Abaixo uma correção que fiz em 2005 a um desses editoriais mal escritos e mal informados...
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, em viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas.
O que é este blog?
Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.
sábado, 30 de junho de 2012
O Tratado de Nao-Proliferacao Nuclear: corrigindo um editorial de jornal (2005)
Abaixo uma correção que fiz em 2005 a um desses editoriais mal escritos e mal informados...
segunda-feira, 7 de novembro de 2011
O TNP e a posição do Brasil: Paulo Roberto de Almeida
domingo, 9 de maio de 2010
Conferencia de revisao do TNP - Editorial do NYT
Editorial New York Times, May 9, 2010
The world has a chance this month to send a powerful message about its determination to curb the spread of nuclear weapons. To do that, 189 nations, whose diplomats have gathered in New York, must strengthen the Nuclear Nonproliferation Treaty.
At a frightening time — when Iran and North Korea are defying the Security Council and pressing ahead with their nuclear programs, and terrorists are actively trying to buy or steal their own weapon — there has to be a law to make clear that proliferation will not be tolerated. The treaty is that law. But it is badly fraying.
Iran, which is a “non-weapons” state, managed for years to hide its nuclear activities. North Korea secretly diverted fuel and built weapons, then suddenly withdrew from the treaty and tested a weapon.
Ideally, the treaty would be strengthened with legally binding amendments. But that requires a consensus, and even then could take years of votes. A strong political document from the conference could make the world safer. That should include:
¶An insistence that all treaty members accept tougher nuclear monitoring, giving the International Atomic Energy Agency greatly expanded access to suspected nuclear sites and related data.
¶An agreement to penalize any state that violates its treaty commitments and then withdraws from the pact, as North Korea did.
¶A requirement that states that do not already make their own nuclear fuel stay out of the fuel business — it is too easy to divert to make a nuclear weapon. States with fuel programs must commit to guarantee supplies for peaceful energy programs.
¶A strong call for the United States and Russia to quickly begin negotiations on deeper weapons reductions, and a commitment to quickly draw other nuclear powers into arms reduction talks.
¶A firm agreement that there will be no more India-like exemptions from nuclear trade rules, and that any state that tests a weapon would be denied nuclear trade.
Four decades ago, a bargain was struck. Countries without nuclear weapons signed the treaty and forswore them in return for access to peaceful nuclear energy. The five weapons states — the United States, Britain, France, Russia, China — promised to eventually disarm and provide nuclear energy technology to non-weapons states.
The bargain was always tenuous, and countries that gave up nuclear arms have some right to feel aggrieved. For too long the United States and Russia did little to shrink their huge arsenals. China’s arsenal is still expanding. Washington’s agreement to sell nuclear energy technology to India (which like Pakistan boycotted the nonproliferation treaty so it could develop weapons) enshrined unequal treatment.
President Obama has shown that he is willing to lead by example. He has downgraded the importance of nuclear arms, pledged to build no new weapons, and signed a new arms reduction treaty with Moscow. All five weapons states issued a useful joint statement pledging not to test a weapon and promising to cooperate with countries seeking peaceful nuclear energy programs.
A successful conference — with robust commitments — would give real momentum as the Security Council tries to negotiate a fourth round of sanctions for Iran. That is why Iran is working so hard to dilute or block a strong consensus document.
Egypt, which leads the Nonaligned Movement, is also playing games by pressing for a nuclear-weapons-free zone in the Middle East that seeks to force Israel to give up its nuclear arsenal. That is not going to happen any time soon. All states need to ante up and reverse the treaty’s slide. The world’s security depends on it.
quarta-feira, 21 de abril de 2010
2050) Politica externa brasileira: dando destaque a um comentário
terça-feira, 20 de abril de 2010
2047) Finacial Times criticizes Brazilian Foreign Policy
Brazil's cuddly ways are barrier to seat at the top table
By John Paul Rathbone
Financial Times, 20/04/2010
recebi um comentário de um leitor bem informado, cuja utilidade -- várias citações remetendo a outros materiais de relevo, por exemplo, ademais de comentários sempre bem ponderados -- merece destaque maior do que uma simples nota de rodapé, que costuma ficar escondida, ilhada, incógnita nas dobras de outro post.
