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segunda-feira, 31 de dezembro de 2018

O politicamente correto nada mais é do que censura, pura e simples - Julian Adorney

O politicamente correto ataca um direito humano básico: a liberdade de pensamento e de expressão.
Blog Do Orlando Tambosi / by Orlando Tambosi / 31/12/2018

"A liberdade de expressão é o mecanismo por meio do qual a sociedade evoluiu. É em decorrência da liberdade de expressão e da capacidade de articular idéias que as pessoas conseguem apontar problemas, explicá-los, solucioná-los e tentar chegar a um consenso". Artigo de Julian Adorney, publicado pelo Instituto Mises Brasil:


O ser humano é um animal dotado da capacidade de raciocinar, imitar e imaginar. Mas não só. Ele é também um animal dotado da capacidade de verbalizar e comunicar suas idéias com o propósito de persuadir seus interlocutores, trocar informações com eles ou, simplesmente, expressar suas emoções.

A capacidade de se expressar de maneira complexa e argumentada constitui um traço distintivamente humano — o qual, ademais, é em grande medida responsável pelo nosso progresso civilizatório.

Mais ainda: a capacidade de se expressar livremente é o mecanismo por meio do qual o ser humano mantém a sociedade funcionando.

É em decorrência da liberdade de expressão e da capacidade de articular idéias que as pessoas conseguem apontar problemas, explicá-los, solucioná-los e tentar chegar a um consenso.

Mas há o outro lado: a transmissão de idéias também representa um foco potencial de conflitos entre os seres humanos. Um determinado conjunto de idéias — sobretudo quando estas não fazem parte de nossa identidade cultural — pode nos parecer rechaçáveis, criticáveis ou mesmo repugnantes. Ou seja, as idéias não só nos seduzem, como também podem nos molestar. E, em ocasiões, podem nos molestar sobejamente.

E isso é inevitável: por ser capaz de pensar e de se expressar, o ser humano sempre poderá soar ofensivo a terceiros.

A evolução se deu por meio do debate aberto

Durante séculos, os indivíduos chegaram ao ponto de se enfrentar mutuamente, até o extremo de se aniquilarem, por causa das idéias. As guerras religiosas foram, em última instância, guerras sobre idéias: sobre concepções heterogêneas (e contrapostas), acerca da transcendência, pelas quais muitos estavam dispostos a morrer e a matar.

A forma que socialmente descobrimos para evitar nos enfrentarmos e nos agredirmos por causa de nossas idéias díspares foi a tolerância mútua: um programa ideológico que politicamente se cristalizou naquilo que hoje chamamos de 'liberalismo' — "uma tecnologia para evitar a guerra civil", como, de maneira clarividente, definiu o filósofo Scott Alexander.

As idéias liberais nos ensinaram o segredo para podermos conviver em paz: aceitarmos tolerar mutuamente as idéias díspares e incorrermos em argumentações racionais para resolver nossas discordâncias. Foi assim que a civilização evoluiu.

A censura estimula a intolerância

Obviamente, nosso desafio sempre foi tolerar aquelas idéias ou expressões alheias que nos ofendem, e não aquelas que nos agradam e entusiasmam. Somos tolerantes quando respeitamos o dissenso, e não quando recriamos o consenso. E somos mais propensos a tolerar as idéias alheias quando os demais toleram as nossas: se um grupo de pessoas vê suas idéias sendo silenciadas e censuradas, ele perde toda a razão estratégica para tolerar as idéias alheias.

Consequentemente, quando um grupo politicamente influente consegue instituir a censura sobre aquelas idéias alheias que consideram ofensivas, essa ação bem-sucedida começa a atrair imitadores: a tendência natural é que outros indivíduos que também se sentem ofendidos por outras idéias passem a exigir a censura dessas idéias. Como consequência, o debate vai se tornando cada vez mais manietado.

Pior: quando um grupo vê suas idéias sendo censuradas, a tendência é que ele redobre a aposta em suas idéias, tornando-as ainda mais agressivas, podendo se degenerar em violência física.

Assim, qualquer sociedade que opte pela censura, ainda que branda, está continuamente colocando em xeque a resistência de seus pactos implícitos em torno da liberdade de expressão.

Em última instância, a tolerância mútua é, em certa medida, um equilíbrio potencialmente muito frágil: quando um grupo sente que suas idéias já são suficientemente toleradas pelos demais, ele pode, de um lado, se limitar a tolerar as idéias alheias; mas, de outro, pode também cair na tentação oportunista de tentar censurar marginalmente aquelas idéias ou expressões de terceiros que lhes ofendem, causando ainda mais distúrbios.

Esse tem sido o caminho escolhido pelos adeptos do politicamente correto.

O politicamente correto como ferramenta de controle

O adjetivo 'politicamente correto' é usado para descrever linguagens ou ações que devem ser evitadas por serem vistas como 'excludentes' ou 'ofensivas'.

Em tese, o politicamente correto defende a censura de idéias que marginalizam ou insultam grupos de pessoas tidos como desfavorecidos ou discriminados, especialmente grupos definidos por gênero, raça ou preferências sexuais.

No entanto, ao defender a censura de idéias consideradas "ofensivas", o politicamente correto nada mais é do que uma ferramenta criada para intimidar e restringir a liberdade de expressão. Ao proibir a livre manifestação de idéias a respeito de uma miríade de assuntos, o politicamente correto funciona como uma linha de montagem mecanizada, cujo objetivo é padronizar e homogeneizar as ideias dos indivíduos, fazendo-os pensar e agir sempre de modo uniforme.

Para o politicamente correto, um debate aberto e sem censura, além de ofensivo para as minorias, é também subversivo, inflamatório e gerador de discórdias, devendo por isso ser censurado. Mas isso atenta contra a lógica básica. O debate aberto é algo que, por definição, estimula a análise crítica e impede a uniformidade (e a hegemonia) intelectual. O debate aberto e sem censura evita a predominância do chamado "pensamento de manada", garantindo assim uma voz exatamente para os grupos mais marginalizados e excluídos — os quais, em tese, são o alvo da preocupação do politicamente correto.

Se o indivíduo não mais tiver a liberdade de falar o que pensa, ele não mais será capaz de pensar. Como bem disse o psicólogo Jordan Peterson, a liberdade de expressão é suprema e está acima do "direito" de alguém de não se sentir ofendido. Com efeito, não há o "direito de não ser ofendido" simplesmente porque isso, caso realmente fosse impingido, levaria à extinção do próprio pensamento: o ser humano, por ser capaz de pensar, sempre poderá soar ofensivo a alguém. Querer proibir a expressão do pensamento significa proibir o próprio ato de pensar.

Conclusão (e um teste)

No final, o que temos hoje é apenas uma defesa simétrica da liberdade de expressão: só é lícito aquilo que me agrada. Aquilo que me ofende deve ser proibido.

Só que defender a liberdade de expressão de minhas idéias não é mérito nenhum. Tampouco representa qualquer utilidade social. O verdadeiro mérito está em defender a liberdade de expressão daqueles que nos ofendem profundamente, e então vencê-los no debate por meio da razão. A censura prévia é simplesmente o método a que recorrem os intelectualmente incapazes.

No geral, se você é de esquerda e defende censura e punição àquilo que você considera "discurso de ódio da direita", você está apenas defendendo o privilégio da sua seita de abolir a expressão das idéias alheias. E vice-versa. A universalidade da liberdade de expressão não existe para proteger aquilo que nos agrada, mas sim para proteger da censura aquilo que nos ofende.

