segunda-feira, 23 de outubro de 2006

632) Capitalistas, pelo amor de Deus, apliquem o seu dinheiro no Banco do Brasil...

Não, não é de agora...
A suplica é do principe regente D. João que, em 1812, implorava aos governadores-gerais das provincias que encontrassem capitalistas bondosos, dotados de "pecunia" (ou cabedaes, como se dizia na época), e que estivessem dispostos a investir o seu dinheiro numa instituição pública tão...?, prometedora?, tão cheia de futuro quanto o Banco do Brasil.
Não sabemos o quanto se conseguiu na época, provavalmente recursos significativos, pois o futuro parecia otimista, o Banco do Brasil parecia sólido, com as garantias estatais que se anunciavam concretas.
Ele veio a quebrar, esse primeiro banco, em 1828 e provavelmente deixou os capitalistas sem os seus cabedaes...
Mais de vinte anos depois, Irineu Evangelista de Souza, que talvez ainda não fosse o Barão de Mauá, fundou um segundo Banco do do Brasil, expropriado dois anos depois pelo ministro da Fazenda, seu inimigo (deve ter sido por ciume).
Tivemos um terceiro, entre o final do império e o início da República e não tenho certeza se estamos no quarto ou no quinto.
Talvez no sexto, pois ainda em meados dos anos 1990, o governo teve de capitalizar o Banco do Brasil à altura de 5 ou 8 bilhões de reais (não sei quanto seria a valores correntes).
Enfim, sempre é bom rever como tudo começou...

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(do site histórico do Ministério da Fazenda, aliás horrivel e pouco prático):

Leis Históricas
Carta Régia - de 22 de Agosto de 1812
Recommenda aos Governadores das Capitanias que obtenham accionistas para o Banco do Brazil.
Conde dos Arcos, Governador e Capitão General da Capitania da Bahia.
Amigo.
Eu o Principe Regente vos envio muito saudar, como aquelle que amo.
Sendo conveniente ao Commercio, aos particulares e ao Estado que o Banco do Brazil estabelecido por Alvará de 12 de Outubro de 1808 tenha um consideravel fundo capital, com que possa vantajosamente fazer as operações que lhe são proprias: constando na minha real presença que um dos motivos de haverem concorrido tão poucos cabedaes ao seu cofre, tem sido a idéa do pequeno lucro, que os accionistas esperam de suas entradas no cofre de um tão util como necessario estabelecimento publico, esquecendo-se talvez das vantagens, que poderiam colher, bem que indirectamente, desse seu pequeno e insignificante sacrificio de interesses, pela maior facilidade de giro mercantil, pela viva circulação de cabedaes estagnados e pelo conveniente e moderado limite dos descontos das letras de cambio:
querendo auxiliar e promover efficazmente um tão importante estabelecimento, não sómente para bem commum dos meus vassallos, mas para que possa prestar ao Estado os meios e recursos de que as rendas reaes necessitam, afim de se occorrer com promptidão ás despezas publicas, cessando por intervenção do mesmo Banco os embaraços e difficuldades, que se encontram em ter disponiveis no Real Erario nas épocas competentes os fundos públicos existentes nos diversos cofres das Capitanias deste Estado do Brazil, como muito convém á manutenção da Monarchia;
tenho resolvido fazer entrar nos cofres do Banco o producto de algumas novas imposições, orçado por anno em mais de cem contos de réis, e isto por espaço de dez annos consecutivos, confiando a administração e arrecadação destes impostos á Junta do Banco do Brazil, e cedendo em beneficio dos seus accionistas particulares o lucro do capital que for arrecadado nos primeiros cinco annos proveniente das ditas novas imposições, e isto por todo o tempo da duração dos privilegios outorgados a este Estabelecimento, afim de que por um tal meio possam os accionistas particulares contar com avultado lucro dos cabedaes que tiverem no cofre do Banco, e se possa mais facilmente conseguir o elevar-se o fundo capital do mesmo Banco muito além dos dous mil contos de réis, como convém ao credito, e ao explendor de um tão util Estabelecimento publico, e que tanto merece a minha real contemplação.
E porque concorrendo todos os meus fieis vassallos tanto os capitalistas, proprietarios e negociantes, como os empregados publicos que estiverem em circumstancias de entrar para o sobredito cofre, sem estorvo de suas especulações commerciaes, que pelo contrario muito desejo facilitar e promover, e sem diminuição de suas communidades pessoaes e disposições particulares, mas antes com a vantagem dos lucros resultantes das operações do Banco, com perfeita segurança de seus cabedaes confiados á administração dos Directores e Deputados do Banco, igualmente interessados com todos os accionistas na sua conservação e prosperidade, sem duvida pode o Banco do Brazil elevar-se muito facil e suavemente em breve tempo a um consideravel gráo de força, e de opulencia pelo concurso das entradas dos accionistas particulares e das provenientes dos novos impostos, com que sou servido auxiliar o cofre deste tão importante Estabelecimento.
Confiando no zelo, intelligencia e actividade, com que tanto vos tendes distinguido no meu real serviço, sou servido encarregar-vos de solicitar a effectiva cooperação de todos os capitalistas, proprietarios, negociantes e empregados publicos dessa Capitania, que estiverem nas circumstancias de concorrer ao cofre do Banco, segurando-lhes no meu real nome que serão por mim attendidos com honras e mercês os que vantajosamente se distinguirem, e se fizerem por isso dignos da minha real contemplação.
Cumpri-o assim, dando-me logo parte pela Secretaria de Estado dos Negocios do Brazil do resultado desta tão importante commissão, cujo desempenho haverei como um muito particular serviço por vós feito á minha Real Corôa e ao Estado.
Escripta no Palacio do Rio de Janeiro aos 22 de Agosto de 1812.
REI.
Para o Conde dos Arcos.

