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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

segunda-feira, 31 de março de 2014

O regime militar e a oposição armada (4): A derrota da luta armada e suas consequências - Paulo Roberto de Almeida

regime militar e a oposição armada (4):
um retrospecto histórico, por um observador engajado

Paulo Roberto de Almeida

Sumário:
1. Antecedentes e contexto do golpe militar de 1964
(ver neste link)
2. A reação dos perdedores: resistência política e luta armada
(ver neste link)
3. A passagem à luta armada: a insensatez em ação
(ver neste link)


4. A derrota da luta armada e suas consequências: uma história a ser escrita
A luta armada no Brasil, à diferença de outros experimentos guerrilheiros na América Latina, e de guerras civis na Ásia ou na África, foi relativamente breve, pouco cruenta e atingiu uma fração mínima da população, se é que se pode falar em população, no caso de umas poucas centenas de engajados ativos em seus diversos exercícios tentativos e alguns milhares de militares e policiais dedicados à sua repressão. Ela pode ter uma extensão maior, se considerarmos os primeiros ensaios, quase patéticos, dos brizolistas na imediata sequência da mudança de regime em 1964.
No seu conceito mais restrito, porém, consistindo nas diversas iniciativas de inspiração cubana, de natureza mais urbana do que rural, ela durou, provavelmente, menos de seis anos, aos quais podem ser acrescentados os quatro ou cinco de guerrilha “maoísta” nas selvas do Araguaia, até meados da década seguinte. A maior parte desses experimentos foi bisonha, com muita improvisação, quase nenhuma inspiração, alguma transpiração, mas a repressão, no começo despreparada, foi brutal e eficaz: todos os focos, nas cidades e nos campos, foram eliminados a partir do planejamento e do engajamento dos militares nas tarefas da repressão direta, que contou mais com força bruta do que propriamente com inteligência: ela também foi feita mais de transpiração do que de inspiração.
A luta armada no Brasil obedeceu, com a exceção do episódio maoísta na região do Araguaia, a uma inspiração essencialmente cubana, ainda que métodos, situações políticas e, obviamente, elementos humanos tenham sido totalmente diversos no Brasil do que foi a guerra de guerrilhas em Cuba, que teria supostamente servido de modelo para os empreendimentos realizados no Brasil de meados dos anos 1960 ao início da década seguinte. A revolução cubana foi, de fato, um fenômeno eletrizante no contexto latino-americano, bem mais do que sua importância real na história política do século 20 ou do que sua capacidade de transformar significativamente a realidade nos países da região. Todos os experimentos realizados sob sua inspiração direta – e na maior parte dos casos com seu apoio material – fracassaram: ou foram fragorosamente derrotados militarmente, ou se extinguiram por ineficácia prática, ou, ainda, sobreviveram apenas como deformação grotesca do projeto original, como no caso dos grupos guerrilheiros narcotraficantes da Colômbia e do Peru, convertidos em meros criminosos, traficantes e sequestradores. Os dois países, e os Estados Unidos, não hesitam em chamá-los de terroristas, uma classificação nem sempre aceita por certos governos supostamente progressistas da região.
No Brasil, a importância da luta armada foi bastante reduzida, em termos práticos, ainda que a própria esquerda, e seus escribas gramscianos, e também os militares, tenham a ela atribuído uma relevância histórica que efetivamente ela não tem e nunca teve; uma perspectiva histórica de mais longo prazo se encarregará de minimizar sua importância na história contemporânea do Brasil. A luta armada foi um fenômeno marginal, e os poucos casos de terrorismo mais marginais ainda, mas uma história isenta, completa, não passional, de todos os seus aspectos ainda está para ser escrita. Ela não foi tão traumática quanto o foi na Argentina, no Chile, no Peru e na Colômbia, para ficar nos casos mais relevantes, nem todos similares em dimensão, características e impacto residual, ou permanente. Em vários desses países, o grau de repressão foi tão vasto, que mesmo as lideranças políticas mais moderadas tiveram de acenar com algum “julgamento da História”, quando não com julgamentos reais. A dimensão da luta armada no Brasil não justificaria, provavelmente, esse tipo de retomada das feridas, não fosse pelo fato de os derrotados terem chegado ao poder.

(continua...) 

