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segunda-feira, 7 de novembro de 2011

O TNP e a posição do Brasil: Paulo Roberto de Almeida


O Tratado de Não proliferação Nuclear (TNP) e a posição do Brasil:
Algumas posições pessoais (Paulo Roberto de Almeida)

Entrevista concedida 
para trabalho acadêmico
(Brasília, 7/11/2011)

Perguntas: 

1) O que o Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP) representa, em sua opinião? Segundo a hipótese do meu trabalho, o TNP teria trazido mais pacifismo ao mundo, porém provei no decorrer dos estudos que esta afirmação não se sustenta. Esse tratado teria trazido mais paz aos EUA e Brasil na sua visão?

PRA: Não foi exatamente o TNP que trouxe mais paz ao mundo, e sim o seu objeto próprio, ou seja, as armas nucleares. Por mais contraditório que possa parecer, os vetores nucleares, e as ameaças terríveis que eles fazem pesar sobre o destino dos Estados e o próprio futuro das sociedades – assim como, visto numa perspectiva ainda mais catastrófica, a própria sobrevivência da humanidade – contribuíram, desde Hiroshima e Nagasaki e o término da Segunda Guerra Mundial para que nenhum outro conflito global de grandes proporções tenha ocorrido entre as grandes potências. Foi a ameaça do holocausto nuclear que conteve os ânimos belicosos das grandes potências e impediu-as de “subir aos extremos”, ou seja, deslanchar qualquer tipo de aventura guerreira contra uma outra, igualmente detentora de arma nuclear.
O TNP é apenas uma decorrência dessa terrível perspectiva potencial – a de um conflito entre grandes potências que implicasse o uso desse tipo de vetor – e tem a ver, mais exatamente, com o monopólio desse tipo de arma de destruição em massa por um número reduzido de grandes atores internacionais, basicamente os que já detinham a posse dessas armas no momento da negociação do TNP, em meados dos anos 1960. O TNP representa, assim, uma garantia – por certo não total, ou absoluta – de que essas armas permanecerão sob controle exclusivo de um pequeno grupo de países, considerados como nuclearmente responsáveis, já que sua disseminação por um número maior de entes estatais – ou até não estatais – poderia trazer enormes riscos para a segurança estratégica dessas grandes potências, para a paz mundial, e como dito, para a própria sobrevivência da espécie humana em nosso planeta.
O TNP não trouxe mais paz ao mundo, ele apenas garantiu que a paz ficasse dependente de certo equilíbrio nuclear, desde que esse equilíbrio pudesse ser assegurado por um entendimento tácito entre os patrocinadores desse instrumento discriminatório, iníquo, desigual e unilateral, imposto ao restante dos atores estatais pelos três negociadores originais. Ele pode ser visto como parte de uma arquitetura estratégica não exatamente de paz, mas de não-guerra, pelo menos não de guerra total, e sobretudo de uma guerra direta entre as potências nuclearmente armadas.
O Brasil não é um poder nuclear, e sequer é um ente estratégico significativo, mesmo nos vetores convencionais de guerra e de dissuasão; portanto, ele não pode ser visto como um ator relevante em qualquer questão que tenha a ver com uma discussão séria em torno do equilíbrio nuclear. O Brasil é apenas um dos Estados, dentre muitos outros, que ficou reduzido à condição de participante não nuclear do TNP, embora estivesse ao seu alcance, teoricamente pelo menos, recusar o TNP e qualificar-se nuclearmente por meios próprios, como fizeram outros países (Israel, Índia, Paquistão, Coreia do Norte, por exemplo). O fato de não fazê-lo, antes da vigência da Constituição de 1988 – que proibiu ao país dotar-se de armamentos nucleares – não tem a ver com alguma falta de vontade estratégica (já que ela existia, entre a maioria dos militares e entre muitos outros membros da elite, como os diplomatas), mas sobretudo com a falta de meios financeiros, tecnológicos científicos, para se capacitar nuclearmente, pelo menos no terreno especificamente militar.
O mundo dispõe, portanto, de um acordo que não é mundial, mas tão somente internacional, que regula parcialmente o problema, que é o TNP, o tratado de não-proliferação nuclear (Washington-Moscou-Londres, 1968). Esse tratado não é certamente universal e, sobretudo, não é multilateral, uma vez que apenas três países o negociaram e depois o “ofereceram” à comunidade internacional. Ele foi posteriormente “estendido” ao resto do mundo, na ausência – talvez na oposição – dos dois outros únicos países nucleares à época, que eram a França e a China (que a ele só aderiram no início dos anos 1990). Essa extensão se fez sob os olhos por vezes invejosos, outras vezes preocupados, de outros países, alguns deles interessados em desenvolver seus próprios artefatos nucleares, alguns outros temerosos de que a proliferação indevida dessas terríveis armas pudesse conduzir ao holocausto nuclear.

2)             Sobre a obtenção de armas nucleares por um grupo seleto de países, qual seria sua visão sobre a atitude desses países?

PRA: Não se define qual seria esse seleto grupo de países, uma equação que é altamente aleatória, pois os Estados dispõem, no universo de Westfália que ainda é o nosso, de soberania absoluta para decidir se querem, ou não, dotar-se de armamentos nucleares. É claro que, depois do TNP, aumentaram significativamente os custos – políticos, econômicos, estratégicos – para que esse passo seja dado, mas ele não é impossível, como o provam as trajetórias de países como Israel, Índia, Paquistão, Coreia do Norte e, possivelmente, a África do Sul (o único país que renunciou à posse da arma atômica, depois de ter entrado no domínio dessas tecnologias, e de ter capacidade para se qualificar ainda mais, ou seja, desenvolver vetores de entrega).
De toda forma, trata-se de um arranjo de conveniência, no qual potências médias, ou países menores, renunciam a dotar-se de armas nucleares, contra a garantia, dada pelas potências nucleares de que não irão usar essas armas como ameaça, ou chantagem de uso, contra esses países que aderiram ao TNP no status de não detentor.
Resta saber como fica a situação de potências nucleares, mas militarmente médias, como Israel, Índia, Paquistão, Coreia do Norte, que não assinaram ou se retiraram do TNP e que não possuem um status muito bem definido. Existem também países que assinaram o TNP, que observam suas prescrições, mas que poderiam, se assim o desejassem, se dotar mais facilmente de vetores nucleares em prazo médio, ou até curto: seriam grandes ou médias potências econômicas, tipo Alemanha, Japão, Canadá, Espanha, algumas até em desenvolvimento (como Argentina, Brasil, México, Indonésia, e algumas outras) e talvez até países menores mas avançados, como a Suíça, a Suécia e outros.
Creio que são poucas as vantagens decorrentes do armamento atômico, pois ele traz uma série de consequências provavelmente prejudiciais ao país, como se observou – e se observa ainda – nos casos do Iraque, da Líbia e propriamente do Irã (um caso ainda não resolvido, junto com a Coreia do Norte). As sanções econômicas eventuais – o que a Índia e o Paquistão experimentaram apenas parcialmente – podem impedir a capacitação tecnológica em outras áreas. O Brasil, aliás, sofre até hoje de restrições ao acesso de materiais, tecnologias e equipamentos sensíveis por causa de seu histórico de rejeição ao TNP (até 1996) e de tentativas de capacitação nuclear no passado (ainda com alguns efeitos residuais na área de enriquecimento de urânio).

