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domingo, 31 de dezembro de 2017

A economia da complexidade - Paulo Gala

Neste link, para todos os mapas e gráficos:
https://www.paulogala.com.br/os-clusters-de-desenvolvimento-economico-no-mundo/ 

Os clusters de Desenvolvimento Econômico no mundo

O mapa acima mostra as 3 regiões mais desenvolvidas do planeta: Europa, America do Norte e Leste Asiático. America Latina e Africa estão fora desse circuito. o mapa destaca os países produtores de maquinas e eletro-eletrônicos em 2014, os produtos mais complexos do mundo segundo o Atlas da Complexidade são basicamente manufaturas de ponta. Países da America do Norte e Europa também produzem commodities, mas se destacam mesmo por conta de sua produção manufatureira. America Latina e Africa só são capazes de produzir commodities.
Hausmann et al (2011) usam técnicas de computação, redes e complexidade para criar um método capaz de medir a sofisticação produtiva ou “complexidade econômica” de países com extraordinária simplicidade. A partir da análise da pauta exportadora de um determinado país, são capazes de medir de forma indireta a sofisticação tecnológica de seu tecido produtivo. A metodologia criada para a construção dos índices de complexidade econômica culminou num Atlas (http://atlas.media.mit.edu) que reúne extenso material sobre uma infinidade de produtos e países desde 1963. Como medir a “complexidade econômica” de uma economia? Hausmann e Hildalgo criaram um método de extraordinária simplicidade e comparabilidade entre países.
A partir da analise da pauta exportadora de uma determinada economia são capazes de medir de forma indireta a sofisticação tecnológica de seu tecido produtivo. Os dois conceitos básicos para se medir se um país é complexo economicamente ou sofisticado são a ubiquidade e diversidade de produtos encontrados na sua pauta exportadora. Se uma determinada economia é capaz de produzir bens não ubíquos, há indicação de que tem um sofisticado tecido produtivo. Claro que há um problema aqui de escassez relativa, especialmente de produtos naturais como diamantes e urânio, por exemplo. Os bens não ubíquos devem ser divididos entre aqueles que têm alto conteúdo tecnológico e, portanto, são de difícil produção (aviões por exemplo) e aqueles que são altamente escassos na natureza (nióbio por exemplo) e, portanto, tem uma não ubiquidade natural.
Para controlar esse problema de recursos naturais escassos na medição de complexidade Hausmann et al (2011) usam uma técnica engenhosa: compara a ubiquidade do produto feito num determinado país com a diversidade de produtos que esse país é capaz de exportar. Por exemplo: Botsuana e Serra Leoa produzem e exportam algo raro e, portanto, não ubíquo: diamantes brutos. Por outro lado têm uma pauta exportadora extremamente limitada e não diversificada. Temos aqui então casos de não ubiquidade sem complexidade. No extremo oposto estão, por exemplo, produtos como equipamentos médicos de processamento de imagem, algo que praticamente só Japão, Alemanha e Estados Unidos conseguem fabricar; certamente produtos não ubíquos. Só que nesse caso as pautas de exportação de Japão, EUA e Alemanha são extremamente diversificadas, indicando que esses países são altamente capazes de fazer várias coisas. Ou seja, não ubiquidade com diversidade significa “complexidade econômica”. Por outro lado, um país que tenha uma pauta muito diversificada, mas com bens ubíquos (peixes, tecidos, carnes, minérios, etc…) não apresenta grande complexidade econômica; o pais faz o que todos fazem.
Diversidade com ubiquidade significa falta de complexidade econômica. O truque dos autores nessas medidas de complexidade é usar a diversidade para controlar a ubiquidade e vice versa. Por exemplo Holanda é considerada um país complexo pois tem uma pauta de exportação diversificada e não ubíqua; é um dos poucos países do mundo que exporta aparelhos de raio-X. Ghana, por outro lado, é um país não complexo pois tem uma pauta de exportação sem diversidade e com produto ubíquos: exporta peixes e produtos agrícolas. A Argentina se encontra numa posição intermediária, tem uma pauta exportadora mais diversificada e menos ubíqua do que Ghana, mas por outro lado, menos diversificada e mais ubíqua do que a Holanda; é, portanto considerada intermediariamente complexa.
A comparação feita no Atlas entre Cingapura e Paquistão também ajuda a ilustrar a metodologia. Os dois países têm grosso modo o mesmo tamanho de PIB só que o Paquistão tem uma população 34 vezes maior do que Cingapura é, portanto, em termos per capita um país muito mais pobre. Vejamos o que a pauta exportadora desses países nos diz. A diversidade de exportação do Paquistão e Cingapura é praticamente a mesma, ambos os países exportam aproximadamente 133 produtos distintos. Só que os produtos exportados pelo Paquistão são também exportados na média por 28 outros países. Os produtos exportados por Cingapura são exportados na média por apenas 17 outros países. Ademais os produtos exportados pelo Paquistão são também exportados por países que têm diversidade de exportações muito baixa, enquanto que produtos exportados por Cingapura são também exportados por países que tem diversificação de exportações muito alta e exportam produtos não ubíquos.
A rotina de cálculo de complexidade do Atlas transforma essas diferenças importantes em um número que recebe o nome de complexidade econômica. Por exemplo, em 2014 o Paquistão tinha uma complexidade econômica de -0.75 e Cingapura de 1.40, significando isso que o segundo país era bem mais complexo do que o primeiro nesse ano. Uma das grandes virtudes desses indicadores de complexidade e’ que eles trabalham com medidas quantitativas a partir dos cálculos de álgebra linear para chegar nos resultados. Não há considerações sobre questões qualitativas relevantes para a produção e exportação desses bens. Ou seja, não há juízo de valor em relação ao que se considera complexo ou não complexo. Outra vantagem interessante dessas medidas esta em poder captar enormes mudanças nas tecnologias produtivas ao longo do tempo de forma coerente. Uma televisão dos anos 70 e’ completamente diferente de uma televisão de 2014.
