O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

Meu Twitter: https://twitter.com/PauloAlmeida53

Facebook: https://www.facebook.com/paulobooks

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

E agora as tiranias capitalistas? Mario Vargas Llosa e o futuro de Cuba

Grato ao meu amigo Orlando Tambosi, que está sempre selecionando o que de melhor aparece na imprensa responsável -- e às vezes na irresponsável também -- e em cujo blog vou pescar o que me parece digno de refexão.
O que me interessa nesta crônica de Vargas Llosa não é tanto o futuro de Cuba -- cujo itinerário está muito bem discutido, nas suas alternativas, no artigo abaixo -- e sim o que está na primeira parte de meu título, também refletido na crônica de Vargas Llosa, ou seja, a convivência do capitalismo com regimes tirânicos.

Os anticapitalistas aproveitarão essa modalidade para fazer uma crítica ao capitalismo, onde eu vejo uma homenagem e um triunfo da economia de livres mercados. Ou seja, mesmo as tiranias, cuja lógica é sempre a da concentração monopólica de poder, inclusive econômico, são obrigadas a reconhecer que o seu método, eventualmente funcional na política (até certo tempo), não funciona na economia, pois que regimes fechados e não competitivos são incapazes de criar prosperidade ou sequer de fornecer o básico à população. As tiranias adotam então o método do capitalismo tutelado, de uma economia controlada de modo flexível pelos tiranos do poder político.
Não me interessa discutir aqui os casos da China ou do Vietnã, autocracias de capitalismo amestrado e domado, e sim o nosso próprio caso.
O Brasil dos companheiros não é certamente uma economia socialista. Como eu digo sempre, os companheiros são burros mas não são estúpidos. Se eles não tivessem um capitalismo funcional, onde encontrariam ricos capitalistas para extorquir? E o lado capitalismo amestrado se revela plenamente nessas companhias e órgãos estatais, que são transformados em vacas a serem ordenhadas metodicamente de todo o seu leite financeiro, tanto para reforçar o monopólio do poder político, quanto para o enriquecimento pessoal dos ordenhadores, seus chefes de quadrilha, os intermediários, os políticos, enfim, tutti quanti se encontram associados ao empreendimento mafioso.

Estaríamos caminhando no Brasil para esse tipo de configuração? No que depender dos companheiros, não tenho nenhuma dúvida em responder pela alternativa.
Cabe aos brasileiros dignos denunciar o esquema mafioso neobolchevique, e cabe aos que detêm algum poder tentar desmantelar o empreendimento criminoso. Esse é o desafio do momento.
Paulo Roberto de Almeida
Cuba e as miragens da liberdade
Em artigo publicado no El País, o escritor Mário Vargas Llosa analisa o reatamento de relações entre EUA e Cuba, observando que o acordo pode tornar a vida dos cubanos mais respirável, "mas me entristece pensar que isso poderia afastar ainda por alguns anos mais a recuperação de sua liberdade". 


O restabelecimento de relações diplomáticas entre Cuba e os Estados Unidos depois de mais de meio século e a possibilidade do fim do embargo norte-americano foram recebidos com beneplácito na Europa e América Latina. E, no próprio Estados Unidos, as pesquisas dizem que a maioria das pessoas também aprova, ainda que os republicanos sejam contra. O exílio cubano está dividido; enquanto nas velhas gerações prevalece o repúdio, as novas veem nessa medida um apaziguamento do qual poderia derivar uma abertura maior do regime e até sua democratização. Em todo caso, existe um consenso de que, nas palavras do Presidente Obama, “o embargo foi um fracasso".

A leitura otimista desse acordo pressupõe o fim do embargo, conjetura ainda incerta, pois essa decisão depende do Congresso dominado pelos republicanos.

Mas, se ele acabar, sustenta essa tese, o aumento dos intercâmbios turísticos e comerciais, o investimento de capitais norte-americanos na ilha e o consequente desenvolvimento econômico iriam flexibilizando cada vez mais o regime castrista, levando-o a fazer concessões maiores para a liberdade econômica, o que, cedo ou tarde, resultaria em uma abertura econômica e na democracia. Indício desse futuro promissor seria o fato de que, ao mesmo tempo que Raúl Castro anunciava a boa nova, 53 presos políticos cubanos eram postos em liberdade.