3) Sobre a tentativa de novos países obterem armas nucleares, como o Irã e Coréia do Norte, que retomou a fabricação de bombas atômicas recentemente, de que forma o Senhor explica a atitude desses países? Essa seria uma característica de um novo paradigma mundial, revelado pela nova conjuntura da globalização mundial?

PRA: A globalização não tem absolutamente nada a ver com a capacitação nuclear desses dois países, e sim a vontade de suas elites dirigentes, paranoicas ou calculistas, que estão se armando, seja para dissuadir o “império” americano, seja para intimidar possíveis contendores (no caso do Irã, o Iraque, anteriormente, possivelmente outros na região, e sobretudo Israel). Não existe tampouco nenhum paradigma mundial nesses dois casos, mas pode-se eventualmente falar do paradigma da dissuasão, que me parece, contudo, um elemento secundário, no cálculo estratégico que ambos fizeram. Certas lideranças são fascinadas, com razão, ou sem, pela perspectiva de serem consideradas potências nucleares, acreditando que isso fará com que seus países, ou seu próprio poder, seja mais respeitado e temido. São, de toda forma, países não confiáveis no plano estratégico – o que seria o caso com dois outros nucleares não reconhecidos mas de fato, como Israel e Índia – e portanto vão continuar a sofrer sanções da comunidade internacional. Cada país é um caso diferente, com capacitações diferentes, mas ambos entram naquela categoria que o maniqueísmo político americano já chamou de “Estados vilões”.

4) Como um estudioso de Relações Internacionais e tomando a posição brasileira, o Senhor concorda com a atitude brasileira de ser uma potência “pacífica” por apenas fabricar a energia nuclear para fins de pacifismo, ou acredita que seria importante o Brasil possuir armas nucleares para possuir mais poder de barganha no cenário internacional?

PRA: Não se trata de ser, ou não, potência “pacífica”, e sim de ser um país responsável, sobretudo no plano do direito internacional e dos esforços de todos os países confiáveis para assegurar a paz e a segurança internacionais. Não é a detenção da arma atômica que confere maior poder de barganha no plano internacional, se tanto isso se dá no terreno da dissuasão estrita (como fez a Índia, mais pensando na China, do que no Paquistão, que por sua vez se armou por causa da Índia, com a ajuda da China, por sinal). O que confere maior poder de barganha é ser respeitado pelas suas boas ações, e por certa capacidade militar convencional, a única que conta em certos teatros de guerra.
O Brasil não possui nenhum contenciosos estratégico com vizinhos ou países mais distantes, e não precisa, assim, exibir qualquer dissuasão nuclear, ou mesmo em vetores mais tradicionais. Ele tem, sim, de dispor de vetores convencionais para poder participar de missões de manutenção E DE imposição da paz sob coberta do CSNU. O Brasil precisar ser dotado militarmente de meios capazes de assegurar sua defesa e de eventualmente impor a paz a outros, mas jamais na posse de arma nucleares, que não resolve nenhum problema básico do país e cria dezenas de outros indesejáveis.

5) Em sua opinião, ainda sob a visão nuclear para fins não pacíficos, daqui a 50 anos teremos um mundo...

PRA: Dentro de meio século, o mundo não será muito diferente do que é hoje, ou seja, contraditório, inseguro, com focos de conflitos, mas com ainda menos potencial para conflitos nucleares, já que supostamente aumenta a consciência dos povos quanto aos efeitos nefastos da detenção de armas atômicas.
            Em todo caso, meio século é um prazo muito longo para tratar de questões estratégicas e militares, que podem mudar rapidamente com a ascensão de novos países, e a decadência ou crise de outros países. Observando-se a China, por exemplo, constata-se que ela saiu de uma miséria abjeta a uma pobreza aceitável em menos de 20 anos, tendo construído infraestrutura e capacidades tecnológicas inigualáveis no plano mundial. Mas, ela pode entrar em crise, também, e sofrer problemas ainda não de todo detectados na presente conjuntura.

6) Caso o Senhor deseje expor mais alguma opinião sobre este tema, por gentileza, fique a vontade para colocar suas ideias.

