Ao final, matéria sobre a postura do chanceler brasileiro:
Observatório do Clima, 03 - junho -
2019
Itamaraty
usa dados errados para defender agro brasileiro
Agromitômetro
analisa nota preparada pela chancelaria para subsidiar diplomatas no exterior e
detecta distorções, falácias, erros factuais e referências elogiosas a
políticas que o governo Bolsonaro está desmontando
·
O chanceler
Ernesto Araújo nega o aquecimento da Terra
DO OC – O
Ministério das Relações Exteriores preparou uma nota contendo informações sobre
desmatamento e agronegócio. O objetivo é subsidiar diplomatas que precisam
responder aos crescentes questionamentos feitos no exterior à política
ambiental do governo Bolsonaro.
A nota, à
qual o OC teve acesso, tenta vender a sustentabilidade do
agronegócio brasileiro usando uma série de dados errados, distorções e
meias-verdades. Além disso, várias das políticas às quais o documento se
refere, que supostamente afiançariam a sustentabilidade da produção brasileira,
vêm sendo abandonadas ou ativamente desconstruídas pelo governo de Jair
Bolsonaro. Um exemplo são as políticas de clima, que a nota canta em prosa e
verso, mas que o chanceler Ernesto Araújo acusa de serem uma armação globalista
e o ministro Ricardo Salles, do Meio Ambiente, considera “secundárias”.
O desmonte
das instituições ambientais brasileiras pelo novo governo foi denunciado por
oito dos nove ex-ministros do Meio Ambiente vivos e será objeto de apuração
pelo TCU (Tribunal de Contas da União), que acatou um pedido do Ministério
Público na
semana passada. Governos estrangeiros, investidores e organismos multilaterais
vêm demonstrando preocupação. No fim de abril, 607 cientistas europeus e duas
organizações indígenas pediram numa carta na revista Science que a União Europeia
condicione qualquer acordo comercial com o Mercosul ao cumprimento de uma série
de salvaguardas socioambientais.
Vários dos
dados usados pelo Itamaraty já haviam sido checados pelo OC neste vídeo. Nesta edição do Agromitômetro,
reproduzimos a nota da chancelaria (em itálico) e comentamos seus pontos
problemáticos.
Leia a
seguir.
*
Informação
sobre desmatamento
Na qualidade
de reconhecida potência ambiental, com as maiores reservas de florestas
tropicais, recursos genéticos e água potável do mundo, o País conseguiu, nas
últimas décadas, conciliar políticas ambientais eficazes com uma pujante
produção agrícola, o que lhe permitiu converter-se em parceiro comercial
imprescindível para a segurança alimentar do planeta. O compromisso do Brasil
com a conservação e o uso sustentável do meio ambiente coaduna-se plenamente
com o direito ao desenvolvimento, fundamental para a geração de empregos e de
renda no País, reconhecido no princípio 3 da Declaração do Rio sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de 1992, além de perpassar toda a Agenda
2030 sobre Desenvolvimento Sustentável.
Atualmente,
cerca de 66,3% do território brasileiro são dedicados à proteção e preservação
da vegetação nativa (unidades de conservação, terras indígenas,assentamentos
rurais, quilombolas, áreas militares, reserva legal nos imóveis rurais e terras
devolutas)…
MENTIRA: 67% do território brasileiro está coberto com
vegetação nativa. Isso é muito, muito diferente de estar “dedicado à proteção e
preservação”. O Itamaraty põe na conta áreas de produção familiar, como terras
quilombolas e assentamentos, áreas onde múltiplos usos (inclusive agricultura e
mineração) são permitidos, como APAs (Áreas de Proteção Ambiental), terras
atualmente com floresta mas que podem ser legalmente desmatadas em propriedades
privadas e áreas devolutas – terras públicas sem destinação formal,
concentradas na Amazônia. Mesmo que a abordagem fosse correta, dados do Projeto
MapBiomas mostram que a proteção efetiva é bem menor: se computarmos o que tem
se mantido preservado nos últimos 30 anos, é menos de 50%.
…proporção
muito superior à da maioria dos países.
MEIA-VERDADE: Há pelo menos 20 países que
mantêm mais floresta como proporção do território que o Brasil, segundo dados
do Banco Mundial que podem ser consultados neste link. A lista inclui o Suriname (98%), o
Japão (68%), a Suécia (69%), a Finlândia (73%) e o Congo (67%).
