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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

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terça-feira, 15 de dezembro de 2020

Stefan Zweig e o Brasil: exílio e integração, Kristina Michahelles - livro da Casa Stefan Zweig, 2020


 

Stefan Zweig e o Brasil: exílio e integração

Livro da Casa Stefan Zweig, 2020

A Casa Stefan Zweig recebe o apoio da KAS para publicar a cartilha Stefan Zweig e o Brasil: exílio e integração. A publicação apresenta e estimula o debate sobre várias das questões mais em evidência na atualidade, como migração, refúgio e exílio. A obra é dedicada a um amplo público, incluindo jovens, alunos de nível médio e estudantes universitários.

Coordenação editorial: 

Kristina Michahelles

Projeto gráfico: Ruth Freihof, Passaredo Design


Sumário: 


Apresentação, 6 

O viajante, de Luiz Aquila, 8

Artigo: Exílios - Renato Lessa, 11

Exposição | Legado do exílio, 15

Livro: Dicionário dos refugiados do nazifascismo no Brasil, 28

Perfil: Lore Koch, única discípula de Volpi, 35

Grupo de Estudos: Stefan Zweig no país do futuro, 40

Download: 

https://www.kas.de/documents/265553/265602/Stefan+Zweig+-+Ex%C3%ADlio+e+Integra%C3%A7%C3%A3o.pdf/69c28c71-5df3-efd1-cb7f-f2a08d3d9a6f?version=1.1&t=1607529230018


Grupo de estudos

Stefan Zweig no país do futuro


O Grupo de Estudos Stefan Zweig foi criado em junho de 2020 com o objetivo de ampliar a rede de especialistas na obra e a vida do autor austríaco nas universidades brasileiras. Coordenado por Kristina Michahelles, o encontro inicial contou com a presença de Larissa Fumis, Marina de Brito e Carlos Eduardo do Prado. 

Mariana Holms acaba de se juntar ao grupo.

Larissa Fumis é de São José do Rio Preto, SP. Fez mestrado em Literatura com uma tese dissertação sobre Stefan Zweig e seu livro Brasil, um país do futuroNo doutorado, fará uma análise contrapondo o mesmo livro ao Romanceiro Brasileiro, do também exilado Ulrich Becher. 

Marina Brito mora em Viena. Em sua tese de mestrado, fez um estudo comparativo das traduções para o português - em um intervalo de sete décadas - das duas obras icônicas de Zweig, Brasil, um país do futuro e a autobiografia O mundo de ontem.

Carlos Eduardo do Prado é professor de francês da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e se doutorou em Estudos de Literatura – Literatura Comparada pela Universidade Federal Fluminense com um estudo comparativo entre as biografias de Balzac e Zweig, com base na obra Balzac, eine Biographiede Zweig.

Mariana Holms é doutoranda em Língua e Literatura Alemã pela Universidade de São Paulo. Depois de focar em Stefan Zweig no mestrado, atualmente concentra sua atenção na vida e obra da escritora e pintora austríaca Paula Ludwig, exilada no Brasil entre 1940 e 1953. 

As reuniões serão trimestrais. O site da CSZ (www.casastefanzweig.org) criou uma nova seção para abrigar trabalhos acadêmicos sobre Stefan Zweig no Brasil. 




quinta-feira, 21 de maio de 2020

Projeto de livro (2010) sobre o Brasil no mundo, diplomacia, política externa, economia, integração - Paulo Roberto de Almeida

Em 2010, já tendo acumulado certo número de trabalhos - este projeto de livro, por exemplo, levou o número 2195 da lista de originais – agrupei os trabalhos mais significativos em duas listas, possivelmente pensando numa publicação de autor. A primeira, de caráter mais conjuntural, ou formada por artigos mais leves, e uma segunda, com ensaios de caráter mais estrutural, ou analítico.
Eis o esquema do segundo livro projetado.
Talvez aproveite alguns, ou a maioria, numa nova publicação, em 2020, ou seja, dez anos depois. O problema é que, neste intervalo de tempo, dezenas de novos itens foram agregados à lista, e que poderão, portanto, integrar novos projetos de livros.
Eis a nova lista: 
3677. “Listagem de ensaios de relações internacionais, de política externa e de história da diplomacia brasileira e sobre personalidades nessas áreas (para fins de seleção)”, Brasília, 21 maio 2020, 4 p. Para elaborar seleção de trabalhos a serem publicados. Postado no blog Diplomatizzando (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2020/05/listagem-de-trabalhos-sobre-relacoes.html).