Identicas Cartas Régias foram dirigidas ás outras Capitanias.


Pela transcrição e comentários: Paulo Roberto de Almeida (sem cobrar tarifa extra)

domingo, 22 de outubro de 2006

631) Sobre o papel do Estado no desempenho economico e social

Primeiro a transcrição de um artigo do conhecido economista de Columbia University Jeffrey Sachs:


The Social Welfare State, beyond Ideology
Are higher taxes and strong social "safety nets" antagonistic to a prosperous market economy? The evidence is now in
By Jeffrey D. Sachs
Scientific American, October 16, 2006

Link para o artigo: http://www.sciam.com/print_version.cfm?articleID=000AF3D5-6DC9-152E-A9F183414B7F0000

One of the great challenges of sustainable development is to combine society's desires for economic prosperity and social security. For decades economists and politicians have debated how to reconcile the undoubted power of markets with the reassuring protections of social insurance. America's supply-siders claim that the best way to achieve well-being for America's poor is by spurring rapid economic growth and that the higher taxes needed to fund high levels of social insurance would cripple prosperity.

Austrian-born free-market economist Friedrich August von Hayek suggested in the 1940s that high taxation would be a "road to serfdom," a threat to freedom itself.

Most of the debate in the U.S. is clouded by vested interests and by ideology. Yet there is by now a rich empirical rec-ord to judge these issues scientifically. The evidence may be found by comparing a group of relatively free-market economies that have low to moderate rates of taxation and social outlays with a group of social-welfare states that have high rates of taxation and social outlays.

Renda per capita Taxa de Orçamento Taxa de Investimento em
US$ PPP Desemprego Superavit Pobreza P&D (% do PIB)

Paises 48.500 5,2 0,2 12,6 1,8
"Ingleses"
Paises 50.700 6,3 4,2 5,6 3,0
Nordicos
Dados da OCDE (médias nacionais)

Not coincidentally, the low-tax, high-income countries are mostly English-speaking ones that share a direct historical lineage with 19th-century Britain and its theories of economic laissez-faire. These countries include Australia, Canada, Ireland, New Zealand, the U.K. and the U.S. The high-tax, high-income states are the Nordic social democracies, notably Denmark, Finland, Norway and Sweden, which have been governed by left-of-center social democratic parties for much or all of the post–World War II era. They combine a healthy respect for market forces with a strong commitment to antipoverty programs. Budgetary outlays for social purposes average around 27 percent of gross domestic product (GDP) in the Nordic countries and just 17 percent of GDP in the English-speaking countries.

On average, the Nordic countries outperform the Anglo-Saxon ones on most measures of economic performance. Poverty rates are much lower there, and national income per working-age population is on average higher. Unemployment rates are roughly the same in both groups, just slightly higher in the Nordic countries. The budget situation is stronger in the Nordic group, with larger surpluses as a share of GDP.

The Nordic countries maintain their dynamism despite high taxation in several ways. Most important, they spend lavishly on research and development and higher education. All of them, but especially Sweden and Finland, have taken to the sweeping revolution in information and communications technology and leveraged it to gain global competitiveness. Sweden now spends nearly 4 percent of GDP on R&D, the highest ratio in the world today. On average, the Nordic nations spend 3 percent of GDP on R&D, compared with around 2 percent in the English-speaking nations.

The Nordic states have also worked to keep social expenditures compatible with an open, competitive, market-based economic system. Tax rates on capital are relatively low. Labor market policies pay low-skilled and otherwise difficult-to-employ individuals to work in the service sector, in key quality-of-life areas such as child care, health, and support for the elderly and disabled.

The results for the households at the bottom of the income distribution are astoundingly good, especially in contrast to the mean-spirited neglect that now passes for American social policy. The U.S. spends less than almost all rich countries on social services for the poor and disabled, and it gets what it pays for: the highest poverty rate among the rich countries and an exploding prison population. Actually, by shunning public spending on health, the U.S. gets much less than it pays for, because its dependence on private health care has led to a ramshackle system that yields mediocre results at very high costs.

Von Hayek was wrong. In strong and vibrant democracies, a generous social-welfare state is not a road to serfdom but rather to fairness, economic equality and international competitiveness.

Link para a tabela: http://www.sciam.com/media/inline/000AF3D5-6DC9-152E-A9F183414B7F0000_chart.gif


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Comentarios iniciais de Paulo Roberto de Almeida:
22 outubro 2006
Minha impressao primeira é que nao se pode tomar o Estado como algo dado e imutavel ao longo do tempo e que não se pode partir da suposição de seu papel, funcoes e caracteristicas sempre permancem os mesmos, entre as sociedades e dentro das sociedades.