PRA: Acredito que o recurso à guerra total já não é mais possível na era nuclear, com a crescente interpenetração dos “impérios” regionais. Isto não quer dizer que o direito internacional – e suas manifestações institucionais, como a ONU e outras agências intergovernamentais – venha a prevalecer sobre a vontade dos Estados-nacionais e, sobretudo, acima desses impérios: a ameaça do uso da força deve permanecer como a ultima ratio da política internacional durante um bom tempo ainda, enquanto, pelo menos, a lógica westfaliana continuar a prevalecer (e isto pode durar mais um século e meio, aproximadamente).
            Em todo caso, na equação estratégica contemporânea, a detenção de artefatos nucleares continua a ser o elemento dominante, em ultima ratio, do jogo do poder. Existem, obviamente, outros vetores de poder, em especial o tecnológico e o econômico, este constituindo, em última instância – segundo o modelo analítico marxista, que neste particular conserva plena validade –, o elemento crucial de afirmação de supremacia, de modo continuado. Não se compreende, aliás, o desenvolvimento e a posse de artefatos nucleares senão ao cabo de certo grau de avanço científico e tecnológico, que costuma estar ligado ao nível de desenvolvimento econômico do país.
Certamente que países economicamente poderosos estão em condições de assegurar um modo de vida satisfatório aos seus cidadãos, podendo influenciar decisivamente a agenda política e econômica mundial e contribuir, no mundo contemporâneo, para o desenvolvimento econômico e social de outros povos e países. Isso é plenamente verdade. Mas, se formos decidir, em determinados momentos, sobre a paz e a guerra, e definir quem, no momento decisivo, é capaz de impor sua vontade – ou de impedir que outros imponham a sua própria vontade –, então, a posse de armas nucleares torna-se o diferencial absoluto de poder, independentemente do poder econômico relativo de cada um dos contendores.
A questão nuclear, no seu sentido amplo, estratégico, apresenta três aspectos que não estão necessariamente conectados entre si de modo estrutural, mas que foram conceitualmente reunidos pelo próprio instrumento que “regula” a questão no plano internacional: (a) a não-proliferação, que é obviamente o aspecto principal subjacente às intenções dos proponentes do TNP; (b) a cooperação nuclear para fins civis, ou pacíficos, que representa uma promessa e uma garantia das potências nuclearmente armadas em direção de todas as outras; (c) o desarmamento, que é uma hipótese fantasiosa inventada pelos proponentes do TNP para atrair – enganar seria o termo mais exato – os demais países a esse instrumento discriminatório e desigual. Em relação a esta terceira dimensão da questão nuclear, se poderia repetir o velho argumento tantas vezes utilizado em outras circunstâncias: em relação ao desarmamento, as potências nuclearmente armadas fingem que pretendem desarmar, um dia, e todos os demais fingem que acreditam nessa hipocrisia. De fato, parece difícil reverter a situação ao status quo ante: uma vez que o “gênio” nuclear saiu da sua lâmpada militar, é praticamente impossível fazê-lo retornar à sua “inexistência” anterior.
Para todos os efeitos práticos, o que vale, para as potências do TNP é a garantia de não-proliferação, com alguma cooperação na dimensão da cooperação – sob o olhar vigilante da AIEA – e a total desconsideração da dimensão desarmamento. Para todos os “nucleares”, portanto, essa questão apresenta dois aspectos: o da projeção da força e o da dissuasão. O primeiro aspecto, depois de Hiroshima e Nagasaki, não mais voltou ao cenário internacional (a despeito de alguns “ensaios”, como em Cuba, em 1962). A arma nuclear não mais voltou a ser usada como arma de terreno para abreviar o final de uma guerra, ainda que ela tenha sido cogitada em alguns cenários ou teatros possíveis de operação (como a sugestão do general MacArthur, em face da ofensiva chinesa durante a guerra da Coréia). Mesmo no caso de Cuba (1962), quando os dois grandes contendores da fase pré-TNP parecem ter chegado ao limite do abismo nuclear, não estavam reunidas todas as condições para que o jogo de pôquer, naquelas circunstâncias, chegasse a uma “solução final”.
A arma nuclear é usada, portanto, para fins essencialmente dissuasórios, e é como tal que Israel a concebe, em face de uma coalizão agressiva de Estados árabes que gostariam de varrê-lo do mapa. Existem, certamente, militares, que concebem alguma utilização tática da arma nuclear; mas os estadistas responsáveis e planejadores sensatos dos países nuclearmente “capazes” – e não apenas daqueles nuclearmente armados – assim imaginam sua equação nuclear nacional. De fato, repassando a lista dos nucleares, veremos que eles sempre tiveram em mente algum perigo estratégico, para o qual se buscou a solução de última instância.
Com a possível exceção da França – que estava exercendo uma opção de “orgulho nacional”, depois de tantas humilhações sofridas desde o século 19 – e, possivelmente, da África do Sul – que se sentia acuada pelos demais países africanos no momento do Apartheid –, todos os demais países tinham algum contendor em mente no desenvolvimento do seu programa nuclear. A China se armou contra os EUA e contra a própria URSS; a Índia o fez contra a China, menos do que contra o Paquistão; o Paquistão contra a Índia (com a ajuda da China); Israel contra os países árabes, e eles são muitos; a Coréia do Norte contra os EUA (possivelmente o Irã, também, mais do que contra o Iraque). As aventuras nucleares de Saddam Hussein (ditador do Iraque até sua derrubada pelos EUA em março de 2003) e as do coronel Kadhafy, da Líbia (estas, finalizadas depois de duras sanções contra o país), entram nesta equação a título de bizarrice, embora o ditador do Iraque tivesse o inimigo iraniano no seu planejamento militar. De todos esses países, o único que desarmou voluntariamente foi a África do Sul; mas ela o fez no momento da transição para o regime de maioria negra, e esse elemento pode ter entrado no cálculo estratégico da liderança branca que assim decidiu no início dos anos 1990. Quanto à Coréia do Norte, a supor que ela desarme, efetivamente, tal fato pode ser atribuído à dupla pressão da China e dos EUA, nessa ordem.
Parece haver uma teoria das relações internacionais contemporâneas – mas não testada na prática – que afirma que os Estados que se tornam nuclearmente armados passam a se comportar de modo mais responsável e condizente com suas novas responsabilidades no plano internacional. Este foi certamente o caso da China, de Israel, da Índia, embora haja desconfianças em relação ao que possam algum dia fazer o Paquistão, a Coréia do Norte e, eventualmente, o Irã. Mesmo com relação à China, se questiona se seu papel foi responsável, uma vez que ela pode ter sido decisiva na capacitação nuclear do Paquistão, que por sua vez foi, em parte, negligente com o seu programa: um físico desse país está na origem de uma das mais importantes redes de disseminação de tecnologia e materiais nucleares, num contexto de “proliferação” por empreendimento individual, um pouco como faziam os piratas de antigamente, que também podiam servir de corsários para seus Estados respectivos. Alguns cenários podem ser preocupantes, nessa hipótese de uma proliferação não controlada pelos atores responsáveis, o que poderia ser o caso do Paquistão, da Coréia do Norte e do Irã, precisamente.
Mesmo quando um país nuclearmente “capaz” não parece ameaçar a paz mundial, cenários de conflito são sempre imprevisíveis, pois as fontes podem emergir não da situação objetiva de um país determinado, em seu contexto geopolítico próprio, mas como resultado da paixão dos homens, falíveis por definição. Imaginemos, por um instante, uma ocupação das Malvinas por tropas argentinas respaldadas por um artefato nuclear que teria sido previamente desenvolvido pela ditadura militar. A história poderia ter sido bastante diferente.
O TNP vem se “universalizando” nos últimos anos, em que pese sua notória falta de legitimidade intrínseca. Por outro lado, mais países estão se tornando nuclearmente capazes, quando não nuclearmente armados. A Índia já criou uma situação nova e vem sendo aceita como uma potência nuclear de fato, ainda que não o venha a ser de direito. O grande responsável por essa transformação foi, a rigor, a potência garantidora, por excelência, do TNP e aquela teoricamente mais engajada na não-proliferação: os EUA. A dissuasão e o cálculo estratégico estão aqui bem presentes. As boas relações entre Índia e EUA, nesse terreno, têm a ver com a China, embora equivocadamente considerada como a fonte possível de desafios estratégicos para os EUA. O acordo nuclear entre EUA e Índia vale estritamente para fins civis, e não tem o poder de qualificá-la para o clube formal das potências nucleares, o que de toda forma exigiria reforma do TNP, algo praticamente impossível de ocorrer nessas bases.
O TNP precisa, sim, de reformas, mas elas teriam de ser bem mais radicais do que poderiam admitir os cinco privilegiados da atualidade. Nem eles poderiam admitir o seu desarmamento, o que obviamente não ocorrerá, nem eles vão querer estimular em demasia o desenvolvimento nuclear – ainda que para fins eminentemente pacíficos – dos demais países. Assim, parecem existir poucas chances de progresso institucional na questão nuclear, com base nos instrumentos atualmente disponíveis, em primeiro lugar o TNP. Haverá, portanto, muita hipocrisia e muito more of the same nesta agenda.
Não se concebe, com efeito, as potências nuclearmente armadas favorecendo o ingresso de países “candidatos” no clube nuclear. Eles precisariam “forçar a porta” e garantir o seu ingresso, mas sempre serão passageiros incômodos, por não disporem do bilhete desde a partida. Em outros termos, não haverá nenhum levantamento de restrições à transferência de tecnologia. Mas os próprios países que aspiram ingressar no grande jogo estratégico terão de buscar sua equiparação progressiva – embora rudimentar – com os cinco grandes, com base em sua própria capacitação. Esta dependerá em grande medida do aprendizado próprio – ou seja, ciência e indústria, com base em tecnologia endógena ou copiada –, da política dirigida ao comércio de materiais sensíveis, alguma cooperação bilateral e um pouco de espionagem.
Quanto ao problema da reforma da Carta das Nações Unidas e a ampliação do seu Conselho de Segurança, esse processo não tem a ver, diretamente, com a posse de algum artefato nuclear. O Japão – potencialmente capaz de desenvolver a arma, mas que prefere, por enquanto, viver castrado nessa dimensão – e a Índia são, teoricamente, os dois únicos países que estariam na lista dos EUA para ingresso no CSNU, mas não por algum cálculo de natureza estratégica que envolva a posse de armas nucleares. De toda forma, o alegado desejo dos países membros e dos candidatos em promover uma “democratização” das estruturas de poder internacional não passa de uma hipótese pouco credível para quem acompanha a realidade das relações internacionais. Os cinco permanentes atuais não desejam a reforma e não pretendem diluir o seu poder com novos candidatos. O status quo lhes convém e assim será mantido até que novos dados da realidade alterem substancialmente a equação estratégica do cenário internacional contemporâneo. Uma coisa é certa: o “gênio” nuclear continuará fora da garrafa.
E o Brasil, como se situa ele, neste cenário de unilateralismo arrogante, de arranjos oligárquicos e de pressões sobre os países “desviantes”? Ele mesmo poderia ser incluído nessa categoria, ao persistir sua recusa do Protocolo adicional ao TNP, mesmo depois de aceitar relutantemente esse instrumento discriminatório em 1996. É certo que, na origem, isto é, nos anos 1950, o Brasil mantinha concepções otimistas – talvez ingênuas – sobre a utilização do poder nuclear, tanto sob a forma de energia, como em aplicações médicas e mesmo em obras de engenharia civil. Depois ele alimentou o sonho de aceder à tecnologia de processamento e de sua eventual utilização militar, ao empreender, entre outros programas, a cooperação nuclear com a Alemanha (que, junto com o Brasil, foi objeto de intensas pressões dos EUA). Sua capacitação interna foi prejudicada por insuficiência de recursos e de vontade política, independentemente do eventual sucesso tecnológico do acordo com a Alemanha, que não foi conduzida a termo. Foi, provavelmente, melhor assim, pois o espectro de uma corrida nuclear com a Argentina foi afastado e ambos os países terminaram não apenas acedendo ao TNP, como também desenvolveram um programa exemplar de cooperação em salvaguardas nucleares que pode servir de modelo para outras situações do gênero (provavelmente no sul da Ásia, com o impasse indo-paquistanês ainda pendente).
Continuam pendentes, portanto, o problema da recusa brasileira ao Protocolo adicional ao TNP – que parece ter a ver com uma hipotética “tecnologia original” utilizada na fábrica de processamento de Resende – e a questão da postura em relação à nova “doutrina nuclear” dos EUA, que envolve o controle das atividades civis, em todos os seus aspectos (comerciais, tecnológicos, produtivos). Tendo em vista o nacionalismo e o soberanismo brasileiros, não haverá progresso sensível no futuro imediato, mas essa questão não é crucial no plano da segurança estratégica para a ordem política mundial: afinal de contas, o Brasil não é um elemento desestabilizador da ordem internacional e o mundo pode facilmente conviver com esse tipo de nacionalismo “nuclear”.