Caso cedamos ao encanto de censurar aquilo que nos desagrada, em vez de criarmos uma plataforma que estimule o desenvolvimento do indivíduo por meio do raciocínio lógico, do questionamento e dos diálogos estimulantes, estaremos apenas criando robôs com pensamentos padronizados e homogeneizados.

Abrir a Caixa de Pandora da censura pode acabar estimulando outros grupos a fazerem exatamente o mesmo, acabando assim com a liberdade geral de expressão e com toda a nossa capacidade de debate baseado na razão. Com efeito, estaremos atacando a nossa própria capacidade de raciocínio.

Não há mágica: o livre intercâmbio de informações e idéias é crucial para o progresso de uma sociedade livre. Por isso, toda a forma de "polícia do pensamento" deve ser abolida.

Por fim, um teste: alguns países europeus, como a Alemanha, transformaram em crime o "discurso de ódio" (hate speech) na internet. Na prática, as mídias sociais (Google, Facebook e Twitter) serão severamente multadas caso permitam que seus usuários façam "discursos de ódio" em suas plataformas.


Por uma questão de lógica, isso implica que agora é ilegal odiar Hitler e o Holocausto na internet. Também significa que o marxismo — que fomenta o ódio dos assalariados aos capitalistas, estimulando o assassinato de capitalistas — se tornou ilegal. Você apóia?

Um presidente mentiroso que quebra o seu próprio recorde de mentiras: quem seria?

Bem, pelo menos começaremos o ano com o presidente contado 0 km de mentiras. Vamos seguir para fazer como o Washington Post em relação ao super-hiper-mega mentiroso do Trump: ele consegue contar 15 mentiras POR DIA.
Nunca antes na história daquele país, o cargo de presidente tinha descido tão baixo na escala da mentira, das falcatruas, das manipulações, dos exageros, das trapaças deliberadas, um caso patológico, sem nenhuma dúvida.
Vamos criar um mentirômetro similar para o caso do Brasil...
Paulo Roberto de Almeida
Tubarão, 31/12/2018

A year of unprecedented deception: Trump averaged 15 false claims a day in 2018

The Washington Post, December 31, 2018

President Trump’s year of lies, false statements and misleading claims started with some morning tweets.
Over a couple of hours on Jan. 2, Trump made false claims about three of his favorite targets — Iranthe New York Times and Hillary Clinton. He also took credit for the “best and safest year on record” for commercial aviation, even though there had been no commercial plane crashes in the United States since 2009 and, in any case, the president has little to do with ensuring the safety of commercial aviation.
The fusillade of tweets was the start of a year of unprecedented deception during which Trump became increasingly unmoored from the truth. When 2018 began, the president had made 1,989 false and misleading claims, according to The Fact Checker’s database, which tracks every suspect statement uttered by the president. By the end of the year, Trump had accumulated more than 7,600 untruths during his presidency — averaging more than 15 erroneous claims a day during 2018, almost triple the rate from the year before.
Even as Trump’s fact-free statements proliferate, there is growing evidence that his approach is failing.
Fewer than 3 in 10 Americans believe many of his most-common false statements, according to a Fact Checker poll conducted this month. Only among a pool of strong Trump approvers — about 1 in 6 adults in the survey — did large majorities accept several, though not all, of his falsehoods as true.
Similarly, a November Quinnipiac poll found 58 percent of voters saying Trump wasn’t honest, compared with just 36 percent who said he was honest. The same poll found 50 percent saying he is “less honest” than most previous presidents, tying his own record for the highest share of registered voters saying so in Quinnipiac polling.
“When before have we seen a president so indifferent to the distinction between truth and falsehood, or so eager to blur that distinction?” presidential historian Michael R. Beschloss said of Trump in 2018.
Beschloss noted that the U.S. Constitution set very few guidelines in this regard because the expectation was that the first president would be George Washington and he would set the tone for the office. “What is it that schoolchildren are taught about George Washington? That he never told a lie,” the historian said. “That is a bedrock expectation of a president by Americans.”
President Trump speaks at a roundtable in the Roosevelt Room of the White House on Dec. 18, 2018 in Washington. (Jabin Botsford/The Washington Post)
Trump began 2018 on a similar pace as last year. Through May, he generally averaged about 200 to 250 false claims a month. But his rate suddenly exploded in June, when he topped 500 falsehoods, as he appeared to shift to campaign mode. He uttered almost 500 more in both July and August, almost 600 in September, more than 1,200 in October and almost 900 in November. In December, Trump drifted back to the mid-200s.
Trump’s midsummer acceleration came as the White House stopped having regular press briefings and the primary voice in the administration was Trump, who met repeatedly with reporters, held events, staged rallies and tweeted constantly.
Trump is among the more loquacious of recent presidents, according to Martha Kumar, professor emerita at Towson University, who has kept track of every presidential interaction with the media, dating to Ronald Reagan. Through Dec. 20, Trump held 323 short question-and-answer sessions with reporters, second only to Bill Clinton through the first 23 months, and granted 196 interviews, second to Barack Obama.
More than a quarter of Trump’s claims were made during campaign rallies. On Nov. 5, the day before the midterm elections, for instance, Trump held three rallies, yielding a total of 139 false or misleading claims. A review of every statement made by Trump at two of his earlier 2018 rallies found that he exaggerated or made up at least 70 percent of his assertions.
Almost as many false claims came during remarks at press events, and about 17 percent were the result of his itchy Twitter finger.
The president misled Americans about issues big and small. He told lies about payments that his now-convicted attorney says Trump authorized to silence women alleging affairs with him. He routinely exaggerates his accomplishments, such as claiming that he passed the biggest tax cut everpresided over the best economy in historyscored massive deals for jobs with Saudi Arabia and all but solved the North Korea nuclear crisis.
He attacks his perceived enemies with abandon, falsely accusing Clinton of colluding with the Russiansformer FBI Director James B. Comey of leaking classified information and Democrats of seeking to let undocumented immigrants swamp the U.S. borders.
The president often makes statements that are disconnected from his policies. He said his administration did not have a family separation policy on the border, when it did. Then he said the policy was required because of existing laws, when it was not.
The president also simply invents faux facts. He repeatedly said U.S. Steel is building six to eight new steel plants, but that’s not true. He said that as president, Obama gave citizenship to 2,500 Iranians during the nuclear-deal negotiations, but that’s false. Over and over, Trump claimed that the Uzbekistan-born man who in 2017 was accused of killing eight people with a pickup truck in New York brought two dozen relatives to the United States through “chain migration.” The real number is zero.
President Trump answers questions as he walks to board Marine One at the White House on Nov. 20, 2018. (Jabin Botsford/The Washington Post)
In one of his more preposterous statements of 2018, Trump labeled the Palm Beach Post as “fake news” for blaming him for traffic jams across the nation — when an article about the effect of low gas prices on driving habits never mentioned his name.
Sometimes, Trump simply attempts to create his own reality.
When leaders attending the U.N. General Assembly burst into laughter when Trump uttered a favorite false claim — that his administration had accomplished more in less than two years than “almost any administration in the history of our country” — the president was visibly startled and remarked that he “didn’t expect that reaction.” But then he later falsely insisted to reporters that the boast “was meant to get some laughter.”
In an October interview with the Wall Street Journal, Trump emphatically denied he had imposed many tariffs. “I mean, other than some tariffs on steel — which is actually small, what do we have? . . . Where do we have tariffs? We don’t have tariffs anywhere,” he insisted. The newspaper responded by printing a list of $305 billion worth of tariffs on many types of U.S. imports.
Trump exaggerates when the facts are on his side.
He routinely touts a job-growth number that dates from his election, not when he took office, thus inflating it by 600,000 jobs. And although there’s no question Trump can draw supporters to his rallies by the thousands, he often claims pumped-up numbers that have no basis in fact. At a Tampa rally, he declared that “thousands of people” who could not get in were watching outside on a “tremendous movie screen.” Neither a crowd of that size nor the movie screen existed.
The president even includes references to The Fact Checker in his dubious remarks.
On Oct. 18, in Missoula, Mont., Trump falsely said that no one challenges his description of the Democrats as the party of crime. “Democrats have become the party of crime. It’s true. Who would believe you could say that and nobody even challenges it. Nobody’s ever challenged it,” he said.
But then he had an unusual moment of doubt. “Maybe they have. Who knows? I have to always say that, because then they’ll say they did actually challenge it, and they’ll put like — then they’ll say he gets a Pinocchio.”