A sentenca final de Sachs, de que “Hayeck está errado”, só poderia ser aceita se estivessemos falando do MESMO ESTADO, o que claramente não é o caso, pois existem tantos Estados quanto existem sociedades, e suas formas de intervencao respondem e expressam realidades muito diferentes nos diferentes contextos de organizacao economica e social, de comportamentos coletivos, de graus de socializacao e de escolarizacao, e uma infinidade de outras variaveis que nao podem ser reduzidas a um tipo unico, imutavel e imperturbavel, de Estado.

A divinizacao ou demonizacao do Estado sao ambas erradas e claramente inadequadas quando se analisa o seu desempenho social ao longo da historia.

Os Estados nao podem ser isolados e testados em laboratorio, o que implica que os resultados quantitativos, os indicadores economicos nao podem ser tomados como expressando uma realidade social total.

quarta-feira, 18 de outubro de 2006

630) Politica comercial brasileira

Revendo a Política Comercial Brasileira
MARCOS S. JANK
O ESTADO DE S. PAULO, Quarta-feira, 18 de outubro de 2006.
Espaço Aberto, pág. A-2.

A política comercial trata das discriminações impostas e recebidas pelos países, por meio de tarifas, cotas, barreiras não-tarifárias, subsídios, etc. As negociações internacionais servem para reduzir essas discriminações de forma balanceada, gerando aumento do comércio, dos investimentos e dos empregos.
Costuma-se fazer muita confusão entre política externa, política comercial e comércio. Um dos erros mais freqüentes é medir o resultado da política comercial pela variação do comércio de um ano para outro. Exportações podem crescer porque a moeda esteve desvalorizada ou porque o país cresce menos que a economia mundial. Ambos os resultados nada têm que ver com política comercial e podem ser rapidamente revertidos se a moeda se valorizar ou se a economia doméstica crescer mais rapidamente. A política comercial deve, sim, ser medida pelos ganhos concretos de comércio e investimentos, que resultam da redução de tarifas, barreiras sanitárias, subsídios distorcivos, etc. Seu resultado aparece apenas no momento em que um acordo comercial (multilateral, regional, bilateral, sanitário, etc.) é implementado e se traduz em menores custos de transação para fazer negócios. O resto é conversa mole!
No Brasil, a política comercial tem-se submetido às idiossincrasias da política externa, como se a primeira fosse uma filha menor da segunda. Já países como os EUA optam, claramente, por uma política comercial mais voltada para o interesse das empresas, ou seja, para o crescimento do comércio e investimentos. Os últimos resultados concretos de política comercial brasileira datam da primeira metade dos anos 90, quando fizemos a abertura comercial e implementamos a Rodada Uruguai do Gatt e a primeira fase do Mercosul. Desde então, estamos vivendo na base de promessas e impasses.
Apesar do papel protagônico do Brasil na liderança do G-20, a Rodada de Doha ainda é apenas uma vaga promessa. Sem dúvida, o G-20 representa um esforço louvável para reduzir a absurda distância que separa a agricultura dos demais setores econômicos. O lado forte do G-20 é sua capacidade técnica, seu pragmatismo e sua rápida resposta política na construção de consensos. O lado fraco foi acreditar que ele poderia representar uma aliança política de países emergentes além da negociação agrícola, que poderia mudar a geografia comercial do mundo ou que elegeria um brasileiro como diretor-geral da OMC.
O atual governo apostou todas as suas fichas na Rodada de Doha e no G-20. Enquanto isso, a evolução das negociações regionais e bilaterais deixou a desejar. Uma análise mais detalhada da pauta de comércio mostra que a nossa melhor opção de política comercial seria uma maior integração no continente americano. Nossas exportações para a América Latina e os EUA mostram um surpreendente dinamismo nos últimos dez anos (ver meu artigo de 5/7), principalmente nos produtos de maior tecnologia. Só que, infelizmente, a integração americana é hoje uma miragem no deserto. A Alca foi morta pelo desinteresse de praticamente todos os países do Hemisfério, a começar pelos co-presidentes do processo, EUA e Brasil. O Mercosul vive uma grave crise regulatória e de identidade. A Argentina luta para introduzir mecanismos de substituição de importações dentro de um bloco que se autodenomina ironicamente “mercado comum”. Uruguai e Paraguai estão a um passo de iniciar negociações com os EUA, seguindo o caminho de México, Chile, Colômbia, Peru e países centro-americanos. A UE vive a “síndrome do reboque”, assinando acordos expressos com todos os países que concluem negociações com os EUA. Hugo Chávez participa das reuniões do Mercosul sempre com um enorme megafone à mão, porém, na prática, a Venezuela ainda é um sócio virtual do bloco, que está longe de concluir sua negociação de acesso e de internalizar as legislações pertinentes. A presença da Venezuela no Mercosul dificulta enormemente qualquer negociação não só com os EUA, mas também com a UE. Por sua vez, Evo Morales alia-se à Venezuela no discurso, nas sobras do petróleo e no aparelhamento militar, espalhando dores de cabeça para o Brasil com a nacionalização do gás e a perseguição aos sojicultores brasileiros de Santa Cruz. Enquanto isso, dezenas de novos acordos bilaterais explodem no Leste da Ásia e já se começam a delinear os primeiros acordos bilaterais entre as grandes economias emergentes e os países desenvolvidos. Os EUA iniciaram negociações com a Coréia do Sul e a UE anunciou, dia 4 de outubro, que vai negociar com os emergentes asiáticos.
O governo Lula quis mudar a geografia comercial do mundo ao priorizar acordos com países em desenvolvimento. Se fosse factível, essa opção faria todo o sentido, principalmente para a mineração e o agronegócio, que são os únicos setores realmente “global traders”. Ocorre, porém, que há enormes obstáculos nessa trajetória. Primeiro, os países mais pobres dependem umbilicalmente e preferem lutar pelo acesso preferencial aos mercados ricos. Segundo, as grandes economias emergentes priorizam negociações com seus principais clientes, os países ricos. Terceiro, boa parte da indústria brasileira não quer nem ouvir falar de uma integração com a China e outros emergentes. Os setores de têxteis e calçados, por exemplo, ainda sonham com uma Alca que lhes garantiria acesso preferencial, porém temem qualquer abertura adicional na OMC.
Em suma, tirando a Rodada de Doha, que deve avançar lentamente, nossa política comercial parece estar hoje num beco sem saída. Em vez de mudar a nova geografia comercial deste início de milênio, o próximo governo deveria entendê-la e aceitá-la, promovendo reformas internas e negociações externas que ampliem nossa inserção internacional. A política comercial brasileira precisa avançar mais rapidamente, com foco nos mercados que criam comércio e promovendo maior coordenação com o setor privado. Ou seja, a política comercial deveria ser menos “política” e mais “comercial”.

