesar do comércio dos dois países ter chegado a US$ 30 bilhões em 2010, com previsões de ultrapassar US$40 bilhões em 2011) têm levado alguns a questionar a estratégia de buscar o aprofundamento do Mercosul, sugerindo que o Brasil já alcançou peso suficiente para buscar sozinho seus interesses. Porém, a oposição entre orientações global e regional não parece totalmente rígida. Estas podem ser, por vezes, complementares (SOARES; SANTOS, 2008).
A aspiração de liderança brasileira se inclui no centro das duas orientações, permitindo que o país fortaleça seus laços regionais enquanto ascende como importante global player. O peso estratégico da América do Sul para o Brasil justifica por si um projeto que vise conduzi-la de forma favorável ao seu interesse nacional. O fato de a região ser um subsistema aberto, estando suscetível a influências externas (como do EUA ou da China), faz com que o projeto brasileiro intencione ser o mais atraente possível, criando incentivos à aceitação voluntária de sua liderança. Por outro lado, como ficou patente em alguns choques de influência como o de Honduras e das negociações com o Irã, a aspiração do Brasil possui uma clara limitação, restringindo-se à sua vizinhança. Ao transbordá-la, o país perde tanto em legitimidade como em influência, ao mesmo tempo em que esbarra em outros atores interessados em manter ou ampliar suas áreas de influência.
Referências:
CERVO, Amado Luiz. Inserção Internacional: formação dos conceitos brasileiros. São Paulo: Ed. Saraiva, 2008.
DANESE, Sérgio (2009). A escola da liderança – ensaios sobre a política externa e a inserção internacional do Brasil. Rio de Janeiro: Record.
LIMA, Maria Regina Soares; SANTOS, Fabiano (2008). “O interesse nacional e a integração regional”. Papéis Legislativos, ano 2, n. 1, p. 01-15, abr. 2008.
MANDELBAUM, Michael (2002). The Inadequacy of American Power. Foreign Affairs, vol. 81, n° 5, September/October, 2002, p. 61-73.
SORJ, Bernardo; FAUSTO, Sergio (2011). O papel do Brasil na América do Sul: estratégias e percepções mútuas. Política Externa, vol. 20, n. 2, p.11-22, Set./Out./Nov. 2011.
VIGEVANI, Tullo; CEPALUNI, Gabriel (2007). A política externa de Lula da Silva: a estratégia da autonomia pela diversificação. Contexto Internacional, Rio de Janeiro, vol. 29, n. 2, p. 273-335, julho/dezembro 2007.
Reinaldo Alencar Domingues é Bacharel em Relações Internacionais pela Universidade Católica de Brasília – UCB. Integrará a turma de mestrandos da Universidade de Brasília – UnB em 2012. (reinaldoalencar@gmail.com)

[1] O presente artigo apresenta uma síntese do argumento do autor em seu trabalho de conclusão de curso no Curso de Relações Internacionais da Universidade Católica de Brasília – UCB.

Monteiro Lobato, um pioneiro do petroleo no Brasil

Descubro agora, graças ao Google -- santo Google, a mais de um título -- que um trabalho meu, publicado num suplemento especial da Revista de História da Biblioteca Nacional, encontra-se disponível online: 



2158. “Monteiro Lobato: pioneiro do petróleo no Brasil”, Beijing-Shanghai, 28 junho 2010, 4 p (+ 1p. de boxes). Contribuição a número especial de revista de história das ciências no Brasil, coordenada pela Biblioteca Nacional. 
Publicado sob o título “Um Agitador Petrolífero”, Revista de História da Biblioteca Nacional (Edição Especial n. 1, História da Ciência, outubro 2010, p. 40-43; ISSN: 1808-4001.
Disponível online em História da Ciência online, 23/12/2010; link: http://www.revistadehistoria.com.br/historiadaciencia/2010/12/um-agitador-petrolifero/). 
Relação de Publicados n. 1002.

domingo, 18 de dezembro de 2011

Diplomacia da era Lula: preparando o balanco e a avaliacao

Já escrevi um artigo, que se chama precisamente "A diplomacia da era Lula: balanço e avaliação", que deverá ser publicado por uma revista de política externa proximamente.
Antecipando sobre isso, e aguardando a revisão do texto para sua fixação definitiva, permito-me informar aqui sobre um artigo que publiquei bem ao início dessa "era" -- que ainda "não era", no sentido de que ainda não passou e que ameaça ficar conosco por uma "nova era" -- consistindo num exame das posições de "política internacional" -- se é o caso de se dizer -- do Partido dos Trabalhadores e do candidato Lula da Silva nos três pleitos que ele disputou antes de sagrar-se vencedor em 2002.
Creio que esse exame preliminar da diplomacia lulista, em sua fase inaugural, fornece algumas chaves explicativas, para o bem e para o mal, do que viria depois, nos oito anos que transformaram o Brasil e sua diplomacia.



