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quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

Thomas Sowell: a despedida de um sabio socratico, um negro americano

Leitura obrigatória para todos aqueles que pensam (com desculpas antecipadas aos que pouco ou nada pensam, mas que de toda forma não vão ler esta postagem).
Thomas Sowell faz parte desse grupo restrito de pessoas inteligentes que, a despeito da modestíssima condição social de origem, souberam acumular conhecimentos e colocar todo esse conhecimento, e experiência de vida, a serviço daquilo que eu chamo de elevação espiritual da humanidade, uma tarefa nobre, praticada por todos aqueles que valorizam a sabedoria adquirida nos livros e na observação honesta da realidade do mundo, e colocam esse tesouro à disposição de todos os demais, por meio de livros, artigos, palestras.
Esta é uma postagem de leitura obrigatória.

Paulo Roberto de Almeida


27 de dezembro de 2016
Texto originalmente publicado no WND
Tradução de Rodrigo Constantino


Por Thomas Sowell*
Mesmo as melhores coisas chegam ao fim. Após aproveitar um quarto de século escrevendo esta coluna para Creators Syndicate, eu decidi parar. A idade de 86 está bem à frente da idade usual de aposentadoria, então a pergunta não é por que estou parando, mas por que isso levou tanto tempo.
Foi muito enriquecedor poder compartilhar meus pensamentos sobre os acontecimentos ao nosso redor, e receber o retorno de leitores pelo país todo – mesmo que fosse impossível responder a todos eles.
Sendo alguém à moda antiga, eu gostava de conhecer os fatos antes de escrever. Isso demandava não só bastante pesquisa, como também exigia me manter atualizado com aquilo que estava sendo dito pela mídia.
Durante uma estadia no Yosemite National Park em maio passado, tirando fotos com alguns amigos, fiquei quatro dias consecutivos sem ler os jornais ou ver os noticiários da televisão – e a sensação foi maravilhosa. Com as notícias políticas sendo tão terríveis este ano, isso pareceu especialmente maravilhoso.
Isso me fez decidir gastar menos tempo acompanhando política e mais tempo com minha fotografia, adicionando mais fotos ao meu website (www.tsowell.com).
Olhando para trás pelos anos, como os mais velhos estão aptos a fazer, eu vejo grandes mudanças, tanto para melhor como para pior.
Em termos materiais, houve um progresso quase inacreditável. A maioria dos americanos não tinha refrigeradores em 1930, quando eu nasci. Televisão era pouco mais do que um experimento, e tais coisas como ar-condicionado ou viagem aérea eram somente para os muito ricos.
Minha própria família não tinha eletricidade ou água corrente quente em minha infância, o que não era incomum para negros do sul naqueles tempos.
É difícil transmitir à geração de hoje o temor que a doença paralisante da pólio despertava, até que as vacinas pusessem um fim abrupto a seu longo reinado de terror nos anos 50.
A maioria das pessoas vivendo na pobreza oficialmente definida no século 21 possui coisas como TV a cabo, microondas e ar-condicionado. A maioria dos americanos não tinha tais coisas, mesmo tão tarde quanto nos anos 1980. As pessoas que a intelligentsia continua a chamar de “despossuídos” hoje possuem coisas que os “abastados” não tinham, apenas uma geração atrás.
Description: http://ssum.casalemedia.com/usermatchredir?s=183697&cb=http%3a%2f%2fdis.criteo.com%2frex%2fmatch.aspx%3fc%3d24%26uid%3d%25%25USER_ID%25%25
Em alguns outros sentidos, porém, houve sérios retrocessos ao longo dos anos. A política, e especialmente a confiança dos cidadãos em seu governo, desabaram.
Em 1962, o presidente John F. Kennedy, um homem eleito de forma apertada há apenas dois anos, foi à televisão dizer à nação que ele estava nos levando à beira de uma guerra nuclear com a União Soviética, porque os soviéticos tinham construído secretamente bases para mísseis nucleares em Cuba, a apenas 90 milhas da América.
Muitos de nós não questionaram o que ele fez. Ele era o presidente dos Estados Unidos, e ele sabia coisas que o restante de nós não poderia saber – e isso era bom o suficiente para nós. Felizmente, os soviéticos recuaram. Mas algum presidente hoje poderia fazer algo desse tipo e contar com o apoio do povo americano?
Anos de presidentes mentirosos – o democrata Lyndon Johnson e o republicano Richard Nixon, especialmente – destruíram não só sua própria credibilidade, mas também a credibilidade de que o cargo em si já gozou. A perda dessa credibilidade foi uma perda do país, não apenas das pessoas que ocuparam o cargo nos anos seguintes.
Com todos os avanços dos negros ao longo dos anos, nada me fez constatar mais a degradação nos guetos de negros do que uma visita a uma escola em Harlem alguns anos atrás.
Quando olhei pela janela para o parque do outro lado da rua, eu mencionei que, quando criança, costumava passear com meu cachorro naquele parque. Olhares de horror vieram do rosto dos alunos, ao pensamento de um garoto indo para o buraco do inferno que aquele parque se tornou em seu tempo.
Quando eu mencionei que dormia em uma escada de incêndio no Harlem durante as noites quentes de verão, antes que a maioria pudesse bancar um ar-condicionado, os jovens me olharam como se eu fosse de Marte. Mas negros e brancos vinham dormindo em escadas de incêndio em Nova York desde o século 19. Eles não tinham que lidar com tiros voando ao seu redor durante a noite.
Não podemos voltar ao passado, mesmo que desejássemos, mas vamos esperar que possamos aprender algo com o passado para construir um presente e um futuro melhores.
Adeus e boa sorte a todos.
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SOBRE / 

 RODRIGO CONSTANTINO
Rodrigo Constantino
Economista pela PUC com MBA de Finanças pelo IBMEC, trabalhou por vários anos no mercado financeiro. É autor de vários livros, entre eles o best-seller “Esquerda Caviar” e a coletânea “Contra a maré vermelha”. Contribuiu para veículos como Veja.com, jornal O Globo e Gazeta do Povo. Preside o Conselho Deliberativo do Instituto Liberal.

terça-feira, 27 de dezembro de 2016

Tucidides: "o segredo da felicidade reside na liberdade" - Oracao aos Mortos, de Pericles