Um carro, avião, moto dos anos 80 está muito distante do que chamamos hoje de carro, moto ou avião. Ainda assim a metodologia do Atlas da complexidade é capaz de capturar a dificuldade relativa de se produzir cada bem em qualquer momento do tempo. Um país capaz de produzir uma moto hoje talvez fosse incapaz de produzir uma moto em 1980 pelo simples motivo de que hoje com as tecnoloigas existentes e integração comercial é bem mais fácil produzir uma moto. Mas hoje, provavelmente, uma moto é considerada no Atlas um bem menos sofisticado do que em 1980. O conceito de complexidade se mantem ao longo do tempo sempre como uma medida relativa entre países e produtos.
Nessa linha de raciocínio Hausmann e Hidalgo seguem classificando diversos países e chegam a correlações impressionantes entre níveis de renda per capita e complexidade econômica; esse indicador pode ser tomado como uma proxy do desenvolvimento econômico relativo entre países. Não à toa Japão, Alemanha, Estados Unidos, Reino Unido e Suécia estão sempre entres os países mais sofisticados do mundo nos últimos 10 anos. O desenvolvimento econômico pode ser tratado nessa perspectiva como o domínio de técnicas de produção mais sofisticadas que em geral levam a produção de maior valor adicionado por trabalhador; como diria a tradição estruturalista em economia.
O Atlas da Complexidade Econômica traz uma contribuição interessante para a discussão estruturalista da importância da industrialização para o desenvolvimento econômico; do ponto de vista de uma análise estritamente empírica feita pelo algoritmo do Atlas, fica claro que manufaturas se caracterizam em geral como bens mais complexos e commodities como bens menos complexos. Ao calcular a probabilidade de produtos serem co-exportados por diversos países, o Atlas cria uma medida interessante sobre conhecimento produtivo contido nos produtos e capacidades locais necessárias para produzi-los: o “espaço produtivo” (Hidalgo et al 2007). Quanto maior a probabilidade de dois produtos serem co-exportados maior a indicação de que contem características similares e de que portanto demandam capacidades produtivas similares para serem produzidos, são produtos “irmãos” ou “primos”.
O indicador de co-exportação acaba funcionando como uma medida de encadeamento de conhecimento produtivo entre produtos, ou seja, ele indica as conexões produtivas existentes entre vários bens graças aos pré-requisitos comuns necessários para produzi-los. Os bens que tem muita conectividade estão, portanto, carregados de potencial de conhecimento tecnológico. Isto os torna hubs de conhecimento; enquanto que bens com baixa conectividade requerem capacidades produtivas simples e que tem baixo potencial multiplicativo de conhecimento.
Por exemplo: países que produzem motores de combustão avançados provavelmente têm engenheiros e conhecimentos que permitem produzir uma série de coisas similares e sofisticadas. Países que produzem só bananas ou frutas tem conhecimentos limitados e provavelmente serão incapazes de fazer bens mais complexos. É importante frisar aqui que toda dificuldade para se observar isso decorre da incapacidade de se medir e capturar diretamente essas competências produtivas locais. O que se observa no comércio internacional são os produtos e não as habilidades que os países têm em produzi-los. Do ponto de vista empírico, fica claro no Atlas que manufaturas se caracterizam em geral como bens mais complexos e commodities aparecem como bens não complexos.
Das 34 principais comunidades de produtos calculadas a partir de uma algoritmo de compressão do Atlas (Rosvall and Bergstrom 2007), é possível observar que maquinário, produtos químicos, aviões, navios e eletrônicos se destacam como bens mais complexos e conectados entre si (ou seja, hubs de conhecimento). Por outro lado, pedras preciosas, petróleo, minerais, peixes e crustáceos, frutas, flores e agricultura tropical apresentam baixíssima complexidade e conectividade. Cereais, têxteis, equipamentos para construção e alimentos processados situam-se numa posição intermediaria entre os bens mais complexos e menos complexos.
Quanto a críticas e possíveis problemas da metodologia de analise de complexidade, talvez a maior falha do método seja usar unicamente dados de exportações como proxies da estrutura produtiva dos diversos países. Trata-se de fato de uma fragilidade pois sabemos que muitos países produzem mas não exportam bens por n motivos. Toda análise se baseia no que se pode “ver” nos dados de comércio mundial; uma base ampla, desagregada, padronizada e com histórico desde os anos 60. A grande vantagem dessas bases de comércio está justamente na padronização, capilaridade e longevidade dos dados; a desvantagem está em não captar todas as questões internas idiossincráticas de cada país. Por outro lado, as bases de contas nacionais que poderiam ter esses dados não conseguem capturar, ainda, o mesmo tipo de informação com a granularidade necessária para o tipo de análise que aqui fizemos; são, em geral, bases com poucas camadas de desagregação produtiva. Um outro problema da metodologia é não identificar os países que são maquiladores: aqueles que simplesmente importaram e depois exportam produtos complexos. O caso mais conhecido é o México. Schteingart (2014) faz um interessante trabalho para qualificar a complexidade “genuína” de países levando em conta número de patentes registradas e gastos em P&D como porcentagem do PIB.
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Ver Construindo ComplexidadeA vingança dos estruturalistas, como medir complexidade?