Ou seja, de 3667 a 2195, são quase 1.500 trabalhos novos, dos quais certamente 5 ou 10% merecerão compilação em algum novo volume.
Paulo Roberto de Almeida

Diplomatizando 2
Sumário:

Prefácio: O Brasil, na região e no mundo...                                                                            9

Parte I:
O Brasil, na região e no mundo
1. Le Brésil à deux moments de la globalisation capitaliste et à un siècle de distance (1909-2009) (2020)
2. A ordem mundial e as relações internacionais do Brasil, 63 p (1960); Economia Internacional, Globalização e Regionalização”, 164 p. (1899); O Brasil nas relações internacionais do século 21: fatores externos e internos de sua atuação (1858) 
3. O Brasil e as relações internacionais no pós-Guerra Fria (2018) 
4. O Brasil no contexto da governança global (1946)
5. Obsolescência de uma velha senhora?: a OEA (2011)
6. A Estratégia Nacional de Defesa e a União das Nações Sul-Americanas (2151)
7. Convergências e divergências no regionalismo econômico e político da América do Sul: evolução histórica, dilemas atuais e perspectivas futuras”, 59 p. (1927)
8. O regionalismo latino-americano no confronto com o modelo europeu: uma perspectiva histórica de seu desenvolvimento”, Brasília, 17 maio 2008, 34 p. Resumo do trabalho 1844. (1889); As experiências de integração regional na América Latina”, Brasília, 13 maio 2008, 23 p. Revisão, redutora, do trabalho 1844, para fins de publicação (1887)
9. Mercosul, 1991-2011: percurso histórico, desafios e perspectivas (2179)
10. O Mercosul não é para principiantes: sete teses na linha do bom senso 
11. Por que a América Latina não decola: alguma explicação plausível?
12. Por que o Brasil avança tão pouco: sumário das explicações possíveis
13. Brasil: o que poderíamos ter feito melhor, como sociedade, e não fizemos?
14. Qual a melhor política econômica para o Brasil?: algumas opções pessoais
15. O que podemos aprender com a experiência dos demais países?
16. Nossa contribuição para o mundo: onde o Brasil poderia ser melhor (2144)

Parte IV: 
Política Externa e diplomacia do Brasil
17. A herança portuguesa e a obra brasileira: balanço e avaliação de dois séculos (1857)
18. A política comercial do Brasil no contexto internacional, 1889-1945 (1991)
19. Estratégia Nacional de Defesa (END): comentários dissidentes (1984)
20. A Arte de NÃO Fazer a Guerra: novos comentários à END (2066)
21. As crises financeiras internacionais e o Brasil desde 1929: 80 anos de uma história turbulenta (2013)
22. Finanças internacionais do Brasil na segunda metade do século XX
23. Relações econômicas internacionais do Brasil dos anos 1950 aos 1980
24. As relações Brasil-Estados Unidos do século XX ao século XXI (1918)
25. Non-Intervention: a political concept, in a legal wrap: a historical and juridical appraisal of the Brazilian doctrine and practice (2023)
26. O Brasil e a (finada) Alca: doze questões para um debate racional 
27. Pensamento e ação da diplomacia de Lula: uma visão crítica (2168 ?)
28. Política exterior do Brasil: potência regional ou ator global? (2134)
29. A dinâmica da relações exteriores do Brasil (2068)
30. Qual a melhor política externa para o Brasil?: algumas preferências pessoais
31. Dez novas regras de diplomacia

