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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

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quinta-feira, 6 de março de 2025

As relações internacionais do Brasil numa era de fragmentação geopolítica - Paulo Roberto de Almeida

Ficha do trabalho:  

4834. “As relações internacionais do Brasil numa era de fragmentação geopolítica”, Brasília, 22 janeiro 2025, 15 p. Texto em apoio a interação com o Ateliê das Humanidades. Texto disponível plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/128050929/4834_As_relacoes_internacionais_do_Brasil_numa_era_de_fragmentacao_geopolitica_2025_). 

Parte inicial do trabalho: 

As relações internacionais do Brasil numa era de fragmentação geopolítica

 

Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor.

Texto em apoio a interação com o Ateliê das Humanidades, evento realizado no dia 22/01/2025; YouTube (https://youtu.be/wze6Rw3rPyE) e (Spotify: https://open.spotify.com/episode/553PSG4fE9txXGjI1pHin4?si=15775e7121dd4bc6); Informação disponível no blog Diplomatizzando (27/01/2025; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2025/01/as-relacoes-internacionais-do-brasil_27.html).

 

Sumário: 

1. A primeira política externa republicana: fundamentos da doutrina diplomática

2. A diplomacia da República de 1946: o alinhamento pragmático da Guerra Fria

3. O primeiro exercício de política externa independente: um padrão consistente

4. O ecumenismo responsável da política externa autônoma e orgulhosa de sê-la

5. A diplomacia da redemocratização: sem os tabus do regime militar

6. As relações internacionais do Brasil numa era de fragmentação geopolítica

Referências bibliográficas

 

1. A primeira política externa republicana: fundamentos da doutrina diplomática

        Cem anos atrás, o Brasil se preparava para encerrar, pouco gloriosamente, a sua primeira experiência de diplomacia multilateral: a retirada do país da Liga das Nações, não tendo logrado o apoio das grandes potências, ou sequer de países latino-americanos, para tornar-se membro permanente do seu Conselho Executivo, lugar que acabou sendo cedido à Alemanha, o país justamente punido pelo Tratado de Versalhes de 1919, que a condenava como responsável pela Grande Guerra e, por isso, obrigada a pagar pesadas reparações aos países invadidos. A retirada resultou de um gesto desastrado do presidente Artur Bernardes, contra os argumentos do representante brasileiro em Genebra, embaixador Afrânio de Melo Franco, que depois seria o primeiro chanceler do governo provisório de Getúlio Vargas (1930-1934).

        Esse curto experimento multilateral tinha começado quase duas décadas antes, na segunda conferência internacional da Paz, realizada na Haia, em 1907, na qual o Brasil tinha sido representado pelo baiano Rui Barbosa, que atuou brilhantemente em perfeito acordo com o chanceler Rio Branco. Na conferência, Rui e o Barão – o único a ser conhecido por esse título nobiliárquico em plena República – defenderam o princípio que se converteria no eixo central do multilateralismo contemporâneo: a igualdade soberana dos Estados (embora, antes e depois da Liga, e na própria ONU, essa igualdade sempre foi mais teórica do que real). A saída da Liga não impediu que o Brasil continuasse a participar das conferências econômicas organizadas pela organização, uma sobre comércio, em 1927, outra monetária e financeira, em 1934, ambas totalmente frustradas em seus objetivos liberalizantes e de coordenação de políticas comerciais e cambiais.


(...)


Ler a íntegra em Academia.edu, no link: 

https://www.academia.edu/128050929/4834_As_relacoes_internacionais_do_Brasil_numa_era_de_fragmentacao_geopolitica_2025_


segunda-feira, 27 de janeiro de 2025

As relações internacionais do Brasil numa era de fragmentação geopolítica - Paulo Roberto de Almeida (Ateliê de Humanidades)

Convidado que fui pelo Ateliê das Humanidades pelo André Magnelli, Lucas Fayal Soneghet e Paulo Martins para uma conversa sobre a atualidade das relações internacionais, daí resultou uma gravação que agora está disponível no YouTube, como abaixo explicitado.

Os apressados, antes de ler a introdução que segue abaixo, podem ir diretamente ao link: https://youtu.be/wze6Rw3rPyE

Seja bem-vindo ao Conversas de Ateliê!

Na mesa temos Paulo Roberto de Almeida, Paulo Henrique Martins, André Magnelli e Lucas Faial Soneghet. Nosso convidado, Paulo Roberto de Almeida, foi diplomata de carreira entre 1977 e 2021, representando o Brasil ao redor do mundo, e é professor no Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal.