Paulo Roberto de Almeida
(Brasília, 7/11/2011)

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Discutindo as ameaças nucleares: Hudson Institute (Washington)


Nuclear Security Summits: Impact and Assessment
Tuesday, September 13
9:30 - 11:30 AM


The explosion of one crude nuclear device in one city would change our world forever.
Since the end of the Cold War, a serious effort has been under way to fully secure the world's nuclear material. But 20 years later, that has yet to be achieved and the new threat of nuclear terrorism has emerged.
Panelists will discuss the impact of Nuclear Security Summits and developments in nuclear security since the 2010 summit in Washington, DC, with a look ahead to desired outcomes from the next Nuclear Security Summit in South Korea in 2012.

Panelists include:

Laura Holgate
Senior Director, WMD Terrorism & Threat Reduction at the National Security Council

Christopher A. Ford
Senior Fellow and Director of the Center for Technology and Global Security, Hudson Institute
Former United States Special Representative for Nuclear Nonproliferation

Kenneth Luongo
Co-Chair, Fissile Materials Working Group
President, Partnership for Global Security

Co-Chaired by
Richard Weitz
Senior Fellow and Director of the Center for Political-Military Analysis, Hudson Institute

Co-Chaired and moderated by
Jennifer Smyser
Program Officer, Policy and Outreach, Stanley Foundation

This event will be streamed live on Hudson's website: www.hudson.org/WatchLive.
The video and audio recordings of the event will be posted on the site a few days later.
 Hudson Institute is a nonpartisan policy research organization dedicated to innovative research and analysis that promotes global security, prosperity, and freedom. Partnership for a Secure America (PSA) is dedicated to advancing bipartisan action on U.S. foreign policy and national security challenges. The Stanley Foundation is a nonprofit, nonpartisan, private operating foundation with programming focused on promoting and building support for principled multilateralism in addressing international issues.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

A "maldicao" do poder nucelar: o caso de Israel (NYT)

Bringing Israel's Bomb Out of the Basement
By AVNER COHEN and MARVIN MILLER
I.H.T. Op-Ed Contributor
The New York Times, August 25, 2010

In the shadow of the Holocaust, Israel made a determined and ultimately successful effort to acquire nuclear weapons. Just as fear of genocide is the key to understanding Israel’s nuclear resolve, that fear has also encouraged nuclear restraint. After all, if Israel’s enemies also acquired the bomb, the small Jewish state might well face destruction. Moreover, the specter of killing large numbers of innocent people was morally unsettling.