Como nas últimas décadas vivemos toda sorte de fenômenos sociais e políticos extraordinários, nada parece já impossível em nosso tempo e, então, tudo aquilo poderia acontecer. Seria o único caso na história de um regime comunista que renuncia ao comunismo e escolhe a democracia graças ao desenvolvimento econômico e a melhoria do nível de vida de sua população devido às aplicações de políticas de mercado. O fabuloso crescimento da China não trouxe a decadência do totalitarismo político, mas, pelo contrário, como acabam de experimentar os estudantes de Hong Kong, o seu fortalecimento. O mesmo poderia ser dito do Vietnã, onde a adoção desse modelo anômalo – o capitalismo comunista – apesar de ter impulsionado uma prosperidade indiscutível não suavizou a dureza do regime de partido único e a perseguição de toda forma de dissidência. O desmoronamento da União Soviética e seus satélites centro-europeus não foi obra do progresso econômico, pelo contrário: foi o fracasso do estatismo e do coletivismo que levou essa sociedade à ruína e ao caos. Cuba poderia ser a exceção à regra, como espera a maioria dos cubanos e entre eles muitos críticos e resistentes ao domínio castrista? É preciso desejá-lo, a partir de agora, mas não acreditar ingenuamente que isso já está escrito nas estrelas e será inevitável e automático.

As ditaduras nunca caem graças à bonança econômica, mas graças à sua inaptidão para satisfazer as mais elementares necessidades da população e a que esta, em um dado momento, se mobiliza contra a asfixia política e a pobreza, não acredita mais nas instituições e perde as ilusões que sustentaram o regime. Ainda que o meio século e pouco de ditadura que Cuba padece tenha visto aparecer em seu interior opositores heroicos, pelo desamparo com o qual enfrentavam a prisão, a tortura ou a morte, a verdade é que, como a eficácia da repressão os impedia, ou porque as reformas da revolução nos campos da educação, da medicina e do trabalho trouxeram melhoras reais na condição de vida dos mais pobres e adormeciam seu desejo de liberdade, o regime castrista não teve uma oposição maciça nesse meio século; somente uma míngua discreta do apoio quase generalizado com que contou no começo e que, com o empobrecimento progressivo e o fechamento político, transformou-se na resignação e no sonho da fuga para as costas da Flórida. Não é de estranhar que, para aqueles que perderam as esperanças, a abertura de relações diplomáticas e comerciais com os Estados Unidos, e a perspectiva de milhões de turistas dispostos a gastar seus dólares e de empresários e comerciantes decididos a investir e criar empregos por toda a ilha, tenha sido exultante, a ilusão de um novo despertar.

Raúl Castro, mais pragmático que seu irmão, parece ter compreendido que Cuba não pode continuar vivendo das dádivas petrolíferas da Venezuela, muito ameaçadas desde a queda brutal dos preços do ouro negro e da bagunça na qual o governo de Maduro está metido. E que a única sobrevivência possível de seu regime em longo prazo é uma certa distensão e uma acomodação com os Estados Unidos. Isso está em marcha. O desígnio do governo cubano é, sem dúvida, seguindo o modelo chinês ou vietnamita, abrir a economia, um setor dela pelo menos, ao mercado e à empresa privada, de modo que os níveis de vida aumentem, empregos sejam criados, o turismo se desenvolva, ao mesmo tempo que no campo político sejam mantidos o monolitismo e a mão de ferro para quem alimente aspirações democráticas. Pode funcionar? Em curto prazo, sem dúvida nenhuma, e desde que o embargo acabe.

Em médio ou longo prazo não é muito certo. A abertura econômica e os intercâmbios crescentes vão contaminar a ilha com informação e modelos culturais e institucionais das sociedades abertas que contrastam de maneira tão espetacular com os que o comunismo impõe à ilha, o que, cedo ou tarde, animará a oposição interna. E, diferentemente da China e do Vietnã, que estão muito distantes, Cuba está no coração do Ocidente e rodeada de países que, uns mais e outros menos, participam da cultura da liberdade. É inevitável que ela termine por se infiltrar sobretudo nas camadas mais ilustradas da sociedade. Cuba estará em condições de resistir a essa pressão democrática e libertária, como fazem a China e o Vietnã?