Otaviano Canuto: o Brasil nao esta a beira de uma crise fiscal (revista Epoca)

Entrevista: Otaviano Canuto, conselheiro-sênior para economias dos BRICS do Banco Mundial

“O Brasil não está à beira de uma crise fiscal”

Por Luís Artur Nogueira
Revista Época, 2/03/2014

Há 11 anos trabalhando em Washington, o economista sergipano Otaviano Canuto, de 58 anos, já ocupou diversos cargos no Banco Mundial e no Banco Interamericano de Desenvolvimento. Nesse período, teve o privilégio de acompanhar os desdobramentos econômicos no Brasil, sem se deixar contaminar pelo debate político-eleitoral. Além disso, conversa rotineiramente com empresários e investidores estrangeiros interessados em obter informações sobre o País. Em visita à Universidade de São Paulo, na quarta-feira 26, Canuto concedeu entrevista à DINHEIRO em meio às repercussões sobre o rebaixamento do Brasil pela Standard and Poor’s (S&P). 

Qual é a sua visão sobre a situação fiscal do Brasil?
Eu noto um certo descompasso entre a visão de fora, do Exterior, e a visão de dentro do País. Até porque a visão interna é um pouco impregnada por questões políticas, o que é normal numa democracia, ainda mais em ano de eleição. 

Mas a visão externa, da S&P, também não é boa...
O que as agências de classificação de risco fazem não é dizer se o Brasil é bom ou ruim, nem se é um bom lugar para investir ou não. O rating dessas instituições é uma tentativa de opinar sobre a probabilidade de pagamento dos países. O importante, no caso da Standard & Poor’s, é que a redução da nota brasileira não foi acompanhada de algum tipo de “olha, teve essa redução e pode ter mais”. Aí, sim, a coisa complicaria, porque o mercado se anteciparia a possíveis rebaixamentos, o que colocaria o País numa zona perigosa. 

Então, a perspectiva estável da nota traz tranquilidade ao País?
Sim, afinal de contas o País não está à beira de uma crise fiscal. E, não por acaso, o rebaixamento já estava meio “precificado” pelo mercado. O mais importante é que o Brasil continua sendo grau de investimento. Na hora de avaliar a relação dívida/PIB, é preciso levar em consideração o crescimento econômico, o tamanho do superávit primário e a visão do prêmio de risco que o mercado está exigindo. Dessas três variáveis, a única sobre a qual o governo tem poder imediato é o superávit. De fato, se nós compararmos o Brasil de hoje com o de quatro anos atrás, a dívida bruta piorou um pouco.

É um quadro preocupante? 
Não se trata de uma situação de deterioração fiscal que esteja prenunciando uma crise. Porém, a evolução desse quadro vai depender do que acontecerá com a dívida pública no futuro. Do lado do crescimento, tudo o mais permanecendo constante, o sinal é para cima. 

O que justifica, na sua avaliação, essa tendência de alta do PIB?
A mudança de postura do governo em relação a concessões, atraindo investimentos na área de infraestrutura. O que está segurando o crescimento no Brasil é a carência de investimentos em infraestrutura, que gera um ônus muito grande em vários setores da economia. O Banco Mundial fez um estudo, em 2006, que apontou uma perda de 30% na produção de soja por conta dos gargalos logísticos como armazenamento, transporte e portos. Eu duvido que esses problemas não se repitam em outros setores. O desperdício de recursos e os riscos associados à insegurança energética reduzem a produtividade da economia. Se o País conseguir deslanchar numa onda de investimentos em infraestrutura, os ganhos de produtividade serão generalizados. 

Que outros fatores podem ajudar o PIB?
Sem dúvida, o ambiente de negócios no Brasil. A estrutura jurídico-institucional impõe um desperdício de materiais humanos, sem a contrapartida de valor. O tempo que se requer no Brasil para uma licença de construção é um absurdo, e há problemas em todos os níveis de governo. Para não falar no óbvio, que é o numero de homens-hora que uma empresa gasta para pagar impostos. Não estamos falando de carga tributária, mas o quanto se gasta para conseguir cumprir todas as normas. Isso é desperdício de gente qualificada e de recursos humanos. Além disso, creio que há uma margem de ganho por maior eficiência no gasto público. 

De que forma?
Se o País adotasse uma maior transparência não apenas nas grandes obras, mas em todos os gastos, com licitações eletrônicas, certamente haveria menos desvios e mais competição, o que reduziria os gastos públicos. Essa agenda me parece tão óbvia que quem ganhar a eleição vai perceber o potencial de ganhos de produtividade que isso tem. 