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8 thoughts on “Os clusters de Desenvolvimento Econômico no mundo”

  1. Bom dia, professor. Qual é a situação dos países da Oceania (especialmente, Austrália e Nova Zelândia) do ponto de vista da complexidade econômica? Pergunto pois comumente tais países são citados como exemplos de estratégias de desenvolvimento que “prescindiram da industrialização” ou que se basearam essencialmente na produção e exportação de commodities. Abraços, obrigado e parabéns pelo trabalho.
  2. Analisando o impressionante mapa do desenvolvimento econômico do mundo, tenho algumas dúvidas, por gentileza:
    O Canadá e a Austrália que são Países com desenvolvimento econômico somente aparecem com alguns pontos?
    Isso sem falar que poderia aparecer a Nova Zelândia no mapa.
    O próprio México parece que é muito mais desenvolvido economicamente do que o Canadá e a Austrália.
    E países como o próprio Brasil e a Argentina têm desenvolvimento econômico de porte médio.
    Deveriam aparecer no mapa com algum destaque para São Paulo, Rio de Janeiro e Buenos Aires.
    Mesmo a Rússia deveria aparecer muito mais no mapa.
    A impressão que ocorre quando se visualiza esse mapa, é que existem SOMENTE 3 regiões economicamente desenvolvidas no Mundo: os Estados Unidos, a Europa (com exceção da Rússia), e a Ásia Oriental (China, Japão, Coreia do Sul e o Sudeste Asiático).
    E de acordo com aquele mapa: “TODOS os demais Países são totalmente subdesenvolvidos economicamente”, o que obviamente não é verdade. Alguns países tem alguns pontos, mas pouco significa em comparação com as 3 regiões economicamente mais desenvolvidas do Mundo.
    Esse mapa pode estar parcialmente correto.
    1. Prezado, na verdade o mapa mostra os grandes sistemas econômicos do mundo, com economias de 13tri de dólares ou mais! Austrália é Nova Zelândia tem rendas per capitas elevadas mas são exceções, pois só produzem e não estão integradas nesses sistemas. Na África e América latina a maioria dos países é pobre e muito desigual, não houve desenvolvimento de fato, só México avançou um pouco, mas Ainda Longe de ser rico. O mapa na verdade simplesmente destaca os países que hoje são capazes de produzir e exportar máquinas e equipamentos! Esse foi o critério de plotagem!
  3. Olá Paulo, muito bom seus artigos, a America Latina, especialmente o Brasil está fora desse mapa devido a falta de politica voltada para o desenvolvimento. a formação de grupos de cientistas ( universidades junto com as empresas ) voltada para a produção de bens de alto valor agregado ( química fina ou farmaco, microeletronica, mecanica de alta precisão, aliada a uma deplomacia comercial ativa e agressiva para vender esses produtos ao redor do mundo. O grande protagonista dessas mudanças são: a sociedade, ( empresas, políticos e a sociedade organizada) com foco nesse belo futuro.


ONGs nem sempre sao beneficas, e podem causar muito mal - book review

Ithaca: Cornell University Press, 2017. 238 pp. $89.95 (cloth), ISBN 978-1-5017-0923-4; $24.95 (paper), ISBN 978-1-5017-0924-1.

Reviewed by Paul Stubbs (The Institute of Economics, Zagreb)
Published on H-Diplo (December, 2017)
Commissioned by Seth Offenbach

Patrice C. McMahon’s The NGO Game articulates a very clear and consistent thesis that in postconflict environments and beyond, although nongovernmental organizations (NGOs) have been seen as a kind of magic bullet fostering sustainable peace and development, their impact has been much exaggerated. At times, McMahon goes further to suggest that the unintended consequences of their activities result in them actually doing more harm than good on the ground. She is particularly concerned with the distorting influence which international NGOs have on local organizations whose growing numbers are a product more of instrumentalized relations than of burgeoning civil society. A general conclusion is, therefore, that the international community’s faith in NGOs as a kind of peacebuilding panacea, primarily by Western donors, is essentially misplaced and even akin to a form of colonialism.
Most of the empirical evidence for this is drawn from the author’s own extended, if intermittent, fieldwork, over a long period of time, roughly 2000 to 2011, in Bosnia-Herzegovina (which throughout the author calls Bosnia) and Kosovo, presented in chapters 3 and 4 of the book, respectively. In addition, reference is made in the introductory chapter to the author’s fieldwork in Vietnam and Cambodia. Throughout the book, and particularly in the concluding chapter, the author uses work by others on, inter alia, Rwanda, Afghanistan, Sri Lanka, Iraq, East Timor, Libya, Haiti, and postcommunist Russia.    
McMahon in some ways is faced with a dilemma, in that when she began her work on NGOs in peacebuilding, the literature was generally positive about their impact, although lacking detailed empirical validation. However, by the time she wrote the book, an opposite orthodoxy, a kind of complete volte face as it were, was in place, substituting for a more nuanced and complex understanding of the diverse impacts of diverse NGOs in different places at different times. In a moment of reflexivity, the author notes that her own initial discussion of NGOs in Mostar was “incomplete and somewhat misleading” (p. 89), although no direct reference is provided to the text or texts in which this supposed error is manifest. This does not lead McMahon to embrace the open and contradictory roles of NGOs, individually and collectively, over time, within postconflict environments. Instead, she repeats frequently what I want to term the new common sense about their negative impacts, sometimes giving the book an air of superficiality.
Although there is a general agreement that research on peacebuilding and postconflict reconstruction needs to be multidisciplinary,[1] the book appears to be focused primarily within the discipline of international relations (IR). In fairness, an early criticism in the book regarding the statist bias of IR and the concomitant failure to address the role of NGOs and other nonstate actors in international politics leads to McMahon, rightly in my view, suggesting that “IR scholars have a long way to go to catch up with their peers in sociology, anthropology, and even comparative politics, who have all interrogated NGOs more thoroughly” (p. 19). Unfortunately, subsequent reference to, in particular, anthropological work which is extremely well placed to provide a more nuanced account and to address the gap between what NGOs say they do and what they actually do on the ground, is rather haphazard, however. A great deal of important anthropological work on realities in contemporary Bosnia-Herzegovina by Čarna Brković, Andrew Gilbert, Elisa Helms, Azra Hromadžić, Stef Jansen, and Larisa Kurtović, to name a few, for example, is entirely absent.[2]
The author’s invoking, throughout the book, of “institutionalism” as a key conceptual lens through which to address the roles of NGOs in peacebuilding is problematic. McMahon does not explain which type of institutional theory is being preferred (at different moments, rational choice institutionalism, historical institutionalism, and discursive institutionalism seem to be influential). She also does not explain how to conceptualize the relationship between individual agency, organizational form, and macro-level power structures in “determining” NGO practices.
At times, it is not clear whether it is the faith in NGOs as a quick, effective and, above all, cheap substitute for direct, long-term engagement in postconflict reconstruction by international (read Western) intergovernmental and bilateral actors which is the main target of McMahon’s criticism or, rather, any attempt to intervene from outside, through the establishment of protectorates or semi-protectorates. The best parts of the book, in my view, are those which address the complex, and ever lengthening, chains of relations between different agencies and the complex, and often competing, roles of the United Nations and its agencies, the European Union, the World Bank, the Organization for Security and Co-operation in Europe (OSCE), and other key actors in aid and development. l would argue that what Mark Duffield termed a new security and development agenda, linking humanitarianism, peacebuilding, biopolitical interventions, and forms of social and political engineering “from above” within a developing “Duty to Protect” (D2P) frame is more of an issue than the role of NGOs per se.[3] At the same time, linking the faith in NGOs not only to “liberal peace,” which is discussed in the book, but also to “neoliberal restructurings” and “new public management” approaches, which are not, could also have taken the book in an interesting direction. What if the projectization, NGOization, and, even marketization and subcontracting (for-profit actors, including consultancy companies, are not given enough attention in the book), traced here are part of more general global restructurings?[4]
Regarding McMahon’s sources, I am concerned with the rather uncritical use, at times, of Robert Kaplan’s Balkan Ghosts (1993) and Samuel Huntington’s The Clash of Civilizations and the Remaking of World Order (1996). Both works tend to reinforce a kind of “West is best” ideology which, in other places, the author is keen to reject. At the same time, Kaplan’s invocation of “ancient ethnic hatreds” in the Balkans is a prime example of what Milica Bakić-Hayden has termed “nested Orientalism.”[5] Thus, McMahon’s work is in danger of negatively comparing supposed “exotic” elsewheres with a mythical “civilized” West, as well as buying into a thesis that Kosovo is at risk in terms of the spread of “radical Islamic ideas” (p. 162). Favorably quoting Huntingdon for his “cogent” analysis in which “future violence” is caused by “issues of identity and culture” (p. 31) is far from an understanding of the causes of the wars of the Yugoslav succession through categories which are not essentialist but which relate to the contested claims of political elites in complex political economies. Following the work of Michael Pugh and, more recently, Karla Koutkova, any simplistic and binary division between “local” and “international” actors and organizations is difficult to accept.[6] While McMahon does recognize the thriving civil society in Kosovo, explored in Howard Clarke’s Civil Resistance in Kosovo (2000), she fails to pay similar attention to a nascent civil society of women’s, student, and artist groups in parts of Bosnia-Herzegovina in the 1980s.  
The NGO Game appears to be aimed at US readers (the book is marked by a noticeable US-centrism) who still believe in the panacea of NGOs in international assistance, if such straw persons exist. Unfortunately, as someone deeply involved in activist-oriented research on peacebuilding and on the role of NGOs in the post-Yugoslav space, I may be far from the book’s ideal reader. At the same time, the empirical work charting the rise of NGOs in chapter 2 is very much worth reading and shows the author’s grasp of the shifts which occurred in both the framing and practice of partnerships with nonstate actors by a large number of diverse supranational organizations. The argument in the conclusion of four “gaps” undermining NGO work in conflict environments—the “funding gap,” or the failure of most development assistance to actually reach local actors; the “empowerment gap,” in terms of the false rhetoric of “partnership” with local actors; the “accountability gap,” in terms of the failure to involve end beneficiaries; and the “motivation gap,” in terms of the reluctance of powerful actors to change the status quo—is extremely interesting and could, and perhaps, should have been more central to the book.