Apenas 30,2%
(257.002.000 hectares) das terras brasileiras são de uso agropecuário: 8% de
pastagens nativas, 13,2% de pastagens plantadas, 7,8% de lavouras e 1,2%
de florestas plantadas. O restante, 3,5% do território nacional, é ocupado por
cidades, infraestrutura e outros.
MEIA-VERDADE: Segundo o cruzamento das bases
de dados do Projeto MapBiomas e do Atlas da Agropecuária Brasileira, o Brasil
tem 245 milhões de hectares em uso agropecuário, o que dá 29% do país – um
pouco menos até do que sugerem os dados da nota do Itamaraty. Essa cifra sobe
para 34% do território (295 milhões de hectares) quando se consideram os campos
naturais no Pampa e no Pantanal, que podem ser usados para pastoreio. É uma
cifra próxima da média mundial, que é de 37%. Cidades, água e infraestrutura
cobrem cerca de 5% do país. O Brasil é o quarto maior produtor agrícola do
planeta e tem a terceira área sob cultivo, atrás apenas de China e Estados
Unidos – países mais extensos e mais populosos que o Brasil. A área agrícola
per capita é maior no Brasil (1,17 hectare por habitante) do que nestes dois
países (0,34 ha/habitante e 1 ha/habitante, respectivamente). A área agrícola
do Brasil equivale a 1,5 vez a área agrícola de todos os países da Europa
somados.
A título de
comparação, os Estados Unidos utilizam 74,3% do seu território para a
agropecuária, 5,8% são ocupados por cidades e infraestrutura e 19,9% são
dedicados à proteção e preservação da vegetação nativa. A produção agrícola dos
países da União Europeia ocupa entre 45% e 65%; da China, 17,7%; e da Índia,
60,5%.
FALACIOSO: O documento do Itamaraty usa dois pesos e duas
medidas para comparar o Brasil a outros países. Computa, por exemplo, as
florestas nativas manejadas nos Estados Unidos na categoria “uso agropecuário”,
enquanto as florestas nativas manejadas ou passíveis de manejo no Brasil, como
as Florestas Nacionais, são consideradas “área de preservação”. Segundo dados
do Departamento de Agricultura dos EUA, que podem ser consultados
aqui, os EUA têm
61% do território sob áreas privadas para agropecuária e outros usos, mas 66%
de áreas naturais e de vegetação nativa, quase tanto quanto o Brasil, e 30% do
país está sob proteção (12% integral e 18% sob uso sustentável). Nos EUA, a
área de cobertura florestal corresponde a 74% do que existia em 1850. Embora
haja menos floresta lá do que aqui, a proporção de florestas mantidas lá é
maior do que aqui. Pesquisadores da UFMG esmiuçaram a comparação.
Dessa forma,
diferentemente do que se possa sugerir, o Brasil é um dos poucos países com capacidade
concomitante para produzir e conservar, e sua experiência, suas lições e seus
desafios informam a elaboração de políticas sustentáveis em outros países.
Contribuem para o alcance desse difícil equilíbrio políticas ambientais
especificamente voltadas para a conservação e o manejo sustentável de
florestas, com forte participação do setor privado e com o emprego de
tecnologias de ponta que permitem produção agropecuária de precisão com
sustentabilidade.
O Código
Florestal (Lei 12.651/2012) estabelece normas gerais sobre a proteção da
vegetação nativa, incluindo Áreas de Preservação Permanente (APPs), e institui,
entre outros, áreas de uso restrito e Reservas Legais dentro de propriedades
rurais privadas, que variam de 20% (Mata Atlântica) a 80% (Amazônia) da
propriedade. Com o Código Florestal, é possível fazer uma distinção entre
“desmatamento legal”, que permite o desenvolvimento da agricultura, e
“desmatamento ilegal”, que deve ser combatido nas Reservas Legais, nas
APPs e nas áreas de proteção (unidades de conservação, terras indígenas), por
meio de políticas de comando-e-controle, incluindo monitoramento, fiscalização
e combate de vetores econômicos e pressões sociais que contribuem para
possíveis devastações.
O Código
Florestal brasileiro permitiu o mais completo mapeamento florestal já realizado
com a implantação do Cadastro Ambiental Rural (CAR). Trata-se de sistema
inovador que permite o cruzamento de dados informados pelos proprietários
rurais e dados de satélites sobre a cobertura florestal das propriedades.
