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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

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sexta-feira, 18 de julho de 2014

Emprego em queda: deve ser alguma maldicao companheira, deu tudo errado no mes da Copa

Perdemos feio (não usem o número sete por aí), as pesquisas eleitorais vão pelo mau caminho, e ainda tem esta: emprego em queda.
Mas justamente logo quando o governo esperava um emprego explodindo no mês da Copa, as vendas caem, o emprego some, a seleção deu chabu, a satisfação com a soberana volta a descer a rampa do Planalto.
Não é possível. Deve ser algum vodoo da oposição, esse pessoalzinho malvado, que aproveitou a presença de um bocado de haitianos (também importados por obra e graça dos companheiros), para fazer feitiçaria contra um governo tão bonzinho, tão preocupado com a questão social, tão sem outros recursos...
Paulo Roberto de Almeida

Criação de emprego no mês da Copa cai 79,5%, mostra Caged. Número de vagas é o pior desde 1992.
Políbio Braga, 17 Jul 2014 01:11 PM PDT

Foram criadas 25.363 vagas em junho — o pior resultado para o mês dos últimos 16 anos O país registrou abertura de apenas 25.363 vagas formais em junho, segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), divulgado pelo Ministério do Trabalho nesta quinta-feira. O número é 79,5% inferior ao registrado no mesmo mês de 2013 . Em maio, foram criados 58.836 postos com carteira...

Addendum:

Aliás, esses efeitos negativos da Copa já tinham sido antecipados ANTES da Copa, por Roberto Ellery, como ele revela em seu blog, em post de 19 de junho.

Participação no Globonews Alexandre Garcia

Ontem, 18/06, estive na Globonews para consversar com Alexandre Garcia e Paulo Dantas Costa, presidente do Conselho Federal de Economia (COFECON), a respeito dos impactos econômicos da Copa. Minha avaliação é que a Copa não terá efeitos econômicos de longo prazo e que no curto prazo os efeitos podem até ser negativos. Os que me acompanham sabem que meu diagnóstico sobre a economia brasileira é que existe um problema de oferta e não de demanda. Sendo assim os possíveis ganhos econômicos por conta da elevação da demanda no período da Copa serão pequenos e possivelmente menores que as perdas com os dias parados por conta dos feriados.
O presidente do COFECON acredita que o setor de turismo pode ser beneficiado no longo prazo. Eu não compartilho desta idéia, várias pesquisas relativas a mudanças setoriais em países que foram sede da Copa do Mundo mostram que o efeito sobre a composição setorial do emprego é pequena ou nula, ou seja, não há um crescimento significativo do setor de turismo em relação a outros setores. No caso do Brasil as inúmeras dificuldades que temos para o turismo continuarão fazendo com que o país inteiro receba mais ou menos a mesma quantidade de turista recebidos pela Torre Eiffel a cada ano. Para os que se interessarem o link para o vídeo está aqui.

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Disseram que a Europa se americanizou, no trabalho, pelo menos...

ECONOMIC SCENE

Americanized Labor Policy Is Spreading in Europe


Francisco Seco/Associated Press
Union protesters in Lisbon last month hold signs reading “Government Out.”


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In 2008, 1.9 million Portuguese workers in the private sector werecovered by collective bargaining agreements. Last year, the number was down to 300,000.

