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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

segunda-feira, 31 de março de 2014

O regime militar e a oposicao armada (2): A reacao dos perdedores: resistencia política e luta armada

regime militar e a oposição armada:
um retrospecto histórico, por um observador engajado

Paulo Roberto de Almeida

Sumário:
1. Antecedentes e contexto do golpe militar de 1964
(ver neste link)


2. A reação dos perdedores: resistência política e luta armada
Seja qual for a interpretação que se decida adotar ainda hoje, o golpe militar de 1964 contra o regime de João Goulart – ou a “revolução”, segundo seus promotores – provavelmente não representou nada de muito diferente do que ocorreu na mesma época em diversos outros países latino-americanos. Talvez não tenha sido realmente nada de muito diferente, inclusive no que respeita às forças de esquerda que lutavam contra os regimes oligárquicos ou de burguesias alinhadas ao imperialismo americano durante a era da Guerra Fria. Estas forças se dividiram, logo em seguida, em dois grupos: depois de uma primeira preeminência dos partidos comunistas de orientação (e subserviência) soviética, ocorreram as primeiras cisões na esquerda latino-americana, basicamente representadas pela criação de partidos comunistas pró-chineses (tendentes a apoiar o conceito de guerra popular de base camponesa, conforme o modelo maoísta) e de movimentos identificados com a visão foquista-guerrilheira do processo de luta contra o Estado burguês, privilegiando os métodos fidelistas-guevaristas de tomada do poder.
A esquerda brasileira também acompanhou essas divisões dos movimentos de esquerda no plano mundial e passou a se organizar em função dos modelos respectivos de lutas políticas e militares. As cisões da esquerda brasileira se deram sobretudo em detrimento do “Partidão” (o “velho” PCB); foram muitas as que ocorreram, a começar pelo grupo maoísta que acompanhou as críticas de Mao Tsé-tung ao “revisionismo soviético” então representado pela desestalinização conduzida por Nikita Kruschev: se constituiu então o Partido Comunista do Brasil (PCdoB), que pretendia retomar a tradição dos primeiros anos do poder bolchevique, mas que acabou seguindo a via chinesa da guerra “camponesa” (consubstanciada mais tarde na guerrilha do Araguaia).
Vários outros grupos se organizaram, geralmente com o sentido de “passar à ação”, ante o reformismo do Partidão. Não havia muita elaboração teórica em torno das opções de luta, nem uma análise “científica” do que era a sociedade brasileira, ou sobre sua disposição de adotar a luta armada como uma forma de resistência a um regime que, nessa conjuntura (1965-1966), estava longe de ser uma ditadura feroz. Muitos desses grupos se organizaram atendendo ao apelo das conferências realizadas em Havana, a Tri-continental (reunindo militantes dos três continentes do Terceiro Mundo) e a dos movimentos guerrilheiros da América Latina, da qual resultou a criação da OLAS, Organização Latino-Americana de Solidariedade, uma mini-internacional que pretendia estimular o modelo cubano em todos os países do continente.
De fato, para a esquerda latino-americana, nenhum episódio da Guerra Fria foi tão marcante quanto a revolução cubana, e seu desfilar de “guerrilheiros heroicos” lutando contra um ditador submisso aos EUA. Ché Guevara simbolizava essa luta e foi com ele que se identificavam os jovens que também pensavam libertar o Brasil da hegemonia americana e instaurar um regime de “justiça social” e de “democracia popular”, embora divididos entre a adesão a um ou outro dos socialismos realmente existentes. Cuba era justamente o exemplo de que se podia derrocar um regime corrupto e criar o “homem novo”, base da transformação radical que se esperava fazer. As primeiras reações ensaiadas pelos militantes que recusavam a via reformista e pacifista do Partido Comunista Brasileiro, de linha soviética, partiam de pressupostos de inspiração cubana ou maoísta, no sentido de que só a luta armada poderia representar a verdadeira libertação do Brasil.
Todo o ambiente universitário era invariavelmente caracterizado por uma ideologia de esquerda, essencialmente marxista, nas diversas variantes da época, a que se somava a radicalização concomitante da chamada Igreja progressista. Os jovens dessa geração foram sendo levados quase naturalmente para a opção socialista, que na época se apresentava como uma solução “factível” e “possível”, tendo em vista os exemplos precedentes da revolução bolchevique, da guerra civil conduzida por Mao Tsé-tung na China e, sobretudo, porque bem mais perto do Brasil, da guerrilha cubana. Progressivamente, esses movimentos foram se preparando para a luta armada, de acordo com as diretrizes que emanavam de Havana, onde tinha sido organizada, em 1965, a Conferência Tri-continental, para prestar solidariedade ao Vietnã do Norte, em sua luta contra a república pró-americana do sul, e para estimular a luta armada na América Latina, como recomendava Fidel Castro, e como já tinha passado à ação Ché Guevara.
Guevara era – parece que continua sendo, a despeito de todas as evidências em contrário – o símbolo da rebeldia juvenil contra a opressão capitalista, e a metodologia então proposta para romper com o capitalismo e o imperialismo era dar início a um “foco guerrilheiro”, conforme teorizado pelo militante francês Regis Debray. No Brasil, entretanto, na ausência de massas camponesas sujeitas a algum tipo de dominação “feudal”, ou de uma “Sierra Maestra” próxima das cidades e dos latifúndios, nem a solução maoísta da guerra camponesa, nem o modelo cubano da coluna de guerrilha rural pareciam aplicáveis, razão pela qual os líderes comprometidos com a luta armada adotaram a via da guerrilha urbana, como depois seria enfatizado no “Mini-manual do guerrilheiro urbano”, do dissidente do Partido Comunista pró-soviético e líder da Ação de Libertação Nacional, Carlos Marighella.
Essas nuances das táticas de combate não se manifestavam, contudo, de forma muito clara no debate político desses grupos guerrilheiros, que decidiram passar à ação mesmo na completa confusão do que fazer, de quem doutrinar, que tipo de mensagem política preconizar, ou qual tipo de governo se pretendia implantar, exatamente, depois que se conquistasse o poder. O que é certo é que ninguém, nenhum desses grupos, em nenhum documento programático, se dizia que a intenção, ao lutar contra a ditadura militar, era a de colocar em seu lugar uma “democracia burguesa”, ou admitir alguma variante do regime capitalista-burguês. Sem que isso ficasse muito explícito, o que se cogitava, na verdade, era alguma variante dos regimes cubano ou chinês, uma vez que a União Soviética já era julgada, então, como muito burocrática e conservadora. Alguns grupos admitiam claramente que estavam lutando pela “ditadura do proletariado”.