This combination of resolve and restraint led to a nuclear posture known as opacity, which is fundamentally different from that of all other nuclear weapons states. Israel neither affirms nor denies its possession of nuclear weapons; indeed, the government refuses to say anything factual about its nuclear activities, and Israeli citizens are encouraged, both by law and by custom, to follow suit.

Opacity was first codified in a secret accord between President Richard Nixon and Prime Minister Golda Meir of Israel in September 1969. As long as Israel did not advertise its possession of nuclear weapons, by either declaring it had them or testing them, the United States agreed to tolerate and shield Israel’s nuclear program. Ever since, all U.S. presidents and Israeli prime ministers have reaffirmed this policy — most recently, President Obama in a July White House meeting with President Benjamin Netanyahu, during which Mr. Obama stated, “Israel has unique security requirements. ... And the United States will never ask Israel to take any steps that would undermine [its] security interests.”

Opacity continues to have almost universal support among members of the Israeli security establishment, who argue that, by not publicly flaunting its nuclear status, Israel has reduced its neighbors’ incentives to proliferate and has made it easier to resist demands that it give up its nuclear shield before a just and durable peace is established in the Middle East.

But this policy has now become anachronistic, even counterproductive. In the early days of its nuclear program, Israel had no concerns about legitimacy, recognition and responsibility; its focus was acquiring a nuclear capability. Today, the situation is different. Israel is now a mature nuclear weapons state, but it finds it difficult under the strictures of opacity to make a convincing case that it is a responsible one. To the extent that opacity shields Israel’s nuclear capabilities and intentions, it also undercuts the need for its citizens to be informed about issues that are literally matters of life and death, such as: Whose finger is on the nuclear trigger and under what circumstances would nuclear weapons be used?

Opacity also prevents Israel from making a convincing case that its nuclear policy is indeed one of defensive last resort and from participating in a meaningful fashion in regional arms control and global disarmament deliberations.

Israel needs to recognize, moreover, that the Middle East peace process is linked to the issue of nuclear weapons in the region. International support for Israel and its opaque bomb is being increasingly eroded by its continued occupation of Palestinian territory and the policies that support that occupation. Such criticism of these policies might well spill over into the nuclear domain, making Israel vulnerable to the charge that it is a nuclear-armed pariah state, and thus associating it to an uncomfortable degree with today’s rogue Iranian regime.

Indeed, while almost all states publicly oppose the acquisition of nuclear weapons by Iran, there is also growing support for dealing with this problem in an “evenhanded” manner, namely, by establishing a nuclear weapons free zone across the entire region.

However, if Israel takes seriously the need to modify its own nuclear posture and its approach to the peace process, there will likely be stronger international support for measures designed to stop Iran from crossing the nuclear threshold and to contain a nuclear-armed Iran if those efforts fail.

Israel was not the first state to acquire nuclear weapons, and given its unique geopolitical concerns, it should not be expected to lead the world into the nuclear-free age. But in order to deal effectively with the new regional nuclear environment and emerging global nuclear norms, Israel must reassess the wisdom of its unwavering commitment to opacity and realize that international support for retaining its military edge, including its military edge, rests on retaining its moral edge.

Avner Cohen is a senior fellow at the James Martin Center for Non-proliferation Studies at the Monterey Institute of International Studies. Marvin Miller is a research associate in the Science, Technology, and Society Program at the Massachusetts Institute of Technology. A longer version of this article will appear in the September/October issue of Foreign Affairs.
Tribune Media Services

quinta-feira, 8 de abril de 2010

2047) Nao-proliferacao: pense duas vezes - Foreign Policy en Espanol

DEPENDE: NO PROLIFERACIÓN
Miki Petrovic
Foreign Policy en Español, diciembre-enero 2010

El camino hacia un mundo libre de armas atómicas está lleno de obstáculos, pese a las buenas intenciones de la Administración Obama. El planeta debería hacer un esfuerzo para apuntalar el Tratado de No Proliferación Nuclear, que se revisará en mayo y que ya pasa de los 40 años. Pero, ¿ha servido para algo?

El TNP ha evitado más potencias nucleares

Más o menos. Pese a los continuos obstáculos y a que no ha impedido la aparición de cuatro nuevas potencias atómicas (Israel, Pakistán e India no lo han ratificado y Corea del Norte se retiró en 2003), el mundo estaría peor sin el Tratado de No Proliferación (TNP). Desde 1968 ha imposibilitado que se amplíe, al menos de forma oficial, el restringido club de los cinco miembros que lo componen (EE UU, Rusia, Francia, Reino Unido y China), y sus objetivos, acatados por 187 países, son loables: la no proliferación, el uso pacífico de la energía nuclear y el desarme. Revisado cada cinco años (la próxima cita en es mayo de 2010), su guardián nuclear es el Organismo Internacional de Energía Atómica (OIEA), cuya responsabilidad es establecer un sistema de salvaguardias con los Estados firmantes, mediante la inspección y la monitorización de las instalaciones, y mantener así un inventario de material nuclear para detectar usos no declarados. Sin embargo, el texto no permite que se abra la puerta a los inspectores del OIEA a instalaciones no reconocidas. Tal y como está redactado el TNP, permite a los países signatarios desarrollar el ciclo del fuel, que incluye la extracción de plutonio del uranio irradiado en un reactor y el enriquecimiento de uranio. Esta tecnología de doble uso (civil y militar) hace posible obtener el material fisible, que es el proceso más complejo y costoso del camino para construir un artefacto atómico, lo que otorga a los países una capacidad nuclear virtual.