Economic Scene

Eduardo Porter writes the Economic Scene column for the Wednesday Business section.
Kay Nietfeld/Deutsche Presse-Agentur, via Associated Press
Angela Merkel, center, was forced to approve Germany’s first minimum wage law to form a government.
Spain has eased restrictions on collective layoffs and unfair dismissal, and softened limits on extending temporary work, allowing workers to be kept on fixed-term contracts for up to four years. Ireland and Portugal have frozen the minimum wage, while Greece has cut it by nearly a fourth. This is what is known in Europe as “internal devaluation.”
Tethered to the euro and thus unable to devalue their currency to help make their goods less expensive in export markets, many European countries — especially those along the Continent’s southern rim that have been hammered by the financial crisis — have been furiously dismantling workplace protections in a bid to reduce the cost of labor.
The rationale — forcefully articulated by the German government of Angela Merkel, the European Commission and somewhat less enthusiastically by the International Monetary Fund — is that this is the only strategy available to restore competitiveness, increase employment and recover solvency.
These policy moves are radically changing the nature of Europe’s society.
“The speed of change has certainly been very fast,” said Raymond Torres, the chief economist of the International Labor Organization in Geneva. “As far as I can tell, these are the most significant changes since World War II.”
While most of the debate over Europe’s response to the financial crisis has focused on the budget austerity enveloping the Continent, the comparatively unheralded erosion of worker protection is likely to have at least as big and lasting an impact on Europe’s social contract.
“It has a disastrous effect on social cohesion and a tremendous effect on inequality,” argued Jean-Paul Fitoussi, an economics professor at the Institut d’Études Politiques de Paris. “Well-being has fallen all across Europe. One symptom is the rise of extremist political parties.”
Europe’s strategy offers a test of the role played by labor market institutions — from unions to the minimum wage — in moderating the soaring income inequality that has become one of the hallmarks of our era.
Inequality across much of Europe has widened, but it is still quite modest when compared with the vast income gap in the United States.
The question is whether relative equity can hold as workplace institutions that for decades protected European employees’ standard of living give way to a more lightly regulated, American-style approach, where the government hardly interferes in the job market and organized labor has little say.
The evidence so far suggests the answer is no. The drop in unionization in Portugal “is going to blow the wage distribution apart,” David Card, a labor economist at the University of California, Berkeley, said.
Perhaps the most compelling evidence that Europe’s tentative new path will lead to deepening inequality comes from the country that adopted the strategy earliest and came out at the other end a paragon of success: Germany.
The overhaul of the labor market started after German unification in the early 1990s, when factories in the less-productive Eastern part of the country found they could not compete at the pay scales provided in the West, and defected en masse from the sector agreements negotiated between industry associations and large unions. West German firms soon took up the strategy. The share of workers covered by collective labor agreements fell.
In the early 2000s — when a hobbled Germany won the moniker “sick man of Europe” — efforts to improve competitiveness and employment further eroded worker protections, fueling a boom in low-paid, short-term “mini-jobs” that today account for more than a fifth of German employment.
Today, Germany is seen as a shining example of the virtues of such reform efforts. It is an exporting powerhouse with an unemployment rate, according to the European statistical agency Eurostat, of 5.2 percent: the envy of the Western world. But on closer inspection it becomes apparent that not all Germans have benefited from Germany’s success.
In 1991, the richest 10 percent of Germans took in 26 percent of the nation’s income before taxes and transfers, according to a report by Kai Daniel Schmid and Ulrike Stein of the Macroeconomic Policy Institute in Düsseldorf, which is closely linked to the German Confederation of Trade Unions. By 2010 they took in 31 percent.
Over the same period, the slice of the nation’s income taken by the bottom half of the population fell to 17 percent, from 22 percent.
As Professor Card has noted, the widening of the wage gap among German men from 1996 through 2009 roughly matches that in the United States during the 1980s — one of the periods of fastest-growing income inequality since the Gilded Age.
And though inequality in Germany has abated somewhat over the last two years as the number of part-time, low-wage jobs has stabilized, it remains much higher than a decade ago.
Whether Germany’s strategy will be of any use to distressed European countries today ishotly debated. German exports did take off, but domestic demand sagged, a direct consequence, critics say, of lower pay. So it took a long time for the efforts to produce jobs.
What’s more, the German rebound relied on a fast-growing global economy that was hungry for its exports. The world is very different today. “Demand from Asia was much more important than mini-jobs,” Mr. Torres of the I.L.O. argues.
But there is another issue at play. Even if the strategy were to eventually increase employment, what else will it do to Europe?
Andrew Watt, an economist who heads the Macroeconomic Policy Institute in Germany, worries that the push for labor market deregulation will cascade from one weak country to the next, as all engage in a futile race to create jobs by gaining market share from one another in a world of insufficient demand. “Whichever country is weakest at the time is forced into major cutbacks. First Germany, now Spain, next France,” he said.
“I am concerned about the longer-run costs,” Mr. Watt added. “It is hard to rebuild collective bargaining and welfare-state structures once they have been destroyed.”
Lowell Turner, who heads the Worker Institute at Cornell University, argues that there has always been a tension between the European Union’s economic project — centered on creating a vast single market — and the Continent’s deep-rooted commitment to social equity. The crisis put a thumb on the scales. “For a year or two governments protected their workers,” he said. But “the balance has tipped away from social Europe.”
There are signs of change, though. German elections earlier this year forced the Christian Democratic Union of Chancellor Merkel into a governing coalition with the Social Democratic Party. Part of the deal to form a government included introducing Germany’s first minimum wage, at 8.5 euros an hour, or about $11.50.
Lifting German wages at the bottom end should help other European countries to some extent, expanding German demand for their products. It is perhaps overly optimistic, though, to assume Berlin would welcome similar policies among its poorer, weaker neighbors.
Rather, labor markets in Southern Europe seem destined to increasingly follow the American way. “This is a way to, indeed, make Europe very much more like the U.S.,” Mr. Watt said. “With respect, that is not what most Europeans want.”
Email: eporter@nytimes.com;
Twitter: @portereduardo