 (continua...)

Mudancas climaticas: os neomaltusianos do tempo preveem sempre o pior...

Não há muito novidade nesses gritos de alarme, com projeções de desastres incomensuráveis, feitos por esses novos profetas do apocalipse climático (e oceânico) que são os cientistas do clima.
Eles são os novos malthusianos, aqueles que anunciam tais e tais catástrofes se a humanidade não se arrepende de seus pecados e segue o caminho duvidoso que eles preconizam.
Eu gastaria todo o dinheiro que eles projetam ser empregado na mitigação dos gases de efeito estufa na promoção do desenvolvimento de regiões atrasadas, não como ajuda ao desenvolvimento, mas simplesmente para o tratamento de epidemias, algumas poucas obras de infraestrutura mas restritas ao saneamento básico e, sobretudo, educação, não mais do que isso.
A educação dos países pobres, e um regime comercial aberto, livre para a competição agrícola, fará muito mais, e melhor, para preparar o mundo para os desastres neomalthusianos do que todo esse dinheiro que os cientistas malucos pensam gastar com quem já é rico, ou seja, indústrias e governos (inclusive cientistas) para que eles façam o que o sistema de livre mercado e de preços livres fará melhor: preparar a humanidade para tempos diferentes (não digo nem melhores nem piores, apenas diferentes) que virão, eventualmente.
Assim como deve haver coisas ruins, derivadas do tal de aquecimento global (man-made, não se esqueçam), também deve haver coisas boas, ora essa. Nenhuma realidade, sobretudo econômica, tem uma só faceta.
Paulo Roberto de Almeida


BY JAMES FREEMAN
ANOTHER CLIMATE WARNING
The Wall Street Journal, March 31, 2014

Summarizing the latest warning from the United Nations' Intergovernmental Panel on Climate Change, the New York Times reports that "the worst is yet to come." This is of course the message of every climate warning, since the global-warming thesis is that emissions of greenhouse gases now will cause dire consequences in the future . But what's new here is an emphasis on one potential consequence. "In particular, the report emphasized that the world's food supply is at considerable risk — a threat that could have serious consequences for the poorest nations."
Yet according to a separate U.N. organization, the World Food Programme, the world's food supply is not simply at risk in the future. The WFP says that a full 842 million people in the world do not have enough to eat right now. Has the climate panel calculated how the costs of global-warming regulation could make it more difficult to feed these suffering souls?
The impact of potential energy restrictions on the world's developing countries is particularly relevant because, as the Times correctly notes, "While greenhouse gas emissions have begun to decline slightly in many wealthy countries, including the United States, those gains are being swamped by emissions from rising economic powers like China and India." 

Acucar no comercio internacional: fim de uma distorcao de tres seculos na economia mundial?