Posfácio: O que o Brasil pode ser, daqui para a frente                                                                    

Obras do autor

segunda-feira, 14 de janeiro de 2019

O euro aos 20 anos; ensaio PRA quando de sua criação (2000)

Quando o euro foi introduzido como moeda fiduciária – ou seja, em 1999, antes de sua introdução efetiva, como meio circulante, o que só ocorreu em 2002 – eu recebi um convite para fazer um verbete sobre o euro para uma Enciclopédia de Direito.
Agora que o euro já completou 20 anos, pode-se ler este meu ensaio com o olhar crítico do que deu certo e do que pode não dar certo. A integração tem muitos requerimentos e o da unificação monetária é um dos mais difíceis.
Eu provavelmente vou escrever um novo ensaio, com a experiência – êxitos e frustrações – das últimas duas décadas, e as falhas se devem mais a decisões políticas dos países membros do que a deficiências da própria moeda. Enquanto isso, vale ler o que eu escrevia no início de 2000, com uma pequena revisão alguns meses depois, apenas para contemplar a questão de uma eventual moeda comum no Mercosul, este sim uma grande frustração.
Mas, como no caso do euro, a culpa não é do Mercosul, e sim por causa de decisões políticas dos países membros.
Vamos reler e refletir.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 14 de janeiro de 2019

O euro: a moeda europeia

Paulo Roberto de Almeida
Washington, 719: 14/01/2000
In Carlos Valder do Nascimento e Geraldo Magela Alves (coords.), Enciclopédia de Direito Brasileiro, 2º volume: Direito Comunitário, de Integração e Internacional
(Rio de Janeiro: Editora Forense, 2002; ISBN 85-309-0860-0), pp. 214-219.