terça-feira, 14 de maio de 2013

Panorama do emprego no reino de Liliput - Editorial Estadao

Sem comentários

Mantega reinventa o emprego

13 de maio de 2013 | 2h 05
Editorial O Estado de S.Paulo
 
Sempre criativo, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, acaba de lançar uma teoria sobre a criação de emprego sem crescimento econômico. Segundo ele, a geração de empregos pode ser mais importante que a expansão do Produto Interno Bruto (PIB), como se a primeira fosse independente da segunda. De fato, a oferta de vagas pode até crescer mais que a atividade geral da economia, em circunstâncias muito especiais, como tem ocorrido no Brasil. As limitações econômicas, no entanto, deverão prevalecer depois de algum tempo. Assim terminará a bonança dos trabalhadores, se a produção continuar estagnada ou em marcha muito lenta.
A tese apresentada a parlamentares do PT, na quinta-feira, pode servir à campanha eleitoral de um governo preocupado sobretudo com eleições. Mas o ministro ainda terá algum trabalho para garantir respeitabilidade acadêmica a suas ideias inovadoras. Não basta a inventividade, como ele deveria ter aprendido quando recorreu à contabilidade criativa para fechar as contas federais.
A oscilação do emprego na indústria de transformação desmente componentes importantes do discurso oficial, mas a presidente Dilma Rousseff e o ministro da Fazenda parecem desconhecer esses dados. Em março, o número de ocupados no setor de transformação foi 0,2% maior que em fevereiro, mas 0,6% menor que um ano antes. O número de empregados no primeiro trimestre foi 1% inferior ao do período entre janeiro e março de 2012. Em 12 meses o contingente diminuiu 1,4%. Os números são do IBGE. A abertura de vagas de um ano para cá dependeu, portanto, principalmente de outros segmentos. São, na maior parte dos casos, atividades menos envolvidas na absorção e na difusão de tecnologia e na criação dos chamados empregos de qualidade.
Apesar disso, o quadro geral mantém-se razoável, especialmente quando se observa a situação internacional. Seria muito pior se as demissões na indústria de transformação refletissem mais precisamente as condições econômicas do setor. Há um mistério aparente nessa história, mas algumas observações bastam para tornar o cenário menos estranho.
Em primeiro lugar, estímulos ao consumo têm contribuído para manter alguns segmentos da indústria em movimento e para sustentar seu quadro de pessoal. Esses estímulos têm sido insuficientes, no entanto, para estimular um maior empenho na produção e para afetar positivamente outras áreas da indústria.
Em segundo lugar, empresas têm preferido manter seu pessoal pela combinação de dois motivos muito compreensíveis. Demissões custam muito e, além disso, quem demitir poderá encontrar dificuldade para preencher as vagas depois, se a economia voltar a crescer. Falta mão de obra qualificada e a escassez ficará mais grave, se muitas empresas decidirem contratar.
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) chamou a atenção para esses pontos, em estudos divulgados recentemente. Isso ajuda a explicar, também, os ganhos reais obtidos pelos trabalhadores nas negociações dos últimos anos. Há desequilíbrio no mercado.
Em resumo: 1) a criação de empregos tem dependido de estímulos de curto alcance, isto é, insuficientes para gerar crescimento sustentável; 2) boa parte das vagas tem resultado na criação de ocupações de baixa qualidade; e 3) a preservação de quadros na indústria tem sido motivada, em boa parte, por um dado negativo para a economia brasileira - a escassez de mão de obra qualificada e até, como já havia indicado a Confederação Nacional da Indústria, pela falta de pessoal preparado para receber treinamento na fábrica.
Esse dado reflete a política educacional do Partido dos Trabalhadores (PT). O governo dedicou-se a facilitar de forma eleitoreira o acesso a faculdades e negligenciou a formação indispensável à atividade produtiva. Recentemente o discurso oficial começou a valorizar a educação técnica. Já seria bom se o governo cuidasse mais da educação fundamental. Mas sua maior realização nesse campo foi a defesa da frase "os menino pega os peixe" como padrão aceitável de linguagem.