Improvável que aconteça. Em todo caso, se trata da primeira vez, em praticamente três séculos de história econômica mundial, que um produto primário, dos mais importantes no comércio internacional desde a baixa Idade Média, e um dos mais importantes desde a era das navegações, vem a ser objeto de negociações realmente internacionais, com vistas a terminar um conjunto de distorções que prejudicam produtores e consumidores em praticamente todos os cantos do planeta.
O açúcar foi um dos primeiros produtos, talvez unicamente, a ser objeto de políticas governamentais de incentivo, estímulo, proteção, subsídios, enfim, um conjunto de medidas oficiais que distorcem as condições de produção, distribuição, comércio e consumo desde antes do período contemporâneo.
Já durante os tempos coloniais, ele era um dos objetos preferidos do exclusivo comercial entre metrópoles e respectivas colônias.
Durante as guerras napoleônicas, quando se começou a produzir mais maciçamente açúcar de beterraba para substituir o de cana que não chegava mais nos portos continentais, começaram as medidas oficiais de subsídios e proteção, que nunca mais terminaram.
O açúcar foi um dos primeiros produtos a deformar as regras de um sistema de comércio aberto e multilateralizado, e provavelmente será um dos últimos, senão o último, a ser totalmente liberado dessas políticas distorcivas.
Não acredito que o esquema proposto por um congressista americano venha a dar resultado, e isto por um motivo muito simples. Ainda que todos os demais países concordassem com o que ele propõe, a Índia, sempre a Índia, nosso grande aliado no protecionismo comercial internacional, simplesmente vai se opor a isso, em nome dos seus 400 ou 500 milhões de miseráveis. A desculpa é esfarrapada, sabemos, e a Índia seria a primeira a ganhar com a modernização do seu setor agrícola, mas a última coisa que políticos populistas, e corruptos, querem ouvir falar é de um sistema de mercados livres.
Nossa aliada no G20 comercial vai sabotar esses esforços, querem apostar?
Prevejo mais algum tempo de subsídios, protecionismo, distorções para o açúcar no comércio internacional.
Ele será o último a ser liberalizado.
Provavelmente dentre de mais ou menos 150 anos...
Paulo Roberto de Almeida

Has the time come for worldwide sugar subsidies to end?

sugarBy Rick Manning
A unique opportunity has emerged at the World Trade Organization to end sugar subsidies once and for all.
Australia, Colombia, Brazil, Paraguay, Thailand, Canada, El Salvador, the European Union and the United States have all complained to the WTO about massive sugar subsidies in India that threaten the world sugar market.
The complaints would be much more powerful if the U.S. Congress were to move forward immediately with Representative Ted Yoho’s (R-FL) proposal that would dictate that U.S. sugar subsidies would end once the rest of the world dropped their market distorting giveaways.  The proposal, known as Zero to Zero, would give U.S. representatives at the WTO the moral authority to demand the rest of the world drop the sugar subsidy arms race without permanently harming U.S. sugar production through unilateral disarmament.
Here’s how it would work.
Under the Yoho Zero to Zero plan, the U.S. would agree to eliminate all domestic sugar subsidies after the WTO had brokered an agreement with other countries around the world to drop theirs as well.  With sugar subsidies taking center stage at the WTO, there is no better time than the present to move forward with this innovative and aggressive move to return to a subsidy free world wide sugar market.
While the Farm Bill in the U.S. has passed and is in place for five years, congressional action on the Yoho proposal should not wait as it would give our nation’s trade negotiators a timely boost in seeking an end to escalating subsidies.  Most importantly, it would force other nations, like Brazil, to choose whether to argue against Indian sugar subsidies while continuing their own program that has undercut other sugar producers around the world.
By leading the way on the Yoho legislation without unilaterally disarming and harming our nation’s domestic sugar industry, Congress would be making a bold statement that could provide the tipping point in the world wide debate on the place of agriculture subsidies as a whole, and sugar subsidies in particular.
Rick Manning is the vice president of public policy and communications for Americans for Limited Government.

Read more at NetRightDaily.com: http://netrightdaily.com/2014/03/time-come-worldwide-sugar-subsidies-end/#ixzz2xXzu8Oms

O regime militar e a oposição armada (1): Antecedentes e contexto do golpe militar de 1964 - Paulo Roberto de Almeida

Vou dar início a uma série de dez artigos sobre o regime militar inaugurado em 1964 e sobre a luta armada que se desenvolveu na sua sequência, segundo o esquema abaixo.

regime militar e a oposição armada:
um retrospecto histórico, por um observador engajado

Paulo Roberto de Almeida

Sumário:
1. Antecedentes e contexto do golpe militar de 1964
(ver neste link)
2. A reação dos perdedores: resistência política e luta armada
(ver neste link)
3. A passagem à luta armada: a insensatez em ação
(ver neste link)
4. A derrota da luta armada e suas consequências: uma história a ser escrita
(ver neste link)
5. O que foi a luta armada no Brasil: uma interpretação pessoal
(ver neste link)
6. Quando a luta armada se desenvolveu no Brasil?
(ver neste link)
7. Onde a luta armada se desenvolveu no Brasil?
(ver neste link)
8. Como a luta armada se desenvolveu?
(ver neste link)
9. Por que houve luta armada no Brasil?
(ver neste link)
10. Uma avaliação pessoal da luta armada e suas consequências atuais
(ver neste link)