Minha esperança é que não, que o castrismo tenha perdido toda a força ideológica que teve no começo e que em todos esses anos se tenha transformado em mera retórica, uma propaganda na qual seja improvável que até mesmo os dirigentes da Revolução acreditem. O desaparecimento dos irmãos Castro e dos veteranos da Revolução, que agora ainda exercem o controle do país, e a tomada dos postos de comando pelas novas gerações, menos ideológicas e mais pragmáticas, poderia facilitar aquela transição pacífica que esperam aqueles que comemoram com tanto entusiasmo o fim do embargo.

Existem razões para compartilhar esse entusiasmo? Talvez em longo prazo. Em curto, não. Porque agora quem tira mais proveito do novo estado de coisas é o governo cubano: os Estados Unidos reconhecem que se equivocaram tentando dobrar Cuba mediante uma quarentena econômica (“o bloqueio criminoso”) e agora vão contribuir com seus turistas, seus dólares e suas empresas para levantar a economia da ilha, para reduzir a pobreza, para criar emprego, em outras palavras, para escorar o regime castrista. Se Obama visitar Cuba será recebido com todas as honras, tanto pelos opositores como pelo governo.

Não é nada para se alegrar do ponto de vista da democracia e da liberdade. Mas a verdade é que esta não era, não é, uma opção realista neste preciso momento da história de Cuba. A escolha era entre Cuba continuar empobrecendo e os cubanos continuarem submergidos no obscurantismo, no isolamento informativo, na incerteza, ou que, graças a esse acordo com os Estados Unidos, e sempre desde que o embargo acabe, seu futuro imediato se alivie, gozem de melhores oportunidades econômicas, sejam abertas maiores vias de comunicação com o restante do mundo, e – se se portam bem e não incorrem por exemplo nas extravagâncias dos estudantes de Hong Kong – possam até gozar de uma certa abertura política. Ainda que a contragosto, eu também escolheria essa segunda opção.

Época confusa a nossa, na qual ocorrem certas coisas que nos fazem sentir saudade daqueles anos tensos da guerra fria, onde pelo menos a escolha era muito clara, pois se tratava de optar “entre a liberdade e o medo” (para citar o livro de Germán Arciniegas). Agora a escolha é muito mais arriscada porque é preciso optar entre o menos mau e o menos bom, cujas fronteiras não são nem um pouco claras, mas escorregadiças e volúveis. Resumindo: alegra-me que o acordo entre Obama e Raúl Castro possa tornar a vida dos cubanos mais respirável e esperançosa, mas me entristece pensar que isso poderia afastar ainda por alguns anos mais a recuperação de sua liberdade. 

Lima, dezembro de 2014

Carta aberta ao mundo muculmano - Abdennour Biddar

Este "filosofo" islâmico diz o óbvio: existe um conflito de civilização DENTRO do mundo islâmico.
Paulo Roberto de Almeida