domingo, 15 de outubro de 2006

629) Uma politica externa politica...

O chanceler em campanha
O Estado de S. Paulo, 15/10/2006:

"Nas últimas semanas, o ministro Celso Amorim quebrou uma tradição do Itamaraty e passou a ser visto num lugar que os chanceleres não costumam freqüentar: o palanque de campanha.

Desde o fim de agosto, o ministro das Relações Exteriores aproveitou a suspensão das negociações na Organização Mundial do Comércio (OMC) - sua prioridade máxima neste ano - para estar presente em cinco comícios e acompanhar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, candidato à reeleição, em reuniões com caciques políticos e intelectuais e até mesmo no único debate a que compareceu.

No Itamaraty, onde raros são os diplomatas que escapam de apelidos, Celso Amorim passou a ser chamado de 'ministro das Relações Interiores'.

No Palácio dos Arcos, seu empenho para manter-se no posto no eventual segundo mandato petista fora assimilado há tempos pela diplomacia - em especial depois de Amorim ter se referido ao presidente, em 2005, como 'nosso guia'.

A diferença, hoje, é sua presença em palanques, a despeito da agenda externa nada tranqüila, de sua movimentação limitada nos meios políticos e da feição pouco conhecida pelo eleitorado."

Ministro de Estado das Relações Exteriores
Brasília - DF, 13/10/2006
Entrevista concedida pelo Ministro de Estado das Relações Exteriores, Embaixador Celso Amorim, à Agência Reuters

ENTREVISTA - "Lula faz política externa que povo quer", diz Amorim
por Ricardo Amaral