Notes:
[1]. See Francisco Ferrandiz and Antonius Robben, eds., Multi-Disciplinary Perspectives on Peace and Conflict Research: A View from Europe, (Bilbao: University of Deusto, 2007).
[2]. See, for example, Čarna Brković, “Scaling Humanitarianism: Humanitarian Actions in a Bosnian Town,” Ethnos: Journal of Anthropology 81, no. 1 (2016); 99-124; Andrew Gilbert, “Legitimacy Matters: Managing the Democratization Paradox of Foreign State-building in Bosnia-Herzegovina,” Sudosteuropa 60, no. 4 (2012); 483-96; Elisa Helms, Innocence and Victimhood: Gender, Nation, and Women's Activism in Postwar Bosnia-Herzegovina (Madison: University of Wisconsin Press, 2013); Azra Hromadžić, Citizens of an Empty Nation: Youth and State-Making in Postwar Bosnia and Herzegovina (Phiadelphia: University of Pennsylvania Press, 2015); Stef Jansen, Yearnings in the Meantime: 'Normal Lives' and the State in a Sarajevo Apartment Complex (New York: Berghan Books, 2015); Larisa Kurtović, “The Strange Life and Death of Democracy Promotion in Post-Dayton Bosnia-Herzegovina,” in Unbribable Bosnia-Herzegovina: The Fight for the Commons, ed. Damir Arsenijević (Baden-Baden: Nomos, 2014), 97-102.
[3]. Mark Duffield, Global Governance and the New Wars: The Merging of Development and Security (London: Zed Books, 2001).
[4]. Paul Stubbs, “International Non-State Actors and Social Development Policy,” Global Social Policy 3, no. 4 (2003): 319-48.
[5]. Milica Bakić-Hayden, “Nesting Orientalisms: The Case of Former Yugoslavia,” Slavic Review 54, no. 4 (1995): 917-31.
[6]. Michael Pugh, “Protectorates and Spoils of Peace: intermestic manipulations of political economy in South-East Europe,” Copenhagen Peace Research Institute (2000); Karla Koutkova, “‘The King is Naked’: Internationality, informality and ko ful statebuilding in Bosnia,” in Negotiating Social Relations in Bosnia and Herzegovina: Semiperipheral Entaglements, ed. Stef Jansen, Čarna Brković, and Vanja Čelebičić (New York: Routledge, 2016), 109-21.

sábado, 30 de dezembro de 2017

Conta bilionaria: Tesouro começa a pagar calotes sofridos pelo BNDES em outros paises

Começou a chegar a conta do desastroso, catastrófico, criminoso projeto do lulopetismo aloprado para fazer a política externa megalomaníaca, que foi o principal traço da diplomacia lulopetista. Mas, além da obsessão por ser famoso no mundo inteiro, havia, por trás, por baixo, e por todos os lados, esse projeto criminoso de enriquecer-se pessoalmente por meio da colusão criminosa com as grandes empreiteiras, que são geneticamente corruptas.
Não adianta agora o BNDES vir dizer que atuou sempre tecnicamente, e que não fazia empréstimos para governos estrangeiros, e que apenas financiava a exportação de bens e serviços brasileiros, se essas operações eram garantidas não pelo tomador desses serviços mas pelo Fundo Garantidor de Crédito, ou seja, pelo Tesouro brasileiro, em última instância, eu, você e todo mundo, nós os contribuintes compulsórios, os extorquidos pelo Estado brasileiro.
A conta vai ser grande, gigantesca, e vai pesar por décadas em nossos bolsos, sob a forma de impostos acrescidos, dívida pública aumentada, serviços estatais diminuídos e de baixa qualidade.
Ainda não se fez a contabilidade catastrófica do lulopetismo diplomático, e de sua gigantesca vertente econômica, micro e macro.
Paulo Roberto de Almeida
Uberaba, 30 de dezembro de 2017