Quando o Banco Mundial discute o Brasil, qual é o ponto mais exaltado?
A redução da pobreza, nos últimos anos. Esse, aliás, era o ponto que nos dava mais vergonha.

O Bolsa Família é um símbolo disso?
É um símbolo, mas a redução da pobreza é explicada também pela melhora nos índices de escolaridade da população. Há muito o que avançar na qualidade da educação, mas a simples mudança no nível educacional básico já tem feito uma diferença enorme. 

E o tema mais criticado?
O que me dá agonia é o ambiente de negócios, porque há coisas irracionais. 

Se um investidor estrangeiro chega para o senhor e diz que é difícil fazer negócios no Brasil...
Não tenho o que falar para ele. É inexplicável. Com medo, o investidor arranja um sócio brasileiro e já calcula o custo que terá para contratar um exército de advogados e contadores. No final, é claro, coloca tudo isso no preço. Isso é um impedimento para pequenos e médios empresários estrangeiros que gostariam muito de ter negócios no Brasil. Além disso, esses advogados e contadores poderiam estar fazendo coisas mais úteis dentro da empresa do que enxugar gelo. Essa reclamação eu escuto sempre dos estrangeiros. 

O Brasil precisa mudar a sua imagem no Exterior? 
Trabalhar a imagem ajuda, mas não sem antes mudar a realidade. As pessoas olham para o País com um potencial enorme, muita riqueza natural, instituições democráticas e uma cultura que é muito amigável ao investimento externo. Tanto que, a despeito de todos esses empecilhos, continua sendo um polo de atração de investimento direto estrangeiro. Só que poderia ser muito mais, com greenfields, novas unidades produtivas. 

Estamos comemorando 20 anos do Real. Por que a inflação ainda é manchete econômica no Brasil?
Porque ela está rodando acima do centro da meta. Acho que o ideal seria combinar a política monetária com uma política fiscal condizente. A política monetária é o instrumento principal, mas, evidentemente, sua eficácia seria maior se conseguisse convencer os agentes a alterar suas expectativas. Alterando expectativas, ela diminui o ritmo de repasses e, olhando para a frente, os ajustes de preços passam a ser menores. Mas isso precisa de uma sintonia com a política fiscal. A boa notícia é a clara percepção que o governo federal teve de ajustar a política fiscal, nesse contexto. No entanto, não se consegue isso da noite para o dia, porque parte dessa deterioração no problema fiscal diz respeito a gastos que são automáticos e que precisam de reformas estruturais para serem alterados. 

Colaborou: Carolina Oms

O regime militar e a oposicao armada (3): A passagem a luta armada: a insensatez em acao - Paulo Roberto de Almeida

regime militar e a oposição armada (3):
um retrospecto histórico, por um observador engajado

Paulo Roberto de Almeida

Sumário:
1. Antecedentes e contexto do golpe militar de 1964
(ver neste link)
2. A reação dos perdedores: resistência política e luta armada
(ver neste link)