BRASÍLIA (Reuters) - Pode ser tudo, menos monótona, a vida de chanceler no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que fez da política externa uma referência obrigatória na política interna do país.
Ao final de uma semana de rotina, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, pode ser visto num hotel de luxo no Rio, negociando com um alto funcionário estrangeiro, ou perdido num beco da periferia de Guarulhos (SP), pedindo socorro à polícia para encontrar o caminho do aeroporto, depois de participar de um comício de Lula no início de setembro.
"Este governo pratica a política externa que o povo quer: independente, ousada e equilibrada", disse o ministro à Reuters nesta sexta-feira, explicando o fato de participar de atividades de política interna, inclusive comícios eleitorais, o que não é usual no Brasil.
A atividade de Amorim tem alimentado críticas à política externa do governo Lula, inclusive por expoentes da carreira diplomática. A mais recente partiu do ex-embaixador Rubens Barbosa, que, em artigo no "Estado de S. Paulo" condenou "a tentativa de partidarização dos quadros do Itamaraty".
"Certas pessoas gostariam que o chanceler fosse uma espécie de presidente de um Banco Central independente", diz Amorim, reconhecendo as críticas. "Só que ele é o porta-voz da política externa do presidente eleito pelo povo. Respeito muito o Itamaraty mas fui indicado pelo presidente Lula", rebate.
Aos 64 anos, Celso Amorim está no comando do Itamaraty pela segunda vez. Foi ministro de Itamar Franco, em 1993 e 1994, sucedendo Fernando Henrique Cardoso, que mais tarde seria presidente da República e que nesta eleição é o paradigma de tudo que o governo Lula condena.
"É PO-LÍ-TI-CA"
Além do comício de Guarulhos, Celso Amorim esteve com Lula na Cidade de Deus, a favela mais famosa do mundo; numa reunião política com professores e intelectuais, em São Paulo; e visitando operários nas portas das fábricas DaymlerChrysler e Ford, em São Bernardo, entre outras atividades eleitorais.
"Sou mais reconhecido em São Bernardo do que nos shopping-centers", constata Amorim, um paulista de Santos que passou boa parte da vida no Rio e, extradiplomacia, foi aprendiz de cineasta e diretor da Embrafilme nos anos 70.
"Claro que as pessoas reconhecem em mim a política do presidente, e isso é gratificante", prossegue. "Outro dia me parou um rapaz negro, de uns 18 anos, e disse: Celso, eu ia estudar arquitetura, mas agora vou tentar o Itamaraty".
A defesa da política externa foi considerada por muitos o melhor momento do presidente Lula no debate com o candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, domingo passado, na TV Bandeirantes. No encontro com intelectuais, no final de agosto, Lula ouviu tantas críticas à política monetária e tantos elogios à política externa que pediu a Amorim para falar à platéia, formada por petistas ortodoxos, como a filósofa Marilena Chauí, e dissidentes, como o economista Paulo Nogueira Batista Júnior.
"Tinha uns dez ministros ali, mas só falei eu, o único que não era filiado ao PT", recorda Amorim. Nos anos 80, por influência do ex-ministro Renato Archer, ele foi filiado ao PMDB, mas nem sabe dizer se a ficha de filiação ainda existe.
"Claro que a política externa é de Estado, mas é po-lí-ti-ca, ou não estaria nas plataformas de cada candidato", argumenta, escandindo a palavra-chave. "Não é a primeira vez que ela faz parte do debate nacional, mas há muito isso não acontecia".
Amorim afirma que o breve governo Itamar Franco teve uma política externa "digna", mas até por falta de tempo não desenvolveu um projeto completo "como o que está no discurso de posse do presidente Lula".
"BEM NA FOTO"
O resumo dessa política seria, segundo o chanceler, a defesa dos interesses nacionais em negociações comerciais, buscando a integração da América do Sul e a aproximação com países de dimensões semelhantes (Índia, África do Sul, China), e maior contato com a África e Oriente Médio, sem perder a interlocução com os Estados Unidos e a União Européia.
"O crescimento do comércio e das exportações em todas essas frentes é a expressão mais fácil do sucesso da política externa", diz Amorim. "Mas também há uma dimensão política: o povo gosta de se reconhecer positivamente na relação com o mundo, não quer se ver cabisbaixo, com uma certa subserviência".
"O último presidente vivia atrás de ser convidado para uma reunião do G8 (países mais ricos o mundo) e nunca foi", provoca Amorim. "Lula foi convidado três vezes, sem pedir".
A figura pública do presidente Lula é uma das chaves da interlocução com líderes como o presidentes George W. Bush, dos Estados Unidos, e Jaques Chirac, da França. "Fica bem na foto sair com o Lula, porque mesmo os líderes mais à direita têm consciência de que existe um mal estar com a globalização selvagem", avalia Amorim.
"Lula oferece resposta firmemente ancorada na reforma social e nos preceitos democráticos e não apenas na aparência", prossegue. "Ele é um homem da classe operária, do terceiro mundo e um produto genuíno da democracia no Brasil".

sábado, 14 de outubro de 2006

628) Dois problemas vitais para o Brasil: as privatizacoes e o equilibrio das contas publicas

Sei que o foco deste blog é política externa e relações internacionais, mas numa conjuntura politica de extrema importancia como a presente fase eleitoral no Brasil, não se pode deixar de examinar os problemas mais graves que contaminam as contas publicas: a ausencia de crescimento pela insuficiencia de investimentos (em virtude, em grande medida dos gastos excessivos do Estado) e o deficit da Previdencia.
As matérias abaixo, da edição atual da revista Veja, trazem alguma luz a dois debates altamente enviesados, o das privatizações de estatais (que estão sendo utilizadas como armas do terrorismo eleitoral) e o do desequilibrio da Previdência, que impede um maior crescimento por inviabilizar mobilização da poupança via investimentos produtivos (privados ou públicos).
A matéria ainda comporta um infográfico impossivel de reproduzi aqui (Quadro: A riqueza do Estado cresce e a renda das pessoas cai), mas que demonstra claramente que a renda do trabalhador (e da sociedade) diminui constantemente, à medida exata do crescimento das despesas do Estado, apresentado como um elefante que achata os rendimentos do setor privado.
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Paulo Roberto de Almeida


Veja, edição 1978, 18 de outubro de 2006
Brasil: Vivam as privatizações!

Lula as abomina. Alckmin as defende com timidez, mas a venda de estatais é a melhor maneira de combater a corrupção, o aparelhamento e a ineficiência
Giuliano Guandalini

Surgiu finalmente na campanha eleitoral o debate sobre dois temas essenciais, as privatizações e os gastos públicos. O candidato Lula da Silva e o desafiante Geraldo Alckmin evitavam o máximo possível tocar nesses assuntos, considerados sensíveis pela opinião pública. Mas Lula, desde que foi acuado no debate do domingo, partiu para o ataque e acusou o tucano de ter como plataforma a redução dos gastos públicos e a venda de estatais. "As únicas coisas que eles sabem fazer é privatizar e cortar gastos", afirmou Lula, como se isso fosse uma mácula, e não uma virtude. O PT disseminou a boataria segundo a qual Alckmin venderia a Petrobras, o Banco do Brasil e outras companhias públicas. Essas privatizações, defendidas com bons argumentos, são corretas em princípio, mas impraticáveis por inapetência do mercado para absorver esses gigantes. Alckmin foi falsamente acusado de querer vendê-los (veja a reportagem sobre o terrorismo eleitoral do PT).