Conta bilionária: Tesouro começa a pagar calotes sofridos pelo BNDES em outros países
Primeiro a dar o calote foi Moçambique, segundo informa a Folha de S. Paulo - mas conta pode ser ainda maior
SÃO PAULO - O Brasil está pagando agora um preço alto pelas políticas dos últimos governos de financiar em outros países obras de empreiteiras brasileiras envolvidas na Operação Lava Jato através do BNDES(Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), segundo informa o jornal Folha de S. Paulo desta sexta-feira (29).
Durante os governos de Lula e Dilma Rousseff, as empreiteiras expandiram presença na África e na América Latina graças a volumosos empréstimos do banco de fomento, o que rendeu contratos bilionários às empresas e potencializou as exportações do Brasil. Mas agora alguns países entraram em crise e estão deixando de honrar compromissos. Com isso, as contas estão sobrando para o Tesouro. Isso porque os financiamentos têm seguro do FGE (Fundo de Garantia à Exportação). Assim, em caso de calote dos países, o pagamento fica com o Tesouro Nacional.
O jornal cita que, no último dia 15, o governo liberou do Orçamento R$ 124 milhões para ressarcir o banco por não receber US$ 22,4 milhões (fora encargos) de um financiamento feito a Moçambique, sendo este possivelmente o começo de uma série de pagamentos que recairão sobre o contribuinte brasileiro e que, apenas no caso do país africano, deve chegar a US$ 483 milhões (R$ 1,5 bilhão). Moçambique, em grave crise financeira, deixou de pagar duas parcelas; com o default confirmado, o BNDES acionou o FGE e o primeiro pagamento foi feito em dezembro.
O governo também deve decretar calote oficial da Venezuela, pela falta de pagamento de uma parcela de US$ 262 milhões em setembro. O BNDES e bancos privados têm a receber US$ 1,5 bilhão (cerca de R$ 5 bilhões) da Venezuela – mais da metade desse valor em 2018.  O terceiro país sob risco é Angola, com passivo com o Brasil somando US$ 1,9 bilhão. 
 Ao ser procurado pelo jornal, o BNDES informou que "não financia projetos em outros países, mas a exportação de bens e serviços produzidos no Brasil, tendo por objetivo o aumento da competitividade das empresas brasileiras, a geração de emprego e renda no país".

quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

Suspenso o indulto natalino de premio a improbidade e ao crime de colarinho branco

Ministra Cármen Lúcia suspende dispositivos de decreto que amplia regras para concessão de indulto
“Indulto não é e nem pode ser instrumento de impunidade”, afirma presidente do STF. De acordo com a ministra, dispositivos suspensos "não se coadunam com a finalidade constitucionalmente estatuída a permitir o indulto, portanto, sem fundamento jurídico válido”.
28/12/2017 17h15 - 
http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/bancoImagemSco/bancoImagemSco_AP_365896.jpg

A presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, deferiu medida cautelar para suspender os efeitos de dispositivos do Decreto 9.246/2017 que reduziram o tempo de cumprimento da pena para fins de concessão do chamado indulto de Natal. “Indulto não é e nem pode ser instrumento de impunidade”, afirma a ministra na decisão, tomada na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5874, ajuizada pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge.
Os dispositivos impugnados são o inciso I do artigo 1º, o parágrafo 1º do artigo 2º e os artigos 8º, 10 e 11 do decreto. O inciso I do artigo 1º concede indulto natalino aos condenados que cumpriram um quinto da pena, no caso de não reincidentes, nos crimes praticados sem grave ameaça ou violência. Reduções de penas também estão previstas no artigo 2º. O artigo 8º beneficia réus que cumprem medidas alternativas à prisão ou tenham obtido a suspensão condicional do processo, e o artigo 10º extingue penas de multa e flexibiliza a reparação do dano causado. O artigo 11 prevê a possibilidade da concessão do benefício mesmo quando ainda há recursos em andamento.
A ministra explicou a natureza do indulto, adotado no Brasil desde a Constituição de 1891 “em situações específicas, excepcionais e não demolidoras do processo penal” a fim de se permitir a extinção da pena pela superveniência de medida humanitária. A medida, segundo a presidente, é um gesto estatal que beneficia aquele que, tendo cumprido parte de seu débito com a sociedade, obtém uma nova chance de superar seu erro, fortalecendo a crença no direito e no sistema penal democrático. “Indulto não é prêmio ao criminoso nem tolerância ao crime”, ressaltou. “O indulto constitucionalmente previsto é legitimo apenas se estiver em consonância com a finalidade juridicamente estabelecida. Fora daí é arbítrio”.
Em relação ao Decreto 9.246/2017, Cármen Lúcia entendeu que os dispositivos impugnados pela procuradora-geral da República não se coadunam com a finalidade constitucional do instituto do indulto, pois “esvazia-se a jurisdição penal, nega-se o prosseguimento e finalização de ações penais em curso, privilegia-se situações de benefícios sobre outros antes concedidas a diluir o processo penal, nega-se, enfim, a natureza humanitária do indulto, convertendo-o em benemerência sem causa e, portanto, sem fundamento jurídico válido”.
Crimes de "colarinho branco"
A presidente também considerou plausível a alegação da PGR de afronta ao princípio da proporcionalidade, porque os dispositivos questionados “dão concretude à situação de impunidade, em especial aos denominados ‘crimes de colarinho branco’, desguarnecendo o erário e a sociedade de providências legais voltadas a coibir a atuação deletéria de sujeitos descompromissados com valores éticos e com o interesse público garantidores pela integridade do sistema jurídico”.
Em relação à multa, a decisão destaca que a pena pecuniária “não provoca situação de desumanidade ou digno de benignidade”, e lembra que o STF firmou jurisprudência no sentido de que, para que o condenado possa obter benefício carcerário, como a progressão de regime, é imprescindível o adimplemento da pena de multa. “Indulto de pena pecuniária significa, num primeiro exame, relativização da jurisdição e agravo à sociedade”, afirma a ministra.
Para a presidente do Supremo, as circunstâncias que conduziram à edição do decreto, “que, numa primeira análise, demonstra aparente desvio de finalidade”, impõem a concessão de cautelar para a suspensão da norma. A medida, conforme assinalou, não implica qualquer dano de difícil reparação, pois os possíveis beneficiários do indulto cumprem pena imposta mediante processo penal regular, “não havendo se falar em agravamento de sua situação criminal ou em redução de direitos constitucionalmente assegurados”.
A decisão suspende os efeitos dos dispositivos apontados pela procuradora-geral até o exame do caso pelo relator da ADI 5874, ministro Luís Roberto Barroso, ou pelo Plenário do STF.