3. A passagem à luta armada: a insensatez em ação
Repercutia então – em torno de 1966 – a palavra de ordem de Ché Guevara que era a de “criar dois, três, muitos Vietnãs”, como forma de ajudar a guerrilha vietcong a vencer o imperialismo. Não se sabia, então, onde estava o comandante Ché Guevara, que se tinha despedido oficialmente de Cuba, e de seus cargos cubanos, desde 1965, para continuar, como diziam os líderes cubanos, sua obra de revolucionário em outros continentes. Dois anos depois ele terminaria a vida nas selvas da Bolívia, maltrapilho, faminto, entregue à sua própria sorte, já que o Partido Comunista boliviano ignorou-o.
Pouco depois, mesmo em face do completo fracasso da aventura guerrilheira de Ché Guevara na Bolívia, os grupos que se estavam se preparando para a luta armada no Brasil passaram à ação, com ataques a quarteis, atentados a bomba, assaltos a bancos (chamados de “expropriações”) e de municiamento em armas e munições, embora de forma desorganizada e improvisada, como logo se constatou. Em 1966, um dirigente do PCB, Carlos Marighella, que tinha participado das reuniões de Havana e rompido com o Partidão, criou, com alguns outros companheiros e muitos recrutas do movimento estudantil, a Ação de Libertação Nacional: esta passou imediatamente a emitir palavras de ordem no sentido de atacar os militares e outros representantes da ditadura.
Numa primeira fase se tratava de ações simbólicas, e logísticas – ou seja, de levantamento de fundos – que seriam seguidas, esperava-se, de revoltas populares e de greves de trabalhadores, que todas contribuiriam para o “acirramento de contradições” e a passagem à fase ulterior da luta, com brigadas e unidades completas armadas, que seriam capazes de vencer o exército a serviço da burguesia e do imperialismo. Em qualquer hipótese, a passagem às ações armadas se deu muito tempo antes do AI-5, de dezembro de 1968. A partir daí, em vista do recrudescimento dos ataques de grupos armados de guerrilheiros urbanos, é que ocorreu o verdadeiro endurecimento do regime militar, desafiado por ataques diretos às suas instalações, com perda de vidas dentre os seus membros.
O ano de 1968 parecia ensejar, de fato, grandes progressos para os movimentos de resistência à ditadura. A despeito da morte de Ché Guevara, na Bolívia, em outubro do ano anterior, pipocavam por todas as partes, na região e no Brasil, ações armadas que pareciam prenunciar a ascensão dos grupos guerrilheiros que iriam se lançar na “guerra” contra o regime militar. Não se percebia muito bem que, por mais espetaculares que fossem as ações do punhado de militantes que tinham decidido pegar em armas – assaltos a bancos, roubos de armas, ataques a quartéis, “justiçamento” de um “espião americano” (como o capitão Charles Chandler) ou de algum “esbirro da ditadura” –, elas não iriam levar, por si só, à formação das colunas guerrilheiras (ao estilo cubano) ou do “exército popular” (como no exemplo chinês) que conduziria os grupos guerrilheiros à tomada do poder.
A população permanecia relativamente indiferente a esses apelos à “luta armada”, e os trabalhadores já tinham preocupação suficiente com a defesa de seus salários, num ambiente inflacionário que permanecia renitentemente inercial e sustentado. A relativa intensidade dos ataques a bancos e a outros alvos táticos dava a impressão que os movimentos de luta armada estavam crescendo, quando na verdade eles apenas procuravam sustentar-se a si próprios, independentemente de qualquer debate político mais estratégico ou de ações efetivas de organização da população. A situação se inverteu rapidamente: padres dominicanos – um dos quais continua ativo e com as mesmas ideias que tinha naquela época – que serviam de contato com um dos líderes mais famosos da guerrilha, Carlos Marighella, foram presos no segundo semestre de 1969.
Poucos dias depois, mais exatamente em 4 de novembro de 1969, Marighella foi morto num “encontro” com a polícia política, encontro ao qual um dos dominicanos foi levado como “isca”. O choque foi brutal, e a partir daí o ambiente psicológico foi, na verdade, não mais de avanços na luta contra a ditadura, mas de simples busca de sobrevivência, quando os grupos existentes – bastante divididos entre si – e os seus “combatentes” procuravam, mais concretamente, encontrar meios e formas para continuar livres, e vivos, esperando alguma mudança positiva no futuro de médio ou longo prazo, ou seja, uma crise do sistema, greves operárias e levantes da população contra o regime. Nada disso ocorreu, obviamente.
A fase seguinte da guerrilha urbana foi marcada por diversos sequestros de diplomatas, apenas como forma de libertar os guerrilheiros ou opositores já presos, e submetidos a tortura, muitos deles. Se tratava de uma luta de sobrevivência, que se arrastou durante dois ou três anos mais, até a completa dispersão dos grupos de luta armada. No refluxo dos movimentos de guerrilha urbana anti-regime militar, cada um buscou as melhores soluções de sobrevivência num quadro de aumento da repressão ditatorial, de censura, de prisões arbitrárias. Essa fase coincidiu com a descoberta de núcleos rurais preparatórios a uma futura guerrilha na região do Araguaia, sob a responsabilidade do PCdoB: essa “frente” – na verdade, focos dispersos numa região de penetração muito difícil – foi desbaratada, depois de muito esforço por parte das forças do Exército, não sem novas exações e abusos por parte dos militares.

(continua...) 