A inauguração do euro, em janeiro de 1999, como moeda oficial — embora ainda sob forma escritural até o final de 2001 — de onze dos quinze países-membros da União Européia, seguida de sua introdução efetiva, a partir de janeiro de 2002, como meio circulante único dos integrantes da chamada “Euroland”, representam, para a Europa e para o mundo, o início de uma fase de grandes transformações no sistema monetário internacional, até agora marcado pela presença dominante do dólar enquanto instrumento de intercâmbio, reserva de valor e unidade de referência para dezenas de países integrando o sistema financeiro mundial. Essa etapa recente do movimento de unificação monetária na Europa ocidental deriva de um longo processo de aproximação econômica que pode ser remontado à visão integracionista de Jean Monnet, do final dos anos 1940, e à concepção política que presidiu desde então, à integração européia.
Com efeito, ainda que não mencionada expressamente nos primeiros instrumentos jurídicos da integração européia – o Tratado da Comunidade Européia do Carvão e do Aço (CECA), de 1951, e os Tratados de Roma, de 1957 – o projeto de um “poder monetário” estava implícito nos propósitos a vocação “unionista” que foram dando sustentação econômica ao alargamento progressivo dos campos de intervenção da então Comunidade Européia. Os primeiros seis países que assinaram os Tratados de Roma (Alemanha, Bélgica, França, Itália, Luxemburgo e Países Baixos) já previam trabalhar com políticas econômicas comuns, nomeadamente no domínio da agricultura. Esses campos foram sendo depois ampliados para novos domínios, como os da indústria e da ciência e tecnologia, ainda que não com o monitoramento estrito em matéria de organização da produção e da comercialização como na agricultura ou com o abandono completo de soberania em matéria de política comercial que representou a concretização da união aduaneira, em 1968, e do mercado comum pleno nas etapas subsequentes.
O movimento “unificacionista” no campo monetário começa efetivamente a caminhar em meados dos anos 1960 — em pleno regime de paridades fixas do sistema de Bretton Woods –, a partir do plano Barre (1967-69) e do relatório Werner de união monetária (de 1968, mas aprovado em 1970 e prevendo sua realização num espaço de dez anos). Ambos foram tornados inexeqüíveis pelo desmantelamento, entre 1971 e 1973, do sistema de Bretton Woods que, ao operar a desvinculação do dólar de seu valor fixo em ouro, significou igualmente a interrupção desse processo por etapas de unificação das moedas nacionais da então Comunidade Européia.
No regime de livre flutuação de moedas que se seguiu, os países europeus avançaram nos esforços de coordenação, estabelecendo primeiro a “serpente dentro do túnel” e depois, como resposta política à crise do sistema monetário internacional, o Sistema Monetário Europeu (1979). O SME – com um número variável de países participantes, segundo as épocas – funcionava segundo um mecanismo de banda cambial ajustável entre as moedas participantes (tendo o marco alemão como âncora), mas com paridades estreitamente correlacionadas entre si. De fato, durante a maior parte de existência do SME, o mundo viveu em constante turbulência monetária, ocorrendo grandes variações nos valores respectivos das principais moedas, o deutsche mark, o iene japonês e o dólar dos Estados Unidos. No interior do próprio SME, contudo, as margens de variação recíproca estabelecidas para moedas como o marco alemão e o florim holandês eram, obviamente, bem menores do que aquelas permitidas para a flutuação de moedas mais “fracas” como a lira italiana.
Em 1986, a adoção do acordo conhecido como “Ato Único Europeu” deslancha o processo de unificação definitiva do mercado comum, instituindo uma série de medidas adicionais de liberalização econômica, em especial na prestação de serviços, inclusive financeiros, e na circulação de capitais. Em 1989, o relatório Delors já proclamava o objetivo de uma futura moeda comum, podendo-se considerar o ecuEuropean currency unit, até então um simples instrumento de contabilidade orçamentária – como o antecessor do euro. Mas é o Tratado de Maastricht sobre a União Européia, de 1992, que dá os fundamentos jurídicos da união econômica e monetária (UEM) e da moeda única européia.
O Tratado de Maastricht, que entrou em vigor em novembro de 1993, estabeleceu três fases para a concretização da UEM: a primeira, com início em 1º de Julho de 1990, permitiu a livre circulação de capitais e o oferecimento de serviços bancários além-fronteiras; a segunda, começando em 1º de Janeiro de 1994, constituiu uma fase intermediária de preparação para a moeda única, tendo assistido ao estabelecimento da independência dos bancos centrais nacionais e à criação do Instituto Monetário Europeu, já com sede em Frankfurt. A terceira fase, que começou em 1º de Janeiro de 1999, viu o estabelecimento do Banco Central Europeu — no lugar do IME – e o lançamento da moeda única (cujo nome, euro, tinha sido escolhido dois anos antes).
No decurso da segunda fase seriam definidos os países habilitados a entrar na terceira fase da união monetária, segundo rígidos requisitos de “bom comportamento macroeconômico”, o que significou a instauração de uma coordenação reforçada das políticas econômicas nacionais, visando a reduzir a inflação, as taxas de juros e as flutuações cambiais, assim como os déficits e a dívida pública dos Estados. Os principais critérios de convergência definidos pelo Tratado de Maastricht referiam-se à estabilidade dos preços, à disciplina orçamentária, às contas públicas, à convergência das taxas de juros e à estabilidade das taxas de câmbio. Concretamente, eles significaram que os países desejosos de aderir à moeda comum necessitariam cumprir os requisitos seguintes: a taxa de inflação não poderia ser superior em mais de um ponto e meio percentual à média dos três Estados-membros com as taxas menos elevadas de inflação; o déficit público não deveria ultrapassar 3% do PIB e a dívida pública não poderia ultrapassar 60% do PIB; a taxa de juros de longo prazo não poderia ser superior em mais de dois pontos percentuais à média dos três Estados-membros com as taxas menos elevadas; no plano cambial, deveriam ser observadas, durante dois anos, as margens normais do SME, sem tensões graves nem desvalorizações, o que nem sempre pôde ser alcançado.