Bildner Center promove debate sobre Havana, uma cidade destruida pelo castrismo

Havana…Havana!
Author and diplomat Herman Portocarero, former ambassador to Cuba from the European Union and Belgium

Wednesday, January 24, 2018
4PM
 Skylight Room
The Graduate Center, CUNY
This conversatorio will draw heavily from the just published, Havana Without Makeup: Inside the Soul of the City by Herman Portocarero (Turtle Point Press, 2017; photography by Joaquin Portocarero). Illustrated with original photographs, this volume presents a unique account of Havana's history, its present, and what its future may hold.
"The story Portocarero weaves here is rich and fascinating, and vital to understanding an often mysterious place."--Patrick Oppmann, CNN Havana Correspondent and Bureau Chief

Havana without Makeup, an insider's view of Havana, offers a wide-ranging exploration of its many complex facets. It aims to capture the soul of a city and a society that have evolved on their own terms at the moment before they face inevitable transformations. Opening on the eve of the announcement of reconciliation between the U.S. and Cuba, the book then looks back at the cultural, political, economic, and religious influences that led up to this historic moment and beyond. Examining all things Cuban--racial issues, la revolución, baseball, Hemingway, communism, synagogues, Santeria, Cimarron culture, and much more--Portocarero overturns every stone in his endeavor to bring us inside the city he loves.
Herman Portocarero is a Belgian-born writer and diplomat of Spanish and Portuguese descent. He served twice as Ambassador to Cuba -- representing Belgium in 1995-1999 and the European Union during 2012-2017. He has published more than twenty works of fiction and nonfiction, including the Hercule Poirot Prize-winning crime novel New Yorkse Nachten (New York Nights). 
Jerry Carlson (Ph.D., University of Chicago) is Director of the Cinema Studies Program in the Department of Media & Communication Arts at The City College, CUNY. He is a specialist in narrative theory, global independent film, and the cinemas of the Americas. He is a member of the doctoral faculties of French, Film Studies and Comparative Literature at the Graduate Center, CUNY and a Senior Fellow at the Bildner Center for Western Hemispheric Studies.
Mauricio Font is director of the Bildner Center for Western Hemisphere Studies and Professor of Sociology at The Graduate Center and Queens College, CUNY. Professor Font’s most recent publication is The State and the Private Sector in Latin America (Palgrave Macmillan, 2015). He is co-editor of Handbook of Contemporary Cuba (Paradigm Press, 2013), Handbook on Cuban History, Literature, and the Arts (Paradigm Press, 2014), Cuban Counterpoints: The Legacy of Fernando Ortiz (Lexington Books, 2005), La República Cubana y José Martí (1902-2002) (Lexington Books, 2005), Toward a New Cuba? (Lynne Rienner, 1997) and Integración económica y democratización: América Latina y Cuba (Instituto de Estudios Internacionales, Universidad de Chile, 1998).
TO REGISTER send email to bildner@gc.cuny.edu.

Ricupero lanca o seu livro na Bahia: longa entrevista ao jornal A Tarde

Rubens Ricupero: "Diplomacia é a arma de quem não tem exército"

Luís Fernando Lisboa

Em novo livro, o ex-ministro Rubens Ricupero analisa a situação do Brasil no cenário internacional - Foto: Adilton Venegeroles / Ag. A TARDE
Em novo livro, o ex-ministro Rubens Ricupero analisa a situação do Brasil no cenário internacional
Adilton Venegeroles / Ag. A TARDE
Foram muitos os episódios da política brasileira em que o diplomata, jurista e historiador Rubens Ricupero, 80, foi testemunha e ator participativo. Desde a implantação do Plano Real, como substituto de Fernando Henrique Cardoso no Ministério da Fazenda, do governo Itamar Franco (1992-1994), até a negativa repercussão no “escândalo da parabólica”, no ano de 1994, resultado de uma transmissão televisiva vazada. O episódio foi lembrado recentemente numa nota emitida pelo Planalto Nacional, em reação a uma aspa de Ricupero: “Ninguém quer sair na foto com o Brasil”. A frase vem no contexto de lançamento do seu novo livro A Diplomacia na Construção do Brasil: 1750-2016, recém-lançado pela Versal Editores. Com mais de 55 anos de carreira dedicados à trajetória diplomática, além de atuação como embaixador do Brasil nas Nações Unidas e como ministro do Meio Ambiente e Amazônia Legal, Ricupero apresenta uma pesquisa que lhe demandou imersão de cinco anos em arquivos brasileiros e internacionais que ainda não tinham vindo a público. Traz detalhes, por exemplo, sobre os avisos dados pelo governo norte-americano ao presidente João Goulart a respeito de “posições antiamericanas”, oferecendo suporte favorável aos militares para a execução do golpe em 1964. Na passagem por Salvador, onde palestrou no Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais da Ufba, na Associação Comercial, Ricupero conversou com Muito sobre a história do Brasil e sua articulação com a diplomacia internacional.