O regime militar e a oposicao armada (2): A reacao dos perdedores: resistencia política e luta armada

regime militar e a oposição armada:
um retrospecto histórico, por um observador engajado

Paulo Roberto de Almeida

Sumário:
1. Antecedentes e contexto do golpe militar de 1964
(ver neste link)


2. A reação dos perdedores: resistência política e luta armada
Seja qual for a interpretação que se decida adotar ainda hoje, o golpe militar de 1964 contra o regime de João Goulart – ou a “revolução”, segundo seus promotores – provavelmente não representou nada de muito diferente do que ocorreu na mesma época em diversos outros países latino-americanos. Talvez não tenha sido realmente nada de muito diferente, inclusive no que respeita às forças de esquerda que lutavam contra os regimes oligárquicos ou de burguesias alinhadas ao imperialismo americano durante a era da Guerra Fria. Estas forças se dividiram, logo em seguida, em dois grupos: depois de uma primeira preeminência dos partidos comunistas de orientação (e subserviência) soviética, ocorreram as primeiras cisões na esquerda latino-americana, basicamente representadas pela criação de partidos comunistas pró-chineses (tendentes a apoiar o conceito de guerra popular de base camponesa, conforme o modelo maoísta) e de movimentos identificados com a visão foquista-guerrilheira do processo de luta contra o Estado burguês, privilegiando os métodos fidelistas-guevaristas de tomada do poder.
A esquerda brasileira também acompanhou essas divisões dos movimentos de esquerda no plano mundial e passou a se organizar em função dos modelos respectivos de lutas políticas e militares. As cisões da esquerda brasileira se deram sobretudo em detrimento do “Partidão” (o “velho” PCB); foram muitas as que ocorreram, a começar pelo grupo maoísta que acompanhou as críticas de Mao Tsé-tung ao “revisionismo soviético” então representado pela desestalinização conduzida por Nikita Kruschev: se constituiu então o Partido Comunista do Brasil (PCdoB), que pretendia retomar a tradição dos primeiros anos do poder bolchevique, mas que acabou seguindo a via chinesa da guerra “camponesa” (consubstanciada mais tarde na guerrilha do Araguaia).
Vários outros grupos se organizaram, geralmente com o sentido de “passar à ação”, ante o reformismo do Partidão. Não havia muita elaboração teórica em torno das opções de luta, nem uma análise “científica” do que era a sociedade brasileira, ou sobre sua disposição de adotar a luta armada como uma forma de resistência a um regime que, nessa conjuntura (1965-1966), estava longe de ser uma ditadura feroz. Muitos desses grupos se organizaram atendendo ao apelo das conferências realizadas em Havana, a Tri-continental (reunindo militantes dos três continentes do Terceiro Mundo) e a dos movimentos guerrilheiros da América Latina, da qual resultou a criação da OLAS, Organização Latino-Americana de Solidariedade, uma mini-internacional que pretendia estimular o modelo cubano em todos os países do continente.
De fato, para a esquerda latino-americana, nenhum episódio da Guerra Fria foi tão marcante quanto a revolução cubana, e seu desfilar de “guerrilheiros heroicos” lutando contra um ditador submisso aos EUA. Ché Guevara simbolizava essa luta e foi com ele que se identificavam os jovens que também pensavam libertar o Brasil da hegemonia americana e instaurar um regime de “justiça social” e de “democracia popular”, embora divididos entre a adesão a um ou outro dos socialismos realmente existentes. Cuba era justamente o exemplo de que se podia derrocar um regime corrupto e criar o “homem novo”, base da transformação radical que se esperava fazer. As primeiras reações ensaiadas pelos militantes que recusavam a via reformista e pacifista do Partido Comunista Brasileiro, de linha soviética, partiam de pressupostos de inspiração cubana ou maoísta, no sentido de que só a luta armada poderia representar a verdadeira libertação do Brasil.
Todo o ambiente universitário era invariavelmente caracterizado por uma ideologia de esquerda, essencialmente marxista, nas diversas variantes da época, a que se somava a radicalização concomitante da chamada Igreja progressista. Os jovens dessa geração foram sendo levados quase naturalmente para a opção socialista, que na época se apresentava como uma solução “factível” e “possível”, tendo em vista os exemplos precedentes da revolução bolchevique, da guerra civil conduzida por Mao Tsé-tung na China e, sobretudo, porque bem mais perto do Brasil, da guerrilha cubana. Progressivamente, esses movimentos foram se preparando para a luta armada, de acordo com as diretrizes que emanavam de Havana, onde tinha sido organizada, em 1965, a Conferência Tri-continental, para prestar solidariedade ao Vietnã do Norte, em sua luta contra a república pró-americana do sul, e para estimular a luta armada na América Latina, como recomendava Fidel Castro, e como já tinha passado à ação Ché Guevara.
Guevara era – parece que continua sendo, a despeito de todas as evidências em contrário – o símbolo da rebeldia juvenil contra a opressão capitalista, e a metodologia então proposta para romper com o capitalismo e o imperialismo era dar início a um “foco guerrilheiro”, conforme teorizado pelo militante francês Regis Debray. No Brasil, entretanto, na ausência de massas camponesas sujeitas a algum tipo de dominação “feudal”, ou de uma “Sierra Maestra” próxima das cidades e dos latifúndios, nem a solução maoísta da guerra camponesa, nem o modelo cubano da coluna de guerrilha rural pareciam aplicáveis, razão pela qual os líderes comprometidos com a luta armada adotaram a via da guerrilha urbana, como depois seria enfatizado no “Mini-manual do guerrilheiro urbano”, do dissidente do Partido Comunista pró-soviético e líder da Ação de Libertação Nacional, Carlos Marighella.
Essas nuances das táticas de combate não se manifestavam, contudo, de forma muito clara no debate político desses grupos guerrilheiros, que decidiram passar à ação mesmo na completa confusão do que fazer, de quem doutrinar, que tipo de mensagem política preconizar, ou qual tipo de governo se pretendia implantar, exatamente, depois que se conquistasse o poder. O que é certo é que ninguém, nenhum desses grupos, em nenhum documento programático, se dizia que a intenção, ao lutar contra a ditadura militar, era a de colocar em seu lugar uma “democracia burguesa”, ou admitir alguma variante do regime capitalista-burguês. Sem que isso ficasse muito explícito, o que se cogitava, na verdade, era alguma variante dos regimes cubano ou chinês, uma vez que a União Soviética já era julgada, então, como muito burocrática e conservadora. Alguns grupos admitiam claramente que estavam lutando pela “ditadura do proletariado”.

