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sábado, 6 de outubro de 2018

Mundo apresenta perfil majoritario de classe media - World Data Lab

Clovis Rossi não aceita que a classe média, prejudicada pelo crise no Brasil, possa apoiar um candidato de direita, que para ele "defende a tortura".  Esse jornalista de esquerda reconhece a defasagem brasileira em relação aos progressos alcançados em termos de prosperidade para a maior parte da população mundial, mas reluta em atribuir essa situação à política econômica catastrófica dos companheiros.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 6 de outubro de 2018


O mundo moderno é de classe média e alta: pela primeira vez na história contemporânea, um pouquinho mais de 50% da população global de 7,6 bilhões de pessoas pode ser considerado de classe média ou alta, sendo 3,59 bilhões só no segmento médio.

É o que informa o World Data Lab, baseado em Viena e financiado, entre outros, pelo governo alemão e pelo Unicef, o braço da ONU para a infância. O resultado decorre da análise da renda e de gastos de lares compilados por 188 países e agregados pelo Banco Mundial.

Pena que o Brasil não siga essa tendência mundial. Afinal, classe média costuma ser elemento de estabilidade, porque, em geral, seus integrantes têm um desejo existencial (ascender ao andar de cima) e um receio primordial (evitar descer para o andar de baixo), para usar expressões consagradas por Elio Gaspari.

É óbvio que instabilidade, econômica ou política, conspira contra a ascensão e facilita a derrapagem.

Homi Kharas, um dos coordenadores da pesquisa, traz a classe média para a situação do Brasil às vésperas da eleição de domingo: "A classe média estava saturada da corrupção, saturada dos pobres serviços públicos e vinha consistentemente optando por mudanças no governo", disse.

No Brasil, de fato, a classe média foi espremida nos anos Lula/Dilma, como prova a mais completa e confiável pesquisa sobre desigualdade, feita pelo grupo liderado pelo francês Thomas Piketty e que desmontou a propaganda governamental de que havia diminuído a desigualdade no período.

O estudo deles demonstra que os 10% mais ricos viram sua fatia da riqueza nacional aumentar de já obscenos 54% para 55%. Os 50% mais pobres também tiveram um ganho de um ponto percentual (de ínfimos 11% para insignificantes 12%).

Quem perdeu esses dois pontos percentuais foi justamente a classe média, que passou a ficar com 32% da renda.

Que esteja enfurecida, se entende. Mas, do meu ponto de vista, não se justifica que penda para um candidato que faz apologia da tortura.

Na teoria, o comportamento deveria ser diferente, como comenta Kristofer Hamel, operador-chefe do World Data Lab: o rápido crescimento da classe média, diz ele, "terá significativos efeitos econômicos e políticos, na medida em que as pessoas se tornarão mais exigentes com as empresas e os governos".

O World Data Lab põe na classe média quem ganha entre US$ 11 e US$ 110 por dia (de R$ 43 a R$ 423), com base na paridade do poder de compra, o cálculo que leva em conta os preços em cada país.

No Brasil também houve notável progresso, mas a maioria da população ainda é ou pobre ou de baixa renda (ganha entre US$ 2 e US$ 10 por dia).

É o que mostra outro estudo, do Centro Pew de Pesquisas, feito em 2011: a maioria (50,9%) ficava entre a pobreza (7,3%) e a baixa renda (43,6%).

Na classe média (US$ 10 a US$ 20), estavam apenas 27,8% dos brasileiros, de todo modo um auspicioso crescimento de dez pontos percentuais em relação a 2001.

Como os anos mais recentes, não cobertos pelo estudo, foram de crescimento econômico negativo ou muito reduzido, parece razoável deduzir que a classe média encolheu ou estacionou desde 2011.

Ou, posto de outra forma, também nesse quesito, o da classe média, o Brasil está fora de sintonia com o mundo.

Clóvis Rossi. Repórter especial, membro do Conselho Editorial da Folha e vencedor do prêmio Maria Moors Cabot.