1010. “A política internacional do Partido dos Trabalhadores: da fundação do partido à diplomacia do governo Lula”, Washington 19 fev. 2003, 27 p. Análise das posições de política externa do Partido dos Trabalhadores e do candidato Luiz Inácio Lula da Silva, desde a fundação do partido e as eleições de 1989, até o pleito vitorioso de 2002, com destaque para os temas básicos e a evolução em direção de uma postura mais próxima da forma tradicional de atuação da diplomacia. 
Publicado na revista Sociologia e Política (Curitiba: UFPR; ISSN: 0104-4478; n. 20 jun. 2003, p. 87-102; Dossiê Relações Internacionais, Rafael A. D. Villa (org); http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-44782003000100008&lng=en&nrm=iso). 
Citado em matéria de Carlos Malamud, “El impacto de la elección de Lula en la Argentina”, publicada no site do Real Instituto Elcano (http://www.r-i-elcano.org/publicaciones/68.asp).
Disponível na plataforma Scielo: http://www.scielo.br/pdf/rsocp/n20/n20a8.pdf
Relação de Publicados n. 435.

Eu acuso... um juiz do Supremo (alias, mais de um)...

Eu acuso um desses juízes da safra recente, homens encomendados pelos companheiros, de ser um preguiçoso congenital, de recusar-se a ler, em qualquer momento, os autos do processo, para preparar-se devidamente para um processo histórico, um desses que começaria, por uma vez, a corrigir o estado de corrupção genética a que parece condenado o sistema político brasileiro.
Eu o acuso de preparar a opinião pública para a prescrição seletiva e gradual dos crimes de que são imputados alguns dos que o nomearam. Eu o acuso de ser leviano, irresponsável ou até mesmo conivente.
Estou disposto a lhe pagar um curso de leitura rápida, para ver se ele consegue se desempenhar de seu dever, inerente ao cargo que ocupa.
Existem 50% de chances para que ele colabore com mais uma pizza em elaboração.
Mais um pouco o percentual aumentará...
Eu acuso...
Paulo Roberto de Almeida 

O terror dos companheiros: mas é apenas papel (ou bits and bytes)...

Bem, não se trata bem de "companheiros", como somos eu e todos os que frequentam este espaço para fins eminentemente intelectuais: informações, análises, diálogo, conhecimento, esclarecimento, engrandecimento inteligente e tudo o que deriva disto.
Esses "companheiros", na verdade, são patifes, fraudadores, mentirosos, ladrões, alguns até criminosos, pelo menos em intenção (e muitas vezes nos fatos, também, embora eles façam tudo para disfarçar).
E o papel é uma simples revista semanal, embora exista em forma digital também,


O fato é que começa a se aproximar o fim de semana, vai dando uma coceira nos.. hum... "companheiros": eles ficam se perguntando o que a maldita e reacionária revista vai trazer contra eles desta vez.
Sexta à noite (em formato digital), sábado pela manha, nas bancas, é aquela corrida angustiada para saber o que existe de novo em matéria de denúncia de falcatruas, patifarias, roubos, corrupção e outros delitos maiores e menores, enfim, crimes tipificados em vários artigos no Código Penal.
O mais desagradável é ficar ouvindo aquelas mentiras e desculpas esfarrapadas: a "mídia" fica inventando coisas, isso é calúnia dos nossos inimigos políticos, estou sendo massacrado sem direito à defesa, e outras bobagens desse tipo.
Pode até ser que a (in)Justiça que somos obrigados a suportar neste país, com juízes molengas -- quando não coniventes -- demais para cumprir seus deveres mínimos de "fazer justiça", seja incapaz de retirar de circulação essas ervas daninhas, mas de uma coisa estamos certos, eu e os leitores inteligentes deste blog,  com a notória exceção dos AAs costumeiros por aqui também: sabemos, por convicção íntima que esses patifes merecem a condenação moral de todos os cidadãos de bens deste país e que os os próprios, e os que os apóiam nunca poderão olhar no espelho, todos os dias, e dizer: "aqui está um cidadão honesto, que cumpre seus deveres e faz do Brasil um país melhor".
No fundo, eles têm consciência -- se não forem idiotas consumados, o que alguns de fato são -- de que são patifes, e que nunca conseguirão se livrar da pecha de integrar quadrilhas de assaltantes dedicadas a roubar recursos públicos e a enganar os eleitores ingênuos.