No episódio de hoje, conversamos sobre o cenário de política internacional, com foco na posição do Brasil entre China e Estados Unidos. A política internacional no ano de 2024 foi, para dizer o mínimo, conturbada. Os conflitos no Oriente Médio entre Israel e o Hamas se estenderam por 15 meses até o cessar-fogo recentemente acordado no dia 19 de janeiro de 2025. Começando em outubro de 2023 quando 1.200 pessoas foram mortas e outras 251 foram tomadas como reféns pelo Hamas, os conflitos transbordaram em ataques ao Irã e ao Líbano, visando atingir o grupo Hezbollah. Gaza, cenário da guerra, atualmente está em ruínas. Mais de 46 mil palestinos foram mortos durante as ações militares, segundo a o ministério da saúde de Gaza, enquanto as forças armadas israelenses contabilizam 17 mil mortes de combatentes palestinos e menos de 1 mil mortos de soldados israelenses. O cessar-fogo recente prevê a libertação gradual de reféns do Hamas e a retirada de tropas israelenses do território palestino.

Em 24 de fevereiro de 2022, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, lançou uma invasão militar na Ucrânia, começando um conflito bélico que no mês que vem completará três anos. A guerra arrasou a Ucrânia e criou milhares de refugiados na região. Em resposta à invasão russa, algumas nações ocidentais impuseram sanções contra Moscou que, posteriormente, fechou um de seus principais gasodutos na Europa. Ao longo dos meses, com sanções, posicionamentos e políticas humanitárias, o conflito dividiu nações e opiniões ao redor do mundo e tem sido chamado de o maior e mais mortal desde a Segunda Guerra Mundial. Estima-se que cerca de 8 milhões de ucranianos deixaram o país, enquanto outros 8 milhões foram deslocados internamente. Atualmente, cerca de 20% do território ucraniano permanece sob ocupação russa.

Nas Américas, Donald Trump está de volta após Joe Biden, seu antecessor, decidir não concorrer para reeleição e apoiar a candidatura da democrata Kamala Harris. O processo foi controverso e tenso, redundando em uma vitória marcante para o republicano, que alcançou a maioria dos votos populares e vantagens claras nos principais estados. A campanha contou com apoio direto de Elon Musk, dono da rede social X e atualmente encarregado do Departamento de Eficiência Governamental no governo Trump. No discurso de posse dado no dia 20 de janeiro de 2025, Trump anunciou a revogação de 78 ordens da gestão anterior, a retirada dos EUA do Acordo de Paris, que versa sobre a redução da emissão de gases de efeito estufa, perdão aos invasores do Capitólio em 2021, o fim das políticas de ação afirmativa e diversidade no governo e o fim do uso do termo “gênero” nos documentos e registros oficiais do país, que deverão usar a palavra “sexo” e conter somente as opções “masculino” e “feminino”.

Para o Brasil, a eleição de Trump significa um novo cenário de polarização internacional. A diplomacia brasileira terá de se equilibrar entre a China, destino da maioria das suas exportações e grande investidora na América Latina, e os EUA, que busca retomar sua influência histórica no continente americano.

Tópicos discutidos: Política Internacional; Globalização; Brasil; China; Estados Unido

Vamos conversar? 

No Youtube: https://youtu.be/wze6Rw3rPyE

No Spotify: https://open.spotify.com/episode/553PSG4fE9txXGjI1pHin4?si=15775e7121dd4bc6

Fontes:

https://www.bbc.com/portuguese/articles/c5y7g25yljyo

https://g1.globo.com/mundo/noticia/2024/10/07/guerra-em-gaza-israel-soldados-palestina.ghtml

https://www.bbc.com/portuguese/articles/cnlnngrzzzeo

https://veja.abril.com.br/mundo/linha-do-tempo-da-guerra-na-ucrania-relembre-o-que-aconteceu-em-um-ano


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sexta-feira, 24 de janeiro de 2025

As relações internacionais do Brasil numa era de fragmentação geopolítica - Paulo Roberto de Almeida

 As relações internacionais do Brasil numa era de fragmentação geopolítica


Paulo Roberto de Almeida


A divisão bipolar do planeta durante a Guerra Fria iniciada em 1947 parecia ter sido superada em 1992, quando os presidentes dos Estados Unidos, George Bush, e da Rússia, Boris Ieltsin, proclamaram a emergência de uma “nova ordem mundial”. O otimismo quanto à convergência de interesses entre os grandes atores geopolíticos se manteve durante alguns anos, chamados de “pós-Guerra Fria”, mas depreciativamente caracterizados como sendo de um“momento unipolar”, isto é, da hegemonia dos Estados Unidos. A Rússia de Putin ainda se encontrava empenhada numdifícil reconstrução econômica (e militar) a China, recém-admitida na OMC em 2001, ainda ensaiava sua extraordinária expansão comercial e tecnológica das décadas seguintesque levou se afirmar, em poucos anos, como a segunda maior potência econômica do planeta e a primeira no domínio do comércio mundialEm 2009 ela já tinha substituído os Estados Unidos como primeiro parceiro comercial do Brasil, depois de um domínio americano de mais de 150 anos nos nossos intercâmbios externos.