 (continua...)

Mudancas climaticas: os neomaltusianos do tempo preveem sempre o pior...

Não há muito novidade nesses gritos de alarme, com projeções de desastres incomensuráveis, feitos por esses novos profetas do apocalipse climático (e oceânico) que são os cientistas do clima.
Eles são os novos malthusianos, aqueles que anunciam tais e tais catástrofes se a humanidade não se arrepende de seus pecados e segue o caminho duvidoso que eles preconizam.
Eu gastaria todo o dinheiro que eles projetam ser empregado na mitigação dos gases de efeito estufa na promoção do desenvolvimento de regiões atrasadas, não como ajuda ao desenvolvimento, mas simplesmente para o tratamento de epidemias, algumas poucas obras de infraestrutura mas restritas ao saneamento básico e, sobretudo, educação, não mais do que isso.
A educação dos países pobres, e um regime comercial aberto, livre para a competição agrícola, fará muito mais, e melhor, para preparar o mundo para os desastres neomalthusianos do que todo esse dinheiro que os cientistas malucos pensam gastar com quem já é rico, ou seja, indústrias e governos (inclusive cientistas) para que eles façam o que o sistema de livre mercado e de preços livres fará melhor: preparar a humanidade para tempos diferentes (não digo nem melhores nem piores, apenas diferentes) que virão, eventualmente.
Assim como deve haver coisas ruins, derivadas do tal de aquecimento global (man-made, não se esqueçam), também deve haver coisas boas, ora essa. Nenhuma realidade, sobretudo econômica, tem uma só faceta.
Paulo Roberto de Almeida


BY JAMES FREEMAN
ANOTHER CLIMATE WARNING
The Wall Street Journal, March 31, 2014

Summarizing the latest warning from the United Nations' Intergovernmental Panel on Climate Change, the New York Times reports that "the worst is yet to come." This is of course the message of every climate warning, since the global-warming thesis is that emissions of greenhouse gases now will cause dire consequences in the future . But what's new here is an emphasis on one potential consequence. "In particular, the report emphasized that the world's food supply is at considerable risk — a threat that could have serious consequences for the poorest nations."
Yet according to a separate U.N. organization, the World Food Programme, the world's food supply is not simply at risk in the future. The WFP says that a full 842 million people in the world do not have enough to eat right now. Has the climate panel calculated how the costs of global-warming regulation could make it more difficult to feed these suffering souls?
The impact of potential energy restrictions on the world's developing countries is particularly relevant because, as the Times correctly notes, "While greenhouse gas emissions have begun to decline slightly in many wealthy countries, including the United States, those gains are being swamped by emissions from rising economic powers like China and India." 