Tucídides, como salientou Hélio Jaguaribe em seu prefácio a este edição, "foi o primeiro historiador moderno e o primeiro analista crítico das relações internacionais. Como Ranke [PRA: ao contrário: Ranke veio depois dele, obviamente; e ele serviu de modelo ao historiador alemão], pretendia relatar, objeetivamente, os fatos como haviam ocorrido, Como os sucessores culturalistas deste, aspirava a interpretar as motivações e a explicar as circunstâncias que condicionaram os eventos que narrava. Sua preocupação com a motivação dos protagonistas o levou a expor os discursos que teriam pronunciado para justificar seus atos ou incentivar a prática do que almejavam realizar. Quando, como usualmente ocorria, não dispusesse de registro das palavras que haviam sido pronunciadas, Tucídedes levava seus personagens a dizer aquilo que, dadas as circunstâncias, seriam supostos ter dito (H.I.22). A famosa oração fúnebre de Péricles (H.II.35-46) em que declara Atenas a escola da Grécia, é um dos mais típicos exemplos de genial reconstrução de discursos por Tucídedes." (p. xxv)


Tucídides (c. 460 – c. 400 a.C)

História da Guerra do Peloponeso

(Prefácio de Hélio Jaguaribe; tradução do grego e notas de Mário da Gama Kury; 4a. edição: Brasília: Editora Universidade de Brasília, Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais; São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2001, xlvii + 584 p.; Clássicos IPRI; ISBN: 85-230-0204-9)



Extratos da oração fúnebre pronunciada por Péricles, capítulos 35 a 46 do Livro Segundo, p. 107-114:
 
35. “Muitos dos que me precederam neste lugar fizeram elogios ao legislador que acrescentou um discurso à cerimônia usual nestas circunstâncias, considerando justo celebrar também com palavras os mortos na guerra em seus funerais. A mim, todavia, ter-me-ia parecido suficiente, tratando-se de homens que se mostravam valorosos em atos, manifestar apenas com atos as honras que lhes prestamos – honras como as que hoje presenciastes nesta cerimônia fúnebre oficial – em vez de deixar o reconhecimento do valor de tantos homens na dependência do maior ou menor talento oratório de um só homem. É realmente difícil falar com propriedade numa ocasião em que não é possível aquilatar a credibilidade das palavras do orador. O ouvinte bem informado e disposto favoravelmente pensará talvez que não foi feita a devida justiça em face de seus próprios desejos e de seu conhecimento dos fatos, enquanto outro menos informado, ouvindo falar de um feito além de sua própria capacidade, será levado pela inveja a pensar em algum exagero. De fato, elogios a outras pessoas são toleráveis somente até onde cada um se julga capaz de realizar qualquer dos atos cuja menção está ouvindo; quando vão além disto, provocam a inveja, e com ela a incredulidade. Seja como for, já que nossos antepassados julgaram boa esta prática também devo obedecer à lei, e farei o possível para corresponder à expectativa e às opiniões de cada um de vós.

36. “Falarei primeiro de nossos antepassados, pois é justo e ao mesmo tempo conveniente, numa ocasião como esta, dar-lhes este lugar de honra rememorando os seus feitos. Na verdade, perpetuando-se em nossa terra através de gerações sucessivas, eles, por seus méritos, no-la transmitiram livre até hoje. Se eles são dignos de elogios, nossos pais o são ainda mais, pois aumentando a herança recebida, constituíram o império que agora possuímos e a duras penas nos deixaram este legado, a nós que estamos aqui e o temos. Nós mesmos aqui presentes, muitos ainda na plenitude de nossas forças, contribuímos para fortalecer o império sob vários aspectos, e demos à nossa cidade todos os recursos, tornando-a auto suficiente na paz e na guerra. Quanto a isto, quer se trate de feitos militares que nos proporcionaram esta série de conquistas, ou das ocasiões em que nós ou nossos pais nos empenhamos em repelir as investidas guerreiras tanto bárbaras quanto helênicas, pretendo silenciar, para não me tornar repetitivo aqui diante de pessoas às quais nada teria a ensinar. Mencionarei inicialmente os princípios de conduta, o regime de governo e os traços de caráter graças aos quais conseguimos chegar à nossa posição atual, e depois farei o elogio destes homens, pois penso que no momento presente esta exposição não será imprópria e que todos vós aqui reunidos, cidadãos e estrangeiros, podereis ouvi-la com proveito. 
37. ‘‘Vivemos sob uma forma de governo que não se baseia nas instituições de nossos vizinhos[1]; ao contrário, servimos de modelo a alguns[2] ao invés de imitar outros. Seu nome, como tudo depende não de poucos mas da maioria, é democracia. Nela, enquanto no tocante às leis todos são iguais para a solução de suas divergências privadas, quando se trata de escolher (se é preciso distinguir em qualquer setor), não é o fato de pertencer a uma classe, mas o mérito, que dá acesso aos pontos mais honrosos; inversamente, a pobreza não é razão para que alguém, sendo capaz de prestar serviços à cidade, seja impedido de fazê-lo pela obscuridade de sua condição. Conduzimo-nos liberalmente em nossa vida pública, e não observamos com uma curiosidade suspicaz a vida privada de nossos concidadãos, pois não nos ressentimos com nosso vizinho se ele age como lhe apraz, nem o olhamos com ares de reprovação que, embora inócuos, lhes causariam desgosto. Ao mesmo tempo que evitamos ofender os outros em nosso convívio privado, em nossa vida pública nos afastamos da ilegalidade principalmente por causa de um temor reverente, pois somos submissos às autoridades e às leis, especialmente àquelas promulgadas para socorrer os oprimidos e às que, embora não escritas, trazem aos transgressores uma desonra visível a todos.