Analogias históricas são sempre enganosas, mas observa-se uma tendência, entre os analistas internacionais, no sentido de caracterizar o atual cenário geopolítico internacional como sendo o de uma “segunda Guerra Fria”, ao início com características mais econômicas e tecnológicas, no período recente mais marcadamente geopolíticos. Ela coloca, em dois campos opostos, o império americano, de um lado, ainda hegemônico no plano militar, e, de outro, dois novos contendores, Rússia e China, unidos por uma “aliança sem limites” a partir de fevereiro de 2022, pouco antes da invasão da Ucrânia pela Rússia

A similaridade de situações pode não se dar exatamente nos moldes da “primeira” Guerra Fria, quando o que predominou foi o chamado “equilíbrio do terror nuclear; mas eventuais desenvolvimentos, nesta nova fase, podedesembocar num cenário ainda mais preocupante, que foi oque prevaleceu no “Norte Global” dos anos 1930, colocando em confronto aberto as democracias de mercado do Atlântico Norte então com vários pacifistas no comando das principais potências – e as potências fascistas, expansionistas e belicistas, que se opunham a esse poderio geopolítico e que pretendiam contestar pela força das armas essa hegemonia. O confronto desembocou na maior conflagração militar da história, com dezenas de milhões de mortos e a conformação de uma nova ordem global a partir de 1945, um cenário mundial construído principalmente pelos Estados Unidos e que seguiu sendo caracteristicamente ocidental, em virtude da mediocridade econômica do universo comunista e das tribulações internas da China durante maior parte do período.

No pós-guerra, em face da grande divisão do mundo, a da Guerra Fria geopolítica das contendas interimperiais do período 1946-1989o Brasil construiu, com hesitações ao início, uma postura diplomática de neutralidade e de real autonomia na política externa. Isto foi positivo para oobjetivos prioritários da nação, o do crescimento econômico e o do seu desenvolvimento social. Não parece mais ser o caso no período recente, desde quando o candidato Lula, ainda em 2022, e o agora presidente, a partir de 2023,  proclamou várias vezes sua preferência pessoal – ou seja, ainda não uma escolha da diplomacia brasileira – pela construção de uma “nova ordem global multipolar”, nos mesmos termos vagos que vem sendo anunciados pelo presidente russo Vladimir Putin, secundado pelo líder chinês Xi JinpingEsse objetivo pode ser encampado pelo foro Brics, em fase de ampliação para o Brics+, com a incorporação de mais de uma dezena de países associados a partir de 2023.

De maneira já evidente, o que se assiste em 2025 – quando o Brasil responde pela presidência interina do Brics+,acolhendo sua reunião de cúpula – é a uma nova fratura entre as grandes potências, como não se via desde o entre guerras. A preeminência de fato de uma ordem ocidental,construída nos estertores da Segunda Guerra Mundial, vem sendo ativamente contestada pelo novo poderio econômico e militar das duas grandes potências declaradamente adversárias dessa ordemA Rússia de Putin, em especial, parece repetir os descaminhos diplomáticos dos impérios centrais na fase preliminar à Grande Guerra, assim como as aventuras bélicas das potências fascistas agressivas dos anos 1930. Naquela conjuntura, o Brasil tentou manter, tanto quanto conseguiu, sua neutralidade em face dessas disputas imperiais, mas soube escolher o seu campo no momento decisivo, graças ao tirocínio esclarecido de um estadista, Oswaldo Aranha, nutrido nos ensinamentos do barão do Rio Branco e na doutrina jurídica construída pelo jurista Rui Barbosa. 

A fragmentação geopolítica da atual conjuntura internacional, que vem sendo chamada – sem muita originalidade histórica – de “segunda Guerra Fria, ameaça, assim, se converter em guerra quente, talvez em conflagração direta, pela agressividade bélica de uma das duas potências autocráticas, declaradamente opostas à ordem ocidental “hegemônica”. É nesse contexto que o presidente Lula, em clara ruptura com os padrões tradicionais da diplomacia brasileira, de afirmada autonomia em relação às contendas políticas das grandes potências e de neutralidade em face dos conflitos interimperiais, parece ter escolhido o seu “campo”, que é o dos promotores de uma largamente indefinida “nova ordem global multipolarsem que isso constitua, ainda, uma nova doutrina para a diplomacia brasileira.

Se tal orientação se confirmar, enquanto política de Estado, ela pode ser prejudicial ao Brasil, não apenas no contexto dos seus objetivos e interesses nacionais permanentes, de crescimento econômico e desenvolvimento social, mas também no campo dos valores e princípios democráticos e humanistas expressos nas cláusulas de relações internacionais do artigo 4º da Constituição de 1988. No primeiro semestre de 2025, um eventual desvio em relação a essefundamentos conceituais da política externa e da diplomacia brasileira permanecia ainda no terreno das hipóteses. Uma evolução mais conforme à tradicional postura do Brasil nas suas relações internacionais indicaria um desejável retorno à autonomia e à independência de sua política externa e de neutralidade no posicionamentdiplomático em face das contendas interimperiais.

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 24 de janeiro de 2025