Acucar no comercio internacional: fim de uma distorcao de tres seculos na economia mundial?

Improvável que aconteça. Em todo caso, se trata da primeira vez, em praticamente três séculos de história econômica mundial, que um produto primário, dos mais importantes no comércio internacional desde a baixa Idade Média, e um dos mais importantes desde a era das navegações, vem a ser objeto de negociações realmente internacionais, com vistas a terminar um conjunto de distorções que prejudicam produtores e consumidores em praticamente todos os cantos do planeta.
O açúcar foi um dos primeiros produtos, talvez unicamente, a ser objeto de políticas governamentais de incentivo, estímulo, proteção, subsídios, enfim, um conjunto de medidas oficiais que distorcem as condições de produção, distribuição, comércio e consumo desde antes do período contemporâneo.
Já durante os tempos coloniais, ele era um dos objetos preferidos do exclusivo comercial entre metrópoles e respectivas colônias.
Durante as guerras napoleônicas, quando se começou a produzir mais maciçamente açúcar de beterraba para substituir o de cana que não chegava mais nos portos continentais, começaram as medidas oficiais de subsídios e proteção, que nunca mais terminaram.
O açúcar foi um dos primeiros produtos a deformar as regras de um sistema de comércio aberto e multilateralizado, e provavelmente será um dos últimos, senão o último, a ser totalmente liberado dessas políticas distorcivas.
Não acredito que o esquema proposto por um congressista americano venha a dar resultado, e isto por um motivo muito simples. Ainda que todos os demais países concordassem com o que ele propõe, a Índia, sempre a Índia, nosso grande aliado no protecionismo comercial internacional, simplesmente vai se opor a isso, em nome dos seus 400 ou 500 milhões de miseráveis. A desculpa é esfarrapada, sabemos, e a Índia seria a primeira a ganhar com a modernização do seu setor agrícola, mas a última coisa que políticos populistas, e corruptos, querem ouvir falar é de um sistema de mercados livres.
Nossa aliada no G20 comercial vai sabotar esses esforços, querem apostar?
Prevejo mais algum tempo de subsídios, protecionismo, distorções para o açúcar no comércio internacional.
Ele será o último a ser liberalizado.
Provavelmente dentre de mais ou menos 150 anos...
Paulo Roberto de Almeida

Has the time come for worldwide sugar subsidies to end?

sugarBy Rick Manning
A unique opportunity has emerged at the World Trade Organization to end sugar subsidies once and for all.
Australia, Colombia, Brazil, Paraguay, Thailand, Canada, El Salvador, the European Union and the United States have all complained to the WTO about massive sugar subsidies in India that threaten the world sugar market.
The complaints would be much more powerful if the U.S. Congress were to move forward immediately with Representative Ted Yoho’s (R-FL) proposal that would dictate that U.S. sugar subsidies would end once the rest of the world dropped their market distorting giveaways.  The proposal, known as Zero to Zero, would give U.S. representatives at the WTO the moral authority to demand the rest of the world drop the sugar subsidy arms race without permanently harming U.S. sugar production through unilateral disarmament.
Here’s how it would work.
Under the Yoho Zero to Zero plan, the U.S. would agree to eliminate all domestic sugar subsidies after the WTO had brokered an agreement with other countries around the world to drop theirs as well.  With sugar subsidies taking center stage at the WTO, there is no better time than the present to move forward with this innovative and aggressive move to return to a subsidy free world wide sugar market.
While the Farm Bill in the U.S. has passed and is in place for five years, congressional action on the Yoho proposal should not wait as it would give our nation’s trade negotiators a timely boost in seeking an end to escalating subsidies.  Most importantly, it would force other nations, like Brazil, to choose whether to argue against Indian sugar subsidies while continuing their own program that has undercut other sugar producers around the world.
By leading the way on the Yoho legislation without unilaterally disarming and harming our nation’s domestic sugar industry, Congress would be making a bold statement that could provide the tipping point in the world wide debate on the place of agriculture subsidies as a whole, and sugar subsidies in particular.
Rick Manning is the vice president of public policy and communications for Americans for Limited Government.

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