Por isso cabe aqui transcrevê-la, in totum:
Paulo Araújo disse...
Bom artigo. Concordo bastante.
Que Lula é um narcisista, não discuto. Mas chama-lo de ingênuo ou bufão é um equívoco do analista.
A atual condução da política externa não tem nada de ingênua. Tem método, embora às vezes errático na condução, como no caso de Honduras e de Cuba. Se vão ou não atingir os seus alvos estratégicos, são outros quinhentos. Se perdem a eleição agora em 2010, então ciclo fecha e a análise do período poderá ser feita com base nos resultados. Se ganharem, acho que vão continuar insistindo com a novidade do Lula atuando mais à vontade na linha de frente internacional.
Na visita ao Irã, Lula terá que convencer os aitolás que o governo brasileiro tem, em relação ao programa nuclear, os mesmos interesses estratégicos que o Irã.
Para tornar-se respeitável aos aitolás, precisará convencê-los sobre a vitória de Dilma estar no papo. Essa é a única garantia de que não haveria mudança na política externa com as eleições. Estando em fim de mandato, não vejo o que mais Lula poderia oferecer como garantia, a não ser a continuidade do seu grupo no controle do poder de Estado.
Vai dar certo o “olho no olho”? O narcisismo de Lula, alimentado diuturnamente pelo puxa-saquismo dos áulicos, o leva a crer que suas chances no Irã são tão grandes quanto o ego dele.
Eu prefiro aguardar os fatos, observar com quem ele conversará além do Ahmadinejad, ouvir o que Lula e os donos da casa dirão e, principalmente, como agirão desde agora até a VIII Conferência do TNP em maio
A Conferencia Nuclear de Teerã, tida como preparatória para a VIII Conferência do TNP na ONU, aconteceu neste último fim de semana. No domingo, foi lida uma declaração tão irrealista quanto a de Lula (pediu o desarme nuclear imediato dos EUA) na Cúpula de Washington: “Um Oriente Médio livre de armas nucleares requer que o regime sionista se una ao TNP”. A declaração foi lida pelo ministro iraniano de relações exteriores Manouchehr Mottaki (18/04/2010)
http://www.almanar.com.lb/newssite/NewsDetails.aspx?id=134189&language=es
Na abertura da Conferência, Ahmadinejad pronunciou-se favorável à criação de “um grupo internacional independente que planeje e supervisione o desarme nuclear e impeça a proliferação”. Ahmadinejad defendeu que os EUA não fossem admitidos nesse “grupo internacional independente”.
http://www.almanar.com.lb/newssite/NewsDetails.aspx?id=133861&language=es
No mesmo domingo de encerramento da Conferência que exigiu a adesão de Israel ao TNP, o governo iraniano comemorou o “dia do exército” e expôs no desfile militar os mísseis capazes de transportar ogivas nucleares.
Durante o desfile, Ahmadinejad pronunciou um discurso no qual, mais uma vez, comparou Israel a um “micróbio corrupto”. Se ainda restava dúvida sobre o objetivo estratégico de varrer Israel do mapa, a metáfora do micróbio corrupto é prova mais que suficiente dessa intenção. Apesar de não ter dito textualmente, o que mais se deve fazer com o micróbio corrupto que ameaça a saúde das nações da região, a não ser exterminá-lo?
“O regime sionista está em vias de colapso", disse Ahmadinejad. "Este regime é o principal instigador da rebelião e conflito na região [...]. A principal razão para a insegurança na região nesses últimos 60 anos é esse micróbio corrupto. Seus aliados e criadores [refere-se à criação de Israel pela ONU em 1948] devem parar de apoiá-lo [Israel] e permitir que as nações da região e os palestinos resolvam as coisas com eles”.
Só não disse exatamente o que farão com o “micróbio corrupto”.
http://www.almanar.com.lb/newssite/NewsDetails.aspx?id=133891&language=en
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De minha parte concordo com o comentarista Paulo Araujo: não há nada de ingênuo ou desinformado nas posturas assumidas pelos responsáveis pela política externa. Eles estão aplicando exatamente aquilo que acreditam e pelo que lutam. Pode ser que a realidade seja um pouco mais teimosa em se dobrar às suas crenças e intenções, mas que eles tentam, isso tentam...