O senhor  diria que o seu novo  livro – A Diplomacia na Construção do Brasil: 1750-2016  – é, de algum modo, inaugural?
Eu acho que essa é uma palavra correta, que não tinha me ocorrido, sabe? É um livro realmente  inaugural porque ele preenche um vazio. Não havia até hoje uma abordagem sobre a história do Brasil que mostrasse a relação do país com o mundo, e o impacto dos acontecimentos internacionais na nossa sociedade. No livro, isso é pensado de uma maneira integrada com a vida interna, com a política e a economia. No passado, havia uma ou outra pequena história diplomática, mas todos eram livros muito antigos, de 80, 90 anos atrás. Muito breves, quase todos concentrados na época colonial e abstraíam por completo da vida política e econômica interna. É como se tudo acontecesse num abstrato, num vácuo. Um país qualquer. Aliás, de um modo geral eram livros muito enfadonhos. Eles se restringiam a falar apenas  de limites geográficos, montanhas, rios. Era uma relação de nomes, datas, tratados. Não havia palpitação de vida. As histórias gerais do Brasil dão pouca atenção e espaço aos acontecimentos internacionais. No máximo, um parágrafo, uma nota ao pé da página. É sempre alguma coisa menor. Procurei fundir as duas coisas: apresentar a história do Brasil e a história internacional integradas.

Quais acontecimentos históricos, na opinião do senhor,  deixam clara a implicação de fatos históricos no Brasil com o ambiente internacional?
A independência e a abertura dos portos, que inclusive ocorreu aqui em Salvador, são episódios que reverberam o que estava acontecendo na Europa: a Revolução Francesa, o fim do Antigo Regime, as Guerras Napoleônicas, a Invasão de Portugal pelas tropas francesas. Então, não se pode separar uma coisa da outra. No Brasil, já havia descontentamento com o sistema colonial, e que vinha de longe com a Inconfidência Mineira e a Revolta dos Alfaiates. Mas nada disso prosperou porque não havia condições internacionais.

Quando o cenário internacional começou a influenciar a história do Brasil?
Esse cenário começa a mudar quando acontece a convulsão que resulta no encerramento do Antigo Regime Europeu, na Revolução Americana, na Revolução Industrial Inglesa. No livro, procuro mostrar que muitos episódios históricos brasileiros, supostamente apenas internos, na verdade são internacionais. Eles são a repercussão, no Brasil, do que acontecia do lado de fora do nosso país.

Esses embates interferem na ideia que outros países fazem hoje do Brasil?
As relações internacionais, a política externa, contribuíram muito para criar a imagem que o brasileiro faz de si próprio, e também na imagem de Brasil, nos valores do país. O general Charles de Gaulle costumava dizer que a França não seria a França sem uma certa ideia de grandeza. Mas era a ligação com a glória militar. Lá fora, representamos a imagem de um país pacífico, que não está em guerra com os vizinhos. Estamos prestes a completar 150 anos ininterruptos de paz com os dez países que temos fronteiras, tão distintos como Argentina e Suriname, Guiana e Uruguai. A última guerra bilateral em que o Brasil esteve foi a Guerra do Paraguai, que acabou em 1870. Isso é muito raro. Os países que se comparam a nós, como Rússia, China e Índia, viveram sempre em conflito.

O senhor considera esse fato – de não entrarmos em conflito com nossos  vizinhos, ao contrário de outros países –  como um traço marcante da nossa trajetória política internacional?
É um traço, mas não porque somos melhores do que os outros. Não quero dizer isso. Apenas tivemos a sorte de construir um país numa área de, relativamente, pequena incidência de conflitos. Além do mais, um aspecto muito importante a realçar é que o Brasil, desde cedo, foi herdeiro da tradição portuguesa. Portugal sempre foi um país fraco, diminuto, dependente da diplomacia para evitar ser engolido pela Espanha, que de 1500 até 1640 era a nação mais poderosa do mundo. Quando Portugal se torna independente dos 60 anos de dominação espanhola, se defendeu como? Não pela força própria, já que não tinha. Mas, sim, pela aliança com a Inglaterra, isto é, pela diplomacia. Essa é a aliança mais antiga do mundo e nunca foi interrompida: desde 1280, atravessando a Segunda Guerra Mundial. Isso é interessante para mostrar que a diplomacia, a política externa, é a arma daqueles que não têm armas, exército.

De que modo o Brasil incorporou essa postura portuguesa nas estratégias diplomáticas?
O país segue com essa particularidade: se não fosse a diplomacia, teríamos menos de um terço do território atual, não seríamos membro dos Brics [grupo político de cooperação formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul]  nem teríamos a pujança do agronegócio. Dos dez municípios de maior produção de soja, carnes e milho no Brasil, os que fazem a exportação do agronegócio, oito estão localizados  no Mato Grosso. Eles, hoje, poderiam ser território do Peru, Colômbia ou Bolívia. Não ganhamos isso pelo exército, porque sempre fomos um país militarmente fraco. Nunca houve um exército poderoso. O Brasil ganhou isso através da arma da diplomacia, negociação, perseverança, aquilo que eu chamo no meu livro de “diplomacia do conhecimento”, aquela que se baseia no estudo, nos argumentos cartográficos, nos mapas, nos documentos que, hoje, as pessoas esqueceram.

Historicamente, nas tomadas de posição internacional do Brasil, as ideologias partidárias chegaram a influenciar rumos da política externa?
De maneira geral, a nossa política externa tomou bastante cuidado com ideologias e modismos passageiros. Houve um momento ou outro de influência, mas a nossa tradição histórica nunca foi de paixão ideológica. Veja a Proclamação da República no Brasil: o movimento não teve, nem de longe, a violência da França, por exemplo. A família imperial foi tratada corretamente, não eram muitos monarquistas. A ideia-base que sempre tivemos no Brasil é que o diplomata, assim como um militar, serve a um Estado, quer dizer, a encarnação do país, e não serve a um governo. Não há nada condenável em servir a um governo ou a um partido, mas isso é uma maioria eventual, que pode mudar. O diplomata ou militar tem que ter em mente a permanência do país. Em momentos mais recentes, por exemplo, houve um certo afastamento disso, sobretudo durante a época da diplomacia do governo Lula em relação à América Latina. Mas isso não é uma tradição nossa. Em geral, nós procuramos promover  as melhores relações com os nossos  vizinhos, mas sem misturar-se à política interna dos outros. Lula tinha um entendimento diferente, inclusive participando de comícios do Evo Morales [presidente da Bolívia]. A visão dele é de um homem de partido, por conta da questão de fraternidade. Mas é perigoso porque o país acaba se amarrando.