Lula afirmou na semana passada, em entrevista ao jornal O Globo, que não teria privatizado a Telebrás nem a mineradora Vale do Rio Doce. Miopia ideológica do presidente-candidato. Foi a privatização da Telebrás que levou o telefone às camadas mais pobres da população, dando aos marceneiros, encanadores, mecânicos, costureiras, cozinheiras e outros profissionais um imprescindível instrumento de trabalho. O Brasil caminha para ter 100 milhões de telefones celulares, vendidos a preço de banana e com tarifas ao alcance do bolso dos trabalhadores. A Telebrás que Lula endeusa vendia um telefone por 5.000 dólares e, pior, não o entregava. Só os amigos do rei conseguiam ver suas linhas instaladas. Vivessem as telecomunicações ainda sob o jugo da Telebrás hoje, só os petistas teriam direito a um telefone. Será que é isso que atrai Lula no modelo estatal de telefonia? A Vale era uma empresa funcional mesmo sob o comando estatal. Porém não pagava impostos e não tinha capital próprio para se modernizar, crescer, nem podia atrair investidores privados. Estava condenada ao sucateamento. Privatizada, tornou-se uma das maiores empresas do setor. Suas ações valorizaram-se 500% nos últimos cinco anos. O estatismo ruiu em todo o mundo, por sua ineficiência e estímulo à corrupção. Sua reencarnação tropical sob os auspícios do PT é anacrônica e altamente suspeita.

Outro tema vital, a contenção dos gastos públicos, também entrou no debate pela porta dos fundos e de maneira enviesada. O assunto só ganhou destaque depois que um dos formuladores do programa de Alckmin, o economista Yoshiaki Nakano, defendeu o corte de gastos e o fim do déficit público. O petista Marco Aurélio Garcia, coordenador do programa de Lula, foi rápido no gatilho e acusou os tucanos de ter a intenção de enxugar programas sociais. Nakano muitas vezes é criticado por suas propostas heterodoxas sobre câmbio e juros, mas quem o conhece sabe que as críticas de Garcia não fazem sentido. Para o tucano, que foi secretário da Fazenda paulista, o ajuste deve ocorrer por meio da melhora na gestão pública, e não pela redução do investimento social. Ainda assim, temendo o desgaste político, Alckmin desautorizou Nakano. Quando o tema é a Previdência, os tucanos são ainda mais escorregadios. Já o programa de Lula não tem meias palavras: a gastança vai continuar e não haverá reforma da Previdência. A confusão é que petistas que trabalham nos ministérios da Fazenda e do Planejamento sabem do drama nas contas públicas e defendem uma redução dos gastos. Eles chegaram a articular, antes de Antonio Palocci ter caído em desgraça, um projeto para zerar o déficit público. Afinal, quem fala pelo presidente Lula, os integrantes de seu governo ou os companheiros que escreveram o seu programa de campanha?

Se aumento de gasto público significasse progresso, o Brasil seria hoje um dos países mais avançados do planeta. Em 1995, as despesas da máquina federal consumiam 208 bilhões de reais. Em 2005, os gastos chegaram a 364 bilhões de reais, um inchaço de 75% nesses dez anos. A despeito de alguns tímidos avanços nos indicadores sociais, esse aumento não se reverteu em benefícios para a população como se apregoa. Além disso, o país cresce menos que todos os demais emergentes, e os trabalhadores ganham hoje, em média, menos do que recebiam há dez anos. O governo sugou recursos da economia e achatou o salário dos brasileiros.

Mas, se o governo gasta tanto e os serviços públicos continuam péssimos, o que explica esse abrupto avanço nas despesas federais? "A Previdência", responde o economista Fabio Giambiagi, um dos maiores especialistas em contas públicas do país. Giambiagi, que trabalha no Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), acaba de concluir um livro no qual mostra como as contas previdenciárias representam o mais sério desequilíbrio fiscal do país (leia entrevista). Em 1988, quando foi promulgada a nova Constituição, os benefícios e aposentadorias pagos pelo INSS (sistema previdenciário dos trabalhadores do setor privado) somavam o equivalente a 2,5% do PIB do país. No ano que vem, essas despesas custarão 8% do PIB. O déficit entre as despesas e a arrecadação supera 40 bilhões de reais ao ano. Sem conter o avanço desses gastos não há como reduzir a carga tributária nem ampliar o investimento público em infra-estrutura, dois requisitos vitais para dar novo ânimo à economia. Afirma o economista Luiz Fernando Figueiredo, ex-diretor do Banco Central: "O Brasil avançou em vários aspectos, mas não fez nenhuma reforma estrutural nos últimos anos. Sem isso não há a menor possibilidade de crescer aceleradamente. Estamos ficando para trás. Enquanto todos os países estão correndo, o Brasil está andando. Quase todos os países emergentes têm fragilidades e problemas regulatórios. A diferença em relação ao Brasil é que eles têm um Estado muito menor". E como diminuir o Estado? Privatizando e cortando gastos.

Quadro: A riqueza do Estado cresce e a renda das pessoas cai

"O Brasil está se suicidando"
Entrevista
Livro mostra como a Previdência se tornou o veneno invisível das contas públicas do país
Giuliano Guandalini

Chega às livrarias nesta semana Reforma da Previdência – O Encontro Marcado (Campus/Elsevier; 256 páginas; 59 reais), do economista Fabio Giambiagi, um dos maiores especialistas em contas públicas do país. Nesta entrevista, Giambiagi argumenta que a reforma previdenciária será inevitável, por mais que os candidatos fujam do assunto.