1. Antecedentes e contexto do golpe militar de 1964
O Brasil do início dos anos 1960 enfrentava uma típica crise de instabilidade do sistema político, não muito diferente de dezenas de outras, que surgem, se desenvolvem e desaparecem em quaisquer outros sistemas políticos, especialmente na América Latina. Desde meados dos anos 1950, a classe política, extremamente dividida quanto a soluções consensuais típicas de países em crescimento – inflação, gastos do governo, tributação, reformas estruturais e administrativas, etc. – não conseguia encontrar mecanismos democráticos para encaminhar as pressões do crescimento e das demandas por participação popular. Daí o velho recurso e o apelo dos políticos aos militares, como “pesos decisivos” na balança política, para “corrigir os problemas”.
De fato, os militares tinham uma longa tradição de intervenção nos assuntos políticos, desde o próprio golpe de derrocada da monarquia e de proclamação da República, até as crises político-militares dos governos JK e Jânio Quadros, passando pelas revoltas tenentistas dos anos 1920, pela revolução que derrubou a Velha República, pelo golpe que instaurou a ditadura do Estado Novo, em 1937, e também pelo que determinou sua extinção, em outubro de 1945. Depois, eles foram ativos participantes dos diversos episódios de turbulência da República de 1946, em especial em meados dos anos 1950, até culminar na implantação do parlamentarismo, em 1961, no bojo de nova crise, e na derrubada dessa República, menos de três anos depois.
Desde meados da década anterior, nos estertores do segundo governo Vargas, o Brasil vivia em permanente crise político-militar, agravando-se as turbulências no início dos anos 1960 em função do comportamento bizarro do presidente eleito Jânio Quadros e da momentosa posse do vice-presidente (eleito pela chapa concorrente) João Goulart. A situação, durante os seus três anos de mandato (primeiro em regime parlamentarista, depois no retorno ao presidencialismo), se caracterizava por constantes greves, inflação crescente, quebra de autoridade em diversas instâncias do poder estatal, inclusive no âmbito das Forças Armadas, e intensa radicalização política por parte dos movimentos que pretendiam para o Brasil opção semelhante à dos países comunistas, indo até, em certos meios, à preparação para a guerrilha rural, em moldes cubanos ou chineses.
O movimento civil-militar – não lhe cabe o nome de golpe, nem de revolução – que derrocou o regime da República de 1946 representou apenas o ponto culminante dessa fase de crise aguda, não sendo nem o resultado de uma conspiração organizada pela direita e pelas elites – como pretende a esquerda – nem o acabamento de algum desígnio imperial no contexto da Guerra Fria – como pretendem os paranoicos anti-imperialistas e antiamericanos das mesmas correntes. Ele ocorreu porque grande parte da sociedade, representada majoritariamente pela classe média, demandava uma solução aos descalabros administrativos, à corrosão do poder de compra, ao clima de desordem política, à percepção do aumento da corrupção que caracterizavam o governo Goulart.
Talvez os militares devessem ter aguardado as eleições do ano seguinte, e ter apostado numa solução democrática em face desse quadro turbulento, mas o fato é que o agravamento da situação induziu algumas lideranças civis e militares a atuarem de imediato contra o governo, sem que a necessária coordenação de todas as forças políticas se fizesse num sentido mais consentâneo com a legalidade constitucional. Existem momentos na história de um país nos quais a população decide assumir ela mesma as atribuições de um poder constituinte originário; foi o que parece ter ocorrido em março de 1964, quando a grande maioria da população brasileira secundou e se solidarizou com as Forças Armadas que assumiram o comando involuntário daquele movimento. A história poderia ter sido outra, mas ela é o que é: incontrolável.
A historiografia brasileira ainda se divide quanto à natureza do golpe, suas origens políticas, suas raízes sociais, suas justificativas econômicas ou geopolíticas, sobre o envolvimento dos Estados Unidos no evento, segundo se é contra ou a favor em relação a esse evento decisivo no Brasil moderno. A esquerda, obviamente, interpreta o golpe militar como o avanço das forças reacionárias, alinhadas ao imperialismo, contra a ascensão dos “movimentos populares”, em favor de reformas democráticas; ela nunca mudou de opinião a esse respeito, o que denota certa incapacidade a revisar suas próprias concepções e caminhar em direção de uma interpretação mais objetiva.
 Os que apoiaram e comandaram o golpe, o veem como uma reação às forças comunistas que ameaçavam tomar o poder para colocar o país na esfera do movimento comunista internacional, liderado pela URSS. No caso do Brasil, curiosamente, as forças de “direita” ganharam, mas a História foi escrita pela “esquerda”, no sentido em que todo o processo político que levou às crises político-militares dos anos 1954-1964 e ao próprio golpe e seus efeitos mediatos e imediatos foram e são interpretados segundo a ótica dos “perdedores”, que, aliás, ascenderiam ao poder em 2003. De fato, o Brasil constitui um caso único de construção de um discurso histórico – e de vários outros padrões culturais – no qual a linha condutora veio a ser quase inteiramente dominada e controlada pelas forças, basicamente socialistas, que não tiveram o apoio da sociedade, seja nos momentos de crise política aguda, ou como projeto de organização econômica e social suscetível de recolher o apoio eleitoral da grande massa da população.