Hasta ahora y debido a la complejidad científica, industrial y financiera de dichas tecnologías, el intercambio de estos métodos se llevaba a cabo entre los Estados. Pero la trama de proliferación liderada por el científico paquistaní Abdul Kader Jan, padre de la llamada bomba atómica paquistaní, desvelada en 2003, puso de manifiesto la incapacidad del sistema de verificación dirigido por el Grupo de Abastecedores Nucleares para impedir la venta de la tecnología y el equipamiento necesarios para fabricar un artefacto nuclear a regímenes como Irán, Libia y Corea del Norte. “Estamos en un momento de desafíos sistemáticos y sin precedentes para la no proliferación global basada en el TNP”, subrayó el presidente del grupo en la reunión plenaria de 2003. Desde 2006, Argelia, Marruecos, Túnez, Libia, Egipto, Turquía, Jordania y el Consejo de Cooperación del Golfo (Emiratos Árabes Unidos, Bahréin, Kuwait, Omán, Qatar y Arabia Saudí) han demostrado interés o iniciado licitaciones para dotarse de tecnología nuclear para generar energía o para la desalación. Los profesores Scott D. Sagan, de la Universidad de Stanford, y Steven E. Miller, de Harvard, se preguntan si es posible la energía nuclear sin proliferación. “Para que un programa de energía nuclear se desarrolle y gestione de forma segura es importante que los Estados tengan un buen gobierno, característica que fomenta una gestión adecuada de las operaciones nucleares. Estas características incluyen un bajo grado de corrupción, un alto grado de estabilidad política, un elevado nivel de eficacia gubernamental y una fuerte regulación de la competencia (…). Por desgracia, los datos ponen de relieve los graves problemas de seguridad que se crearán si proliferan las instalaciones para la producción de energía nuclear en todos los Estados que han expresado su interés en hacerse con ella”. El peligro de proliferación latente que supone la difusión de instalaciones nucleares muestra la necesidad de fortalecer el TNP, ampliar el número de países adheridos al tratado, firmar las salvaguardias ampliadas del protocolo adicional de la OIEA e incentivar la creación de un banco de fuel nuclear que garantice el suministro internacional, a la vez que desincentive la difusión de proyectos nacionales para el enriquecimiento de uranio o la extracción de plutonio.

El ‘club atómico’ no lo ha cumplido

Desde luego. Al menos en lo referente al artículo VI del TNP, según el cual “cada una de las partes del Tratado se compromete a celebrar negociaciones de buena fe sobre medidas eficaces relativas al cese de la carrera de armamentos nucleares en fecha cercana y al desarme nuclear, y sobre un tratado de desarme general y completo, bajo estricto y eficaz control internacional”. Aunque se ha producido un cierto desarme, sobre todo por parte de EE UU y de Rusia (que tenían el 95% del arsenal), y a pesar de la oportunidad que significó el final de la guerra fría, todas están modernizando sus vectores de lanzamiento e incluso sus artefactos nucleares. Por ejemplo, y sólo por hablar de los miembros del club atómico (los mismos del Consejo de Seguridad de la ONU), EE UU tiene en mente el proyecto Reliable Replacement Warhead (RWW), que propone el diseño de nuevas armas; Reino Unido ha decidido iniciar la modernización de sus submarinos y misiles, cuya vida operativa finaliza en 2020; Rusia mantiene el despliegue de sus misiles Topol–M y continúa con los ensayos del proyectil Bulava, instalado a bordo de los nuevos submarinos estratégicos de la clase Borey, China está modernizando sus fuerzas nucleares, aunque persiste en su doctrina de no usar armas atómicas, salvo en caso de legítima defensa, y se declara a favor del desarme completo. Por otro lado, las cinco potencias también han incumplido el artículo primero que les impide ayudar, alentar o inducir a otro país para adquirir armas nucleares. Sin la participación de Francia, por citar sólo un caso, el programa nuclear israelí hubiera sido técnicamente imposible. China, que no se adhirió al TNP hasta 1992, colaboró de forma intensiva en el desarrollo atómico de Pakistán. Y el acuerdo de colaboración entre Washington y Nueva Delhi, firmado en la época de George W. Bush, ha puesto a disposición de India, enemiga tradicional de Islamabad, tecnología de enriquecimiento de uranio y reprocesamiento de plutonio. No sólo eso, sino que el texto permite la venta de combustible nuclear, lo que posibilita dedicar esa parte de su producción para sus bombas. Esta realidad viene a dar la razón a algunos de los signatarios del Tratado, que sostienen que éste sólo impone obligaciones precisas a los firmantes y compromisos imprecisos para las potencias nucleares.

Israel nunca suscribirá el TNP


Ni en sueños. La situación política y de seguridad en la explosiva región de Oriente Medio tendría que dar un giro de 180 grados. Israel no es miembro del TNP y, según los analistas, dispone de un arsenal nuclear similar al de Francia o Reino Unido, aunque nunca lo ha confirmado ni desmentido. Además de Irán, la auténtica piedra en el zapato israelí, que se ha exacerbado desde la llegada al poder del presidente iraní Mahmud Ahmadineyad, unos trece países de la región están interesados en dotarse de infraestructuras nucleares de doble uso, por lo que Tel Aviv considera su arsenal como su último recurso para su supervivencia. En anteriores ocasiones, Israel ha liquidado cualquier conato de proliferación en la región, bombardeando en 1980 el reactor iraquí de Osirek y destruyendo en 2007 una instalación en la localidad siria de Dair Alzour, un supuesto reactor que, según la inteligencia estadounidense, se construyó con la ayuda de Corea del Norte desde 2001. Pero en el caso iraní, el uso de la fuerza contra sus dispersas instalaciones no asegura la destrucción de todo su potencial nuclear. Como respuesta, Teherán podría retirarse del TNP y acelerar sus esfuerzos nucleares, así como hostigar a Israel mediante sus aliados libaneses y palestinos. Esto probablemente obligaría a Israel a reconocer la posesión de armas estratégicas en público, lo que a su vez puede provocar reacciones en la política nuclear de algunos de sus vecinos (Egipto, Siria, Arabia Saudí, Turquía o Argelia). Por si fuera poco, esto podría tener consecuencias catastróficas en el mercado energético mundial. Las declaraciones en 1996 del entonces ministro de exteriores, Ehud Barak, aclaran su postura: “La política nuclear de Israel, tal como la perciben los árabes, no ha cambiado, no cambiará y no puede cambiar, porque es una cuestión fundamental de supervivencia que afecta a todas las generaciones por venir”. En el año 1995, la conferencia de revisión del TNP solicitó la creación de una zona libre de armas de destrucción masiva en Oriente Medio. Tel Aviv apoya la propuesta incluyendo armas químicas, biológicas y nucleares, así como misiles balísticos. Pero para que Israel firme la paz con sus vecinos, como primer paso hacia el desarme en toda la región, hay que solucionar el conflicto palestino.