Com uma avaliação algo mais política do que estritamente econômica dos critérios de Maastricht (uma vez que nem a Bélgica nem a Itália, por exemplo, se qualificavam do ponto de vista da dívida pública), em 1998 foram definidos os Estados-membros que participariam do euro a partir de 1º de Janeiro seguinte. O Conselho Europeu de Bruxelas (Maio de 1998) determinou que os Estados-membros participantes seriam em número de onze: Alemanha, Áustria, Bélgica, Espanha, Finlândia França, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Países Baixos e Portugal. Três outros membros da UE, Dinamarca, Reino Unido e Suécia, decidiram, por escolha própria, permanecer à margem do novo esquema monetário e apenas um, a Grécia, não conseguiu se qualificar em diversos critérios importantes. No final de 1998, foram fixadas irrevogavelmente as taxas de câmbio entre o euro e as moedas nacionais, bem como entrou em vigor a legislação sobre o euro, com o que os mercados monetários e cambiais passaram a poder operar com euros.
A opção dos Estados-membros da UE pela renúncia à soberania monetária e em favor da administração coletiva da coordenação macroeconômica apresenta forte conteúdo emblemático para a Europa unida do século XXI e para seu subsequente papel internacional. O elemento fundamental desse avanço na “união cada vez mais estreita dos povos europeus” no plano monetário é de natureza interna e tem a ver, em termos kantianos, com o compromisso irrevogável dos países membros com uma ordem comunitária como garantia de “paz perpétua” no continente. Adicionalmente, as funções que o euro possa assumir futuramente enquanto “moeda mundial” e seu papel eventual de desafio à hegemonia internacional do dólar representarão a conseqüência natural da afirmação ulterior do poder econômico da União Européia no plano internacional.
De fato, o euro confirma uma das tendências mais evidentes do processo de globalização, em curso acelerado desde a derrocada final do socialismo no começo dos anos 90, movimento tendente a unificar mercados, concentrar força e poder nas mãos de alguns global players e vincular estreitamente circuitos produtivos e financeiros. Ele também reforça as tendências à estabilidade do processo de integração européia no que se refere aos mecanismos de coordenação intergovernamental de políticas macroeconômicas – o que parece ser válido para experiências similares de integração, como seria supostamente o caso do Mercosul –, ainda que a adesão permanente das autoridades financeiras nacionais, em relação a eventuais “desvios” orçamentários, por exemplo, tenha tido de ser reforçada por um “Pacto de Estabilidade e Crescimento”, concluído em meados de 1997. Esse último acordo representou, como se sabe, um difícil compromisso entre aqueles que defendem, antes de mais nada, a manutenção do poder de compra da nova moeda – como é o caso do Bundesbank e outros aderentes da ortodoxia monetária – e os que privilegiam seu papel “social” e que gostariam de ver o Banco Central Europeu promover políticas de estímulo à criação de empregos, como os franceses e italianos. Cabe recordar a esse propósito que, de acordo com disposições do próprio Tratado de Maastricht, as autoridades monetárias nacionais são proibidas de financiar déficits orçamentários, prevendo ainda o Pacto penalidades pecuniárias para aqueles Estados que incorrerem em desvios significativos em relação aos critérios de Maastricht nesse particular (máximo de 3% do PIB de déficit orçamentário e compromisso político de manutenção do equilíbrio fiscal).
No plano interno, as vantagens do euro parecem evidentes: ele simplesmente suprime os riscos de câmbio, reforça o mercado único e a convergência das economias e favorece o investimento na zona do euro. Suas vantagens microeconômicas também são facilmente demonstráveis, sobretudo do ponto de vista do viajante e do consumidor, ao facilitar as operações financeiras transfronteiras, eliminar os encargos relacionados com as operações cambiais e tornar totalmente transparente a comparação dos preços entre países e mais especialmente regiões fronteiriças (e portanto a eventual punção fiscal exercida por alguns Estados).
O período de transição, que vai de 1º de Janeiro de 1999 a 31 de Dezembro de 2001, assiste ao desenvolvimento de processos importantes do ponto de vista da implantação da nova moeda: os principais agregados monetários e a emissões passam a ser de responsabilidade exclusiva do BCE, os mercados financeiros passam a operar em euros, ainda que do ponto de vista prático o euro só pode ser utilizado sob forma escritural (mas qualquer pessoa passa a poder ter uma conta bancária em euros e emitir cheques nessa moeda). Finalmente, no primeiro semestre de 2002, se terá a circulação das notas e das moedas de euros, de modo concomitante à retirada progressiva das notas e das moedas nacionais. O mais tardar em 1º de Julho de 2002 se assistirá à supressão do curso legal das notas e moedas nacionais e passam a circular unicamente notas e moedas de euro. Entretempos, outros candidatos – os atuais ou futuros países membros da UE – poderão decidir-se por sua incorporação à UEM.