Meg Kelly and Salvador Rizzo contributed to this report.

Embaixada em Jerusalem: alerta precoce - Paulo Roberto de Almeida

Vou voltar à questão da mudança da embaixada brasileira junto ao governo de Israel, uma vez que o assunto não saiu dos debates durante um ano inteiro, e volta agora a estar entre os temas prioritários de discussão, a partir da visita do primeiro ministro israelense ao Brasil para a posse do novo governo. Creio ter sido um dos primeiros a fazer um alerta quanto à inconveniência de tal gesto, com base em argumentos facilmente inteligíveis para qualquer um, isso imediatamente após ter lido a primeira matéria sobre o assunto, em fevereiro de 2018.
Vou reproduzir tal qual a nota que elaborei poucos dias depois de tomar conhecimento dessa possibilidade, ou no próprio dia em que a li, sem ter tido tempo de checar todas as informações a respeito, como por exemplo, os volumes e os valores envolvidos na exportação de carne halal para os mercados do Oriente Médio, e para países muçulmanos de forma geral.
Acredito, como ainda há pouco comentei numa postagem de um amigo no Twitter, que se trata de uma inutilidade diplomática, uma coisa de amadores em assuntos de política externa, gente que tem pouco conhecimento do contexto econômico e diplomático, e que fazem propostas inúteis, até descabidas, sem ter consciência das diversas dimensões do problema, que nem deveria existir: foi criado sem qualquer fundamento em posturas que o Brasil deveria observar no plano de suas relações exteriores.
Posto a mesma nota que havia feito na ocasião, sem mudar uma única vírgula.
Paulo Roberto de Almeida
Curitiba, 31 de dezembro de 2018

Um alerta sobre uma delicada questão diplomática: o caso de Israel

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 23 de fevereiro de 2018
 [Objetivo: chamar a atenção para uma questão delicada; finalidade: o estatuto de Jerusalém como capital de Israel; inadequação aos interesses brasileiros] 

Introdução
Recentemente, um órgão da imprensa brasileira (Revista Piauí, 19/02/2018), trouxe uma matéria sobre o crescente apoio político ao pré-candidato Jair Bolsonaro, vindo de meios simpáticos à causa de Israel entre círculos de empresários judeus de São Paulo: “Empresários paulistas contam porque apoiam Bolsonaro” (disponível neste link: http://piaui.folha.uol.com.br/empresarios-paulistas-contam-por-que-estimulam-bolsonaro/). A alegação para o apoio era a de que o candidato seria o único, dentre os já declarados, a ser “favorável a Israel”. A justificativa foi explícita: “É pessoalmente comprometido com o Estado de Israel”. Supõe-se que a mesma justificativa para o apoio a esse candidato possa vir, oportunamente, da já respeitável bancada evangélica no Congresso brasileiro, apoiadora incondicional de Israel, e que representa uma fração não desprezível, talvez até mais de 30%, do eleitorado brasileiro.
É importante chamar a atenção, e fazer um alerta preventivo, quanto ao caráter indesejável de se introduzir essa questão no debate político-eleitoral, por uma tripla preocupação a partir de minha posição como diplomata, mas também como eleitor, ou simples cidadão brasileiro: a inadequação de se introduzir um tema religioso no debate político; sua problemática dimensão diplomática, tendo em vista a posição tradicional do Brasil no tocante a Israel e à questão do status de Jerusalém; os possíveis efeitos desastrosos, no plano comercial-econômico, de uma tomada de posição deste candidato, ou de quaisquer outros, quanto a uma possível mudança de postura diplomática do Brasil, no seguimento da decisão da administração Trump de efetuar o deslocamento da embaixada dos EUA em Israel de Tel Aviv a Jerusalém.

A dimensão religiosa
A Constituição brasileira reconhece a validade, a legitimidade e a liberdade de todas as expressões religiosas no seio da sociedade, sem qualquer tipo de preferência ou discriminação. O Estado, porém, é laico, e não poderia deixar suas políticas públicas, mormente suas posturas diplomáticas, serem influenciadas por demandas específicas de um credo religioso qualquer, sob risco de ser acusado de introduzir a temática religiosa na esfera das grandes definições estatais, especialmente diplomáticas, que devem ficar necessariamente autônomas e independentes de preferências expressas no âmbito de um grupo religioso determinado, por mais influente ou majoritário que este possa ser. O antigo país católico romano que é o Brasil já traz uma crescente diversidade religiosa, e um crescimento visível das afiliações evangélicas, com poder suficiente para influenciar tomadas de decisão políticas na esfera do parlamento, sob a justificativa de que podem expressar correntes relevantes da opinião pública.
Esse parece ser o caso da bancada evangélica, comprometida com uma série de objetivos nos planos ético ou moral – casos do aborto, das opções de gênero, do chamado “casamento homossexual”, etc. –, no plano médico-científico – experimentos com células-tronco, por exemplo –, na esfera educacional – ensino de criacionismo ao lado da teoria da seleção natural – ou ainda, e mais importante para este argumento, a questão de Israel, não como Estado soberano, como qualquer outro, na comunidade internacional, mas como o representante legítimo da “palavra de Deus” na Terra. 
Seria conveniente que tal preferência religiosa não se traduzisse em qualquer pressão sobre o Estado brasileiro, especificamente sobre sua política externa, no caso concreto do reconhecimento de Jerusalém como “capital verdadeira” do Estado de Israel e na eventual transferência da embaixada do Brasil a essa cidade, considerada como “internacional” por ampla maioria dos países membros da ONU, e assim tem sido historicamente. O Brasil tem orgulho de ter sido um dos patrocinadores da criação do Estado de Israel, na famosa partilha da ONU de 1947, prevendo a criação de um estado palestino e a “neutralização” de Jerusalém como cidade comum a diversos credos. Uma interferência desse tipo sobre uma política pública seria, no limite, inconstitucional e extremamente controversa no plano diplomático, como agora argumentado.