(continua...) 

Mafias sindicais continuam a roubar os trabalhadores

Se os sindicatos são entidades de direito privado, só interessam uma categoria específica e não prestam contas do que recebem, deveriam viver do dinheiro dos seus filiados.
Paulo Roberto de Almeida 
Germano Oliveira
O Globo, 30/03/2014

Todos os 41,3 milhões de trabalhadores brasileiros com carteira assinada terão desconto, compulsoriamente, na folha de pagamento deste mês de março, do valor de um dia de trabalho como contribuição sindical.

domingo, 30 de março de 2014

Prognosticos eleitorais: mercados nao querem mais PT (pronto, eles vao reclamar dos mercados...)

Todos os investidores, mesmo aqueles que acham que a política econômica "neoliberal" de Lula foi positiva para o Brasil, não querem mais saber de PT no governo.
Os petistas vão reclamar dos investidores e dos mercados, querem apostar?
Paulo Roberto de Almeida

Por que a bolsa sobe quando Dilma cai

Investidores comentam a expectativa de nova rodada de valorização das ações se as próximas pesquisas mostrarem a ascensão de Aécio ou a possibilidade da volta de Lula 

28 de março de 2014 | 13h 47
SÃO PAULO - A Bovespa e os outros ativos brasileiros poderão registrar uma nova rodada de valorização se as próximas pesquisas de intenção de voto mostrarem perda de terreno da presidente Dilma Rousseff e um desfecho das eleições presidenciais apenas no segundo turno. 
E o rally das ações e da moeda brasileira poderá ser ainda maior se crescerem as chances de Dilma perder as eleições para um candidato de oposição, em particular o tucano Aécio Neves, ou ainda, embora numa magnitude bem mais modesta, se uma reviravolta no cenário político trouxer o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de volta para disputar a Presidência em substituição à Dilma.
Esse é, em resumo, o sentimento de três investidores estrangeiros ouvidos nesta sexta-feira, 28, pela Broadcast, serviço de informações em tempo real da Agência Estado. Um deles fala abertamente e os outros dois pedem nonimato pela delicadeza do tema.
A ameaça à candidatura de Dilma Rousseff tomou força ontem, quando foi divulgado que a avaliação positiva do governo caiu de 43% para 36% em relação a dezembro, segundo pesquisa CNI/Ibope. O porcentual de entrevistados que consideram o governo regular oscilou de 35% para 36%, enquanto os que o avaliam como ruim ou péssimo subiu de 20% para 27%.
Essa pesquisa acendeu a luz amarela em relação ao apoio popular da presidente, em meio a uma economia em desaceleração, a uma inflação em alta e a escândalos, como a compra da refinaria de Pasadena pela Petrobrás.
É preciso ressaltar, contudo, que na última pesquisa de intenção de voto, a presidente ainda conta com larga vantagem. No levantamento do Ibope, divulgado no dia 20 deste mês, a presidente Dilma Rousseff venceria a eleição no primeiro turno caso a votação fosse hoje, na pesquisa estimulada. 
No cenário em que a presidente enfrenta Aécio Neves (PSDB), Eduardo Campos (PSB) e candidatos de partidos nanicos, Dilma aparece com 43% das intenções de voto. O senador do PSDB é o segundo colocado com 15% e o governador de Pernambuco tem 7%. 
O porcentual de Dilma é o mesmo daquele apresentado na última pesquisa Ibope, em 18 de novembro. Em relação à mesma pesquisa, Aécio subiu um ponto porcentual (dentro da margem de erro) e Campos manteve os mesmos 7%. 
Perspectiva de mudança. Na opinião de Greg Lesko, diretor-gerente da Deltec Asset Management em Nova York, que têm US$ 800 milhões em ativos, dos quais quase US$ 200 milhões investidos nas bolsas da América Latina, os investidores estrangeiros se sentiriam mais confiantes em voltar a comprar Brasil se houvesse a perspectiva de mudança de rumos da política econômica no próximo governo.