38. ‘‘Instituímos muito entretenimento para o alívio da mente fatigada; temos concursos, temos festas religiosas regulares ao longo de todo o ano, e nossas casas são arranjadas com bom gosto e elegância, e o deleite que isto nos traz todos os dias afasta de nós a tristeza. Nossa cidade é tão importante que os produtos de todas as terras fluem para nós, e ainda temos a sorte de colher os bons frutos de nossa própria terra com certeza de prazer não menor que o sentido em relação aos produtos de outras. 
39. ‘‘Somos também superiores aos nossos adversários em nosso sistema de preparação para a guerra nos seguintes aspectos: em primeiro lugar, mantemos nossa cidade aberta a todo mundo e nunca, por atos discriminatórios, impedimos alguém de conhecer e ver qualquer coisa que, não estando oculta, possa ser vista por um inimigo e ser-lhe útil. Nossa confiança se baseia menos em preparativos e estratagemas que em nossa bravura no momento de agir. Na educação, ao contrário de outros que impõem desde a adolescência exercícios penosos para estimular a coragem, nós, com nossa maneira liberal de viver, enfrentamos pelo menos tão bem quanto eles perigos comparáveis. Eis a prova disto: os lacedemônios não vêm sós quando invadem nosso território, mas trazem com eles todos os seus aliados, enquanto nós, quando atacamos o território de nossos vizinhos, não temos maiores dificuldades, embora combatendo em terra estrangeira, em levar frequentemente a melhor. Jamais nossas forças se engajaram todas juntas contra um inimigo, pois aos cuidados com a frota se soma em terra o envio de contingentes nossos contra numerosos objetivos; se os lacedemônios por acaso travam combate com uma parte de nossas tropas e derrotam uns poucos soldados nossos, vangloriam-se de haver repelido todas as nossas forças; se todavia, a vitória é nossa, queixam-se de ter sido vencidos por todos nós. Se, portanto, levando nossa vida amena ao invés de recorrer a exercícios extenuantes, e confiantes em uma coragem que resulta mais de nossa maneira de viver que da compulsão das leis, estamos sempre dispostos a enfrentar perigos, a vantagem é toda nossa, porque não nos perturbamos antecipando desgraças ainda não existentes e, chegando o momento da provação, demonstramos tanta bravura quanto aqueles que estão sempre sofrendo; nossa cidade, portanto, é digna de admiração sob esses aspectos e muitos outros.

40. ‘‘Somos amantes da beleza sem extravagâncias e amantes da filosofia sem indolência. Usamos a riqueza mais como uma oportunidade para agir que como um motivo de vanglória; entre nós não há vergonha na pobreza, mas a maior vergonha é não fazer o possível para evitá-la. Ver-se-á em uma mesma pessoa ao mesmo tempo o interesse em atividades privadas e públicas, e em outros entre nós que dão atenção principalmente aos negócios não se verá falta de discernimento em assuntos políticos, pois olhamos o homem alheio às atividades públicas não como alguém que cuida apenas de seus próprios interesses, mas como um inútil; nós, cidadãos atenienses, decidimos as questões públicas por nós mesmos, ou pelo menos nos esforçamos por compreendê-las claramente, na crença de que não é o debate que é empecilho à ação, e sim o fato de não estar esclarecido pelo debate antes de chegar a hora da ação. Consideramo-nos ainda superiores aos outros homens em outro ponto: somos ousados para agir, mas ao mesmo tempo gostamos de refletir sobre os riscos que pretendemos correr, para outros homens, ao contrário, ousadia significa ignorância e reflexão traz a hesitação. Deveriam ser justamente considerados mais corajosos aquele que, percebendo claramente tanto os sofrimentos quanto as satisfações inerentes a uma ação, nem por isso recuam diante do perigo. Mais ainda: em nobreza de espírito contrastamos com a maioria, pois não é por receber favores, mas por fazê-los, que adquirimos amigos. De fato, aquele que faz o favor é um amigo mais seguro, por estar disposto, através de constante benevolência para com o beneficiado, a manter vivo nele o sentimento de gratidão. Em contraste, aquele que deve é mais negligente em sua amizade, sabendo que a sua generosidade, em vez de lhe trazer reconhecimento, apenas quitará uma dívida. Enfim, somente nós ajudamos os outros sem temer as consequências, não por mero cálculo de vantagens que obteríamos, mas pela confiança inerente à liberdade. 
41. ‘‘Em suma, digo que nossa cidade, em seu conjunto, é a escola de toda a Hélade e que, segundo me parece, cada homem entre nós poderia por sua personalidade própria, mostrar-se auto suficiente nas mais variadas formas de atividade, com a maior elegância e naturalidade. E isto não é mero ufanismo inspirado pela ocasião, mas a verdade real, atestada pela força mesma de nossa cidade, adquirida em consequência dessas qualidades. Com efeito, só Atenas entre as cidades contemporâneas se mostra superior à sua reputação quando posta à prova, e só ela jamais suscitou irritação nos inimigos que a atacavam, ao verem o autor de sua desgraça, ou o protesto de seus súditos porque um chefe indigno os comanda. Já demos muitas provas de nosso poder, e certamente não faltam testemunhos disto; seremos portanto admirados não somente pelos homens de hoje mas também do futuro. Não necessitamos de um Homero para cantar nossas glórias, nem de qualquer outro poeta cujos versos poderão talvez deleitar no momento, mais que verão a sua versão dos fatos desacreditada pela realidade. Compelimos todo o mar e toda terra a dar passagem à nossa audácia, e em toda parte plantamos monumentos imorredouros dos males e dos bens que fizemos[3]. Esta, então, é a cidade pela qual estes homens lutaram e morreram nobremente, considerando seu dever não permitir que ela lhes fosse tomada; é natural que todos os sobreviventes, portanto, aceitem de bom grado sofrer por ela.