Eles podem até se safar da Justiça brasileira. Mas não passarão impunes por este blog...
Paulo Roberto de Almeida 

Desumanidade animal... a proposito da morte de um cachorrinho...

Ouvi a notícia no rádio, e confesso que fiquei chocado. Como alguém pode matar um cachorro, que é sempre fiel a quem cuida dele, geralmente seu dono? Como alguém é capaz de tanta crueldade?
Não sei. Apenas transcrevo uma homenagem aos cachorros, e uma reflexão sobre esse tipo de barbaridade de um jornalista conhecido.


Reinaldo Azevedo, 18/12/2011

Cotó, o meu amigão, que se foi em outubro
Houve uma verdadeira comoção nas redes sociais, e não sem razão, por causa de um cachorrinho espancado até a morte por uma mulher na presença de uma criança. Comecei a ver e parei. Não tenho estômago para essas coisas. Esse tipo de brutalidade, com gente ou com bicho, me deixa, sem exagero, de estômago meio embrulhado. O desconforto, moral em primeiro lugar, passa imediatamente a ser físico. Gosto de animais. Quando moleque, tive gatos — muitos: catava os filhotes abandonados na rua e os levava pra casa, o que deixava a minha mãe louca da vida —, papagaio, pomba, porquinho da índia, coelho daquele orelhudo… Moram aqui conosco, vocês sabem, duas cachorras e uma tartaruga. Escrevi, não faz tempo, o adeus a Cotó, o meu amigão que vocês vêem aí no alto, que morreu em outubro. A crueldade daquela moça, pouco importa o pretexto, é incompreensível pra mim. Do pouco que vi, não se tratava de alguém num ataque de fúria, vingando-se de alguma coisa desagradável que o cão tivesse feito. Sua brutalidade era meio burocrática, pausada, refletida até. Como pode?
Costumo escrever sobre a chamada macropolítica, isto que as pessoas entendem normalmente por política: o jogo do poder, as forças que se organizam para dominar o estado e governar a sociedade, os partidos etc. Mas gosto mesmo é quando surge um tema que diz respeito à política dos indivíduos, àquilo que cada um de nós entende sobre a vida, as pessoas, as relações. Eu levo a sério a máxima de que, ao fazer escolhas no dia a dia, escolhemos em que mundo queremos viver, anunciamos o nosso ideal. O homem sempre há de se perguntar, diante de um ato que tem conseqüências que vão além da sua própria vida, se o mundo seria melhor ou pior se todos agissem como ele. Quem se nega a fazer essa pergunta é, potencialmente ao menos, um monstro moral.
O psicopata não reconhece a existência do “outro”; o sociopata não reconhece a existência dos outros. Aqueles delinqüentes que vemos a jogar latinhas de cerveja na pista nunca pararam para refletir como seriam as estradas se todos fizessem o mesmo. Os que ultrapassam pela direita, andam no acostamento ou varam o sinal vermelho só agem desse modo na certeza de que a maioria cumpre as leis. Não duvidem: indivíduos com esse comportamento costumam ficar furiosos caso sejam prejudicados por ação idêntica. Entendem que seu papel é andar fora das regras; o dos outros é cumpri-las.
A moça que espancou o cachorro é enfermeira. O fato gerou uma onda de especulações. Se trata assim um bicho, o que não fará com os seus doentes? A pergunta, notem, cheia de justa indignação, não deixa de trair uma inversão, ou uma subversão, de valores. Parece-me que a boa tradição humanista nos recomenda outra constatação: quem não respeita nem os seres humanos tampouco há de respeitar os cães. Entendo, no entanto, as ilações a que o caso convida: ela só se portou daquele modo porque a vítima não tinha como se defender, como contra-atacar. Matar um yorkshire, convenham, é coisa para covardes. Os valentes tentariam pegar na unha um pit bull ou um rottweiler. Doentes, numa cama, estariam mais para yorkshire…
Sim, a indignação faz sentido, e o fato de ela ser enfermeira parece ser um constrangimento adicional. Mas também é preciso saber a hora em que as coisas passam do ponto. Os comentários que circulam na rede sobre aquela senhora são horripilantes. E até alguns políticos já decidiram dar pitaco. Há quem pregue abertamente que ela seja submetida ao mesmo tratamento que dispensou ao cachorro, o que nos joga, no que diz respeito àquele terreno das escolhas, numa situação muito delicada: seria aceitável que se fizesse com um ser humano o que consideramos, e com razão, inaceitável que se faça com um cão?
Na era das redes, é preciso ir devagar. É mais fácil linchar pessoas do que matar cachorros, e uma e outra coisa são inaceitáveis. Se essa moça, por qualquer razão, fosse presa numa cela comum, correria, de fato, um sério risco de experimentar o tratamento que dispensou ao yorkshire, e não faltaria quem dissesse: “Mais do que merecido! Como ela pôde fazer aquilo com um bichinho, que nem podia se defender?” O amor pelos bichos que nos humaniza é virtuoso. Mas convém que amemos igualmente os homens, mesmo aqueles que são meio tortos na vida.
Já disse o quanto aquilo me constrangeu. Deixei o escritório por alguns instantes para comer uma fruta. Passo pela sala, e Lolita estava esticada no chão da sala, curtindo o calor. Pipoca estava aboletada numa poltrona e sabe que está no lugar errado. Ao me ver, não tem dúvida: fica de barriga pra cima, com as patinhas traseiras no ar, as dianteiras dobradas, em sinal de submissão, e espera o que sabe que terá: um afago na barriga. A outra me segue até a cozinha à espera de um pedacinho de pêra, de mamão… Que tipo de gente espanca cachorro, Santo Deus!? Mas não me peçam para condescender com espancadores de homens.
Fala-se até em prisão para a mulher com base no Estatuto da Criança e do Adolescente. Bem, talvez seja o caso de verificar se tudo vai bem com ela e tal. Mas vamos devagar! A exposição da criança, da forma como está se dando, não me parece também coisa saudável. Mais: como deixar de considerar que o vídeo é uma óbvia invasão de privacidade?
Já publiquei aqui “Anedota Búlgara”, um poema de Drummond:
Era uma vez um czar naturalista
que caçava homens.
Quando lhe disseram que também se caçam borboletas e andorinhas,
ficou muito espantado
e achou uma barbaridade
Amemos os bichos!
Amemos os homens!
Todos são dignos do nosso afeto.
Mas só aos homens podemos dispensar compaixão e perdão!