Segundo
dados recentes do CAR, existem no País: 231.779.278 hectares de unidades de
conservação (federais e estaduais), equivalentes a 27% do território nacional;
e 117.057.916 hectares de terras indígenas em 600 unidades, ou seja, 13,7% das
terras brasileiras.
A combinação
da extensão das unidades de conservação com a das terras indígenas resulta num
total de 348.837.194 hectares de áreas consideradas “protegidas” segundo
parâmetros das Nações Unidas, ou seja, 41% do País, equivalente à
superfície de pelo menos 15 países europeus. Esse percentual é muito superior
ao de países agroexportadores concorrentes do Brasil, como Austrália (que
protege 19,2% do seu território), os Estados Unidos (13%) e o Canadá (9,7%).
MENTIRA: O CAR, que é autodeclaratório,
não é fonte de dados de unidades de conservação e terras indígenas. O Cadastro Nacional de
Unidades de Conservação aponta a existência de 158 milhões de hectares de UCs continentais
no Brasil sendo que 18% apresentam sobreposições entre si. Além disso 11,4
milhões de hectares das áreas protegidas são sobreposição de Terras Indígenas e
Unidades de Conservação.
A soma de
todas as unidades de conservação continentais, incluindo a categoria APA, muito
permissiva (80% do território do Distrito Federal está numa APA, por exemplo),
e de todas as terras indígenas (que, de fato, representam 14% do território),
perfaz 259 milhões de hectares, cerca de 30% do território nacional – não 41%,
como a nota do Itamaraty. É um número não muito distante da média mundial, 25%,
e menor do que o de países da América do Sul, como Bolívia e Venezuela (mais de
40% cada um) e de países desenvolvidos, como Alemanha (38%) e Grécia (35%).
Além disso, as áreas protegidas estão mal distribuídas no país: a maior parte
delas está na Amazônia, região que responde por apenas 10% da produção
agropecuária. Retirando a Amazônia, apenas 5% do país – que concentra 90% da
produção – está sob alguma forma de proteção.
Além do
Código Florestal, existem diversas políticas agrícolas e ambientais que
promovem o desenvolvimento de práticas sustentáveis e a conservação de florestas,
incluindo o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, o Plano de Ação para
Prevenção e Controle do Desmatamento e Queimadas na Amazônia – PPCDAm , o Plano
de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento e Queimadas no Cerrado
–PPCerrado, para citar alguns. Existem, igualmente, diversas iniciativas de
compromisso ambiental do setor privado, as quais serão descritas a seguir.
VERDADE
ANTES DE BOLSONARO: O novo governo extinguiu a
secretaria responsável pelo PPCDAm e pelo PPCerrado no Ministério do Meio
Ambiente e até agora não disse se e como os planos terão continuidade. Não há
mais nenhum órgão encarregado de formular as políticas de combate ao
desmatamento – o ministro do Meio Ambiente já afirmou que o Ibama
bastaria para
cuidar disso. O mesmo ministro também lançou um ataque sem precedentes ao
Sistema Nacional de Unidades de Conservação, anunciando a revisão de todas as 334
Unidades de Conservação Federais, que segundo ele foram criadas “sem critério” apesar
de contarem com estudos técnicos específicos para a sua criação. Várias poderão
ser reduzidas ou até desfeitas.
Participação
do setor privado
No que diz
respeito à agropecuária, a Lei 12.651/2012 impõe ao agricultor nacional a
obrigação de manter um percentual de sua área com floresta ou outra vegetação
nativa (Reserva Legal), às suas expensas, inclusive tributárias, sem
recebimento de qualquer compensação pecuniária por isso.
FALACIOSO: O Itamaraty dá a entender que os
proprietários rurais deveriam receber dinheiro por cumprir a lei. Por essa
lógica, então, nas cidades os proprietários de imóveis deveriam receber
compensação para cumprir obrigações legais como manter recuo para calçada,
observar o espaçamento entre imóveis ou manter áreas permeáveis, ou motoristas
deveriam ser compensados por se ater aos limites de velocidade sem poder
acelerar até o limite de seus veículos. Pela mesma moeda, os serviços
ambientais prestados pelas florestas brasileiras em áreas públicas à
agricultura, como manutenção do regime de chuvas, polinização e ciclagem de
nutrientes do solo, avaliados em até US$ 700 por hectare por ano, deveriam ser
em parte pagos pelos produtores, que os recebem como um subsídio hoje. Por fim
as áreas destinadas a área de preservação permanente (APP) e reserva legal (RL)
podem ser excluídas do cálculo do ITR (Imposto Territorial Rural), o principal
encargo tributário incidente sobre a propriedade rural.