42. ‘‘Falei detidamente sobre a cidade para mostrar-vos que estamos lutando por um prêmio maior que o daqueles cujo gozo de tais privilégios não é comparável ao nosso, e ao mesmo para provar cabalmente que os homens em cuja honra estou falando agora merecem os nossos elogios. Quanto a eles, muita coisa já foi dita, pois quando louvei a cidade estava de fato elogiando os feitos heroicos com que estes homens e outros iguais a eles a glorificavam; e não há muitos helenos cuja fama esteja como a deles tão exatamente adequada a seus feitos. Parece-me ainda que uma morte como a destes homens é prova total de máscula coragem, seja como seu primeiro indício, seja como sua confirmação final. Mesmo para alguns menos louváveis por outros motivos, a bravura comprovada na luta por sua pátria deve com justiça sobrepor-se ao resto; eles compensaram o mal com o bem e saldaram as falhas na vida privada com a dedicação ao bem comum. Ainda a propósito deles, os ricos não deixaram que o desejo de continuar a gozar da riqueza os acovardasse, e os pobres não permitiram que a esperança de mais tarde se tornarem ricos os levasse a fugir ao dia fatal; punir o adversário foi aos seus olhos mais desejável que essas coisas, e ao mesmo tempo o perigo a correr lhes pareceu mais belo que tudo; enfrentando-o, quiseram infligir esse castigo e atingir esse ideal, deixando por conta da esperança as possibilidades ainda obscuras de sucesso, mas na ação, diante do que estava em jogo à sua frente, confiaram altivamente em si mesmos. Quando chegou a hora do combate, achando melhor defender-se e morrer que ceder e salvar-se, fugiram da desonra, jogaram na ação as suas vidas e, no brevíssimo instante marcado pelo destino, morreram num momento de glória e não de medo. 
43. ‘‘ Assim estes homens se comportaram de maneira condizente com nossa cidade; quanto aos sobreviventes, embora desejando melhor sorte deverão decidir-se a enfrentar o inimigo com bravura não menor. Cumpre-nos apreciar a vantagem de tal estado de espírito não apenas com palavras, pois a fala poderia alongar-se demais para dizer-vos que há razões para enfrentar o inimigo; em vez disso, contemplai diariamente a grandeza de Atenas, apaixonai-vos por ela e, quando sua glória vos houver inspirado, refleti em que tudo isto foi conquistado por homens de coragem cônscios de seu dever, impelidos na hora do combate por um forte sentimento de honra; tais homens, mesmo se alguma vez falharam em seus cometimentos, decidiram que pelo menos à pátria não faltaria o seu valor, e que lhe fariam livremente a mais nobre contribuição possível[4]. De fato, deram-lhe suas vidas para o bem comum e, assim fazendo, ganharam o louvor imperecível e o túmulo mais insigne, não aquele em que estão sepultados, mas aquele no qual sua glória sobrevive relembrada para sempre, celebrada em toda ocasião propícia à manifestação das palavras e dos atos[5]. Com efeito, a terra inteira é o túmulo dos homens valorosos, e não é somente o epitáfio nos mausoléus erigidos em suas cidades que lhes presta homenagem, mas há igualmente em terras além das suas, em cada pessoa, uma reminiscência não escrita, gravada no pensamento e não escrita, gravada no pensamento e não em coisas materiais. Fazei agora destes homens, portanto, o vosso exemplo, e tendo em vista que a felicidade é liberdade e a liberdade é coragem, não vos preocupeis exageradamente com os perigos da guerra. Não são aqueles que estão em situação difícil que têm o melhor pretexto para descuidar-se da preservação da vida, pois eles não têm esperança de melhores dias, mas sim os que correm o risco, se continuarem a viver, de uma reviravolta da fortuna para a pior, e aqueles para os quais faz mais diferença a ocorrência de uma desgraça; para o espírito dos homens, com efeito, a humilhação associada à covardia é mais amarga do que a morte quando chega despercebida em acirrada luta pelas esperanças de todos.

44. ‘‘Eis porque não lastimo os pais destes homens, muitos aqui presentes, mas prefiro confortá-los. Eles sabem que suas vidas transcorrem em meio a constantes vicissitudes, e que a boa sorte consiste em obter o que é mais nobre, seja quanto à morte – como estes homens – seja quanto à amargura – como vós, e em ter tido uma existência em que sei foi feliz quando chegou o fim. Sei que é difícil convencer-vos desta verdade, quando lembrais a cada instante a vossa perda ao ver os outros gozando a ventura em que também  já vos deleitastes; sei, também, que se sente tristeza não pela falta de coisas boas que nunca se teve, mas pelo que se perde depois de ter tido. Aqueles entre vós ainda em idade de procriar devem suavizar a tristeza com a esperança de ter outros filhos; assim, não somente para muitos de vós individualmente os filhos que nascerem serão um motivo de esquecimento dos que se foram, mas a cidade também colherá uma dupla vantagem: não ficará menos populosa e continuará segura; não é possível, com efeito, participar das deliberações na assembleia em pé de igualdade e ponderadamente quando não se arriscam filhos nas decisões a tomar. Quanto a vós, que já estais muito idosos para isso, contai como um ganho a maior porção de vossa vida durante a qual fostes felizes, lembrai-vos de que o porvir será curto, e sobretudo consolai-vos com a glória destes vossos filhos. Só o amor da glória não envelhece, e na idade avançada o principal não é o ganho, como alguns dizem, mas ser honrado. 
45. ‘‘Para vós aqui presentes que sois filhos e irmãos destes homens antevejo a amplitude de vosso conflito íntimo; quem já não existe recebe elogios de todos; quanto a vós, seria muito bom se um mérito excepcional fizesse com que fosseis julgados não iguais a eles, mas pouco inferiores. De fato, há inveja entre os vivos por causa da rivalidade; os que já não estão em nosso caminho, todavia, recebem homenagens unânimes.

        ‘‘Se tenho de falar também das virtudes femininas, dirigindo-me às mulheres agora viúvas, resumirei todo num breve conselho: será grande a vossa glória se vos mantiverdes fiéis à vossa própria natureza, e grande também será a glória daquelas de quem menos se falar, seja pelas virtudes, seja pelos defeitos.

46. ‘‘Aqui termino o meu discurso, no qual, de acordo com o costume, falei o que me pareceu adequado; quanto aos fatos, os homens que viemos sepultar já receberam as nossas homenagens e seus filhos serão, de agora em diante, educados a expensas da cidade até a adolescência; assim ofereceremos aos mortos e a seus descendentes uma valiosa coroa como prêmio por seus feitos, pois onde as recompensas pela virtude são maiores, ali se encontram melhores cidadãos. Agora, depois de cada um haver chorado devidamente os seus mortos, ide embora’’[6].



[1] Alusão aos espartanos, cujas instituições teriam sido copiadas de Creta, veja-se Aristóteles, Politica, 1271 b 23.

[2] Possível alusão à embaixada vinda de Roma em 454 a.C. para examinar a constituição de Sólon; veja-se Tito Lívio, III, 31.

[3]Subentenda-se: ‘‘dos males aos inimigos e bens feitos aos amigos’’.

[4] ‘‘Contribuição’’ aqui traduz o êranos do original. Trata-se de uma ‘‘contribuição conjunta’’, feita para benefícios geral (por exemplo, para um banquete entre membros de uma mesma tribo, para fins beneficentes, etc.). Demóstenes, Contra Mídias, 27, apresenta o Estado como uma espécie de sociedade beneficente em que cada cidadão deve uma contribuição (êranos).


[5] Subentenda-se: ‘‘palavras de louvor e atos de emulação’’.


[6] Esta oração fúnebre de Péricles é considerada um modelo no gênero desde a antiguidade. Entre outras peças representativas do gênero merece menção a do orador Lísias (nº 2 da coleção de seus discursos, pronunciada em 386 a.C.).

O fim da Uniao Sovietica, 25 anos atras (em 1991) - Rubens Barbosa

FIM DA UNIÃO SOVIÉTICA
 Rubens Barbosa
O Estado de S. Paulo, 27/12/2016

Ontem, 26 de dezembro, a dissolução da União Soviética completou 25 anos. Resolução do Soviet Supremo reconheceu a independência das antigas repúblicas soviéticas e criou a Comunidade de Estados Independentes (CEI). Mikhail Gorbachev, o oitavo e último líder da União Soviética, havia renunciado na véspera, declarando seu cargo extinto e passando o poder para o presidente russo Boris Ieltsin. Anteriormente, de agosto a dezembro de 1991, todas as repúblicas, incluindo a própria Rússia, foram se separando da União. Uma semana antes do histórico 26, onze repúblicas - todas, exceto a Georgia e os estados bálticos (Letônia, Estônia e Lituânia) - assinaram o Protocolo de Alma-Ata estabelecendo formalmente a CEI e declararam que a União Soviética tinha deixado de existir.