A dimensão diplomática
Durante toda a história recente do Oriente Médio, e no acompanhamento dos dramáticos conflitos que ocorrem na região, a postura dos diferentes governos do Brasil desde o nascimento do Estado de Israel, tem sido a de apoio político e diplomático à sua existência, reconhecendo porém a necessidade de cumprimento escrupuloso de decisões da Organização das Nações Unidas, e de seu órgão de segurança, quanto ao equilíbrio necessário para se reconhecer os direitos do povo palestino a um Estado soberano, legalmente constituído. Jerusalém dispõe de um status especial, não sendo reconhecida como capital de Israel, a despeito de tentativas de parte do espectro político israelense e de grupos de apoio na esfera religiosa ao redor do mundo. Essa questão foi novamente trazida a exame pela comunidade internacional em face da decisão do presidente Trump de instalar sua embaixada naquela cidade, como “capital de Israel”, no que pode ser eventualmente seguido por iniciativas similares de um punhado de países. 
Não convém ao Brasil, país de tradicional acolhimento de imigrantes de todos os credos e origens raciais, e diplomaticamente um seguidor estrito do direito internacional em todas as vertentes de sua política externa, “importar” uma controvérsia de duvidosa legitimidade política ou diplomática, que não contribuiria em nada para consolidar o seu capital de parceiro imparcial de todos os atores e protagonistas dos dramas do Oriente Médio, quando sua postura tradicional tem sido, justamente, a de “exportar” apelos ao diálogo e à solução pacífica das controvérsias políticas e diplomáticas.
Qualquer pronunciamento de um dos candidatos à presidência do Brasil nessa questão teria o efeito de suscitar controvérsias internas e de colocar um problema no plano diplomático que atualmente inexiste, e deveria permanecer dessa forma. Não convém ao Brasil criar pontos de atrito ou fricções diplomáticas com Estados da região que possuem significativo contingente de expatriados, atualmente naturalizados e totalmente integrados à comunidade nacional, quando seu maior capital diplomático nos problemas do Oriente Médio é justamente a equidistância entre as partes em conflito.

A dimensão econômico-comercial
O Brasil é hoje um dos maiores fornecedores de grãos e carnes, dada a pujança de seu agronegócio, para diferentes mercados do mundo, destacando-se especialmente como um grande exportador de cortes avícolas no sistema “halal” para mercados árabes e muçulmanos em geral. Essa atividade representa bilhões de dólares em exportações, milhares de empregos no Brasil e um dos mais significativos nichos de competitividade nacional nos mercados externos, com perspectivas futuras ainda mais promissoras no comércio internacional do país. Disso deriva que qualquer tomada de posição do Brasil na questão de Jerusalém, ou mesmo de inflexão diplomática de sua postura equilibrada no sentido de maior apoio a Israel, poderia precipitar consequências políticas de grande impacto econômico e social nas regiões exportadoras de cortes especiais para mercados do Oriente Médio ou do mundo muçulmano. 
Cabe, assim, alertar preventivamente quanto à dimensão do problema em causa.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 23 de fevereiro de 2018

Agradecimentos aos meus leitores - Paulo Roberto de Almeida

Agradecimentos aos meus leitores

Paulo Roberto de Almeida
 [Objetivo: agradecimento; finalidade: encerrar o ano] 

Este é o meu último texto (pelo menos acredito), antes de encerrar-se o ano de 2018, extremamente prolífico no plano individual, produtivo no plano profissional, prazeroso no plano intelectual, gratificante em termos de reconhecimento público e exposição nos diversos meios nos quais mantenho interação mais ou menos regular.
Esta é apenas uma nota de agradecimento aos meus leitores – que não sei exatamente quantos seriam – aos comentaristas, novos e habituais que me leram ou leem em algumas das ferramentas sociais de que fiz uso em 2018, aos visitantes ocasionais e aos novos relacionamentos que adquiri ou consolidei num ano especialmente intenso em manifestações públicas de minha parte, que alcançaram, ao que parece, certo impacto ou repercussão nos meios que frequento e nos que fui levado a me expressar (foros de debates, universidades, instituições públicas e privadas). Quero expressar publicamente meu sincero agradecimento a todos aqueles que receberam, reagiram, comentaram, dissentiram, aprovaram os meus muitos textos divulgados pelos canais mais frequentes de comunicação que utilizei neste ano de 2018, que agora vem a termo.
Meu blog, em primeiro lugar, hoje um tanto passivo, depois de um “acidente” – provocado inteiramente por inépcia do provedor anterior – que me obrigou a me transportar, com “armas e bagagens”, a um novo provedor, uma nova plataforma, com novas ferramentas, as quais, por inépcia deste escrevinhador, eu não sou capaz de dominar inteiramente ou facilmente. Assim, a plataforma www.pralmeida.org, que existe há praticamente duas décadas, nesse mesmo endereço e domínio, sofreu várias mudanças, e praticamente vem sendo utilizada mais como uma biblioteca de referência, do que como um instrumento de comunicação. Os leitores podem ali descobrir tudo o que produzi ao longo de meio século de atividade escrevinhadora, mas nem tudo estará linkado dinamicamente, embora a maior parte dos textos possa estar disponível no meu blog (Diplomatizzando) ou nas plataformas Academia.edu e Research Gate.
Os blogs, em segundo lugar, que também começaram tardiamente, cerca de duas décadas atrás, passando por várias denominações e endereços, até estabilizar, desde meados de 2006, aproximadamente no http://diplomatizzando.blogspot.com, baseado num anterior, com um “z” só (ademais de vários blogs paralelos, para objetivos mais definidos – como resenhas, aulas, eleições, textos de terceiros, etc. –, que acabaram convergindo para esse único e multitarefas. Ele é mais dinâmico, e me permite divulgar pequenos textos meus e material informativo de terceiras fontes, às quais sempre busco agregar um comentário pessoal, inicial ou final, para expressar minha concordância, ou não, com a matéria e permitir assim um debate público num ambiente que eu defino como sendo um “espaço de liberdade, com postagens inteligentes para pessoas idem”. 
Demorei para aderir a essas novas (agora velhas) ferramentas sociais, tipo Facebook e Twitter, seja porque eu não queria perder tempo, ou seja, roubar tempo às leituras, reflexões e escrita, seja porque eu sou naturalmente tímido, e hesito muito antes de interagir diretamente com um público mais vasto e desconhecido. Minhas interações públicas se dão geralmente em ambientes “controlados”, ou seja, seminários, palestras-debate, mesas-redondas e outros eventos desse tipo. O Facebook me assustava, ao início, e confesso que apenas entrei não para interagir, mas para ler informações e notícias – esse hábito terrível em que sou viciado, desde sempre –, pois julgava que eu encontraria ali, concentrado, o manancial de materiais de imprensa que, antes, eu tinha de buscar em cada um dos boletins digitais e nos sites proprietários. Ilusão, pois o que reina ali é uma grande confusão, e logo você descobre que está no meio dela, lendo e reagindo com amigos e desconhecidos, alguns perfeitamente agradáveis, ou tristemente desagradáveis. Por isso entrei e saí várias vezes do FB, do qual estou temporariamente – e não sei se definitivamente – afastado, o que só não fiz ainda em relação ao Twitter porque este me parece menos invasivo e intrusivo, ou “demanding”, que o Facebook.
Para facilitar o acesso a trabalhos meus mais “parrudos”, ou seja, coisas de dezenas de páginas, adotei, porque são de graça, as duas plataformas de interação acadêmica, Academia.edu e Research Gate – existem outras, eu sei, mas não consigo lidar com muitas ao mesmo tempo, inclusive porque seguem padrões e ferramentas bastante diferentes entre si – que estão livremente disponíveis a quem a elas se associa voluntariamente. Acredito que ambas permitiram expandir exponencialmente o acesso a meus trabalhos de corte mais tipicamente acadêmicos, uma vez que meus comentários mais ligeiros, triviais e conjunturas se limitam ao ambiente do blog, que acaba sendo um pouco efêmero e passageiro (embora possa ser uma espécie de biblioteca, ou de repositório, onde se pode buscar coisas depositadas meses, anos atrás). 
Com todas essas ferramentas e plataformas de “depósito” e “oferecimento” de textos – meus, e de terceiros – creio que ampliei um pouco minha audiência, pelo que ocasionalmente verifico nos indicadores de acesso, nas estatísticas de leitura e de download de meus textos nesses diferentes repertórios eletrônicos. Não sei dizer exatamente quanto, ou em quais dimensões, pois não sou de ficar controlando esses acessos, e se o faço, regularmente, é apenas para saber o que andam buscando os leitores e visitantes ocasionais.
Pelo que sei – por comentários de professores, colegas e estudantes –, meus textos são muito acessados por aquela categoria de demandantes tradicionais, ou seja, professores e estudantes das áreas em que atuam, e suponho que vários de meus textos se prestem a operações de “copy and paste” em trabalhos de graduação (nunca busquei saber quanto, e nem me interessa saber, pois o propósito é esse mesmo). De forma geral, o que faço é uma espécie de “serviço público”, de pedagogia à distância, usando meu conhecimento acumulado – derivado de leituras e experiência de vida – para transmitir aos mais jovens, e outros nem tão jovens assim, algo do que aprendi em mais de meio século de vida ativa dedicada fundamentalmente à leitura, à reflexão, à escrita e à divulgação de textos, temas, problemas, questões que imagino sejam de interesse público, e que se resumem basicamente numa única coisa: o Brasil, seu progresso social, seu desenvolvimento econômico, sua estabilidade política, sua elevação material e espiritual em benefício dos mais humildes (que é o meu meio de origem). Nunca esqueço que eu me formei em boas escolas públicas, complementando o estudo formal pela frequência a uma boa biblioteca pública infantil, coisas que aparentemente já nem existem mais, pelo menos em qualidade comparável a que uma criança de meio modesto como o meu teve acesso mais de meio século atrás.
O Brasil me angustia, pelo que ainda falta fazer. Eu tenho feito a minha parte no grande esforço de elevação educacional do país, e de progresso para a nação. Fiz isso até aqui, continuarei fazendo em 2019 e nos anos à frente, até onde as forças me permitirem e a vontade persistir. Continuarei lendo, refletindo, escrevendo e divulgando tudo o que for inteligente, para pessoas inteligentes, mas sem discriminação...
Vale! Bom ano a todos. Sejam felizes como eu sou feliz no que faço...