Na Amazônia,
esse percentual de conservação obrigatório é de 80% da propriedade. Segundo
cálculos do Serviço Florestal Brasileiro, cerca de 212.750.000 hectares
são Reserva Legal em áreas privadas brasileiras, aproximadamente 25% do território
(aproximadamente 100.000.000 dos quais são declarados como vegetação nativa em
propriedades privadas, 12% do território brasileiro – uma área pouco inferior
aos territórios de França, Espanha e Portugal combinados), enquanto 257.002.000
hectares são de uso agropecuário (30,2% do território). Portanto, em média,
para cada 1 hectare plantado/cultivado, o setor privado tem a obrigação por lei
de preservar ou recuperar 0,82 hectare de vegetação nativa.
NÃO
É BEM ASSIM: Excluindo-se as sobreposições entre
si e com terras indígenas e unidades de conservação de domínio público, as
áreas privadas cadastradas no Brasil somam cerca de 365 milhões de hectares e
possuem pouco menos de 190 milhões de hectares cobertos com vegetação nativa
(primária ou secundária). É correto afirmar que para cada hectare ocupado por
agropecuária no Brasil existe 0,74 hectare de vegetação nativa em propriedades
privadas – não necessariamente protegidos, como mostram as taxas anuais de
desmatamento no Brasil. Sem considerar a Amazônia, que responde por 10% da
produção agropecuária brasileira, esse índice cai para 0,64. As áreas de
reserva legal das propriedades privadas podem ser utilizadas para produção
florestal, como acontece já em escala tanto na Amazônia quanto na caatinga.
Além da instituição
das Reservas Legais, contribui para a proteção das florestas brasileiras o
desenvolvimento da pesquisa agropecuária de ponta nas últimas décadas, com
empresas como a Embrapa à frente, bem como o avanço de tecnologias que
aumentaram a produtividade, contribuindo para intensificar a produção e evitar
a incorporação de novas áreas à exploração agrícola. Esses avanços tecnológicos
permitiram que, nos últimos 40 anos, o crescimento da produção de grãos
quintuplicasse, ao passo que a área ocupada pelas plantações permanece
praticamente
estável.
MEIA-VERDADE: O desenvolvimento da pesquisa
agropecuária tem sido a chave para o salto de produtividade da agricultura
brasileira, que de fato poupou terras: de 1991 até 2017, a produção de grãos
cresceu 312%, enquanto a área plantada cresceu 61%, sendo que parte importante
da agricultura cresceu sobre áreas de pastagem. A área ocupada não “permaneceu
estável”, como alega o Itamaraty, mas trata-se de um caso de sucesso. Quando se
observa a área total ocupada pela agropecuária no Brasil, ela cresceu quase 40%
entre 1985 e 2017. Isso decorre principalmente do fato de a pecuária permanecer
com índices de produtividade média muito baixos. Segundo o projeto TerraClass,
do Inpe e da Embrapa, 63% de toda a área desmatada na Amazônia dos anos 1980
até hoje está ocupada por pastagens em sua grande maioria de baixa
produtividade.
À luz do que
precede, é correto afirmar que os produtos agrícolas que são produzidos no País
comportam a forte contrapartida de serviços ecossistêmicos prestados pela área
conservada na Reserva Legal em cada propriedade. Devem ser reconhecidos como
commodities que contribuem para a manutenção da biodiversidade, para a proteção
de fontes de água potável e para a estabilidade do clima mundial.
MEIA-VERDADE: Embora parte do agronegócio,
em especial entre os exportadores de grãos e celulose, venha cumprindo a
legislação trabalhista e ambiental, com certificação e rastreabilidade, isso
ainda está longe de ser a regra no setor. O Brasil ainda é o país que mais
desmata no mundo em termos absolutos: são cerca de 15 mil quilômetros quadrados
por ano. As reservas legais vêm sendo desmatadas: propriedades privadas
perderam 20% da vegetação nativa nos últimos 30 anos, enquanto as áreas
protegidas perderam 0,5%. Cerca de 70% das emissões brasileiras de gases de
efeito estufa vêm da atividade agropecuária, seja diretamente, pelo metano
emitido pelo rebanho bovino, seja indiretamente, pelo desmatamento. O Brasil é
o sétimo maior emissor de gases de efeito estufa do planeta – seu agronegócio,
se fosse um país, seria o oitavo maior emissor do mundo, à frente do Japão.