"Sobre a volta do Lula, o ex-presidente apenas manteve no lugar os pilares econômicos estabelecidos no governo Fernando Henrique Cardoso", disse Lesko a esta coluna. "Aconteceria um rally nos preços dos ativos apenas se Lula promovesse uma reviravolta no mix atual de política econômica."
Lesko, contudo, não acredita que Lula e o Partido dos Trabalhadores que ele representa fariam isso. "O que o Lula fez no seu governo não eram as políticas do PT", disse. "Outros quatro anos de políticas do PT, quer seja Lula ou Dilma, não seriam bom para o Brasil."
Para Lesko, uma vitória de Aécio Neves seria o que mais agradaria ao mercado pela perspectiva do retorno de políticas "investment friendly", ou pró-investimento. "A Bovespa já teve uma boa alta, então há um potencial para correção, mas se futuras pesquisas de opinião mostrarem uma eleição bem mais competitiva do que os últimos números de intenção de voto indicaram até agora, então há espaço para a Bovespa manter a valorização já acumulada ou subir até mais", disse Lesko.
Na opinião de um estrategista-chefe de um hedge fund baseado em Londres, o qual investe 80% do seu patrimônio em ações e dívida de países emergentes, se as próximas pesquisas mostrarem uma probabilidade cada vez maior de Dilma Rousseff perder as eleições em favor de um candidato da oposição, em especial Aécio Neves, ou mesmo se ela for substituída por Lula, a Bovespa poderia se valorizar mais 20% sobre o nível atual.
Apenas no mês de março, a Bovespa já acumula ganho de 6,1%, sendo negociada a 49.976,69 pontos por volta das 12h20.
"O Brasil tem um grande problema neste momento que é um mix de política econômica, a qual é percebida pelos investidores brasileiros e estrangeiros como sendo errada", afirmou a fonte, que pediu para não ser identificado. "Há grande preocupação com a postura fiscal do governo brasileiro, com a demanda doméstica e com a falta de investimentos - e o sentimento dos investidores é que a reeleição de Dilma não resolveria tais preocupações, ao menos nos primeiros seis ou doze meses do próximo mandato", explicou.
Volta de Lula. Para ele, o mercado ficaria satisfeito com um cenário em que tivesse de escolher entre a volta de Lula ou a vitória de um candidato de oposição que representasse uma mudança dos rumos da política econômica.
"Mas certamente a volta de Lula como candidato do PT no lugar de Dilma seria um 'driver' (catalisador) poderoso para os preços dos ativos brasileiros", afirmou o gestor de hedge fund inglês. Além da alta da Bovespa, ele considera que a entrada de capital estrangeiro poderia derrubar a cotação do dólar até R$ 2,15.
Já um gestor de um hedge fund nos Estados Unidos, com uma aplicação significativa na bolsa brasileira, comentou que há uma grande frustração entre os investidores estrangeiros com a falta de investimentos no Brasil.
"A reeleição de Dilma Rousseff não reverteria o sentimento negativo hoje prevalecente entre os investidores", disse. Além disso, um segundo mandato de Dilma representaria, aos olhos do gestor ouvido acima, a continuidade do controle de preços da energia elétrica e dos combustíveis, além do intervencionismo em vários segmentos da economia. O reflexo disso, segundo ele, está na resistência das expectativas inflacionárias em ceder.
"Obviamente, uma queda dela nas pesquisas de intenção de voto poderá animar os investidores", afirmou. Para ele, a volta de Lula não resolveria as incertezas dos investidores. "Ninguém quer mais o PT e sua política de controle de preços administrados", afirmou. Para ele, uma crescente possibilidade de vitória de Aécio Neves poderia dar mais confiança aos investidores estrangeiros de que, ao menos quanto à estabilidade macroeconômica, o Brasil poderia "arrumar a casa" e abrir espaço para a volta dos investimentos. 
* A coluna de Fábio Alves foi publicada no serviço Broadcast, da Agência Estado