Paulo Roberto de Almeida
Curitiba, 3390: 31 dezembro 2018

domingo, 30 de dezembro de 2018

As forças politicas e sociais que sustentam o governo Bolsonaro - Angela Alonso (FSP)

“Bolsonaro não é marola de opinião”


Jair Bolsonaro é muito mais do que Jair Bolsonaro.
A presidente do CEBRAP, Angela Alonso, tratou do assunto na Folha de S. Paulo:
“O campo antiesquerda é amplo e enraizado. E nada tem de homogêneo. Ao contrário do que o uso farto das noções de populismo e fascismo leva a crer, trata-se de universo de alta complexidade (…).
A ambiguidade propiciou abrigar sob mesmo guarda-chuva grupos nacionalistas, militaristas, anticomunistas, pró-livre mercado, antitaxação, anticorrupção e pelo controle dos costumes. Todos ansiosos por uma sociedade mais ‘ética’, cada um entendendo ‘ética’ à sua maneira (…).
Todo esse mundo cresceu ao largo da grande mídia e da maioria dos cientistas sociais. Acumulou-se por quase uma década, antes que sua evidência nas ruas em 2015 impusesse sua consideração (…).
A eleição de Jair Bolsonaro é a vitória de uma mobilização social duradoura e arraigada. Não é marola de opinião. Nem é reencarnação de populismos ou fascismos. É fenômeno complexo e moderno. 2019 não será mera reedição de 1964. Quem fica pensando que a história se repete perde o bonde e acaba atropelado.”
O sucesso do governo de Jair Bolsonaro vai depender de sua capacidade de se dirigir a esse campo amplo e heterogêneo, e não apenas à franja bolsonarista.

O que ocorreu em 2017? Melhorou em 2018? - Paulo Roberto de Almeida

Ao final de 2017 eu fazia uma pequena avaliação de como tinha se desenvolvido aquele ano.
Será que mudou alguma coisa em 2018, ou tudo continuou igual?
A cada um de julgar...
Paulo Roberto de Almeida
São Paulo, 30 de dezembro de 2018

Minha brevíssima síntese de 2017

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 23 de dezembro de 2017.
 [Objetivo: resumir o sentido de 2017; finalidade: expor o que falta fazer em 2018]


Apesar de termos caminhado, lentamente, penosamente, quase nos arrastando, para algumas reformas econômicas absolutamente necessárias, nossos dirigentes ainda teimam em praticar aquele velho nacionalismo estatizante esclerosado, aquele dirigismo anacrônico dispensável e aquele patrimonialismo secular que nos mantêm, todas essas deficiências, num estado de letargia indesejado, e mais do que atrasados materialmente, numa situação de retardamento mental insuportável.
No plano político, nossos “representantes” insistem em continuar abusando de sua capacidade de zombar de todos os cidadãos, não apenas insistindo em praticar extorsão contra a economia nacional à luz do dia, mas também em legalizar “malfeitos” passados passando uma borracha oficial nos desvios já cometidos, além de pretender financiar sua continuidade em mandatos arrancados por meio dessas falcatruas por meio de novas extorsões pornográficas, que levam o nome de Fundo Partidário e Financiamento Público de Campanhas (ou “fundo eleitoral”).
No plano do Judiciário, contemplamos alguns pequenos avanços nos processos e condenações de meliantes de colarinho branco, embora os verdadeiros e grandes bandidos — os que dispõem do ultrajante foro privilegiado — continuem leves, livres e soltos, graças à conivência insultante de mandarins da “Justiça” e de alguns tiranetes togados, que também insistem em manter privilégios inaceitáveis em face da cidadania desprotegida e tosquiada por um Estado produtor de desigualdades legalmente instituídas.
No setor da educação, continuo a observar o mesmo desastre pedagógico tradicional, agravado durante os muitos anos de vulgar gramscismo acadêmico estimulado pelo lulopetismo ignaro e delirante, a despeito de alguns poucos sinais de reforma nos métodos e procedimentos, estes até provocados pela tremenda crise fiscal deixada pela herança maldita do lulopetismo econômico, ainda assim insuficientes para superar os imensos retrocessos mentais acumulados ao longo de anos e anos de militantismo sindical próximo do corporativismo fascista.
No plano cultural, finalmente, continuamos a ser intimidados pelos progressos imbecilizantes do politicamente correto, ao mesmo tempo em que os militantes das causas afrodescendentes continuam a construir um infeliz e deletério Apartheid racial, que vai conseguir criar no Brasil algo que nunca existiu na cultura nacional (a despeito de sinais reais de preconceitos e desigualdades sociais possuindo clivagens raciais), que é a divisão fundamental da cidadania em duas categorias de indivíduos: os “negros”, e assimilados a tais, de um lado, e todos os demais cidadãos, de outro.
A despeito de tudo, meus votos de um bom 2018 a todos, com a esperança de que consigamos manter o prumo das reformas e melhorias necessárias e continuar a afastar e remover os fatores de atraso persistentes.


Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 23 de dezembro de 2017.

sábado, 29 de dezembro de 2018

Propostas basicas de politica externa - Paulo Roberto de Almeida

Dando continuidade à divulgação de trabalhos diversos voltados para a análise propositiva de questões relativas à política externa brasileira, transcrevo, pela primeira vez, um texto que elaborei ao final de 2017, e que permaneceu inédito, desde então, pelo simples fato de que eu não o julgava completa, pois faltaram vários temas setoriais da diplomacia brasileira.

3205. “Propostas básicas de política externa”, Brasília, 10 dezembro 2017, 8 p. Argumentos conceituais de caráter geral em favor de um novo estilo na política externa e na diplomacia brasileira, mais conectada aos objetivos do crescimento econômico, da produtividade, com abertura econômica e liberalização comercial. 

Propostas básicas de política externa

 Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 10/12/2017

Diretrizes gerais
O Brasil, para começar com uma postura bem clara, não possui NENHUM problema de política externa, ou sequer de diplomacia. Esta última está bem servida por um corpo profissional de funcionários competentes e devotados disciplinadamente à política externa determinada pelo presidente, qualquer política externa, das mais sensatas, como tradicionalmente foi o caso até 2003, às mais alopradas, como tivemos durante a nefasta dominação do lulopetismo diplomático sobre a área internacional do país. É a política externa, portanto, que precisa mudar para que a diplomacia possa contribuir de modo competente e coadjuvante para a solução dos mais graves problemas da nação, que são todos – cabe repetir, TODOS – de ordem exclusivamente interna.
Com efeito, todos os graves problemas brasileiros — econômicos, políticos, sociais, regionais — têm origem interna e precisam receber soluções essencialmente, senão totalmente, domésticas, para que o Brasil possa iniciar um novo processo de crescimento sustentado, com transformações estruturais de seu sistema produtivo — no sentido de maiores ganhos de produtividade — e com a distribuição social de seus benefícios, mas esta preferencialmente por meio de mecanismos de mercado do que pela via ilusória do distributivismo estatal. A concessão demagógica, e populista, de benesses estatais está praticamente inviabilizada pela grave crise fiscal que o Brasil atravessa atualmente, em decorrência da Grande Destruição lulopetista na economia.
Não há muito o que a diplomacia ou que a política externa possam fazer para a resolução dessa grave crise fiscal, mas existe, sim, espaço para que ambas possam ser mobilizadas em favor do segundo grande problema da presente conjuntura histórica: a elevação dos níveis medíocres de produtividade. A diplomacia sempre foi a coadjuvante dos processos e programas nacionais de desenvolvimento, mas ela nem sempre foi orientada da maneira mais racional possível para servir plenamente a tais objetivos.
A primeira tarefa da política externa, e consequentemente também a de sua diplomacia, é contribuir para um processo de crescimento sustentado da produtividade da economia, pela redução do custo do capital e o aperfeiçoamento do capital humano, os dois elementos mais importantes da produtividade total de fatores, junto com as demais externalidades positivas que cabe ao Estado prover de forma eficiente. A melhor maneira de atingir esses objetivos passa pela ABERTURA ECONÔMICAe pela LIBERALIZAÇÃO COMERCIAL, e ambas medidas constituem, igualmente, decisões de política doméstica, bem mais do que de política externa, que só pode ser acessória a esses objetivos maiores. A maneira de fazê-lo é necessariamente uma tarefa de política interna, tanto por razões estruturais quanto conjunturais, e é fácil identificar as razões.
O Brasil é hoje um país introvertido, o mais fechado do G-20, o grupo de nações economicamente mais importantes do mundo, que todas possuem coeficientes de abertura externa bem superiores ao exibido pelo Brasil. Ou seja, somos nós que estamos errados, não os outros, somos nós que nos fechamos ao mundo, que condenamos nosso povo a consumir produtos caros e de baixa qualidade, que obrigamos os empresários a se abastecer internamente a custos bem mais altos, o que os torna pouco competitivos externamente e que redundou nessa desindustrialização precoce a que assistimos sob o desastroso regime econômico do lulopetismo, e que nos levou à maior recessão de toda a nossa história. Em resumo, somos estruturalmente, sistemicamente protecionistas.
No plano conjuntural, o mundo atravessa uma fase de relativa estagnação nas iniciativas e propostas de negociações comerciais multilaterais, e não há muito o que esperar da OMC, daí a razão dos muitos acordos de livre comércio em escala regional, ou dos esquemas mais abrangentes do que as zonas de comércio preferencial, restritos aos países dispostos a ir além dos meros mecanismos de acesso à mercados para entrar no terreno regulatório e nos novos temas dos intercâmbios globais (investimentos, serviços, propriedade intelectual, etc.). O Brasil, como no caso da abertura tarifária, está singularmente AUSENTEdesse universo negociador, o que constitui mais uma razão para que as iniciativas nesse terreno sejam também de origem basicamente interna.
Abertura econômica e liberalização comercial constituem, portanto, os dois grandes objetivos das medidas de política doméstica que precisam e devem ser coadjuvados pela política externa e pela diplomacia para produzirem resultados benéficos no curto e no médio prazo. Foram esses dois elementos que contribuíram, junto com as privatizações, para maiores ganhos de produtividade na economia brasileira no curso dos anos 1990, quando importantes reformas foram feitas nessa direção, o que preparou o Brasil, a partir da estabilização macroeconômica conduzida entre 1994 e 1999, para a fase de maior crescimento na primeira metade dos anos 2000, expansão revertida e destruída logo adiante pelas políticas desastrosas adotadas pelos dirigentes ineptos e corruptos que tomaram de assalto a economia até 2016.
É nesse contexto de REFORMASESTRUTURAISimportantes, a serem implementadas nos planos interno e externo, que se situa a importante decisão tomada pelo atual governo de transição no sentido de solicitar adesão plena do Brasil à OCDE, o “clube das boas práticas” que pode contribuir para esse processo de reformas que o Brasil deve perseguir no seu próprio interesse nacional. A OCDE possui notória expertise e vasta experiência nos terrenos das reformas fiscais, setoriais e sociais, com destaque para as áreas de políticas comercial, industrial, tecnológica e educacional, ou seja, tudo o que o Brasil necessita para deslanchar um novo salto no plano do crescimento sustentado. Os requerimentos de entrada podem, aliás, apoiar as reformas.
As reformas mais difíceis são, sem dúvida alguma, a fiscal e a tributária, uma conectada à outra, mas aqui também o know-how acumulado pela OCDE nessa área pode se revelar valioso, em várias dimensões. Na política comercial, os estudos da OCDE já provaram fartamente que restrições a um comércio mais livre redundam sempre num declínio da produtividade do trabalho, e portanto dos padrões de vida. O protecionismo comercial brasileiro dificulta, e de fato impede, uma maior integração de nossas empresas às cadeias globais de valor, que constituem o lado mais conspícuo da globalização microeconômica, que é onde se processa, junto com as ferramentas de comunicação social, o lado mais relevante desse fenômeno abrangente e inescapável.
REDUÇÃO DOCUSTO DO CAPITALtambém passa por maior abertura econômica e basicamente pela maior atratividade de investimentos diretos, inclusive no setor financeiro, para diminuir o grau absurdo de concentração bancária hoje existente. A política externa e a diplomacia devem servir a todos esses objetivos da maneira mais eficiente possível, o que justificaria um redimensionamento da rede exterior de representação, exageradamente estendida sob a diplomacia megalomaníaca do lulismo.
A política externa brasileira sempre teve como princípio organizador uma mal definida “diplomacia do desenvolvimento”. Tratava-se, na verdade, mais de um slogan e, mesmo, uma ideologia, do que propriamente uma doutrina adequadamente elaborada, resultando de uma combinação improvisada de prescrições vagamente influenciadas pelo desenvolvimentismo latino-americano da CEPAL e de demandas de tratamento preferencial e mais favorável para países em desenvolvimento emanadas da UNCTAD. Ao abrigo dessas correntes de pensamento, ocorriam vibrantes discursos defendendo “espaços de políticas econômicas” em prol de “projetos nacionais de desenvolvimento”, o que servia de razão, de justificativa e de defesa para o protecionismo tarifário, para as restrições aos investimentos estrangeiros em determinados setores, para os monopólios estatais em indústrias ditas “estratégicas”, para restrições aos fluxos de bens, de serviços e de capitais em nome do equilíbrio do balanço de pagamentos, da preservação da autonomia tecnológica, ademais de diversos outros expedientes, mal coordenados entre si, mas que de fato atuaram contrariamente ao grande objetivo pretendido, que era o de romper a barreira do subdesenvolvimento para alcançar o patamar das nações ricas. 
O Brasil não esteve sozinho nesses experimentos desenvolvimentistas, já que acompanhamos os mesmos tipos de políticas da maioria dos países latino-americanos, que, se bem sucedidas em sua implementação reiterada e teimosa ao longo de décadas, deveriam levar o continente àquele grande objetivo. Ora, o que se assistiu, ao longo do período, foi a superação gradual dos países latino-americanos pelos da Ásia Pacífico, praticamente uma troca de lugares na economia mundial, tanto em termos de pautas exportadoras, de diversificação industrial, de ofertas competitivas em bens e serviços, quanto da atração de investimentos diretos estrangeiros. A América Latina, e com ela o Brasil, reduziu seus índices de participação nos intercâmbios mundiais, ao passo que os países da Ásia Pacífico começaram a ocupar frações crescentes desses fluxos globais.
Está, portanto, mais do que na hora de substituir essa mal definida “diplomacia do desenvolvimento com preservação da autonomia nacional” por uma vigorosa política de “INTEGRAÇÃO À ECONOMIA MUNDIAL”, com a adoção consequente de medidas econômicas e de políticas setoriais visando à inserção das empresas brasileiras nos padrões competitivos da globalização. A OCDE poderá subsidiar a redefinição dessas políticas no novo sentido pretendido, mesmo quando a adesão formal não se realize, pois nada deveria impedir o Brasil de reformar soberanamente o conjunto de políticas nas áreas industrial, comercial e tecnológica na direção da integração mundial, abandonando o prejudicial nacionalismo pretensamente autonomista, mas que é de fato redutor de nossas possibilidades de progresso econômico.