O apoio dado pelo governo americano ao golpe militar de 1964, por exemplo, que é mencionado pelo senhor no livro, deixa claro como a história interna depende dos interesses externos.
Nessa época, eu era diplomata em início de carreira em Brasília, havia muito poucos na cidade porque o Itamaraty ficou no Rio de Janeiro. Por acaso, recebi a comitiva americana que chegou na véspera do Natal de 1962, quando o presidente John Kennedy mandou o irmão dele, Robert Kennedy, vir ao Brasil para dar um ultimato a João Goulart: os americanos queriam que o Brasil escolhesse entre Cuba e Estados Unidos. Ou fazíamos isso ou então eles iam negar a ajuda econômica que o Brasil estava pleiteando. Quando Hermes Lima, então primeiro-ministro e chanceler, me telefonou já eram altas horas da noite. Ele me incumbiu de recebê-los na base área militar em nome do governo brasileiro. Na manhã, por volta das 11h, Robert Kennedy foi recebido por João Goulart no Palácio da Alvorada. Eu não entrei naquela reunião, fiquei do lado de fora. Aliás, os únicos a participar foram Goulart, Kennedy, o embaixador americano Lincoln Gordon e um intérprete americano. Foi uma conversa duríssima, complicada, com ameaças e momentos de quase ruptura, mas ninguém tinha uma ideia clara do que tinha acontecido. Nos levantamentos para o livro, descobri que, 50 anos depois, os americanos haviam finalmente liberado um documento que era um relato de 17 páginas, quase palavra por palavra, feito pelo embaixador americano. Já era o “beijo da morte”. A partir desse encontro, os americanos encorajaram cada vez mais a conspiração militar. Inclusive prometendo aos militares que, se o golpe não desse certo, eles receberiam apoio dos Estados Unidos.

Mas houve realmente uma interferência dos Estados Unidos em relação aos movimentos das   Forças Armadas brasileiras?
No final, não foi necessário. O governo caiu como um castelo de cartas. Mas os Estados Unidos já tinham montado uma operação, numa força-tarefa marítima, planejando a chegada de navios pela Baía de Guanabara, trazendo armas, munições e abastecimento de combustível para apoiar na repressão dos rebeldes, caso houvesse uma guerra civil. No dia do golpe militar, há um telegrama do embaixador americano que dizia: “Está 95% terminado, Castelo [Branco] me disse que já tomou o Rio de Janeiro e não precisa da nossa ajuda”. É assim, literal. Você vê que, com todas as letras, se precisasse, eles iriam ajudar.

O presidente John Kennedy acompanhava de perto os rumos do golpe?
Durante a minha pesquisa, eu descobri algo que divulgo pela primeira vez num livro nacional: a primeira conversa gravada do presidente John Kennedy, no famoso Salão Oval da Casa Branca, é sobre o Brasil. Ele e o embaixador americano decidem mandar o coronel Vernon Walters para cá. Esse homem era um americano que, durante a Segunda Guerra Mundial, atuou como oficial de ligação com Castelo Branco, então integrante do Estado-Maior e o primeiro presidente do governo militar. Walters é enviado para retomar o contato e preparar a conspiração. Essa conversa, que ninguém sequer sabia que existia, aconteceu no dia 30 de julho de 1962.

Recentemente, manchetes de jornais e capas de revistas trazem notícias sobre escândalos de corrupção, crise econômica e política, numa abordagem diferente da famosa capa na revista The Economist, em 2009, onde o Cristo Redentor aparecia decolando como um foguete. Qual imagem o Brasil tem, hoje em dia, no âmbito internacional?
Isso me permite retomar aquilo que considero como  a mensagem principal deste novo  livro. Não se pode separar a diplomacia da política interna e da  economia. Um país, para conseguir  ganhar projeção no mundo, precisa  estar bem: ter uma situação política democrática, respeitar os direitos humanos, ter prosperidade econômica, combater a desigualdade e a pobreza. Quando um país não tem nada disso, quando a imagem que se tem é negativa, falta aquele elemento fundamental da diplomacia: o prestígio, que é  chamado de o poder suave. O poder duro é o das armas, da coação econômica, aquele que o Brasil não tem. O poder brando, do exemplo, é aquele  que vem do prestígio, do fato  de que as coisas dão certo. Por exemplo, o Brasil no fim do governo Lula, por volta de 2009, 2010, possuía um grande prestígio. Era o país dessas capas de revista. Aquilo era falso? Não, já que na época o país ia bem. Aquilo, na verdade, não era sustentável, porque, a partir de um certo momento, passou-se a gastar muito mais do que o país podia. Quando a arrecadação caiu, a crise começou a morder. Mas, ao invés de o governo reduzir, ele continuou gastando. Aquilo não era uma mentira. Seria um erro dizer que a percepção que o mundo tinha era falsa. Só não trabalhamos o bastante para torná-la sustentável ao longo do tempo. É esse o desafio agora.

Qual lição fica, sobre relações diplomáticas e conflitos internacionais, no caso do  reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel pelo governo de Donald Trump?
Isso expressa o erro colossal de um país que, agora, insiste em tomar medidas unilaterais. É o contrário do que deve ser a diplomacia. A base da paz no mundo é uma evolução por meio de acordos. O Estatuto de Jerusalém, por exemplo, deve ser proposto na base da negociação entre os palestinos e os  israelenses. Os Estados Unidos não têm nenhuma atribuição para posicionamento em relação a isso, isso cabe à Organização das Nações Unidas (ONU). Diplomacia é ouvir os outros, é respeitar os outros na base do consenso, da convergência. Nunca da força. Quando as armas começam a falar, esse é o fracasso da diplomacia.

quarta-feira, 27 de dezembro de 2017

Stefan Zweig: A Unidade Espiritual do Mundo - Petropolis, 28/09/2017

Israel Beloch, presidente da Casa Stefan Zweig, em Petropolis, e editor do livro em cinco línguas sobre a conferência que o grande escritor austríaco judeu fez no Rio de Janeiro, em 1936, informa sobre a publicação de novo livro por ocasião de evento comemorativo na casa-museu do escritor (ver o livro sobre sua primeira viagem ao Brasil aqui).
Publicação sobre o  debate "A Unidade Espiritual do Mundo - Reflexões político-culturais sobre pacifismo, nacionalismo e exílio", realizado em 28/09/2017 na Casa Stefan Zweig em parceria com a Fundação Konrad Adenauer.