Do ponto de vista da “geopolítica” do sistema financeiro internacional, o euro será, inevitavelmente, um formidável concorrente em face do dólar, este até agora marginalmente complementado pelo deutsche mark e pelo iene japonês enquanto moedas de intercâmbio e expressão de ativos econômicos. A nova moeda terá efeitos diversos, de grande amplitude, nas áreas do comércio de bens e serviços, de fluxos de investimentos (de risco e de portfólio), dos mercados financeiros (isto é, empréstimos e créditos), das reservas em divisas dos países extra-europeus e, também, no âmbito do sistema monetário internacional, o que está vinculado ao poder econômico da União Européia.
A importância da União Européia na economia mundial pode ser comparada à dos Estados Unidos. Com uma população de aproximadamente 300 milhões de pessoas, o PIB comunitário de cerca de 9 trilhões de dólares — similar ao norte-americano — cai ligeiramente quando computado apenas o peso da “Euroland”, mas deve aumentar para volumes equivalentes quando os países hoje ausentes da união monetária a ela aderirem numa fase seguinte. A Europa mobiliza parte significativa – perto de um terço – do comércio mundial, assim como ela constitui, igualmente, fonte importante de capitais internacionais de empréstimo e de investimento direto nos mercados emergentes. Seria de se esperar, por exemplo, que com base na política conservadora do Banco Central Europeu, o euro contribua para a estabilização dos mercados financeiros globais, ao lado do papel ainda dominante do dólar e da importância reduzida do iene nas transações comerciais e financeiras internacionais. Não há, entretanto, nenhum acordo de princípio entre as autoridades monetárias dos Estados Unidos, da “Euroland” e do Japão para a manutenção de paridades correlacionadas entre suas respectivas moedas, o que indica obviamente que o sistema monetário e financeiro internacional continuará a ser tão turbulento e instável como ele tem sido desde a derrocada do padrão-ouro ao final da belle époque e do desmantelamento do regime de Bretton Woods nos anos 1970.
O fato inédito é que assistimos ao começo do final — um cenário ainda longínquo, reconheça-se — da hegemonia do dólar no sistema financeiro internacional. Esse declínio da predominância absoluta do dólar será tanto mais lento quanto forem incertos os elementos propriamente econômicos e tecnológicos que poderão sustentar uma ascensão da Europa a sua antiga posição de world’s banker. Em favor do dólar deve-se lembrar que os padrões dominantes tendem a ganhar por inércia. Em favor do euro pode-se adiantar sua menor volatilidade intrínseca e seu papel político positivo em outras experiências de integração regional, a começar pelo Mercosul. De fato, um mercado comum pleno requer, quase que naturalmente, uma moeda comum e o fato da existência do euro deverá atuar como catalisador político e econômico no processo de ampliação ulterior da União Européia.
O comportamento de uma moeda, contudo, é tanto a expressão das condições objetivas da economia que a sustenta quanto o resultado de fatores sociais e psicológicos subjacentes, basicamente a confiança dos detentores em seu futuro poder de compra. Desse ponto de vista, o euro (ainda que apenas virtual) sofreu, desde sua introdução, alguns percalços monetários e políticos: ele não apenas enfrentou, em 2000, uma inesperada desvalorização de 25% frente ao dólar, em vista de um desempenho econômico mais fraco (e da maior taxa de desemprego) na Europa, como manifestou-se uma certa desafeição dos cidadãos em relação ao que é percebido como um excesso de centralismo legislativo e de controles burocráticos por parte de Bruxelas. Com efeito, a despeito dos progressos efetuados pela Grécia no sentido de sua incorporação à UEM (a partir de 2001) e da campanha favorável conduzida pelo big business nos prováveis membros, em especial na Grã-Bretanha, o plebiscito dinamarquês sobre a introdução do euro, efetuado em setembro de 2000, com resultados negativos, pode sinalizar o reforço das correntes contrárias à unificação monetária nos demais países e o aparecimento de uma espécie de “marcha lenta” no processo de integração européia.
Que ensinamentos ou que conseqüências poderiam ser extraídos a partir da experiência européia para um esquema de integração conduzindo tendencialmente a um mercado comum como o Mercosul? Se é verdade que este não pretende permanecer uma simples zona de livre comércio ou uma união aduaneira imperfeita, como hoje, a questão da moeda única deve ser colocada como objetivo final, ainda que longínquo. Um mercado comum pleno, repita-se, pede naturalmente a moeda única. Atualmente, contudo, parece evidente que o problema não se coloca ainda em termos de moeda, mas simplesmente como uma obrigação de coordenação de políticas econômicas. Este é um requisito essencial para que choques assimétricos (sempre à espreita) não introduzam dificuldades adicionais e uma séria distorção nos efeitos potencialmente benéficos do processo integrativo. As autoridades financeiras dos países-membros do Mercosul devem reconhecer, antes de mais nada, que as políticas cambiais são uma matéria de interesse comum e que a interação constante entre formuladores de políticas e o permanente intercâmbio de informações entre seus operadores constituem passos indispensáveis para a coordenação de políticas nas áreas monetária e cambial. Essa coordenação deve ser institucionalizada progressivamente, até atingir-se o “ponto de não-retorno”, quando a própria renúncia de soberania monetária passa a ser considerada como uma garantia adicional de boa gestão macroeconômica e um passaporte para a estabilidade.
Referência: A principal fonte de informação sobre o euro e as economia dos países membros é a página do banco Central Europeu, que comporta textos em português: http://www.ecb.int.