Atualmente,
o Brasil concorre nas exportações de grãos com países desenvolvidos como os
EstadosUnidos e a Austrália, mantendo grande parte de seu território intacto.
No que se
refere à produção de soja, está vigente desde 2006 a Moratória Brasileira da
Soja, iniciativa originalmente liderada pelo setor privado.
MENTIRA: A moratória da soja começou devido a
uma iniciativa do Greenpeace, que em 2006 denunciou que a soja que alimentava
os frangos do McDonald’s vinha de desmatamento ilegal na Amazônia. O setor
privado aderiu com relutância, por pressão dos compradores estrangeiros.
A iniciativa
alcançou resultados consistentes, como a contenção a apenas 2% da expansão da
produção de soja em áreas de desmatamento ilegal desde 2008. Iniciativa similar
no Cerrado ficou conhecida como o “Manifesto do Cerrado”.
VERDADE,
MAS…: A moratória de fato foi um sucesso,
apesar de ter quase implodido várias vezes. Tentativas de expandi-la ao cerrado
têm enfrentado resistência do setor privado.
Com relação
à sustentabilidade da pecuária, responsável por cerca de 65% das áreas
desmatadas da Amazônia, tem obtido êxito o Termo de Ajustamento de Conduta
(TAC) da Carne, implementado pelo Ministério Público Federal juntamente com
frigoríficos. Atualmente, cinco estados da região amazônica estão contemplados
no TAC.
MEIA-VERDADE: Como o nome indica, o TAC da
carne não foi uma iniciativa do setor e sim um acordo feito com o Ministério
Público para evitar que as empresas voltassem a delinquir e garantir que
continuassem recebendo crédito rural. O TAC foi um importante primeiro passo na
regularização da pecuária na Amazônia, mas o setor continua sendo o principal
responsável pelo desmatamento na Amazônia– que vem aumentando desde 2012 após
oito anos com tendência de queda.
Quanto ao
setor florestal privado, segundo dados da IBA, estima-se que, para cada hectare
de floresta plantada no Brasil, o setor privado conserva 0,7 hectare de
vegetação nativa. Atualmente, o setor de florestas plantadas possui um total de
7.84 milhões dehectares. Estima-se que, até 2030, o setor alcance 2 milhões de
hectares de novas áreas de plantio florestal comercial, baseado na
intensificação sustentável e na adoção de boas práticas de manejo. O
crescimento do setor florestal privado deve ser considerado importante para a
conservação ambiental no Brasil.
VERDADE: O setor de florestas plantadas
tem o melhor desempenho de sustentabilidade de todo agronegócio brasileiro. Se
todo o agronegócio brasileiro tivesse a performance em sustentabilidade do
setor de florestas plantadas, seguramente o Brasil teria a produção rural mais
sustentável do mundo.
O setor de
florestas plantadas é responsável pela geração de 508 mil empregos diretos e
3,2 milhões de empregos indiretos. Juntamente com o setor agropecuário, são
mais de 20 milhões de empregos diretos e indiretos. Esse número é expressivo,
tendo em conta que a população economicamente ativa do Brasil é de
aproximadamente 104 milhões de pessoas. O campo é portanto responsável, direta
ou indiretamente, por aproximadamente um quinto dos empregos brasileiros e tem
potencial para gerar muito mais oportunidades de trabalho.
Florestas e
mudança do clima
Atualmente,
estão vigentes no País as seguintes normas e compromissos no âmbito das ações
de combate à mudança do clima com implicações para o setor florestal:
VERDADE
ANTES DE BOLSONARO: As políticas citadas abaixo
são de fato importantes e é bom que o Itamaraty reconheça seu valor, porque o
governo Bolsonaro tem se dedicado a desmontá-las, uma a uma.
– Política
Nacional sobre Mudança do Clima (Lei nº 12.187/2009); com meta de redução de 36,8% a
38,9% das emissões em 2020 em relação à trajetória calculada em 2009, será
cumprida graças à estimativa inflada de crescimento anual do PIB (5%). Mas sua
principal meta, a redução de 80% no desmatamento da Amazônia, não será
cumprida. Para que fosse, seria necessário chegar a 2020 com desmatamento na
casa dos 3.900 km2/ano. Estamos em 8.000 km2 em 2018.