Pipoca há alguns minutos: "Você não vai me tirar daqui, né?"

Christopher Hitchens: minha homenagem a um contrarianista


WHAT CAN BE ASSERTED WITHOUT PROOF CAN BE DISMISSED WITHOUT PROOF.




Conheci muito pouco da obra de Hitchens, apenas alguns artigos no New Yorker, e alguns outros esparsos na imprensa britânica ou americana, retranscritos na internet. 
Mas o que conheci me fez seu admirador, não tanto pelo ateismo militante -- sou um irreligioso, mas não um ateista, ou ateu militante, o que acho inútil e desnecessário, já que 90% da humanidade permanecerá religiosa -- mas mais pelo seu contrarianismo visceral, sempre pronto a ir contra o que Flaubert chamava de "idées reçues", ou seja, as obviedades do senso comum, no mais das vezes politicamente correto, e não raramente erradas.
Como contrarianista aprendiz, agradava-me sua verve afiada, sua argumentação inteligente, sempre lógica, quando não ousada, na defesa dos valores que ele julgava maiores do que as idiotices geralmente repercutidas em certa imprensa progressista (aliada de algumas das piores causas possíveis).
Minha homenagem a ele; espero agora ler vários dos seus escritos, que estão sendo reunidos.
Paulo Roberto de Almeida 


Welcome to an unofficial Christopher Hitchens site:
http://www.dailyhitchens.com/search/label/Christopher%20Hitchens

Newsfeed, Updates, Videos, Articles, Tweets, Shop, Forum..



Christopher Hitchens (1949 - 2011) was an Anglo-American author and journalist. His books made him a prominent public intellectual and a staple of talk shows and lecture circuits. He was a columnist and literary critic at Vanity Fair, Slate, The Atlantic, World Affairs, The Nation, Free Inquiry and a variety of other media outlets. He was named one of the world's "Top 100 Public Intellectuals" by Foreign Policy and Britain's Prospect.


Entitled Mortality and based on his columns for Vanity Fair, Christopher Hitchens' final memoir will be published by Atlantic in the new year.

The forthcoming memoir will be based on the essays, said Atlantic Books, and will be called Mortality. The book had been planned for some time, said a spokesperson.

http://www.guardian.co.uk/books/2011/dec/16/christopher-hitchens-memoir-published-in-january