Oscar Cabral
Giambiagi: sem o ajuste na Previdência, o futuro será pouco promissor

TODOS OS ESTUDOS SÉRIOS APONTAM A PREVIDÊNCIA COMO O MAIOR PROBLEMA NAS CONTAS PÚBLICAS. POR QUE OS POLÍTICOS FOGEM DESSE TEMA?
Porque temem perder votos. A questão tem sido maltratada no ambiente político porque há muitos anos deixamos de fazer política de verdade. Esse assunto não pode e não deve ser abordado como tema partidário ou ideológico, mas com números. Precisamos explicar para a população que, sem uma mudança de regras, será muito difícil, para não dizer impossível, ter daqui a vinte ou trinta anos o Brasil que todos almejamos. O Brasil está se suicidando lentamente.

DE ONDE VEM A RESISTÊNCIA AO TEMA?
O brasileiro médio tem dificuldade para enfrentar a questão previdenciária da mesma maneira que os franceses não aceitam a reforma trabalhista. Quando os estudantes franceses foram às ruas no início do ano, no fundo queriam dizer: "Eu não gosto de como o mundo é". A questão é que o resto do mundo está se lixando para eles.

QUAIS OS PRINCIPAIS DESEQUILÍBRIOS DO SISTEMA?
No resto do mundo, os aposentados, na melhor das hipóteses, recebem reajustes de acordo com a inflação. Preservar o poder aquisitivo é uma coisa, mas dar aumentos reais, como ocorre no Brasil, não faz sentido. Nos últimos doze anos, o mínimo teve um aumento real de 95%. Dois de cada três aposentados ganham salário mínimo, que é o piso dos benefícios do INSS. Além disso, o Brasil é um dos únicos países em que não se exige idade mínima para a aposentadoria. Um sueco precisa trabalhar até os 65 anos de idade. No Brasil, um cidadão de classe média, com expectativa de vida semelhante à dos escandinavos, pode se aposentar aos 50 anos ou menos.

MAS O SALÁRIO MÍNIMO AINDA NÃO É MUITO BAIXO? NÃO FARIA SENTIDO RECUPERAR SEU VALOR?
Nos valores de alguns anos atrás, era difícil ser contra o aumento do mínimo. Hoje penso que já seja possível defender o fim da política de dar aumentos acima da inflação. Na sociedade brasileira impera a convicção de que a melhora do mínimo significa a diminuição da desigualdade. No entanto, pesquisas recentes revelam que o efeito do salário mínimo na distribuição de renda é precário. Um estudo de Ricardo Paes de Barros, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), mostra que um aumento de 10% do mínimo gera uma despesa extra de 3,3 bilhões de reais. Desse valor, apenas 100 milhões vão para as pessoas classificadas como extremamente pobres. Estamos gastando rios de dinheiro para obter resultados sociais ínfimos.

COMO SERIA POSSÍVEL FAZER A REFORMA, CONTORNANDO QUESTÕES POLÍTICAS E A RESISTÊNCIA DA SOCIEDADE?
Defendo uma transição gradual. Em primeiro lugar, precisamos adotar uma idade mínima para aposentadorias. Isso poderia valer a partir de 2010, para não afetar aqueles que estejam na iminência de se aposentar. Outro passo seria reduzir a diferença do tempo de contribuição entre homens e mulheres. Hoje as mulheres podem se aposentar cinco anos mais cedo, mas elas têm expectativa de vida maior. Precisamos abandonar a política de dar reajustes ao salário mínimo acima da inflação. Os aposentados teriam seu poder de compra preservado, mas sem ganhos reais. Não vejo por que o presidente eleito não possa ir a público defender medidas como essas. São propostas de bom senso, das quais depende o futuro de nossos filhos. Os impostos cairiam, os juros também, os investimentos aumentariam e todos ganhariam, com mais crescimento e empregos.

sábado, 7 de outubro de 2006

627) Um pequeno retrato do Brasil: um empresario multado por dar educacao aos seus empregados...

Primeiro, o artigo, que nos me foi repassado em 6/10/2005 por Regina Caldas (mas ele se refere, na verdade, a matéria publicada, ao que parece, em 1996):

Repasso, para reflexão, a experiência vivida pela Geremia, uma empresa de São Leopoldo. Foi multada por pagar escola para os seus funcionários.
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Por Silvino Geremia
EXAME

Acabo de descobrir mais um desses absurdos que só servem para atrasar a vida das pessoas que tocam este país: investir em educação é contra a lei. Vocês não acreditam? Minha empresa, a Geremia, tem 25 anos e fabrica equipamentos para extração de petróleo, um ramo que exige tecnologia de ponta e muita pesquisa. Disputamos cada pedacinho do mercado com países fortes, como os Estados Unidos e o Canadá. Só dá para ser competitivo se eu tiver pessoas qualificadas trabalhando comigo. Com essa preocupação criei, em 1988, um programa que custeia a educação em todos os níveis para qualquer funcionário, seja ele um varredor ou um técnico.