– Lei de
Proteção da Vegetação Nativa (Lei nº 12.651/2012) – Implementação dos Programas
de Regularização Ambiental (PRAs); o Código Florestal está sendo atacado no Congresso
pela bancada ruralista e pelo filho do Presidente da República. A implementação
do Cadastro Ambiental Rural já foi adiada três vezes e o PRA ainda não foi
concluído. Em resumo, não se está recuperando floresta, nem se está cortando
crédito de quem não recuperou.
– NDC do
Brasil – compromisso de recuperar de 12 milhões de hectares de florestas até
2030 para usos múltiplos, eliminar o desmatamento ilegal no bioma Amazônia até
2030, fortalecer o cumprimento do Código Florestal; há uma confusão na nota sobre
o que é a NDC: trata-se da meta de reduzir emissões em 37% até 2025. Para
cumpri-la, o governo listou uma série de ações, entre elas restaurar 12 milhões
de hectares e zerar o desmatamento ilegal na Amazônia até 2030.
O Brasil até
hoje não apresentou um plano de implementação da NDC, nem uma estratégia de
longo prazo. Ao contrário, extinguiu a secretaria responsável por isso no MMA e
a divisão que negociava o Acordo de Paris no Itamaraty. O chanceler do Brasil é
um franco negacionista do
clima, que
recentemente atribuiu o aquecimento da Terra a “termostatos” (sic) “no
asfalto”. Também o é o ministro do Meio Ambiente, que se refere às mudanças
climáticas como uma “discussão acadêmica” e já disse que o governo “não será
ativo” no debate climático internacional – segundo ele, há problemas mais
“tangíveis” para atacar no país.
– Desafio de
Bonn e da Política Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa, com a meta de
promover a recuperação de 12 milhões de hectares até 2030;
Não há
sequer instância no governo para cuidar da sua implementação.
– Política
Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Decreto 8.792, de 23 de janeiro de
2017 e Portaria Interministerial nº 230, de 14 de novembro de 2017) ;
Idem.
– Zoneamento
Agrícola de Risco Climático – ZARC;
– Plano de
Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento e Queimadas na Amazônia –
PPCDAm;
Seu futuro é
incerto após a extinção da diretoria que cuidava de sua implementação no MMA.
Até hoje o governo não disse o que será feito dele.
– Plano de
Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento e Queimadas no Cerrado –
PPCerrado;
Idem.
– Plano
Setorial de Mitigação e de Adaptação às Mudanças Climáticas para a Consolidação
de uma Economia de Baixa Emissão de Carbono na Agricultura – Plano ABC;
Foi mantido
no Ministério da Agricultura, mas seus recursos no Plano Safra vêm caindo ano a
ano. No ano passado, a linha de crédito do Programa ABC, que implementa o Plano
ABC, foi a menor desde a sua criação – menos de 1% do Plano Safra.
– Plano
Nacional de Adaptação à Mudança do Clima – PNA.
Foi
engavetado após a extinção da Secretaria de Mudanças Climáticas do MMA.
O Brasil foi
um dos poucos países em desenvolvimento a informar uma Contribuição
Nacionalmente Determinada (NDC), com metas de redução absoluta de emissões de
gases de efeito estufa para o conjunto da economia, no âmbito do Acordo de
Paris sob a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. A NDC
brasileira
indicou, entre outros, o compromisso de fortalecer políticas e medidas com
vistas a alcançar, até 2030, o desmatamento ilegal zero na Amazônia brasileira,
a compensação das emissões de gases de efeito estufa provenientes da supressão
legal da vegetação, bem como a restauração e o reflorestamento de 12 milhões de
hectares de florestas.
VERDADE,
MAS…: O atual governo não apenas não fez
nenhum movimento no sentido de implementar sua NDC como tem jogado ativamente
contra as políticas de controle de desmatamento e o Código Florestal, que
formam o pilar da NDC. O ministro do Meio Ambiente, principal responsável pela
implementação, sequer acredita em mudanças climáticas causadas por seres
humanos.
No que se
refere ao período pré-2020, o País antecipou o cumprimento do objetivo das
Ações de Mitigação Nacionalmente Apropriadas (NAMAs) quanto à redução de emissões
de gases de efeito estufa associada à redução do desmatamento na Amazônia e no
Cerrado.