Golpe de 1964: caderno especial do Estadao - Lourival Santana

Excelente artigo do jornalista Lourival Santana, introduzindo um caderno especial do Estadão sobre o golpe, com o link abaixo:

Choque entre 2 visões de Brasil

Lourival Sant’Anna
O Estado de S.Paulo, 30 de março de 2014

O conflito, que refletia a divisão do mundo entre capitalismo e comunismo, fermentava desde o início da década, ganhou as ruas e teve seu desfecho com a intervenção militar

É quase sempre arbitrária e discutível a definição do momento desencadeador de um acontecimento histórico. A tentação é grande de retroceder um pouco mais na busca do ponto de inflexão, do fato definidor. Com o golpe de 64 não é diferente. Mas talvez não seja possível entender aquele ambiente sem recuar pelo menos até a ascensão de Getúlio Vargas em 1930 e a implantação de seu Estado Novo (1937-45). Naquele período, o ditador populista e autoritário encarnou a figura paterna com que tanto sonham, do Descobrimento até hoje, gerações sucessivas de brasileiros, que se sentem desamparados sem um provedor, seja um senhor de escravos, imperador, marechal, coronel ou governante, ao mesmo tempo implacável, benevolente, poderoso.
Getúlio saiu e voltou. Retomado o ciclo dos governos democráticos, foi antecedido e sucedido por presidentes mais ou menos liberais e carismáticos. Mas seu suicídio em 1954 e sua carta-testamento selaram de forma quase mágica o papel do pai austero e protetor. Ao eleger Juscelino Kubitschek em 1955, os brasileiros buscaram uma resposta mais racional para os seus anseios. JK governava com "planos de meta", que resultaram na industrialização e na interiorização do País, por meio de rodovias e da construção de Brasília. Mas o apego popular ao getulismo ficou manifesto na eleição do vice, João Goulart, ministro do Trabalho e herdeiro político de Getúlio, que teve mais votos que Juscelino.
Conterrâneo de Getúlio, Jango, como era conhecido, rico fazendeiro de São Borja, no interior do Rio Grande do Sul, tinha convite, em meados dos anos 40, para entrar para o PSD, o mesmo partido do futuro presidente JK. Foi por intervenção direta de Getúlio, amigo de seu pai, recém-saído da Presidência, que Jango entrou para o PTB gaúcho. São dados biográficos importantes, que compõem o seu perfil futuro, de trabalhista híbrido, líder indeciso, que parecia ter de ser empurrado para o seu destino quase tão trágico quanto o de seu mentor - a desistência não pelo suicídio, mas pela renúncia sem resistência, seguida do exílio.
A posse de Juscelino teve de ser assegurada pelo general Henrique Lott, então ministro da Guerra, contra oficiais que tentaram impedi-la, por considerar a composição PSD-PTB à esquerda demais. Aí o golpe de 64 teve o seu primeiro ensaio, e as duas vertentes doutrinárias do oficialato - a legalista e a linha dura - se explicitaram. Os mandatos eram de cinco anos, sem direito à reeleição do presidente, mas os vices podiam voltar a se candidatar, e sua eleição era separada da do presidente. Em 1960, Jango consolidou sua popularidade, voltando a se eleger vice de Jânio Quadros, da coligação liderada pela UDN, principal partido conservador do País. Se no mandato anterior havia certa convergência entre o PSD e o PTB, e se Juscelino em certo sentido representava o ponto médio entre as correntes liberais e trabalhistas, com sua abordagem "social-democrata" de desenvolvimento, a eleição de 60 lançou o País na rota da divergência ideológica.
Jânio. Precursor do populismo de direita que depois se atualizaria em figuras como Paulo Maluf e Fernando Collor de Mello, Jânio foi o primeiro a dominar com maestria a mensagem dos meios de comunicação de massa. Venceu a eleição empunhando uma "vassourinha" para "varrer a corrupção" e lanchando sanduíches de mortadela nos comícios , para se identificar com os trabalhadores das grandes cidades. Excêntrico, imprevisível e intuitivo, Jânio estava longe de ser um líder liberal no sentido clássico. No seu curto mandato de sete meses, não esboçou uma política econômica coerente. No ambiente internacional envenenado pela Guerra Fria - a disputa por influência entre os Estados Unidos e a União Soviética -, explorou o arraigado sentimento anti-imperialista brasileiro ao condecorar o líder guerrilheiro argentino Ernesto Che Guevara, ícone da Revolução Cubana de dois anos antes, que então começava a alinhar-se com o bloco comunista.

No Comício da Central do Brasil, 18 dias antes do golpe, foto de Getúlio Vargas indica influência de sua visão de Estado intervencionista sobre Jango e líderes sindicais