Nos últimos 25 anos, a Rússia tem mergulhado em profundas crises econômicas, políticas e éticas. Teve de enfrentar tentativas separatistas, como na Tchechenia, enfraqueceu-se militarmente com o fim do Pacto de Varsovia, sofreu com a queda do preço do petróleo, teve de enfrentar a rebelião na Georgia e mais recentemente envolveu-se na crise da Ucrânia com a reincorporação da estratégica Criméia. Teve de conviver com a imposição de sanções econômicas pelos EUA e Europa e com a crescente desconfiança do Ocidente. Em 2014, o governo russo criou a União Econômica Eurasiana, bloco econômico e comercial, integrado pelo Casaquistão, Bielorussia, Quirguistão e Armênia.

A percepção ocidental é a de que a Russia constitui uma ameaça militar concreta para a Europa, em especial para os estados bálticos e os ex-satélites do Leste Europeu. As invasões da Geórgia e da Ucrânia reforçaram a visão de que a Rússia, em declínio, mas com poderoso arsenal nuclear, teria pretensões imperialistas e bélicas na Europa. As intervenções russas em países vizinhos e no Oriente Médio, bem como os ataques cibernéticos contra alvos nos EUA aumentam a instabilidade global e as reservas em relação a Moscou.

Desde 1999, Vladimir Putin tem governado a Rússia como presidente ou primeiro ministro, imprimindo sua visão estratégica sobre o relacionamento com os EUA, com a Europa e seu interesse nos diferentes teatros globais. Quais as ações do Estado russo a partir das posições públicas expressadas por sua liderança politica?

Para entender a ação russa no tabuleiro político e econômico global é importante ter presente a visão de Putin para a defesa dos interesses de seu país. Ao assumir o governo, Putin chamou o colapso da URSS de “a maior catastrofe geopolitica do seculo XX”.  É sob esse prisma que as ações de Moscou deveriam ser entendidas. O restabelecimento da força e da importância da Russia é a principal prioridade de Putin, que viu nas ações da Europa e dos EUA uma grande conspiração para tentar cercar o pais. As sanções econômicas são vistas como parte de esforço geopolítico para limitar a influência de Moscou.

O pensamento estratégico russo atual foi muito influenciado, segundo Putin, pelo descumprimento de acordo que teria sido negociado depois do fim da União Soviética pelo qual a aliança ocidental, sem a ameaça do Pacto de Varsovia, teria se comprometido a não instalar mísseis e radares na Polônia e outros estados vizinhos da Rússia. A instalação de armamento pesado, a 300 km de Moscou, foi agravado pelo golpe de estado na Ucrânia onde, estimulado pelo ocidente, o governo pró-Rússia foi substituido por um presidente pró-ocidente que pediu formalmente apoio militar da OTAN. Essa nova situação, segundo o governo de Moscou, forçou a invasão da Ucrânia e a re-incorporação da Criméia, de modo a impedir a eventual perda de uma base naval estratégica no Mediterrâneo.

As sanções econômicas em vigor e a teoria do cerco militar ao país levaram Moscou a buscar alternativas geopolíticas e geoeconômicas. Depois de anos de afastamento, concretisou-se a aproximação com a China na assinatura de acordo de fornecimento de gás no valor de US$ 400 bilhões de modo a reduzir a então grande dependência do mercado europeu e avançou-se na construção de gasoduto na Turquia para evitar a passagem pela Ucrânia. Nova doutrina militar prevê agora a substituição de importações militares para reduzir a dependência externa. Prevê também a  ampliação do número de bases militares ao redor do mundo, inclusive com algum tipo de presença em Cuba e na Venezuela.

            No atual momento as iniciativas mais vigorosas da política externa e de defesa da Rússia estão concentradas no Oriente Médio, em especial no conflito na Siria. Apoiando o presidente Bashar Al Assad, Putin envolveu-se no bombardeio contra os rebeldes, sobretudo em Aleppo. A estratégia de Moscou é eliminar o Estado Islâmico primeiro e depois fazer a transição do governo sírio, com o afastamento de Al Assad, o que colocou os EUA e a OTAN contra a Russia. As implicações da politica russa tem desdobramentos no Irã e entre os Curdos, aumentando as resistências contra Putin. No conflito Israel-Palestina, a Rússia mantém attitude discrete, apesar de  membro do Quarteto, junto com os EUA, a União Européia e a Alemanha.

            As relações com os EUA, desgastadas pelas posições antagônicas no conflito com a Siria, ganharão maior visibilidade pelas anunciadas intenções do presidente eleito Donald Trump. Enquanto o CIA publica relatório em que acusa a Rússia de ter interferido na eleição presidencial e o futuro Secretario de Defesa faça ostensivamente criticas a Putin, Trump não se abstém de declarações no sentido de uma aproximação maior com o presidente russo, inclusive acenando com a mudança da estratégia no conflito da Siria, como quer Putin, visando ao exterminio do Estado Islâmico. A designação de um amigo de Putin, Rex Tillerson para Ministro do Exterior pode reforçar a política do presidente russo.

Rubens Barbosa, presidente do Instituto de Relações Internacionais e de Comércio Exterior (IRICE)

Crescimento, nao Igualdade, deve ser a agenda dos economistas - Deirdre McCloskey