domingo, 21 de março de 2010

1895) Relacoes internacionais: oportunidades de emprego e perspectivas de carreira

De vez em quando, um jovem candidato à carreira, estudante de RI, me lembra um velho texto meu sobre o tema das profissões e carreiras, como este, desenterrado de um passado quase esquecido.

As relações internacionais como oportunidade profissional
Paulo Roberto de Almeida (2006)
(www.pralmeida.org)

Respostas a algumas das questões mais colocadas pelos jovens que se voltam para as carreiras de relações internacionais.

Questões:
1. Com quais expectativas o jovem ingressa no curso de relações internacionais?

PRA: Provavelmente, na maior parte dos casos, com a expectativa de tornar-se diplomata ou funcionário internacional, ou então animado pelo vago desejo (ou mesmo vontade concreta) de sair do Brasil, passar sua vida entre capitais européias e da América do Norte, fazer-se no mundo, enfim. Deve-se observar desde logo que o ingresso na diplomacia, na verdade, acaba ocorrendo para uma fração mínima dos ingressados nesses cursos, uma parte também relativamente pequena voltando-se para as próprias atividades acadêmicas ligadas às relações internacionais e a maior parte devendo inserir-se, de algum modo, no mercado de trabalho “normal”, isto é, do setor privado, altamente competitivo.

Aqueles muito jovens – digamos entre os 18 e 20 anos – ostentam uma visão relativamente romântica do que seja o mundo ou a projeção internacional do Brasil, não estando aqui excluídas motivações essencialmente idealísticas, no sentido da atuação em causas humanitárias, ecológicas, imbuídos que são do desejo de mudar o mundo ou de ajudar aqueles que são percebidos como “vítimas da globalização” ou de misérias ancestrais. Os mais “velhos” – que podem eventualmente ter iniciado o terceiro ciclo por algum outro curso e efetuado o desvio para relações internacionais no meio da rota – possuem expectativas mais concretas e realistas, eventualmente construídas a partir do exercício de alguma atividade profissional paralela aos estudos de terceiro ciclo, mas eles também podem estar imaginando ou aspirando por uma “vida diferente” da mesmice cotidiana em âmbito puramente nacional, algum relevante papel de “negociador”, de “funcionário” ou de “executivo internacional”. Ou seja, todos eles possuem altas expectativas em relação aos cursos e as oportunidades profissionais dele resultantes, sem talvez medir muito bem a distância que ainda separa o universo relativamente teórico do universo “mental” desses cursos e a realidade do mundo profissional, feita de muito esforço individual, salários nem sempre elevados como esperado e uma indefinição geral quanto ao exercício concreto das “generalidades” aprendidas nos bancos universitários.

2. Em quais as áreas o bacharel em RI sai preparado para atuar?

PRA: Como ele é um generalista em especialidades “internacionais” ele poderá, supostamente, atuar em todas as áreas nas quais alguma competência vinculada ao seu terreno é requerida, seja no campo da análise e processamento de informações relativas aos diferentes cenários regionais e internacionais, seja na pesquisa e ensino acadêmico, nas áreas de relações internacionais das burocracias públicas – o que inclui a diplomacia tradicional, novas “diplomacias” em ministérios setoriais, assessorias internacionais de diversos órgãos etc. – e, provavelmente em maior “volume”, nas empresas privadas e nas chamadas ONGs que possuem ou aspiram possuir qualquer tipo de interface com o mundo exterior. O problema, aqui, é que as empresas requerem, em geral, uma competência mais específica e provavelmente mais especializada do que o conhecimento sintético das relações internacionais, a qualquer título. As empresas não estão minimamente preocupadas com a teoria institucionalista ou neo-realista das relações internacionais, tampouco com o funcionamento do Conselho de Segurança da ONU: elas desejam simplesmente vender ou fazer negócios com parceiros externos e por isso elas são mais suscetíveis de apelarem para profissionais especializados como economistas, advogados ou algumas outras profissionais mais “tradicionais”. Afinal de contas, trata-se de fazer uma prospecção de mercado ou de elaborar um contrato de cessão ou compra de direitos e outros ativos entre dois agentes privados, que devem rentabilizar seu tempo e seus recursos humanos e materiais, não havendo muito lugar para teorizações indevidas ou abstrações fora do campo essencialmente pragmático no qual atuam essas empresas.