Ha servido para controlar a Irán

Sí. Puede parecer una afirmación extraña, ya que el OIEA no fue capaz de detectar el programa de enriquecimiento de uranio iraní, pero sí se ha encargado desde entonces de vigilarlo. Irán dispone de un ambicioso proyecto nuclear, cuyos orígenes se remontan a la época del sha y que, en la actualidad, abarca casi todo el ciclo del fuel. Con la Revolución Islámica de 1979 cesó toda la colaboración con Occidente y fue fraguándose una relación privilegiada con China, Corea del Norte, Pakistán y Rusia, aunque ha invertido un considerable esfuerzo humano y material en su programa de investigación y desarrollo para la implantación de una industria propia. El régimen de los ayatolás es miembro del TNP desde 1970 y reclama el derecho que le concede el Tratado para desarrollar el ciclo del fuel para su uso pacífico y civil, aunque la comunidad internacional sospeche que sus intenciones son otras. Las negociaciones para resolver el contencioso en el marco de Naciones Unidas están lideradas por el P5+1 (Francia, Alemania, Reino Unido, Rusia y China, más la Unión Europea), que pretende llegar a un acuerdo para controlar la producción de uranio enriquecido. Según un informe confidencial titulado Posible dimensión militar del programa nuclear de Irán, al cual han tenido acceso algunos medios de información, el OIEA afirma que los iraníes han realizado una amplia gama de investigaciones y de ensayos para perfeccionar un artefacto nuclear de implosión, con la fabricación de detonadores de alta tensión, ensayos de explosivos y el diseño de ojivas. Los avances nucleares obtenidos, junto al poder que proyecta mediante la alianza con distintos regímenes y su programa de misiles balísticos, preocupan en muchas capitales árabes, que temen que pueda lograr la hegemonía regional. El tiempo apremia para resolver el contencioso con Irán, ya que, a pesar del control del OIEA en la producción de uranio enriquecido en la central de Natanz, Teherán, sigue incrementando su stock y el conocimiento adquirido le permite replicar dichas instalaciones, como parece haber ocurrido en la planta de Qom.

Pakistán es la mayor pesadilla nuclear

Y con razón. “Pakistán continúa siendo la más inestable de las potencias nucleares. Hay varios factores que cuestionan la seguridad a largo plazo de su arsenal nuclear: la miseria económica, la contracción del espacio estratégico, las frágiles instituciones políticas, la ausencia de consenso político doméstico y el incremento del fundamentalismo islámico. Estas cuestiones ponen en entredicho la fiabilidad de los custodios del arsenal”, asegura Gaurav Kampani, del Centro de Estudios para la No Proliferación.

La reciente ofensiva del Ejército paquistaní contra los talibanes en el valle del Suat, dada la cercanía a la capital, provocó dudas sobre la seguridad de los almacenes de armas estratégicas. Islamabad mantiene separadas las cabezas explosivas de los misiles y las bombas, como único mecanismo de seguridad pasiva, ya que no dispone de mecanismos para bloquear su detonación (enlaces de acción permisiva PAL). El personal está seleccionado, entrenado y vigilado, sin embargo son múltiples los casos conocidos de cooperación o apoyo de científicos y militares con Al Qaeda y los talibanes. El episodio más flagrante fue el de Abdul Kader Jan, El Gran Proliferador, metalúrgico de profesión, que trabajó en la empresa holandesa Fysisch Dynamisch Onderzoekslaboratorium (FDO), dedicada a la fabricación de centrifugadoras para el enriquecimiento de uranio. En 1975 se fugó a Pakistán con los planos de las centrifugadoras y otra documentación secreta para incorporarse al incipiente proyecto nuclear de su país. A través de intermediarios y compañías creadas por el servicio de información paquistaní (ISI) en Europa, Pakistán tejió una red internacional de agentes para la importación de equipamientos para su programa nuclear. Así obtuvo un amplio conocimiento del modo de lograr tecnología de forma legal e ilegal, que puso a disposición de otros. Una vez adquirido el poder nuclear, decidió exportar sus conocimientos a los países que le habían prestado apoyo financiero (Libia, Irán) y tecnológico (Corea del Norte).

Y luego está la cuestión de Cachemira, el territorio en disputa que impide a Islamabad y a Nueva Delhi sellar una paz nuclear. Pakistán e India se han enfrentado en tres guerras, en 1947-1948, 1965 y 1971, en un conflicto menor en Kargil, en 1999, y han mantenido cuatro crisis con la amenaza atómica como telón de fondo, en 1984, 1986-1987, 1990 y 2001-2002. Islamabad, consciente de su inferioridad bélica convencional, ha pretendido usar otros medios para mantener su reclamación viva y evitar la paulatina asimilación del territorio por India. Parece convencido de poder recuperar el territorio militarmente o por el cansancio indio sin el peligro de un enfrentamiento global, confiando en un conflicto de baja intensidad (falsa premisa, como demuestran las guerras de 1947 y 1965). Con este fin, Pakistán se ha prodigado en la llamada “diplomacia coercitiva”, sabedor de la capacidad disuasoria de su arsenal. Por su parte, Nueva Delhi ha optado por el concepto “Cold Stars”, tendente a realizar operaciones conjuntas de gran movilidad y rapidez con que responder a los ataques irregulares o terroristas en su territorio, antes de que la diplomacia internacional logre una rebaja de la tensión. La posibilidad de un ataque en el interior de Pakistán supone un peligroso escenario en el contexto de violencia actual. El régimen paquistaní continúa apoyando o tolerando a los grupos insurgentes que actúan en Cachemira y cada vez más en otras regiones de India. La yihad afgana y la lucha irregular en Cachemira han creado varias generaciones de muyahidines financiados e instrumentalizados por el ISI para su lucha irregular, que han acabado enfrentándose al Gobierno en una brutal campaña terrorista y en un enfrentamiento armado en la Provincia de la Frontera del Noroeste y en las áreas tribales con un despliegue masivo del Ejército. Existe un riesgo difícil de cuantificar de robo de materiales nucleares.