Anger about economic inequality in the United States dominated the presidential election. But while polemics about the issue have flourished across the political spectrum, clarity has not.
Lack of clarity about inequality has been around for a long time. Look, for example, at the Illinois state constitution, adopted in 1970. It sought to “eliminate poverty and inequality.”
Note the linkage of poverty and inequality. It sounds good. Who wouldn’t want to eliminate both of them?
But think it through.
Eliminating poverty is obviously good. And, happily, it is already happening on a global scale. The World Bank reports that the basics of a dignified life are more available to the poorest among us than at any time in history, by a big margin. Shanghai, a place of misery not very long ago, now looks like the most modern parts of the United States, though with better roads and bridges. The real income of India is doubling every 10 years. Sub-Saharan Africa is at last growing. Even in the rich countries, the poor are better off than they were in 1970, with better food and health care and, often, amenities like air-conditioning.
Continue reading the main story
We need to finish the job. But will we really help the poor by focusing on inequality?
Anthony Trollope, the great English novelist, gave an answer in “Phineas Finn” in 1867. His liberal heroine suggests that “making men and women all equal” was “the gist of our political theory.” No, replies her radical and more farseeing friend, “equality is an ugly word, and frightens.” A good person, he declares, should rather “assist in lifting up those below him.” Eliminate poverty, and let the distribution of wealth work.
Economic growth has been accomplishing exactly that since 1800. Equality in the most important matters has increased steadily, through lifting up the wretched of the earth. The enrichment in fundamentals for the poor matters far more in the scheme of things than the acquisition of more Rolexes by the rich.
What matters ethically is that the poor have a roof over their heads and enough to eat, and the opportunity to read and vote and get equal treatment by the police and courts. Enforcing the Voting Rights Act matters. Restraining police violence matters. Equalizing possession of Rolexes does not.
The Princeton philosopher Harry Frankfurt put it this way: “Economic equality is not, as such, of particular moral importance.” Instead we should lift up the poor, in the style of Trollope’s radical liberal, to a level Mr. Frankfurt labeled “enough” — enough for people to function in a democratic society and to have full human lives.
Another eminent philosopher, John Rawls of Harvard, articulated what he called the Difference Principle: If the entrepreneurship of a rich person made the poorest better off, then the higher income of the entrepreneur was justified. It works for me.
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CreditDanny Schwartz
It is true that conspicuous displays of wealth are vulgar and irritating. But they are not something that a nonenvious principle of public policy needs to acknowledge.
Poverty is never good. Difference, including economic difference, often is. It is why New Yorkers exchange goods with Californians and with people in Shanghai, and why the political railing against foreign trade is childish. It is why we converse, and why today is the great age of the novel and the memoir. It is why we celebrate diversity — or should.
A practical objection to focusing on economic equality is that we cannot actually achieve it, not in a big society, not in a just and sensible way. Dividing up a pizza among friends can be done equitably, to be sure. But equality beyond the basics in consumption and in political rights isn’t possible in a specialized and dynamic economy. Cutting down the tall poppies uses violence for the cut. And you need to know exactly which poppies to cut. Trusting a government of self-interested people to know how to redistribute ethically is naïve.
Another problem is that the cutting reduces the size of the crop. We need to allow for rewards that tell the economy to increase the activity earning them. If a brain surgeon and a taxi driver earn the same amount, we won’t have enough brain surgeons. Why bother? An all-wise central plan could force the right people into the right jobs. But such a solution, like much of the case for a compelled equality, is violent and magical. The magic has been tried, in Stalin’s Russia and Mao’s China. So has the violence.
Many of us share socialism in sentiment, if only because we grew up in loving families with Mom as the central planner. Sharing works just fine in a loving household. But it is not how grown-ups get stuff in a liberal society. Free adults get what they need by working to make goods and services for other people, and then exchanging them voluntarily. They don’t get them by slicing up manna from Mother Nature in a zero-sum world.
We could use state violence to take wealth from billionaires like Bill Gates and give it to the homeless, achieving more equality. (Mr. Gates is in fact giving away his fortune, to his credit.) Short of expropriation, we can and should join in supporting a safety net, keeping the violence to a minimum. K-12 public education, for example, should be paid for by compelled taxes on all of us. But we should not be doing a lot more.
As a matter of arithmetic, expropriating the rich to give to the poor does not uplift the poor very much. If we took every dime from the top 20 percent of the income distribution and gave it to the bottom 80 percent, the bottom folk would be only 25 percent better off. If we took only from the superrich, the bottom would get less than that. And redistribution works only once. You can’t expect the expropriated rich to show up for a second cutting. In a free society, they can move to Ireland or the Cayman Islands. And the wretched millionaires can hardly re-earn their millions next year if the state has taken most of the money.
It is growth from exchange-tested betterment, not compelled or voluntary charity, that solves the problem of poverty. In South Korea, economic growth has increased the income of the poorest by a factor of 30 times real 1953 income. Which do we want, a small one-time (though envy-and-anger-satisfying) extraction from the rich, or a free society of betterment, one that lifts up the poor by gigantic amounts?
We had better focus directly on the equality that we actually want and can achieve, which is equality of social dignity and equality before the law. Liberal equality, as against the socialist equality of enforced redistribution, eliminates the worst of poverty. It has done so spectacularly in Britain and Singapore and Botswana. More needs to be done, yes. Namely, more growth, which is sensitive to environmental limits and will require a proliferation of rich engineers. Let them have their money from devising carbon-fixing techniques and new sources of energy. It will enrich all of us.
To borrow from the heroes of my youth, Marx and Engels: Working people of all countries unite! You have nothing to lose but stagnation! Demand exchange-tested betterment in a liberal society.
Some dare call it capitalism.

Vienna: capital of the century - The Economist (December 24, 2016)