Paulo Roberto de Almeida
 [Washington, 719: 14.01.2000]

[Revisão, 719b: 30.09.2000]

sábado, 12 de maio de 2018

Politica e integracao na America do Sul: palestra debate com Antonio Jorge Ramalho da Rocha

Diálogos Internacionais do IPRI: Política e integração na América do Sul 

A Fundação Alexandre de Gusmão (Funag) e o Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (IPRI) convidam para a palestra-debate na série “ Diálogos Internacionais”, sobre “Política e integração na América do Sul: UNASUL, CDS e ESUDE”, pelo professor doutor Antônio Jorge Ramalho da Rocha. O professor Ramalho da Rocha é doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (2002), atualmente cedido ao Ministério da Defesa, na Assessoria do Ministro. Dirigiu o Departamento de Cooperação do Ministério da Defesa e o Centro de Estudos Brasileiros em Porto Príncipe (Haiti) e integrou a Assessoria de Defesa da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. Assessorou o ministro da Defesa na implantação do Instituto Pandiá Calógeras, do qual foi o primeiro diretor. Atualmente, dirige a Escola de Defesa da UNASUL, baseada em Quito, e integra o corpo de professores responsáveis por implantar o Mestrado em Segurança Internacional e Defesa da Escola Superior de Guerra do Brasil. A palestra será realizada na Sala de Reuniões “D”, 2 º andar do Anexo II, no dia 15 de maio de 2018 às 15h. Inscrições pelo site: www.funag.gov.br/sisev.