El TNP puede llevar a un horizonte ‘desnuclearizado’

Quizá, siempre y cuando exista voluntad política. Algunos autores hablan de una “segunda era atómica”,cuyo paradigma sería que las nuevas potencias contemplan las armas nucleares como parte esencial en la creación del Estado y cimentan su seguridad al margen de los grandes. Los miembros del Tratado tienen una serie de retos que superar: los ensayos nucleares de Corea de Norte, el caso iraní y las sombrías perspectivas en el gran Oriente Medio. Sin embargo, por primera vez en su historia, EE UU se ha mostrado proclive a avanzar hacia el desarme nuclear total. El discurso pronunciado por el presidente Obama en Berlín es un hito en este camino: “Éste es el momento en que debemos renovar el objetivo de un mundo sin armas nucleares. (…) Es hora de asegurar todo el material nuclear disperso, para detener la propagación de armas nucleares y para reducir los arsenales de otra era. Éste es el momento de comenzar el trabajo para la búsqueda de la paz en un mundo sin armas nucleares”. Esas intenciones se han traducido en medidas concretas, como el abandono del sistema antimisiles en Polonia, la negociación de un nuevo tratado START o la intención de remitir al Congreso estadounidense el Tratado para la Prohibición Completa de Ensayos Nucleares. Es una buena base, pero el esfuerzo debe provenir, además de EE UU, de Rusia, China, Francia y Reino Unido.

El desarme nuclear ha sido una causa célebre desde hace décadas, aunque todas las iniciativas han fracasado. En la conferencia de revisión del TNP de 2000 se acordaron 13 medidas prácticas para el desarme: reducción unilateral de los arsenales tácticos y estratégicos, eliminación del grado de alerta de las armas nucleares y reducción de su papel en la política de seguridad. El futuro podría ser reforzar el OIEA, promover un sistema internacional de control del ciclo del combustible nuclear y la ratificación por todas las potencias nucleares del Tratado para la Prohibición Completa de Ensayos Nucleares. Pero el auténtico problema es, sin embargo, tan antiguo como la misma bomba nuclear: cómo impedir que la energía nuclear que se utiliza para generar electricidad no sea desviada para construir una bomba.

¿Sería más seguro un mundo sin la bomba?

¡Qué pregunta! Un país puede recuperarse de una guerra convencional; de la guerra nuclear moderna, no. El efecto disuasorio de las armas nucleares durante la guerra fría fue innegable, y la carrera de armamentos entre las superpotencias degeneró en la creación de unos arsenales descomunales. EE UU llegó a disponer de 25.000 objetivos designados en el plan de guerra nuclear SIOP de 1976. Desde 1945 hasta 2002, las potencias construyeron más de 128.000 artefactos de todas clases (desde pequeños mecanismos de varios kilotones hasta una enorme bomba soviética de 50 megatones). Se llegó al overkill, a la destrucción mutua asegurada. Sólo un ejemplo pone los pelos de punta e ilustra hasta qué punto el mundo estuvo cerca de una catástrofe: en caso de detectar misiles enemigos mediante el sistema de alerta temprana, el presidente estadounidense debía tomar la decisión de lanzar las fuerzas estratégicas en menos de 30 minutos. Toda la seguridad del planeta reposaba en la disuasión entre los grandes. En su acepción más común, este concepto consiste en la prevención de una acción por temor a sus consecuencias, un estado de ánimo provocado por la existencia de una amenaza creíble cuya neutralización supone un coste inaceptable. Sin embargo, el general Lee Butler, jefe del comando estratégico estadounidense entre 1992 y 1994, lo definió de una manera más crítica: “[La disuasión] se basa en una letanía de injustificados supuestos, afirmaciones indemostrables y contradicciones lógicas”. Desde hace años, existe un debate sobre la vigencia de este término en el nuevo contexto de seguridad internacional. Si las relaciones eran peligrosas cuando había dos actores (EE UU y la URSS), la llegada de nuevos jugadores ha incrementado la complejidad para alcanzar el equilibrio y la estabilidad. La disuasión nuclear es ahora mucho más enmarañada.

En el libro La difusión de las armas nucleares, los expertos Kenneth Waltz y Scott Sagan expresan opiniones contrapuestas sobre la seguridad que puede ofrecer la bomba atómica. El neorrealista Waltz argumenta que los Estados provistos de este tipo de armamento son más cuidadosos y propensos a la defensa y a la disuasión, convirtiendo la guerra en una opción menos probable. Por el contrario, Sagan asegura que las organizaciones militares, si no están dirigidas por un poder civil fuerte, muestran comportamientos de tipo organizativo que pueden dar lugar a fallos irreversibles. Es posible desencadenar un conflicto deliberado o accidental por culpa de prejuicios, rutinas inflexibles o motivos particulares. Según esta tesis, podría ser probable que los futuros Estados nucleares estuvieran dominados por los intereses militares, no objetivos, dada la carencia de mecanismos civiles de control.

¿Algo más?

Sobre desarme nuclear total, la serie de seis libros publicados por el Stimson Centre examina los obstáculos y las perspectivas en el camino hacia el desarme. http://stimson.org/URZ/programhome.cfm. El documento Debate sobre la abolición de las armas nucleares, del Carnegie Endowment de Washington, reúne a un extraordinario grupo de expertos internacionales (Abolishing Nuclear Weapons a debate, CEIP, 2009). http://www.carnegieendowment.org/files/abolishing_nuclear_weapons_debate.pdf.

Las obras de Scott Sagan siempre resultan apasionantes: Nuclear Power without Nuclear Proliferation? (Daedalus, 2009), Shared Responsibilities for Nuclear Disarmament (Daedalus 2009) y The Spread Nuclear Weapons Debate Renewed (W.W. Norton & Co, 2002).

Para consultar iniciativas y organizaciones que promueven el desarme nuclear: pugwash.org, www.globalzero.org, www.icanw.org, www.abolition2000.org, www.wmdcommission.org, wmdreport.org/, www.hoover.org/publications/digest/6731276.html, luxembourgforum.org/eng, www.icnnd.org.

Sobre el programa nuclear israelí es esencial la obra de Avner Cohen: ‘The bomb that never is’ (The Bulletin of American Scientist, 2009) e Israel and the Bomb(Columbia University Press, 1998). Sobre Irán, la web del Instituto para la Ciencia y la Seguridad Internacional ISIS: isis-online.org/countries/category/iran, www.isisnucleariran.org

Comentarios:
OVERKILL, O DE UNA INDESEABLE DEMOCRACIA NUCLEAR
Enviado por Periodiquero Javier Quiñones (no verificado) el Mar, 01/12/2009 - 15:50.

No cabe alegar que si algunos países poseen atómicas, los demás tienen igual derecho. La democracia nuclear es un callejón sin salida hacia el infierno. La única opción racional y vital radica en la eliminación de todas las bombas nucleares. Y esto sólo se conseguirá si TODAS las naciones del orbe admiten una supervisión exhaustiva en este rubro.