MENTIRA: Quando as metas brasileiras
foram anunciadas, antes da conferência de Copenhague (2009), a principal delas
era reduzir o desmatamento em 80% na Amazônia. Quando o país registrou a meta
na ONU, esses 80% de redução foram “traduzidos” em toneladas de CO2 (564
milhões). O governo vem tentando argumentar que já cumpriu a meta em toneladas
de CO2 usando um truque contábil: computar o carbono supostamente “sequestrado”
em florestas em propriedades privadas inscritas no Cadastro Ambiental Rural –
que, como já vimos, é autodeclaratório. O fato permanece, porém, que o atual
nível de desmatamento é mais do que o dobro previsto na meta para 2020.
A meta para
o cerrado, que foi calculada sem o monitoramento adequado do desmatamento no
bioma e ainda sofreu um expurgo da então ministra da Casa Civil, Dilma
Rousseff, já estava cumprida desde antes de ser enunciada.
Ressalte-se
que a redução das emissões de gases de efeito estufa provenientes de
desmatamento ocorreu simultaneamente ao aumento da produção
agrícola no País.
VERDADE: Isso demonstra que, ao contrário do
que afirma o Presidente da República, a conservação ambiental não atrapalha a
produção.
Ressalte-se
também o REDD+ – instrumento desenvolvido no âmbito da Convenção-Quadro das
Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) para recompensar financeiramente
países em desenvolvimento por seus resultados relacionados a atividades de
redução de emissões no setor florestal. No Brasil, a Estratégia Nacional para
REDD+ (ENREDD+), estabelecida em 2015, tem como objetivo contribuir para a
mitigação da mudança do clima por meio da eliminação do desmatamento ilegal, da
recuperação dos ecossistemas florestais e do desenvolvimento de uma economia
florestal sustentável de baixo carbono, gerando benefícios econômicos, sociais
e ambientais.
VERDADE
ANTES DE BOLSONARO: O Decreto 7.959, publicado em
abril pelo governo atual, extinguiu a Comissão Nacional de Redd+, responsável
pela implementação da Enredd+. Toda a política de Redd+ hoje está no limbo.
O Brasil
obteve, após 12 anos de execução do Plano de Ação para Prevenção e Controle do
Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), seis anos do Plano de Ação para
Prevenção e Controle do Desmatamento e das Queimadas no Cerrado (PPCerrado) e
três anos da ENREDD+, resultados expressivos de redução de emissões
provenientes do desmatamento. Perante à UNFCCC, o Brasil já apresentou e teve
verificadas mais de 6 bilhões de toneladas de reduções de emissões de CO2
provenientes de desmatamento no bioma Amazônia entre os anos de 2006 e 2015.
Esses resultados estão disponíveis para recebimento de pagamentos por
resultados de REDD+.
Até o
momento, o Brasil recebeu como pagamentos por resultados de REDD+ montante
superior a US$ 1,217 bilhão, via Fundo Amazônia, e US$ 38,6 milhões pelo estado
do Acre, que totalizaram o pagamento de uma redução de 243,8 milhões de tCO2 de
emissões por desmatamento. Esses pagamentos equivalem a cerca de 5% do total de
resultados alcançados pelo País.
VERDADE
ANTES DE BOLSONARO: O ministro do Meio Ambiente,
como amplamente noticiado, empreende um ataque inédito ao Fundo Amazônia: já
acusou irregularidades inexistentes nos convênios com ONGs, atacou a equipe
gestora, causando a demissão da diretora do fundo, e quer mudar a governança de
seu comitê orientador de forma a interferir politicamente na destinação da
verba. Também anunciou que pretende usar recursos do fundo para pagar por
desapropriações em áreas protegidas, o que afronta diretamente o objetivo da
doação e as regras do BNDES.
Recentemente,
o País teve aprovado pelo Fundo Verde para o Clima (GCF) a Proposta de
Pagamentos Baseados em Resultados de REDD+ Alcançados pelo Brasil no Bioma
Amazônia nos anos de 2014 e 2015, o qual atinge US$ 96,4 milhões. Essa proposta
foi submetida em resposta à chamada do Programa Piloto para Pagamentos por
Resultados de REDD+ do GCF e contém, além de iniciativas de fortalecimento da
ENREDD+, programa piloto inovador de incentivos para serviços ambientais na
região da Amazônia Legal, em conformidade com os artigos 41 e 58 do Código
Florestal do Brasil, com a ENREDD+ e com a NDC do Brasil.
VERDADE
ANTES DE BOLSONARO: O diretor responsável por
finalizar a negociação com o GCF foi exonerado assim que o Conselho do fundo
aprovou o pagamento ao Brasil. Hoje o recurso também está no limbo, à espera da
nomeação de quem o opere no governo.