ViennaHow Vienna produced ideas that shaped the West

The city of the century
The Economist, December 24, 2016




ACROSS the cobbles of Vienna’s Michaelerplatz the world of empires, waltzes and mutton-chop whiskers glowers at the modern age of psychoanalysis, atonal music and clean shaves. In one corner, the monumental, neo-baroque entrance to the Hofburg palace, seat of the Habsburgs; in the other, the Looshaus, all straight lines and smooth façades, one of the first buildings in the international style. This outcrop of modernism, designed by Adolf Loos, was completed in 1911, less than 20 years after the dome-topped palace entrance it faces. But the building embodied such a different aesthetic, such a contrary world view, that some wondered whether a society that produced such opposites in quick succession could survive. The emperor Franz Joseph is said to have kept the curtains drawn so he would not have to look at the new world across the square.
The sceptics were right. Imperial Viennese society could not survive. But the ideas and art brought forth during the fecund period of Viennese history from the late 1880s to the 1920s endured—from Loos’s modernist architecture to Gustav Klimt’s symbolist canvasses, from Schoenberg’s atonal music and Mahler’s Sturm und Drang to Ludwig Wittgenstein’s philosophy. Those Viennese who escaped Nazism went on to sustain the West during the cold war, and to restore the traditions of empiricism and liberal democracy.
This ferment was part of a generational revolution that swept Europe at the end of the 19th century, from Berlin to London. But the Viennese rebellion was more intense, and more wide-ranging. And it provoked a more extreme reaction. Hitler arrived in Vienna from the Austrian provinces in 1908 and developed his theories of race and power there. Vienna was thus the cradle of modernism and fascism, liberalism and totalitarianism: the currents that have shaped much of Western thought and politics since Vienna itself started to implode in 1916 until the present day. It has been the Viennese century.
What distinguished pre-1914 Vienna from most other European capitals, and what gave the Viennese school its particular intellectual tang, was that it was an imperial city rather than a national capital. Vienna was the heart of an Austro-Hungarian empire of about 53m people that stretched from Innsbruck in the west almost as far as the Black Sea in the east. After 1867 the empire was divided into two: a Magyar-dominated Hungary, ruled from Budapest, and a heterogeneous, multi-ethnic, multilingual other half, ruled from Vienna. In deference to its multinational character, this half was not called Austria but was often referred to as Cisleithania, named after a tributary of the Danube.
In the second half of the 19th century Franz Joseph’s subjects poured into the city: Italians, Slovaks, Poles, Slovenians, Moravians, Germans and, especially, Czechs. By 1910 Vienna had a population of 2m, the sixth-biggest city in the world. Fortunes made in the fast-industrialising empire, many by Jewish and assimilated Jewish families such as the Wittgensteins and Ephrussi, changed the urban landscape. Their enormous palaces adorned the Ringstrasse, the city’s most elegant boulevard. By 1914 Jews made up about 5% of Cisleithania’s population. They did not enjoy rights as a nationality or language group, but benefited from full civil rights as individuals. As Carl Schorske, the greatest historian of the period has written, they “became the supranational people of the multinational state, the one folk which, in effect, stepped into the shoes of the earlier aristocracy. Their fortunes rose and fell with those of the liberal, cosmopolitan state.”
Vienna was a mixture of classes and nationalities, faiths and worldviews. Order a Wiener melange in a Viennese coffee-house today, suggests Steven Beller, a historian of Austria, stir the hot milk into your bitter coffee, and imperial Viennese culture emerges, a dissolving of differences to produce something fresh. The Viennese cultural elite encouraged intellectual collisions to give birth to the new. “There was sperm in the air,” as the writer Stefan Zweig somewhat off-puttingly put it.
Amid a babble of peoples and languages—one in which, as elsewhere at the time, gender roles were being redefined—Viennese thinking was driven by an urge to find universal forms of communication. It aimed to discover what people had in common behind the façade of social convention, “to show modern man his true face”, in the words of Otto Wagner, an architect. Out of this came some of the most important intellectual schools of the 20th century, as well as the influential, and often highly eccentric, characters who went with it. These included one Sigmund Freud, who developed psychoanalysis in Vienna, in order to expose the common archetypes of the unconscious.
Ludwig Wittgenstein’s “Tractatus Logico-Philosophicus” remains the most famous text of Viennese philosophy. The pioneering logical positivism of the Vienna Circle, dominated by Moritz Schlick and Rudolf Carnap (both originally from Germany) was probably of greater influence, setting the scene for modern analytical philosophy with its strong affinity for the sciences. The most accomplished of the circle was Otto Neurath. On top of his philosophy, he revolutionised the transmission of knowledge with new ways of translating complex information into simple, graphic pictograms: to make knowledge accessible was to make it democratic. All sorts of formats for data visualisation in use today can be traced back to these “Isotypes” (example on next page).
The Viennese school also pushed into new fields, such as, famously, sex. Before Freud, there was Richard Krafft-Ebbing, who studied in Graz before coming to Vienna and in 1886 published “Psychopathia Sexualis,” the first attempt to apply some rigorous methodology to the study of sexuality. He drew on court cases to analyse homosexuality and bisexuality (albeit often in Latin). His work popularised the terms sadism and masochism. (Leopold von Sacher-Masoch, eponym to the latter and author of “Venus in Furs,” though a subject of the emperor, was not Viennese.)
It was partly the emperor himself who opened the way to modern sensibilities. Ultra-conservative in taste he may have been, but Franz Joseph’s duty was to all the peoples of his empire, and he tried to guarantee the freedoms—of movement, of religion, of the press and of equal rights—that the liberal constitution of 1867 enshrined. So Europe’s crustiest old monarchy often supported some of the most avant-garde artistic projects of the day, such as the Vienna Secession movement of 1897, in the interests of strengthening the universal language of art and architecture that might unite the empire. Secession artists were engaged to design the empire’s postage stamps and currency. The emperor might have drawn his curtains against the Looshaus, but he let it be built.
Anschluss and after
The tensions and collisions so fruitful to the cultural life of its capital were less salutary for the empire as a whole. Assailed by the rising forces of nationalism, particularly pan-Germanism, the cosmopolitan state began to crumble. The influx of peoples to Vienna provoked increasing resentment among the German working class; immigrant Czechs in particular proved willing to work for less money in worse conditions. At the same time Czech, Serbian and other nationalists increasingly agitated for independence.
Jews, as the supranational people of the multi-ethnic state, readily became the target of every nationalist enemy of the empire. Georg Schoenerer, son of a successful Viennese industrialist, was the first to turn anti-Semitism into a political programme, denouncing the “sucking vampires” who knocked at the “narrow-windowed house of the German farmer and craftsmen”. Unemployment, rising prices and a lack of housing in Vienna fuelled the anger of many Germans after 1900, leading to frequent riots and violent attacks on other nationalities. Karl Lueger channelled Schoenerer’s anti-Semitism into a political movement, campaigning to be mayor on the slogan “Vienna is German and must remain German”. His explicit rejection of the multi-ethnic character of Vienna brought him into direct conflict with the emperor. Lueger won a majority on the city council to elect him mayor in 1895, but for two years Franz Joseph nobly refused to appoint him because of his anti-Semitism. Eventually, in 1897, Franz Joseph bowed to popular pressure, and Lueger ruled the city until 1910.
Portrait of Adele Bloch-Bauer I: Gustav Klimt