Em outros termos, o bacharel de RI seria extremamente consciencioso se ele procurasse, de imediato, suprir suas carências em competências específicas buscando uma especialização dentro de seu campo de estudo, procurando estágios desde cedo ou mesmo fazendo algum outro curso paralelamente. Como para as demais especializações disciplinares, uma pós-graduação seria altamente recomendável, ou então uma outra via, mais racional, a formação de base numa profissão “normal” ou “tradicional” e uma pós ou estudos especializados em relações internacionais, eventualmente com orientação já definida para a área na qual o candidato a um bom emprego pretende atuar.

3. Qual o nome dado ao profissional depois de formado?

PRA: Não tenho certeza se o termo está consagrado, mas, aparentemente, seria “internacionalista” (uma expressão ainda não oficializada, diga-se de passagem, como a própria “profissão”, que não corre nenhum “risco” de ser regulamentada no futuro previsível). Em todo caso, melhor assim, do que algo estranho como “internacionalóide” ou “internacionaleiro”.

4. Existe a discussão sobre a relevância do curso para quem quer seguir carreira diplomática. É mesmo o melhor caminho ou o primeiro passo para o Instituto Rio Branco e o Itamaraty?

PRA: Não tenho certeza de que este seja o melhor caminho para os indivíduos que aspiram a ter alguma atividade já consagrada no circuito profissional, pois se trata de uma área relativamente nova, ainda não suficientemente “testada” nos mercados de trabalho. O que ocorreu, nos últimos anos, levado pelos ventos da globalização e da regionalização, foi um fenômeno “anormal” de expansão “geométrica” dos cursos de relações internacionais, provavelmente sem qualquer relação com a demanda efetiva do mercado. Havia uma demanda da parte dos jovens, atraídos pelo que parece ser um campo novo e talvez vasto – mas provavelmente não suficientemente “elástico” como o desejado pelos jovens – e as instituições privadas de ensino se encarregaram de satisfazer essa demanda por cursos de “aspecto” internacional.

Quanto à carreira diplomática, estrito senso, o recrutamento é altamente seletivo e a formação deveria ser, portanto, focada nas humanidades em geral, com um domínio igualmente satisfatório de ciências sociais aplicadas como economia e direito. Não é seguro que um curso de relações internacionais consiga dar todas as competências requeridas, mas ele é provavelmente o que mais estaria dentro do “campo” da diplomacia profissional. Acontece, porém – e isso precisa ficar muito claro aos jovens aspirantes à carreira – que, sendo o recrutamento caracterizado pela “hecatombe” de 90% dos candidatos, os “não-entrantes” precisam “sobreviver”, de alguma forma, nas profissões normais, requeridas pelo mercado, e aqui o nicho das relações internacionais ainda é relativamente difícil.

Pode-se dizer, de uma maneira geral, que o curso, in abstracto, é relevante, mas os cursos, tomados concretamente, diferem muito entre si pela qualidade das matérias oferecidas, pela competência dos professores contratados, pela disponibilidade de recursos didáticos e materiais, etc.

Parece ocorrer, atualmente, com os cursos de relações internacionais, algo semelhante ao que se passou, em outras épocas, com os cursos de ciências sociais, de psicologia, de jornalismo, que passaram a atrair multidões de jovens sem um perfil muito definido quanto à carreira desejada ou suas aspirações concretas. O modismo, como tudo a cada época, um dia vem abaixo… Mas é também possível que os patamares de demanda sejam mantidos ou até ampliados, pois há certas “modas” que não passam, seja por uma demanda regular – como ocorre hoje com os cursos de jornalismo – seja porque a globalização é mesmo irrefreável e contínua, um “universo em expansão”...