Este ano um fiscal do INSS visitou a empresa e entendeu que educação é salário indireto. Exigiu o recolhimento da contribuição social sobre os valores que pagamos aos estabelecimentos de ensino freqüentados por nossos funcionários, acrescidos de juros de mora e multa pelo não recolhimento ao INSS. Tenho que pagar 26 000 reais à Previdência por promover a educação dos meus funcionários? Eu acho que não. Por isso recorri à Justiça. Não é pelo valor, é porque acho essa tributação um atentado. Estou revoltado. Vou continuar não recolhendo um centavo ao INSS, mesmo que eu seja multado 1 000 vezes.

O Estado brasileiro está falido. Mais da metade das crianças que iniciam a 1a série não conclui o ciclo básico. A Constituição diz que educação é direito do cidadão e dever do Estado. E quem é o Estado? Somos todos nós. Se a União não tem recursos e eu tenho, eu acho que devo pagar a escola dos meus funcionários. Tudo bem, não estou cobrando nada do Estado. Mas também não aceito que o Estado me penalize por fazer o que ele não faz. Se a moda pega, empresas que proporcionam cada vez mais benefícios vão recuar.

Não temos mais tempo a perder. As leis retrógradas, ultrapassadas e em total descompasso com a realidade devem ser revogadas. A legislação e a mentalidade dos nossos homens públicos devem adequar-se aos novos tempos. Por favor, deixem quem está fazendo alguma coisa trabalhar em paz. Vão cobrar de quem desvia dinheiro, de quem sonega impostos, de quem rouba a Previdência, de quem contrata mão-de-obra fria, sem registro algum.

Sou filho de família pobre, de pequenos agricultores, e não tive muito estudo. Completei o 1o grau aos 22 anos e, com dinheiro ganho no meu primeiro emprego, numa indústria de Bento Gonçalves, na serra gaúcha, paguei uma escola técnica de eletromecânica. Cheguei a fazer vestibular e entrar na faculdade, mas nunca terminei o curso de Engenharia Mecânica por falta de tempo. Eu precisava fazer minha empresa crescer. Até hoje me emociono quando vejo alguém se formar. Quis fazer com meus empregados o que gostaria que tivessem feito comigo. A cada ano cresce o valor que invisto em educação porque muitos funcionários já estão chegando à Universidade.

O fiscal do INSS acredita que estou sujeito a ações judiciais. Segundo ele, algum empregado que não receba os valores para educação poderá reclamar uma equiparação salarial com o colega que recebe. Nunca, desde que existe o programa, um funcionário meu entrou na Justiça. Todos sabem que estudar é uma opção daqueles que têm vontade de crescer. E quem tem esse sonho pode realizá-lo porque a empresa oferece essa oportunidade. O empregado pode estudar o que quiser, mesmo que seja Filosofia, que não teria qualquer aproveitamento prático na Geremia. No mínimo, ele trabalhará mais feliz.

Meu sonho de consumo sempre foi uma Mercedes-Benz. Adiei sua realização várias vezes porque, como cidadão consciente do meu dever social, quis usar meu dinheiro para fazer alguma coisa pelos meus 280 empregados. Com os valores que gastei no ano passado na educação deles, eu poderia ter comprado duas Mercedes. Teria mandado dinheiro para fora do país e não estaria me incomodando com leis absurdas. Mas não consigo fazer isso. Sou um teimoso.

No momento em que o modelo de Estado que faz tudo está sendo questionado, cabe uma outra pergunta. Quem vai fazer no seu lugar? Até agora, tem sido a iniciativa privada. Não conheço, felizmente, muitas empresas que tenham recebido o tratamento que a Geremia recebeu da Previdência por fazer o que é dever do Estado. As que foram punidas preferiram se calar e, simplesmente, abandonar seus programas educacionais. Com esse alerta temo desestimular os que ainda não pagam os estudos de seus funcionários. Não é o meu objetivo. Eu, pelo menos, continuarei ousando ser empresário, a despeito de eventuais crises, e não vou parar de investir no meu patrimônio mais precioso: as pessoas. Eu sou mesmo teimoso.

*Silvino Geremia é empresário em São Leopoldo, no Rio Grande do Sul

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Agora meus comentários pessoais (PRA):

Um triste retrato do Brasil.
O pior, é que não é necessariamente é o "Estado" que está fazendo isso. São os agentes do Estado, que parecem agir em total impunidade.
Provavelmente, o fiscal possuia intenções puramente privadas: ameaça com multa para extorquir um dinheiro do pobre empresario, que muitas vezes prefere pagar a metade, antes do que a multa inteira, "arbitrada" pelo fiscal.
Inacreditável.
Ser empresario no Brasil é uma luta insana: eles são uns heróis incompreendidos.

terça-feira, 3 de outubro de 2006

626) Aprendizado...

(O copyright não me pertence)


"Aprendi que se aprende errando,
Que crescer não significa fazer aniversário,
Que o silencio é a melhor resposta, quando se ouve uma bobagem,
Que trabalhar não significa ganhar dinheiro,
Que sonhos estão aí para serem alcançados,
Que amigos a gente conquista mostrando o que somos,
Que os verdadeiros amigos sempre ficam com você até o fim,
Que a maldade se esconde atrás de uma bela face,
Que não se espera a felicidade chegar, mas se procura por ela,
Que a natureza é a coisa mais bela da vida,
Que um só dia pode ser mais importante que muitos anos,
Que quando penso saber de tudo ainda não aprendi nada."


(O autor se revelará um dia, por sua própria iniciativa...)