Paulo Roberto de Almeida
(Xian, 21.04.2010)
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Addendum em 22.04.2010:
Dando destaque ao destaque, e agregando comentário:
O que segue abaixo, já figura em anexo, como comentário a este post que já dava destaque a um comentário anterior, em outro post, do mesmo interlocutor, que volta a escrever o que segue:
Paulo Araujo escreveu o que segue:
Não li na imprensa brasileira uma linha que fosse sobre o a Conferência em Teerã e as declarações de Ahmadinejad sobre Israel. Em minha opinião, as editorias de internacional teriam que estar ligadíssimas nesse assunto. Sobretudo porque o chefe de Estado brasileiro tem visita oficial agendada para aquele país.
Essas declarações pedindo a destruição de Israel dão uma boa medida da encrenca na qual o nosso governo irresponsavelmente quer nos enfiar. Acho grave que a imprensa silencie sobre isso.
Pelo que pude depreender após a leitura das reportagens da agência Al Manar, a posição oficial do governo brasileiro sobre o desarmamento nuclear está afinadíssima com a do Irã. Apesar de embaladas com as “nobres mentiras” da paz mundial, elas não são ingênuas. Não descarto a unificação dos governos brasileiro e iraniano no confronto que certamente patrocinarão também na VIII Conferência (contra os países que “não têm autoridade moral”).
Isso é bom para o Brasil? Eu diria que é péssimo.
Por que o fiz ?(PRA):
Poderia dizer: porque assim o quis, mas digamos que é para arrancar do anonimato de uma nota de rodapé escondida -- ja que os comentários só abrem a pedido do leitor -- que traz mais substância a um tema relevante.
A imprensa brasileira, além de ter poucos correspondentes no exterior (cinco ou seis, na média, cobrindo, mal, regiões inteiras), se preocupa pouco com questões internacionais, o que é "normal" dentro de nosso universo caipira e introvertido. Mas essa conferência de Teeran deveria ter sido seguida com atenção, pois vai "preparar" a posição de alguns países que nitidamente vão querer "perturbar" a conferência de revisão do TNP, em maio.
O Brasil estará entre os "perturbadores"? Talvez não, mas certamente vai exigir, mais uma vez, cumprimento dos compromissos de desnuclearização dos nuclearmente armadas, desta de forma mais vocal, digamos assim. Vai se aliar ao Irã? Duvidoso que o faça, mas digamos que haverá pontos concordantes, ainda que o Irã prefira não comparecer.
Mais uma demonstração de soberania, independência, posições próprias, sempre em defesa de causas altamente relevantes para o interesse nacional...
domingo, 18 de abril de 2010
2036) Reversao da adesao ao TNP?: uma revisao dos argumentos contrarios ao tratado
Paulo Araújo deixou um novo comentário sobre a sua postagem "2035) Advocacia diplomatica: pagando, fazemos qual...":
Caro
Relembrando, a ratificação do TNP aprovada no Senado em 1998 teve os votos favoráveis do PT. Em reunião da ESG em 2002, Lula afirmou a inflexão ao fazer publicamente seu primeiro ataque ao TNP. Hoje, a inflexão de 2002 firmou-se como doutrina de governo. E isso é grave.
Rememorando o que disseram alguns militares da reserva, todos vinculados ao golpe de 64 e à ditadura e contrários ao TNP, sobre a ratificação do TNP pelos “vira-latas” de 1998. Antes, algumas declarações mais recentes.
“Nós temos de ter no Brasil a possibilidade futura de, se o Estado assim entender, desenvolver um artefato nuclear. Não podemos ficar alheios à realidade do mundo.” (general de Exército José Benedito de Barros Moreira. ESP, 16/11/2007)
http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/geral/general-defende-que-brasil-tenha-bomba-atomica/
Em um artigo de 2004, o Vice-Almirante da Reserva Othon L.P. da Silva expressou com todas as letras a crítica que é comum no núcleo Stangelove (personagem de um filme de Kubrick):
“No governo Fernando Henrique, contrariando décadas de coerência em política externa, o Brasil aceitou ratificar o TNP - Tratado de Não Proliferação nuclear.”
http://ecen.com/eee44/eee44p/inpecoes_nucleares_othon.htm
Compare-se a crítica acima com o que os contrariados disseram em 1998, em reportagem da FSP de 10/06/1998:
Os militares da ativa não falam por saber que estariam confrontando a política oficial do governo. Os da reserva falam e não têm dúvida: o Brasil comete um erro ao ratificar o TNP (Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares). [...]