Essas ambivalências acompanhariam o drama que estava por se desenrolar, e continuariam presentes na visão de Estado paternalista, provedor e autoritário que une grande parte dos brasileiros até hoje. Mesmo que a divisão não fosse clara e linear - e talvez poucas coisas o sejam no Brasil -, havia duas visões, dois modelos, dois rumos para o País, que colidiram na composição Jan-Jan (Jânio-Jango) e nos acontecimentos seguintes.
Em aparente manobra para angariar maior apoio no Congresso, o impulsivo Jânio renunciou em agosto de 1961, denunciando "forças ocultas" nunca vistas à luz da História. Jango recebeu a notícia em Cingapura, depois ter passado pela China comunista, em missão acertada com o presidente, como parte de sua política externa desalinhada com o esquema das duas superpotências - EUA e URSS.
O golpe de 64 teve então o seu segundo - e mais robusto - ensaio. Exército, Marinha e Aeronáutica tinham cada uma seu ministro, que, juntamente com o da Guerra, marechal Odílio Denis, tentaram impedir a posse do vice, pelo fato de ser apoiado pelos partidos Comunista e Socialista Brasileiro (PCB e PSB). A posse foi garantida, mais uma vez, pela corrente legalista, liderada, agora da reserva, pelo marechal Lott, que fora candidato a presidente na chapa de Jango. Assim como em 1955, o general Humberto de Castelo Branco fez parte desse grupo. Dessa vez, no entanto, foi necessário um acordo, pelo qual o presidencialismo deu lugar ao parlamentarismo. Tancredo Neves, do PSD, foi eleito primeiro-ministro.
O incidente abriu espaço para o protagonismo de Leonel Brizola, governador do Rio Grande do Sul pelo PTB e cunhado de Jango, que promoveu a "campanha da legalidade". Um plebiscito em janeiro de 1963 traria de volta o presidencialismo. Jango, no entanto, seguiria com apoio insuficiente no Congresso e nas Forças Armadas, e cada vez mais dependente do respaldo das "massas trabalhadoras", organizadas pelos sindicatos vinculados ao PTB e crescentemente hipnotizadas pela retórica febril de Brizola, que, já como deputado federal, disputava influência nacional com seu cunhado. Brizola pressionava Jango para adotar "reformas de base". Sabendo que não havia apoio no Legislativo para elas, falava em Assembleia Constituinte (o que era traduzido por "fechar o Congresso"), e em impô-las "na marra".
Acuado, sem alternativa de apoio, Jango, de índole conciliadora, pareceu vencer a própria relutância e atropelar a própria natureza no Comício da Central do Brasil, no Rio, no dia 13 de março de 1964, quando adotou a beligerância e a impaciência do cunhado - "vou falar em linguagem que pode ser rude", desculpou-se. Anunciou que havia assinado o decreto de reforma agrária e a nacionalização de cinco refinarias, criticou a Constituição e citou o "supremo sacrifício" de Getúlio Vargas. Bandeiras comunistas tingiam de vermelho a multidão de 150 mil a 200 mil pessoas.
Comunismo. Em reação ao que era percebido como o risco de "comunização" do Brasil - apesar de trabalhismo e comunismo competirem entre si -, foram organizadas as "Marchas da Família com Deus pela Liberdade", com apoio da Igreja e de setores liberais. A Marcha começou em São Paulo, no dia 19, onde reuniu entre 300 mil e 500 mil pessoas, e se espalhou por várias outras cidades, totalizando 1 milhão de manifestantes. Eles defendiam a Constituição, a propriedade e a democracia.
Em 25 de março, cerca de 2 mil marinheiros, sob influência do PCB, desafiaram o ministro da Marinha, Silvio Mota, celebrando o aniversário de uma associação que havia sido declarada ilegal. No dia 30, Jango compareceu a uma reunião de cerca de mil cabos e sargentos no Automóvel Club, no Rio, e pronunciou seu discurso mais virulento, em que falou de "represálias do povo" contra seus adversários, financiados pelo Exterior. Era uma referência ao escândalo de ajuda financeira americana à campanha de deputados. Alarmados com a possibilidade de o Brasil converter-se numa Cuba continental, os Estados Unidos patrocinaram também o Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (Ipes), com sede no Rio, que fazia filmes de propaganda anticomunista.
Os dois episódios foram considerados tão provocativos para o oficialato que se especula se não foram estimulados por agentes da linha dura. Eles demoveram a maioria dos legalistas de suas hesitações - a começar por Castelo Branco, chefe do Estado-Maior. A reação foi imediata - e atropelou a cúpula. De prontidão desde o Comício da Central do Brasil, o 10.º Regimento de Infantaria, de Juiz de Fora, pôs-se em marcha às 12h30 do dia 31, rumo ao Rio. Quando entraram em contato com as tropas sublevadas na estrada, as forças supostamente legalistas se congraçaram com os companheiros e aderiram ao golpe.
Seis dias depois, a ‘Marcha da Família com Deus pela Liberdade’, que começou em São Paulo e espalhou-se pelo País, denunciou o ‘risco comunista’

EUA. Os Estados Unidos enviaram uma força-tarefa com um porta-aviões, quatro destróiers, duas escoltas e navios-tanque, para apoiar a intervenção militar. Mas deram meia-volta muito antes de se aproximar da costa brasileira. A rápida adesão dos comandantes levou Goulart a renunciar, partindo para o exílio no Uruguai. Castelo Branco venceu uma surda disputa de poder com o general Artur da Costa e Silva, líder da linha dura, e sagrou-se comandante da "revolução redentora da democracia", como foi chamada por seus partidários. O Congresso o elegeu presidente, e ele tomou posse no dia 15 de abril.
A intenção dos setores civis que apoiaram o golpe - e aparentemente da ala dos militares legalistas liderados por Castelo - era evitar um possível "autogolpe" de Jango, no qual se presumia que ele fecharia o Congresso e imporia suas reformas de base, inaugurando uma "ditadura do proletariado" tropical, aqui chamada de "república sindicalista". Entretanto, Costa e Silva liderou o que entrou para a história como o "golpe dentro do golpe". Numa sequência de decretos paradoxalmente denominados "atos institucionais", a ditadura militar foi gradualmente se instalando, com o cancelamento da eleição presidencial de 1965, o banimento de partidos, a abolição dos direitos e liberdades. A cada quatro anos, um Congresso subserviente elegeu um general-presidente, escolhido antes pela cúpula das Forças Armadas.
A ditadura durou 21 anos, deixando marcas na sociedade brasileira com a tortura e o desaparecimento de opositores. Na economia, seu legado foi ambivalente: de um lado, a inflação e o endividamento elevados; de outro, a implantação de uma importante infraestrutura no País. Toda essa história é contada em detalhes, em muitos casos inéditos, nas páginas que seguem.