5. O que diferencia o curso de RI dos cursos de comércio exterior e de direito e economia internacionais?

PRA: Não existem cursos de “economia internacional”, apenas de economia, tout court, assim como no direito, embora os egressos desses cursos possam buscar, nos últimos semestres, algum tipo de especialização informal dentro desses campos em suas respectivas áreas. Comércio exterior se apresenta hoje como uma orientação relativamente técnica, algo assim como “contador”, embora seja uma área que requeira e deva contar com estudos aperfeiçoados, que aliás podem estar dentro de alguns cursos de relações internacionais – que assim exibiriam especializações mais para “ciência política” ou mais para economia internacional, segundo o gosto do cliente.

Acredito mesmo que no decurso da sedimentação necessária e natural dos cursos de relações internacionais nas diferentes regiões do país, essas orientações geográfico-espaciais ou essas inclinações temáticas acabarão emergindo progressivamente. Ou seja, pode-se conceber cursos de relações internacionais voltados para o agronegócio nas principais regiões produtoras de commodities demandadas pelo mercado mundial, cursos voltados para a diplomacia e a pesquisa nas ciências sociais em algumas grandes capitais, outros cursos voltados para o comércio exterior e a integração regional nas regiões mais “expostas” aos processos sub-regionais de integração e assim por diante.

6. O aumento de ofertas para o curso de RI em diversas faculdades públicas e particulares poderia significar que a procura é alta para a carreira?

PRA: A procura ainda é alta por uma espécie de ilusão dos jovens quanto ao “charme” e a oferta de empregos nessa área, pelo efeito do já mencionado “modismo”, ou porque o Brasil está mesmo deslumbrado com a globalização, ingressante tardio – e incompleto – que foi nos grandes circuitos da interdependência global. Não imagino que a demanda venha a se manter nos próximos anos, seja porque haverá um “plafonnement” e queda ulterior, seja porque o ritmo de crescimento tenderá a diminuir, ao descobrirem, muitos egressos, que os cursos não são assim tão “funcionais” para as necessidades de uma carreira concreta, seja porque a oferta, como sempre ocorre, supera a demanda efetiva. Não deve ocorrer, aqui, nenhum “keynesianismo” avant la lettre, pois o governo não parece estar em condições de garantir demanda efetiva numa área que não aparece como prioritária em termos de recursos humanos.

Resumindo: a procura, a jusante, não é alta, mas sim está ocorrendo um crescimento da oferta de cursos para atender uma demanda pré-existente, a montante, portanto. O mercado deverá ajustar oferta e procura dentro em breve. De toda forma, não existe UMA carreira de relações internacionais, e sim diferentes “carreiras” – ou melhor, oportunidades de emprego – que vão se ajustando aos nichos existentes, muito diversos entre si. Como a profissão não é regulamentada, nem tem chances de sê-lo muito em breve, persistirá essa relativa indefinição do que é “carreira” ou “especialização” em relações internacionais.

7. O jovem passou a se interessar mais por assuntos relacionados ao mundo?

PRA: Certamente. O bebê já nasce ouvindo teclado de computador, e a internet, como as demais tecnologias de informação, permeia a vida das pessoas desde tenra idade. Não há como escapar, hoje, dos apelos do mundo. Mesmo que algum jovem não tenha o mínimo interesse por “coisas” do mundo, o mundo vem inevitavelmente até ele, pelos mais diferentes caminhos e meios. Ninguém escapa…

8. Os atentados de 11 de Setembro e as subseqüentes guerras no Afeganistão e no Iraque podem ter tido alguma influência no aumento de interesse por Relações Internacionais?

PRA: Provavelmente, mas não mais do que MP3, celular, internet de modo geral. Há hoje uma crescente interpenetração entre o nacional e o mundial, todo dia franquias estrangeiras vêem se estabelecer no Brasil, as viagens internacionais são cada vez mais freqüentes e acessíveis, o inglês tornou-se obrigatório para o simples exercício (e vício) preguiçoso do “cut and paste” para os trabalhos escolares, enfim, o mundo vem até nós, aos borbotões. É natural que cresçam e apareçam as profissões e especializações ligadas às relações internacionais, mas os interesses e as oportunidades são ainda muito difusos.

9. Certos cursos, como direito e administração, são opções de vestibular para muitos adolescentes que não sabem exatamente o que querem fazer da vida. Por abranger muitas áreas, a carreira de RI não acaba atraindo mais jovens indecisos?