Diretrizes setoriais
O Brasil sempre privilegiou a via multilateral e a coordenação regional em diversas áreas, inclusive em matéria de integração econômica. Sob o lulopetismo diplomático ele fez mais do que isso: adotou preventivamente uma preferência ideológica por certas “parcerias estratégicas”, o que o fez perder tempo na busca de uma fantasmagórica aliança com protagonistas de algo difuso chamado de “Sul global”, o que podia encantar acadêmicos alienados às realidades da economia mundial, mas que em nada serviu para promover os interesses concretos de sua economia. 
O que caberia fazer agora seria recuperar a plena autonomia da política externa na coordenação das políticas nacionais em todas as áreas de negociações internacionais e regionais, sem mais preferências ideológicas ou compromissos herdados do passado recente, que nos prendiam a determinados compromissos políticos mais estabelecidos em função daquelas preferências partidárias do que das reais necessidades da economia e da sociedade nacional.
O Brasil é grande o suficiente, e dotado de uma diplomacia suficientemente preparada, para poder ATUAR DE MODO INDEPENDENTEnos mais diferentes foros de negociações internacionais, sem precisar de uma coordenação redutora em certas áreas, o que o acaba levando a um mínimo denominador, em escala regional ou em outras esferas, distante, portanto, de objetivos mais ambiciosos, que correspondem ao seu novo objetivo de integração plena à economia mundial. Repetindo: a diplomacia brasileira deve atuar, o mais possível, de modo desafiadoramente AUTÔNOMO.
A plena capacitação tecnológica de sua economia, por exemplo, pode e deve-se fazer numa abertura decisiva em direção de TRADICIONAIS PARCEIROSde seu desenvolvimento passado, do que numa ilusória aliança com novos parceiros, ditos “não hegemônicos”, dessa aliança geograficamente determinada numa única direção. Da mesma forma, políticas sociais e educacionais, ou mesmo a regulação setorial, ganhariam bem mais com a adoção de padrões já adequadamente testados em países avançados, todos pertencentes à OCDE, do que nesses experimentos duvidosos, empurrados burocraticamente por tecnocratas descolados da vida empresarial, ou penosamente e artificialmente estimulados num âmbito puramente governamental.
Qualquer consulta aos relatórios técnicos mais relevantes da economia global — competitividade, ambiente de negócios e liberdade econômica — revela que o Brasil não avançou, e que, de fato, ele recuou em vários desses indicadores globais ou setoriais, o que foi o resultado dos anos de inépcia administrativa, de incompetência gerencial, quando não de desmesurada corrupção, do lulopetismo econômico, o que cabe agora corrigir e avançar, para recuperar o atraso acumulado em várias áreas.
O que se propõe, portanto, é a adoção verdadeiramente estratégica de todos esses indicadores, refinados e adaptados ao nosso contexto, para guiar as diretrizes setoriais da política externa e da diplomacia brasileira nesse esforço de integração do Brasil à economia global. Os relatórios do Fórum Econômico Mundial sobre competitividade, os do Banco Mundial sobre “Fazendo Negócios” e os do Fraser Institute sobre liberdades econômicas deveriam converter-se em manuais práticos de nossos técnicos econômicos e diplomatas na redefinição de amplas áreas da regulação nacional tratando de políticas econômicas externas e de relações econômicas internacionais. Uma leitura atenta desses relatórios, confrontando indicadores relativos ao Brasil com os de outros países, inclusive economias menores ou nações de menor renda per capita que a brasileira, revela o que já se sabe: nosso país apresenta inúmeras distorções macro e setoriais, quase todas elas derivadas da burocracia estatal, de um sistema tributário extorsivo e irracional, de uma regulação intrusiva, tudo isso fazendo um ambiente de negócios verdadeiramente infernal para o empresário nacional. 
Deve-se, aliás, corrigir essa noção de que existe um “custo Brasil”, o que tornaria o cenário em algo quase determinista, ou fatalista, como se a responsabilidade fosse de todos, ou seja, de ninguém. Na verdade, esse custo deve ser chamado pelo seu verdadeiro nome:CUSTO DO ESTADObrasileiro. É este o grande responsável por uma carga fiscal equivalente à média dos países ricos, numa economia com um PIB per capita cinco vezes menor, ou seja, um nível tributário mais de dez pontos percentuais acima dos países emergentes de renda equivalente. Não apenas o volume de impostos é avassalador para a competitividade das empresas brasileiras, mas a burocracia envolvida no recolhimento dessas receitas compulsórias é, também, estupidamente esquizofrênica. 
Todos esses relatórios exibem um número tão excessivo de idiossincrasias – não necessariamente brasileiras, mas do Estado brasileiro, e dos seus governos – que a nossa diplomacia pode passar um bom tempo identificando como os outros países colocados num mesmo patamar de desenvolvimento atuam sobre os mecanismos mais distorcivos e mais perversos que retiram competitividade aos produtos e serviços aqui produzidos e que colocam o Brasil nos piores indicadores em escala comparativa. A Índia, por exemplo, deu enormes saltos de produtividade e de competitividade no plano mundial simplesmente ao identificar os critérios no levantamento do Banco Mundial que a colocavam numa classificação muito baixa no ranking do Doing Business: o trabalho feito de correção dessas distorções levou-a, em poucos anos, a ultrapassar o Brasil na classificação geral. O mesmo pode ser feito pela diplomacia brasileira em diversos outros componentes de políticas setoriais, identificando as melhores práticas pelos países que apresentam indicadores mais favoráveis ao ambiente de negócios.
A redução eventual das receitas, advinda de reformas no sistema tributário e nos mecanismos regulatórios, seria mais do que compensada pelos ganhos de produtividade e de competitividade a serem incorporados pelas empresas brasileiras em decorrência dessa adequação a patamares “normais” de funcionamento do sistema produtivos, em todo caso segundo padrões vigentes na maioria dos países inseridos na economia global. É evidente que haverá custos de transição, que terão de ser compensados pela redução das despesas públicas, mas neste campo também a diplomacia precisa ser mobilizada para demonstrar as imensas distorções existentes sob a forma de gastos com o próprio Estado e seus aparelhos institucionais, quando vistos em escala comparativa. Parece claro, por exemplo, que o funcionamento dos poderes, a remuneração da sua burocracia, o custo da Justiça do Trabalho e, sobretudo, dos regimes previdenciários constituem verdadeiras anomalias vistas no plano internacional, e isso precisa ser evidenciado pela nossa diplomacia, em função de sua capacidade de realizar levantamentos de questões funcionalmente similares em direção de países com instituições equivalentes.
O mesmo se estende, por exemplo, aos mercados de capitais, regimes laborais, sistemas de inovação, funcionamento do ensino público e sua complementação pelo setor privado nos diversos níveis e várias outras áreas problemáticas no atual cenário brasileiro: a diplomacia pode, e deve, trazer uma grande contribuição para diagnósticos realistas sobre as disfunções brasileiras, atribuindo-se depois à política externa a missão de negociar eventuais acordos de cooperação para que as prescrições adequadas sejam seguidas de propostas concretas de reformas setoriais, em linha com padrões existentes de qualidade em países de melhor desempenho nessas áreas. Aqui, novamente, a OCDE poderia prover o Brasil de todas as informações necessárias a esses diagnósticos. 