That, essentially, was the beginning of the end of liberal Vienna. After the war and the end of the monarchy there was a brief flourishing of progressive social democracy in the city, the era of “Red Vienna”. But all the time, in the new, truncated republic of Austria the more conservative provinces slowly tightened their grip on the country. In 1933 Engelbert Dolfuss seized power in the name of Austrofascism, which gave way to Nazi fascism in 1938 with the Anschluss. Hitler, who moved to Vienna from Linz in upper Austria, had been transfixed by Schoenerer and, particularly, Lueger. He hungrily absorbed all his hero’s complaints about the Jews and the mixing of “races”; he called the Viennese a “repulsive bunch”. Thus liberal Vienna had produced its exact opposite: militant nationalism and anti-Semitism. During the interwar years these forces gradually took hold of the new Austria and from the 1920s onwards many began to flee abroad. One of the last out, in 1938, was Freud.
 Most of the exiles went to Britain and America, where they were often gratefully received. The most valuable aspect of Viennese thinking for the West at the time was the application of up-to-date “scientific” methods to fields that had previously been left to amateur theorising, or that had been altogether neglected. This transformed many aspects of life.
The Viennese tended to be more persuasive than the intellectual competition
Take the work of Charlotte Buehler, a pioneer in child psychology. She was born in Berlin to Jewish parents, but moved to Vienna, together with her husband Karl, in 1922. At the University of Vienna, through painstaking direct observation, the Buehlers worked out their influential response-testing techniques: ways to calibrate a child’s development, through the accomplishment of gradually more complex tasks. These tests are, in effect, still in use today. By six months, an infant should be able to distinguish between a bottle and a rubber doll. At 18 months, he or she was expected to respond to the order “No”.
Often the Viennese intellectuals leapt ahead by transferring knowledge gained in one discipline to others, gloriously indifferent to the mind-forged manacles that have come to stifle modern academia and research. In America, several Viennese-trained devotees of Freud used the tools of psychoanalysis to revolutionise business. Ernest Dichter, author of “The Strategy of Desire,” transformed the fortunes of companies through marketing that purposely tapped into consumers’ subliminal desires.
Another example was Paul Lazarsfeld, the founder of modern American sociology. Born of Jewish parents, he studied maths in Vienna, completing his doctorate on Einstein’s gravitational theory, and thereafter applied his expertise in data and quantitative methods to what became known as opinion, or market research—finding out what people really feel about anything from television programmes to presidential candidates. In Vienna in 1931 he conducted the first scientific survey of radio listeners, and also co-wrote a revolutionary study of the devastating social and psychological impacts of unemployment. His team of investigators conducted what is now called “field research”, meticulously recording the results of face-to-face interviews with laid-off factory workers in the town of Marienthal.
Moving to America in 1933, Lazarsfeld went on to found the Columbia University Bureau for Social Research. His team was the first to use focus groups, developed with Dichter, his one-time student, and statistical analysis to delve into the mysteries of voter and consumer preferences or the impact of the emerging mass media. Lazarsfeld and others thus helped revivify moribund, antiquarian modes of inquiry, and re-equip them with the latest Viennese techniques, often saving entire Western intellectual traditions from decrepitude, or possibly extinction.
Pilgrims on the mountain
Of no field was this truer than political economy, where the “Austrian school” of men like Joseph Schumpeter, Ludwig von Mises and Friedrich Hayek strongly influenced the revival of liberalism and conservatism in the West after the second world war. These three were all quintessential products of late Habsburg Vienna. They were born in very different parts of the empire: von Mises of Jewish parents in Galicia (now Ukraine); Schumpeter of Catholic German-speaking parents in Moravia, now part of the Czech Republic; and Hayek in Vienna itself. Yet they were all schooled in the same liberal intellectual discipline.
Von Mises and Hayek, one of his students, saw earlier than most that by the interwar years the liberal era in Europe was being overwhelmed by the collectivism and totalitarianism of the right and the left. They subsequently devoted their lives to reversing the tide. Hayek, like the best of Vienna’s intellectuals, combined technical expertise in economics with a wide breadth of inquiry; as well as economics, he published on law, sociology and more. His greatest contribution was to restore intellectual rigour to the free-market school, expositing in detail the “price mechanism” to show that socialist economics could not possibly work in theory, let alone practice.
But Hayek was not just a dry theorist. He was also a relentless circus-master for the liberal cause. Emigrating to Britain in 1931, he was the author of the first call to arms for the liberal fightback, “The Road to Serfdom,” published in 1944. This was provocatively dedicated to the “Socialists of all Parties”, implying that at the end of the second world war all Britain’s political parties, including Winston Churchill’s Conservatives, had drifted into collectivism by advocating the welfare state.
To organise the fightback he founded the Mont Pelerin Society (MPS) in 1947. Named after the Swiss mountain where the first meeting was held (simply because the founding members couldn’t agree on a more appropriate alternative), the MPS was Hayek’s own Circle for liberalism. It fused the Viennese liberals in exile, including Karl Popper, who had just published The Open Society and its Enemies, with their embattled fellow-travellers from Germany, France, Britain and America, most notably Milton Friedman. Over the next decades the MPS spawned scores of think-tanks around the world dedicated to spreading the word of the Austrian school. Politicians often attended their meetings. The “Chicago school” of economists was made up largely of MPS members. After decades of quiet campaigning, Hayek’s ideas were taken up again by a subsequent generation of politicians in the mid-1970s, including Margaret Thatcher and Ronald Reagan.
The consensus on free markets and democracy won in the 1980s remained intact for decades—a tribute, in part, to the intellectual efforts of Franz Joseph’s Viennese. It also provides a clue as to why they have been so influential in the West. The Viennese school placed the lived experience of individuals—rather than the abstractions of class, race and nationalism favoured by their opponents—at the heart of their intellectual enterprises. Thus the empirical research of a Buehler or a Lazarsfeld tended to work with the “the crooked timber of humanity”, as Immanuel Kant put it, rather than trying to straighten it out, as Marxists, fascists and all systematisers try to do. After a lecture by John Maynard Keynes, always the systematiser, Vienna-born Peter Drucker, the founder of modern management theory, saw the distinction in clear relief: “I suddenly realised that Keynes and all the brilliant economic students in the room were interested in the behaviour of commodities, while I was interested in the behaviour of people.”
For this reason alone, the Viennese tended to be more persuasive than their competitors. Furthermore, the stress on the individual also chimed with the exigencies of an exhausted West taking on the Soviet Union in the cold war after 1947. The Viennese émigrés were vital in sharpening the intellectual and cultural claims of liberal democracy at a time when many young people in the West had deserted to more fashionable leftist causes. They were swiftly promoted to university posts and other influential positions by their Anglo-Saxon admirers. The Viennese could articulate a more convincing defence of freedom because they had direct personal experience of the totalitarian enemy.
However, the freedom that the Viennese espoused came at a price; self-expression could be accomplished only by intellectual rigour and self-discipline. Even at the time this was too much to bear for many of Vienna’s young, several of whom committed suicide as they fell short of their own high standards—three of Ludwig Wittgenstein’s brothers took their own lives. Today, if this year’s elections are any guide, politicians and demagogues seem content to wrap themselves in the language of freedom while abandoning any obligations to intellectual rigour or self-discipline. The Viennese century has ended. Its legacy is fraying.