PRA: Exatamente: direito e administração oferecem amplas possibilidades para todos os tipos de vocações, por vezes sequer diretamente relacionadas com os campos temáticos dessas duas áreas. As RI podem, também, oferecer muitas possibilidades, mas, à diferença das duas primeiras, elas não constituem uma profissão reconhecida, “testada” no mercado e expressamente demandadas pelos mercados ou pelas empresas. Essa pequena diferença pode ser decisiva na inserção profissional dos jovens: entre o certo de uma profissão tradicional e o incerto de um campo novo, talvez seja o caso de ficar com o certo. O problema é que o Brasil é um país dotado de muito pouco empreendedorismo, a despeito da tremenda flexibilidade de sua mão-de-obra, revelada na grande capacidade adaptativa e nos esquemas informais que permeiam os mercados de trabalho (existem vários, do mais inserido ao totalmente informal). Uma pesquisa na escola média revelaria, provavelmente, que poucos jovens aspiram lançar o seu próprio negócio, a maior parte deles estando voltada para cursinho ou estudo para algum concurso, qualquer um, em carreira dotada de estabilidade.

Esse problema da “indecisão” dos jovens pode hoje estar levando muito deles para as RI, assim como no passado os jovens “revolucionários” eram atraídos pela sociologia – segundo Mário de Andrade, a “arte de salvar rapidamente o Brasil” – e as jovens casadoiras eram levadas a fazer psicologia, esperando marido… Hoje se faz RI, porque protestar contra a “globalização perversa” virou esporte quase obrigatório entre os jovens…

10. Com tanta oferta de cursos, há espaço suficiente para o profissional em RI no mercado?

PRA: Certamente tem ocorrido certa “inflação” de cursos, mas nisso os próprios demandantes levam a culpa: eles “pediram” e os empresários da educação correram para atender essa demanda do mercado de estudantes. Esses “industriais da educação” não estão minimamente preocupados com o espaço do “profissional” de RI – se é possível chamá-lo assim – no mercado de trabalho, esse não é o “departamento” deles. Sua função é a de apenas “fornecer” aquilo que lhes é pedido: um curso e um canudo, depois cada um que se vire como puder num mercado indefinido. Ou seja, num estamos num “supply side economics of international relations”, mas essencialmente num mercado demandante por cursos e canudos, o resto fica ao sabor do próprio mercado…

11. O mercado e as empresas estão preparados para entender o que é profissional de RI?

PRA: A pergunta deve ser completamente invertida: nem os mercados, nem a fortiori as empresas precisam estar “preparados para entender o que é profissional de RI”. Essa não é função deles. Sua única função é recrutar competências para o exercício de atividades profissionais específicas e os requerimentos são estritos: ou o profissional se adapta e atende ao que lhe é demandado, ou então ele pode procurar outro emprego. Por isso, volto a insistir: as empresas, na maior parte das vezes, não querem intelectuais brilhantes que sabem discorrer sobre o Conselho de Segurança da ONU ou o último livro do Keohane, elas querem alguém que saiba redigir um contrato, negociar um acordo com parceiro de outro país, fazer uma boa prospecção de mercado, trazer negócios, lucros e resultados, ponto. Este é o mercado, que deve ocupar pelo menos 80% dos egressos dos cursos de RI, qualquer que seja o seu número (o resto indo para os governos e as academias).

Quem deve entender as (e de) empresas e o (de) mercado são esses profissionais, que se não souberem lidar com essas realidades, se auto-excluem dos melhores empregos nesses mercados. Não é uma questão de preferência, é assim, ponto. As empresas não vão à cata de jovens egressos dos cursos de RI, eles é que devem tentar se oferecer para elas.

Os jovens precisam, desde o início, tomar consciência de que, ao receber o canudo, ao saírem das faculdades, não vai haver uma fileira de “head hunters” esperando por eles na calçada, não haverá sequer um mísero recrutador esperando por eles para dizer: “Venha, meu jovem, tenho um emprego esperando por você!”. Isso simplesmente não vai acontecer. Ou eles se preparam, desde o segundo ou terceiro ano, fazendo estágios, montando empresas juniores com seus colegas, pesquisando por conta própria novos nichos de mercado, ou eles vão ficar de canudo na mão reclamando da vida.