"A ratificação desse acordo é o golpe de misericórdia na possibilidade de o Brasil liderar uma proposta que trate de forma igual todos os arsenais nucleares", disse o brigadeiro Ivan Frota.
"Dá para ver que a assinatura do TNP é uma papagaiada. E o mais grave é que o tratado quebra a tradição de um país jamais aceitar em acordos internacionais cláusulas discriminatórias", Bernardino Pontes, ex-comandante da Marinha
htt.p://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft10069802.htm
Em 2002, Lula anuncia a inflexão ao atacar o TNP. O que declarou em 2002 constitui hoje uma doutrina governamental. Isto é, o atual governo é hoje sem dúvida nenhuma um aliado estratégico dos antigos bombistas. É preciso levar a sério a recusa do governo do brasileiro em assinar o Protocolo do TNP. As metáforas de 2002 reativadas por Lula em 2010 expressam indiscutivelmente posição favorável do atual governo à pesquisa nuclear para fins bélicos.
Em 13/09/2002, o candidato Lula criticou a ratificação do TNP. Há quem diga que foi só bravataria, retórica eleitoral oportunista. É? Quantos mil milhares (10.000.000 ?) de votos renderia agradar essa distinta plateia? Sendo bonzinho, talvez uns 20.0000 ou, exagerando, uns 100.0000 votos, se tanto.
Cito abaixo reportagem da FSP, de 14/09/2002. Nessas declarações de Lula, a origem das retóricas do estilingue e da “falta de moral”, reativadas agora por Lula et caterva. Em reunião organizada pela ESG com 160 militares da ativa, ex-ministros e militares da reserva:
"Só teria sentido esse tratado se todos os países que já detêm [armas nucleares" abrissem mão das suas. Ora, por que um cidadão pede para eu me desarmar, para ficar com um estilingue, enquanto ele fica com um canhão para cima de mim? Qual a vantagem que levo? O Brasil só vai ser respeitado no mundo quando for forte econômica, tecnológica e militarmente" [...] Por que só os países em desenvolvimento têm de ficar com um estilingue?". [Lula]
"Disse exatamente o que eu esperava. Foi claro nas propostas." [Leônidas P. Gonçalves].
Seis ex-ministros do regime militar participaram do encontro: Aureliano Chaves (Minas e Energia e vice-presidente de 1979 a 1985), Alfredo Karam (Marinha), Carlos Tinoco (Exército), Leônidas Pires Gonçalves (Exército), Ivan Mendes (Serviço Nacional de Informações) e Gibson Barbosa (Relações Exteriores).
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc1409200212.htm
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Postado por paulo araújo no blog Diplomatizzando... em Domingo, Abril 18, 2010 5:31:00 PM
Dixit...
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Paulo Roberto de Almeida
(Lanzhou, 19.04.2010)
segunda-feira, 12 de abril de 2010
2082) Protocolo adicional ao TNP: duas visoes contrastantes
Folha de São Paulo (10.04.2010):
Instrumento desnecessário e humilhante
Samuel Pinheiro Guimarães
"As ultracentrífugas de tecnologia brasileira são as mais eficientes do mundo e há grande interesse em ter acesso a suas características, uma das consequências da assinatura do Protocolo Adicional, que, no caso do Brasil, seria um instrumento desnecessário, intrusivo, prejudicial e humilhante"
Samuel Pinheiro Guimarães é ministro de Assuntos Estratégicos. Artigo publicado na "Folha de SP":
O centro da questão é o Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP), cujo objetivo é evitar uma guerra nuclear. A possibilidade de tal conflito não está nos países que não detêm armas nucleares, mas, sim, naqueles que as detêm. Portanto, o principal objetivo do TNP deve ser a eliminação das armas dos países nuclearmente armados: Estados Unidos, Rússia, China, França e Inglaterra.