DEMA I – 29.05.2019
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Ernesto Araújo critica desinformação sobre meio ambiente
Ministro das Relações Exteriores disse a deputados que o objetivo do governo é elevar a participação agrícola brasileira no comércio mundial de 7% para 10% em dois anos
Agência Câmara Notícias – O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, passou boa parte de seu tempo inicial em debate na Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados contando sobre recentes negociações com a China e com os países árabes, como forma de desfazer a impressão de que haveria uma posição ideológica contra os governos desses países.
Esse era um dos motivos do requerimento de audiência dos deputados Marcon (PT-RS) e Carlos Veras (PT-PB), realizada na comissão nesta quarta-feira (29). Ernesto Araújo elogiou os chineses, afirmando que os brasileiros precisam aprender com eles a negociar.
Ele disse que a guerra comercial entre China e Estados Unidos pode trazer oportunidades para o agronegócio brasileiro.
Araújo também afirmou que há um esforço do Itamaraty para contrapor o que ele chamou de “informações erradas” divulgadas pela imprensa internacional sobre a sustentabilidade ambiental do agronegócio brasileiro. Segundo ele, apenas 30% do nosso território é usado para produção de alimentos. Mais de 60% da vegetação é nativa. O ministro disse que vai mobilizar as embaixadas para divulgar outras informações e trazer novos mercados:
“Estamos tentando implementar na mentalidade de trabalho de toda a diplomacia brasileira no exterior. Isso a gente vê claramente em outros países que são muito presentes em agricultura. Qualquer evento nas embaixadas argentinas tem sempre o vinho e a carne argentina, por exemplo. Temos que ter esse tipo de coisa nas embaixadas brasileiras”, observou.
Mudanças climáticas
Ernesto Araújo disse que o objetivo é elevar a participação agrícola brasileira no comércio mundial de 7% para 10% em dois anos. Outro problema, na opinião do ministro, seria uma versão parcial relacionada à questão das mudanças climáticas, o que estaria justificando medidas comerciais protecionistas:
“E o que se verifica é que basicamente todos os modelos, eles têm – desde o começo dos anos 90 – eles preveem uma curva muito abrupta de aumento de temperatura que não tem se verificado. Em muitos casos, algumas dessas pessoas apontam que não existe uma mudança de clima global, mas várias mudanças de climas locais. O que acontece nesse contexto – e é o que eu procurei apontar um pouco – é às vezes a manipulação política e o uso político desse alarme em relação à temperatura”, disse.
Sobre o Oriente Médio, o ministro disse que as exportações para a região cresceram 18% no primeiro trimestre em relação ao ano passado. Mas o deputado Marcon disse que o governo brasileiro atrapalha ao fazer declarações polêmicas sobre a região. E lembrou comentário de um dos filhos do presidente Jair Bolsonaro sobre o Hamas, que controla a Faixa de Gaza:
“Teria que alguém aqui do agronegócio pudesse tirar os telefones, os microfones da família Bolsonaro porque o senador Flávio Bolsonaro, no seu twitter diz: queremos que vocês se explodam – para os extremistas árabes. O Brasil nunca se meteu com essas guerras. Não vimos nenhuma colocação do ministro sobre essa questão”, observou.
Nova postura
O presidente da Comissão de Agricultura, Fausto Pinato (PP-SP), afirmou, porém, que o próprio ministro Ernesto Araújo teria mostrado uma nova postura na audiência:
“Mas vossa excelência e o próprio presidente também perceberam que estavam indo num caminho errado e estão tentando consertar. Nós vamos olhar para frente. Eu sou um grande entusiasta do governo. Agora eu não sou obrigado a concordar com algumas ideias loucas que não tenham dados técnicos. Se eu tenho um cliente que é o cliente que compra mais, gostando ou não gostando dele, eu tenho que manter uma boa relação”, disse.
Como parte da promoção do Brasil no exterior, Ernesto Araújo disse ainda que o governo está investindo na participação do país em 14 grandes feiras internacionais este ano.
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Fonte: Agência Câmara Notícias, 22/05/2019, 15:55
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Advogado especialista em agronegócio. Sócio da banca Lutero Pereira & Bornelli, com sede em Maringá/PR e filial em Cuiabá/MT. Membro da União Brasileira de Agraristas Universitários (UBAU). Membro do Comitê Europeu de Direito Rural (CEDR). Contato: tobias@direitorural.com.br