Lettre ouverte au monde musulman

Abdennour Biddar
HuffPost Québec, 15/10/2014
Cher monde musulman, je suis un de tes fils éloignés qui te regarde du dehors et de loin - de ce pays de France où tant de tes enfants vivent aujourd'hui. Je te regarde avec mes yeux sévères de philosophe nourri depuis son enfance par le taçawwuf (soufisme) et par la pensée occidentale. Je te regarde donc à partir de ma position de barzakh, d'isthme entre les deux mers de l'Orient et de l'Occident!
Et qu'est-ce que je vois ? Qu'est-ce que je vois mieux que d'autres sans doute parce que justement je te regarde de loin, avec le recul de la distance ? Je te vois toi, dans un état de misère et de souffrance qui me rend infiniment triste, mais qui rend encore plus sévère mon jugement de philosophe ! Car je te vois en train d'enfanter un monstre qui prétend se nommer État islamique et auquel certains préfèrent donner un nom de démon : DAESH. Mais le pire est que je te vois te perdre - perdre ton temps et ton honneur - dans le refus de reconnaître que ce monstre est né de toi, de tes errances, de tes contradictions, de ton écartèlement interminable entre passé et présent, de ton incapacité trop durable à trouver ta place dans la civilisation humaine.
Que dis-tu en effet face à ce monstre ? Quel est ton unique discours ? Tu cries « Ce n'est pas moi ! », « Ce n'est pas l'islam ! ». Tu refuses que les crimes de ce monstre soient commis en ton nom (hashtag #NotInMyName). Tu t'indignes devant une telle monstruosité, tu t'insurges aussi que le monstre usurpe ton identité, et bien sûr tu as raison de le faire. Il est indispensable qu'à la face du monde tu proclames ainsi, haut et fort, que l'islam dénonce la barbarie. Mais c'est tout à fait insuffisant ! Car tu te réfugies dans le réflexe de l'autodéfense sans assumer aussi, et surtout, la responsabilité de l'autocritique. Tu te contentes de t'indigner, alors que ce moment historique aurait été une si formidable occasion de te remettre en question ! Et comme d'habitude, tu accuses au lieu de prendre ta propre responsabilité : « Arrêtez, vous les occidentaux, et vous tous les ennemis de l'islam de nous associer à ce monstre ! Le terrorisme, ce n'est pas l'islam, le vrai islam, le bon islam qui ne veut pas dire la guerre, mais la paix! »
J'entends ce cri de révolte qui monte en toi, ô mon cher monde musulman, et je le comprends. Oui tu as raison, comme chacune des autres grandes inspirations sacrées du monde l'islam a créé tout au long de son histoire de la Beauté, de la Justice, du Sens, du Bien, et il a puissamment éclairé l'être humain sur le chemin du mystère de l'existence... Je me bats ici en Occident, dans chacun de mes livres, pour que cette sagesse de l'islam et de toutes les religions ne soit pas oubliée ni méprisée ! Mais de ma position lointaine, je vois aussi autre chose - que tu ne sais pas voir ou que tu ne veux pas voir... Et cela m'inspire une question, LA grande question : pourquoi ce monstre t'a-t-il volé ton visage ? Pourquoi ce monstre ignoble a-t-il choisi ton visage et pas un autre ? Pourquoi a-t-il pris le masque de l'islam et pas un autre masque ? C'est qu'en réalité derrière cette image du monstre se cache un immense problème, que tu ne sembles pas prêt à regarder en face. Il le faut bien pourtant, il faut que tu en aies le courage. Ce problème est celui des racines du mal. D'où viennent les crimes de ce soi-disant « État islamique » ? Je vais te le dire, mon ami. Et cela ne va pas te faire plaisir, mais c'est mon devoir de philosophe. Les racines de ce mal qui te vole aujourd'hui ton visage sont en toi-même, le monstre est sorti de ton propre ventre, le cancer est dans ton propre corps. Et de ton ventre malade, il sortira dans le futur autant de nouveaux monstres - pires encore que celui-ci - aussi longtemps que tu refuseras de regarder cette vérité en face, aussi longtemps que tu tarderas à l'admettre et à attaquer enfin cette racine du mal !