Há 42 anos esses países se comprometeram a eliminar suas armas, e há 42 anos não cumprem esse compromisso. Ao contrário, aumentaram a eficiência de suas armas nucleares.
Apesar de não terem se desarmado, esses países insistem em forçar os países não nucleares a aceitar obrigações crescentes, criando crescentes restrições à difusão de tecnologia, inclusive para fins pacíficos, a pretexto de evitar a proliferação.
Os países nucleares, ao continuarem a desenvolver suas armas e, portanto, a intimidar os países não nucleares, estimulam a proliferação, pois os países que se sentem mais ameaçados procuram se capacitar. Isso ocorreu com a então União Soviética (1949), com a França (1960) e com a China (1964).
Hoje, diante da inexistência de ameaça de conflito nuclear, o argumento dos países nucleares é a possibilidade de terroristas adquirirem a tecnologia ou as armas.
Essa tecnologia está disponível. A questão é a capacidade de desenvolver industrialmente as armas e os vetores para atingir os alvos.
Nenhum grupo terrorista detém os vetores (mísseis e aviões), nem a estrutura industrial para produzir o urânio enriquecido, nem a técnica para fabricar detonadores. Por outro lado, os terroristas poderiam obter essas armas justamente onde existem, nos países nucleares.
Nesse contexto se insere o Protocolo Adicional. O TNP prevê que todos os países-membros assinem acordos de salvaguardas com a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), pelos quais os Estados não nucleares submetem a inspeção todas as suas instalações nucleares. O objetivo do acordo é verificar se há, para fins militares, desvio de material nuclear da instalação (reatores, usinas de enriquecimento etc.).
O Brasil tem atividades nucleares exclusivamente para fins pacíficos, como determina a Constituição, e tem um acordo de salvaguardas com a AIEA, que permite à agência inspecionar instalações brasileiras. Tudo com respeito à soberania nacional e a nossos interesses econômicos.
A AIEA, por proposta americana e a pretexto do programa do Iraque, elaborou um modelo de protocolo adicional aos acordos de salvaguardas, permitindo a visita de inspetores, sem aviso prévio, a qualquer local do território dos países não nucleares para verificar suspeitas sobre qualquer atividade nuclear, desde pesquisa acadêmica e usinas nucleares até a produção de equipamentos, como ultracentrífugas e reatores.
O Protocolo Adicional constituiria uma violação inaceitável da soberania diante da natureza pacífica das atividades nucleares no Brasil, uma suspeita injustificada sobre nossos compromissos constitucionais e internacionais e uma intromissão em atividades brasileiras na área nuclear.
Essa intromissão causaria graves danos econômicos, quando se consideram as perspectivas brasileiras na produção de combustível nuclear, que terá forte demanda com a necessidade de enfrentar a crise ambiental.
A solução ambiental exige a reforma da matriz energética, tanto nos emissores tradicionais, como os EUA, quanto nos de rápido desenvolvimento, como a China e a Índia.
Uma das mais importantes fontes de energia não geradora de gases de efeito estufa é a nuclear. O Brasil tem grandes reservas de urânio, tem o conhecimento do ciclo de enriquecimento do urânio e a capacidade para produzir reatores, ultracentrífugas, pastilhas etc. e, assim, pode vir a atender uma crescente demanda externa.
A preservação do conhecimento tecnológico é, assim, aspecto essencial na área nuclear. Ora, as ultracentrífugas de tecnologia brasileira são as mais eficientes do mundo. Há grande interesse de certos países em ter acesso a suas características, uma das consequências da assinatura do Protocolo Adicional, que, no caso do Brasil, seria um instrumento desnecessário, intrusivo, prejudicial e humilhante.