Se eu fosse um jovem, hoje, e não um diplomata com 28 anos de carreira, mas ainda disposto a diversificar no privado (ensino e pesquisa, eventualmente consultoria), eu me perguntaria: “qual é o meu nicho no mercado futuro, o que o Brasil ou o mundo me reserva, dentro de dois ou três anos?” Uma breve pesquisa de internet me daria a resposta em 5 minutos, ou a minha própria vontade e vocação determinariam o meu destino imediato. Abstraindo-se a própria carreira diplomática – excessivamente restrita para servir de “colocação” para um grande número de jovens – e algumas outras carreiras no serviço público – analistas de comércio exterior ou de inteligência – e nas academias, o que sobra, obviamente, como “opção” são as empresas, grandes e pequenas. Eu até diria que o “profissional” de RI poderia montar a sua própria, mas o empreendedorismo individual ainda é muito pouco desenvolvido no Brasil.

Nessa perspectiva, é óbvio que um jovem paulistano precisa ter uma visão “global business”, é evidente que um jovem do “cerrado central” precisa pensar no Brasil como o grande fornecedor mundial – o que ele já é, mas será cada vez mais – de produtos do agronegócio, é evidente que aqueles que amam praia, sol, florestas e montanhas encontrarão excelentes oportunidades no turismo de massa ou especializado, está mais do que claro que o Brasil tem um imenso campo em todas as áreas nas novas energias renováveis, na exploração dos recursos naturais, na conformação de um espaço integrado na América do Sul. Se eu fosse jovem e quisesse ganhar muito dinheiro, eu já estaria estudando todas essas oportunidades. Tudo isso É relações internacionais, tudo isso é interdependência global, tudo isso é globalização. Quanto antes o jovem se preparar, e não ficar passivamente esperando o fim do curso para depois pensar no que vai fazer, será melhor para ele e para suas famílias.

Desse ponto de vista, acho, particularmente, que os cursos, atuais, das faculdades voltadas para esse campo, e seus respectivos professores, estão muito pouco preparados para atender essa demanda. Trata-se de uma demanda real, não daqueles requisitos prosaicos de uma grade curricular tradicional, que copia passivamente a inércia “humanistóide” dos cursos tradicionais das universidades públicas – em ciências sociais em geral, mas fazendo uma combinação de direito, história, economia e ciência política – que, elas, parecem não ter nenhum compromisso com os mercados reais. Talvez os jovens não encontrem o curso ideal nem nas faculdades privadas nem nas públicas. O melhor, então, seria que eles “construam”, sozinhos, e de maneira absolutamente auto-didática (se possível com os colegas), os seus próprios “cursos”. Talvez eles não sejam melhores, em qualidade imediata, do que aqueles oferecidos oficialmente pelas instituições de ensino, mas eles certamente serão mais adaptados e estarão mais conformes às aspirações e necessidades dos próprios jovens.

Acho que é hora de deixar de ser passivos: arregacem as mangas, jovens, mãos à obra, construam suas próprias vidas!

Paulo Roberto de Almeida
(www.pralmeida.org)
Brasília, 22-23 de março de 2006

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Eis o que me escreveu uma jovem estudante, em 19.03.2010:

Caro Paulo Roberto,

Li por acaso seu texto [acima] escrito em 2006. Gostei bastante. Não imaginava que já houvesse alguem que tivesse escrito sobre o (que poderíamos chamar de) DRAMA de um recém formado em relações internacionais. Na verdade formo em RI em junho deste ano, mas já me adiantei em começar a pós em Direito Internacional, pensando assim me especializar em uma área e futuramente apostar nela.

Hoje depois da aula da Pós-graduação (85% são alunos do segmento de Direito, e não de RI), houve uma feira na faculdade de empresas fazendo banco de talentos, buscando jovens para encaixar nas vagas de estágio/emprego e etc. É sim uma frustração não poder ser aceita em NENHUM ramo, porque as vagas requerem o preenchimento dos quadrinhos limitados a cursos "tradicionais" como direito, contábeis, administração...é o feijão com arroz sem muita complicação.

Isso não tira o meu orgulho em estar formando no curso, até porque desde o início já sabia que o campo das RI´s em relação a emprego é limitado, e quase sempre nosso futuro é "catar" as vagas dos de administração, economia, ciência política, direito e afins.

Me resta seguir em frente, na esperança de que ao menos os alunos do futuro possam ser mais "procurados" ao invés de ter que "procurar" tanto.
No mais, vou continuar na luta, e (como você disse) "arregaçando as mangas", pois quem não procura não acha. Quem não constrói seus futuro e não vai atrás, não colhe nada. E isso é simples como uma expressão matemática.

Muitíssimo obrigada...