Relações regionais e com grandes parceiros
A primeira circunstância do Brasil é, obviamente, a sua geografia, e é com ela que o país deve trabalhar para assegurar um ambiente continental favorável ao bem-estar dos seus povos, aos processos de desenvolvimento, à segurança e ao respeito aos princípios dos direitos humanos e da democracia inscritos em nossa Constituição. Nela também está a “obrigação” de realizar a integração com as demais nações da região. O projeto de integração – que já passou por diversas fases – necessita porém ser retomado em novas bases, uma vez que a união aduaneira do Mercosul não parece ter condições de funcionar de modo adequado na configuração atual. De certo modo, o Brasil, como o país mais avançado industrialmente e tecnologicamente, pode decidir abrir-se de modo mais amplo aos produtos e serviços dos países vizinhos, sem exigir reciprocidade. Caberia, igualmente, retomar o projeto de integração física proposto em 2000 e deixado num estado disfuncional pelos equívocos de política econômica e de política externa, nos anos em que esta foi dominada por uma diplomacia partidária animada mais por preconceitos ideológicos do que pela expressão concreta dos interesses nacionais. 
Muito do que deve ser feito no continente nesse terreno depende, obviamente, de um bom ambiente regulatório, o que pode revelar-se praticamente impossível quando vários países adotaram orientações estatizantes e contrárias ao investimento estrangeiro em suas disposições setoriais nacionais, aliás, como o próprio Brasil durante o reinado companheiro. Assim, a mudança de postura do Brasil nessas áreas, sobretudo a abertura necessária aos capitais internacionais, pode sinalizar um bom ambiente de negócios e de investimentos, que cabe estimular nos planos da diplomacia e da política externa por novas iniciativas de caráter integracionista pragmático. Aqui, como em vários outros terrenos, os problemas são e continuam a ser de ordem essencialmente interna – como é o caso do protecionismo brasileiro, mesmo contra produtos e serviços dos vizinhos que, teoricamente ao menos, gozam de acesso aos mercados brasileiros por mera redução das tarifas aplicadas, quando os problemas são propriamente regulatórios –, o que, porém, não deveria impedir a diplomacia de indicar claramente quais os obstáculos percebidos por esses países. Ao proceder em modo de abertura unilateral, o Brasil pode contribuir para a formação de um grande espaço econômico integrado em escala regional, sem mesmo precisar negociar acordos bilaterais ou plurilaterais com os países vizinhos. 
Por outro lado, o conceito de “parceria estratégica” foi usado de modo muito peculiar nos anos do lulopetismo diplomático, privilegiando unilateralmente supostos aliados considerados “anti-hegemônicos”, numa tentativa canhestra de criar “novos polos de poder” distanciados das antigas potências coloniais e “imperialistas”. Na verdade, a diplomacia brasileira não precisa e não deveria ficar selecionando quais são ou deveriam ser os seus “parceiros estratégicos”. O que uma política externa sensata dever fazer, a partir de claras diretrizes governamentais, é definir quais são os objetivos estratégicos nacionais, suas metas prioritárias, e a partir daí, e em função disso, escolher as melhores parcerias que se encaixem de forma racional e pragmática na perspectiva da cooperação ideal para os setores e áreas nas quais se busca o melhor desempenho para aquele campo específico. Não existe e não pode existir um determinismo geográfico por um fantasmagórico “Sul global” em todas as áreas de interesse brasileiro de cooperação, assim como não podem existir grupos rígidos e coalizões estáveis, quando são muito diversos os objetivos estratégicos do país: o interesse nacional deve, assim, selecionar os melhores parceiros, não aqueles supostamente alinhados ideologicamente.
A política externa e a diplomacia brasileira sempre foram universalistas. Elas precisam voltar a sê-lo, como suporte essencial de um novo tipo de desenvolvimento. 


[1aversão: 10/12/2017]; a ser completado...