Même les intellectuels occidentaux, quand je leur dis cela, ont de la difficulté à le voir : pour la plupart, ils ont tellement oublié ce qu'est la puissance de la religion - en bien et en mal, sur la vie et sur la mort - qu'ils me disent « Non le problème du monde musulman n'est pas l'islam, pas la religion, mais la politique, l'histoire, l'économie, etc.». Ils vivent dans des sociétés si sécularisées qu'ils ne se souviennent plus du tout que la religion peut être le cœur du réacteur d'une civilisation humaine ! Et que l'avenir de l'humanité passera demain non pas seulement par la résolution de la crise financière et économique, mais de façon bien plus essentielle par la résolution de la crise spirituelle sans précédent que traverse notre humanité toute entière ! Saurons-nous tous nous rassembler, à l'échelle de la planète, pour affronter ce défi fondamental ? La nature spirituelle de l'homme a horreur du vide, et si elle ne trouve rien de nouveau pour le remplir elle le fera demain avec des religions toujours plus inadaptées au présent - et qui comme l'islam actuellement se mettront alors à produire des monstres.
Je vois en toi, ô monde musulman, des forces immenses prêtes à se lever pour contribuer à cet effort mondial de trouver une vie spirituelle pour le XXIe siècle ! Il y a en toi en effet, malgré la gravité de ta maladie, malgré l'étendue des ombres d'obscurantisme qui veulent te recouvrir tout entier, une multitude extraordinaire de femmes et d'hommes qui sont prêts à réformer l'islam, à réinventer son génie au-delà de ses formes historiques et à participer ainsi au renouvellement complet du rapport que l'humanité entretenait jusque-là avec ses dieux ! C'est à tous ceux-là, musulmans et non musulmans qui rêvent ensemble de révolution spirituelle, que je me suis adressé dans mes livres ! Pour leur donner, avec mes mots de philosophe, confiance en ce qu'entrevoit leur espérance!
Il y a dans la Oumma (communauté des musulmans) de ces femmes et ces hommes de progrès qui portent en eux la vision du futur spirituel de l'être humain. Mais ils ne sont pas encore assez nombreux ni leur parole assez puissante. Tous ceux-là, dont je salue la lucidité et le courage, ont parfaitement vu que c'est l'état général de maladie profonde du monde musulman qui explique la naissance des monstres terroristes aux noms d'Al Qaida, Al Nostra, AQMI ou de l'«État islamique». Ils ont bien compris que ce ne sont là que les symptômes les plus graves et les plus visibles sur un immense corps malade, dont les maladies chroniques sont les suivantes: impuissance à instituer des démocraties durables dans lesquelles est reconnue comme droit moral et politique la liberté de conscience vis-à-vis des dogmes de la religion; prison morale et sociale d'une religion dogmatique, figée, et parfois totalitaire ; difficultés chroniques à améliorer la condition des femmes dans le sens de l'égalité, de la responsabilité et de la liberté; impuissance à séparer suffisamment le pouvoir politique de son contrôle par l'autorité de la religion; incapacité à instituer un respect, une tolérance et une véritable reconnaissance du pluralisme religieux et des minorités religieuses.
Tout cela serait-il donc la faute de l'Occident ? Combien de temps précieux, d'années cruciales, vas-tu perdre encore, ô cher monde musulman, avec cette accusation stupide à laquelle toi-même tu ne crois plus, et derrière laquelle tu te caches pour continuer à te mentir à toi-même ? Si je te critique aussi durement, ce n'est pas parce que je suis un philosophe « occidental », mais parce que je suis un de tes fils conscients de tout ce que tu as perdu de ta grandeur passée depuis si longtemps qu'elle est devenue un mythe !
Depuis le XVIIIe siècle en particulier, il est temps de te l'avouer enfin, tu as été incapable de répondre au défi de l'Occident. Soit tu t'es réfugié de façon infantile et mortifère dans le passé, avec la régression intolérante et obscurantiste du wahhabisme qui continue de faire des ravages presque partout à l'intérieur de tes frontières - un wahhabisme que tu répands à partir de tes lieux saints de l'Arabie Saoudite comme un cancer qui partirait de ton cœur lui-même ! Soit tu as suivi le pire de cet Occident, en produisant comme lui des nationalismes et un modernisme qui est une caricature de modernité - je veux parler de cette frénésie de consommation, ou bien encore de ce développement technologique sans cohérence avec leur archaïsme religieux qui fait de tes « élites » richissimes du Golfe seulement des victimes consentantes de la maladie désormais mondiale qu'est le culte du dieu argent.