(Folha de SP, 10/4)
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Adesão não contraria interesse nacional
Rubens Ricupero
"O Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP) é desigual e injusto, mas superior às alternativas existentes"
Rubens Ricupero é diretor da Faculdade de Economia da Faap e do Instituto Fernand Braudel de São Paulo. Foi secretário-geral da Unctad (Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento) e ministro da Fazenda (governo Itamar Franco). Artigo publicado na "Folha de SP":
Da mesma forma que a democracia, segundo Churchill, é a pior forma de governo, exceto todas as demais, o Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP) é desigual e injusto, mas superior às alternativas existentes. Durante os 40 anos de sua vigência, renunciaram à arma atômica 11 países que já a possuíam ou desejavam adquiri-la (entre eles Brasil, Argentina e África do Sul).
Dos 4 que se tornaram nucleares, 3 (Índia, Paquistão e Israel) jamais assinaram o TNP, e a Coreia do Norte teve que deixá-lo antes de construir a bomba. O controle das armas de destruição de massa não é impossível, pois desde Hiroshima e Nagasaki o mundo viveu 65 anos sem que a tragédia se repetisse.
Brasil e Argentina tomaram juntos a decisão de abandonar seus programas nucleares rivais, desarmando perigosa corrida armamentista na América Latina e abrindo caminho à integração do Mercosul.
O processo culminou, em 1991, com a assinatura do acordo entre o Brasil, a Argentina, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) e a Agência Argentino-Brasileira de Controle, pelo qual os dois países aceitaram as inspeções da agência da ONU.
A adesão ao TNP constituiu a consequência natural, pois a proibição da arma nuclear já constava da Constituição de 1988 e o acordo de 1991 havia criado para o país todas as obrigações que decorreriam do tratado.
Quando a adesão se deu, em 1997-1998, os únicos que não haviam assinado eram Índia, Paquistão e Israel, que tinham para isso uma razão: queriam adquirir a bomba (o quarto era Cuba, que aderiu logo depois). Que sentido teria tido para o Brasil ficar de fora, em companhia dos três belicistas, se já havíamos assumido na prática as obrigações do TNP?
O mesmo argumento se aplica ao Protocolo Adicional, que não é mais que a aceitação de fiscalização reforçada. O Brasil é dos raros países que permitem à agência acesso até a suas instalações militares. O que teríamos a temer se nada temos a esconder?
Alega-se que deveríamos proteger a originalidade de nossa tecnologia. O objetivo é legítimo, mas, segundo especialistas, pode ser perfeitamente assegurado pela negociação com a agência de modalidades que preservem os segredos tecnológicos.
Até agora, a recusa era justificada pelo desinteresse do governo americano de cumprir a obrigação de desarmamento constante do TNP.
A situação mudou totalmente com o advento do governo Obama, o acordo com a Rússia para redução de ogivas nucleares e a nova estratégia dos EUA, que restringe o papel das armas nucleares. Ainda se está longe do desarmamento, mas é mudança construtiva que deve ser encorajada.
Neste momento, a persistência da recusa será vista como obstrução à evolução positiva em curso. A infeliz coincidência com a visita do presidente Lula a Teerã avivará suspeitas sobre nossas intenções.
Cedo ou tarde, o processo de reforço do TNP conduzirá à proibição da exportação ou importação de urânio enriquecido e restrições de acesso tecnológico para os que rejeitam o protocolo. É risco gratuito quando nossa tecnologia pode ser preservada por negociação cautelosa.
Se o real motivo for armamentista, equivale a golpe gravíssimo contra a Constituição. O argumento da soberania não procede, pois a adesão não contraria o interesse nacional.
Que interesse haveria em adquirir a bomba para país que não está sob ameaça ou em zona de conflito, tendo completado 140 anos de paz ininterrupta com seus dez vizinhos?
Na hora lancinante da catástrofe do Rio de Janeiro, só o delírio de grandeza e a perda de contato com a realidade explicam desviar recursos escassos para prioridades erradas e desnecessárias como os desvarios atômicos. A realidade que chega pela tela da TV nos revela aonde estão nossos inimigos: não no exterior, mas aqui dentro.
A corrupção e a incompetência diante da urbanização selvagem, a patética incapacidade de salvar vidas, a falta de dinheiro para dar casa decente aos trabalhadores -são essas as ameaças a enfrentar. E não será com submarinos nucleares e urânio enriquecido que vamos diminuir um só desses perigos reais e imediatos.
(Folha de SP, 10/4)