Qu'as-tu d'admirable aujourd'hui, mon ami ? Qu'est-ce qui en toi reste digne de susciter le respect et l'admiration des autres peuples et civilisations de la Terre ? Où sont tes sages, et as-tu encore une sagesse à proposer au monde ? Où sont tes grands hommes, qui sont tes Mandela, qui sont tes Gandhi, qui sont tes Aung San Suu Kyi ? Où sont tes grands penseurs, tes intellectuels dont les livres devraient être lus dans le monde entier comme au temps où les mathématiciens et les philosophes arabes ou persans faisaient référence de l'Inde à l'Espagne ? En réalité tu es devenu si faible, si impuissant derrière la certitude que tu affiches toujours au sujet de toi-même... Tu ne sais plus du tout qui tu es ni où tu veux aller et cela te rend aussi malheureux qu'agressif... Tu t'obstines à ne pas écouter ceux qui t'appellent à changer en te libérant enfin de la domination que tu as offerte à la religion sur la vie toute entière. Tu as choisi de considérer que Mohammed était prophète et roi. Tu as choisi de définir l'islam comme religion politique, sociale, morale, devant régner comme un tyran aussi bien sur l'État que sur la vie civile, aussi bien dans la rue et dans la maison qu'à l'intérieur même de chaque conscience. Tu as choisi de croire et d'imposer que l'islam veut dire soumission alors que le Coran lui-même proclame qu'«Il n'y a pas de contrainte en religion» (La ikraha fi Dîn). Tu as fait de son Appel à la liberté l'empire de la contrainte ! Comment une civilisation peut-elle trahir à ce point son propre texte sacré ? Je dis qu'il est l'heure, dans la civilisation de l'islam, d'instituer cette liberté spirituelle - la plus sublime et difficile de toutes - à la place de toutes les lois inventées par des générations de théologiens !
De nombreuses voix que tu ne veux pas entendre s'élèvent aujourd'hui dans la Oumma pour s'insurger contre ce scandale, pour dénoncer ce tabou d'une religion autoritaire et indiscutable dont se servent ses chefs pour perpétuer indéfiniment leur domination... Au point que trop de croyants ont tellement intériorisé une culture de la soumission à la tradition et aux « maîtres de religion » (imams, muftis, shouyoukhs, etc.) qu'ils ne comprennent même pas qu'on leur parle de liberté spirituelle, et n'admettent pas qu'on ose leur parler de choix personnel vis-à-vis des « piliers » de l'islam. Tout cela constitue pour eux une « ligne rouge », quelque chose de trop sacré pour qu'ils osent donner à leur propre conscience le droit de le remettre en question ! Et il y a tant de ces familles, tant de ces sociétés musulmanes où cette confusion entre spiritualité et servitude est incrustée dans les esprits dès leur plus jeune âge, et où l'éducation spirituelle est d'une telle pauvreté que tout ce qui concerne de près ou de loin la religion reste ainsi quelque chose qui ne se discute pas!
Or cela, de toute évidence, n'est pas imposé par le terrorisme de quelques fous, par quelques troupes de fanatiques embarqués par l'État islamique. Non, ce problème-là est infiniment plus profond et infiniment plus vaste ! Mais qui le verra et le dira ? Qui veut l'entendre ? Silence là-dessus dans le monde musulman, et dans les médias occidentaux on n'entend plus que tous ces spécialistes du terrorisme qui aggravent jour après jour la myopie générale ! Il ne faut donc pas que tu t'illusionnes, ô mon ami, en croyant et en faisant croire que quand on en aura fini avec le terrorisme islamiste l'islam aura réglé ses problèmes ! Car tout ce que je viens d'évoquer - une religion tyrannique, dogmatique, littéraliste, formaliste, machiste, conservatrice, régressive - est trop souvent, pas toujours, mais trop souvent, l'islam ordinaire, l'islam quotidien, qui souffre et fait souffrir trop de consciences, l'islam de la tradition et du passé, l'islam déformé par tous ceux qui l'utilisent politiquement, l'islam qui finit encore et toujours par étouffer les Printemps arabes et la voix de toutes ses jeunesses qui demandent autre chose. Quand donc vas-tu faire enfin ta vraie révolution ? Cette révolution qui dans les sociétés et les consciences fera rimer définitivement religion et liberté, cette révolution sans retour qui prendra acte que la religion est devenue un fait social parmi d'autres partout dans le monde, et que ses droits exorbitants n'ont plus aucune légitimité !
Bien sûr, dans ton immense territoire, il y a des îlots de liberté spirituelle : des familles qui transmettent un islam de tolérance, de choix personnel, d'approfondissement spirituel ; des milieux sociaux où la cage de la prison religieuse s'est ouverte ou entrouverte ; des lieux où l'islam donne encore le meilleur de lui-même, c'est-à-dire une culture du partage, de l'honneur, de la recherche du savoir, et une spiritualité en quête de ce lieu sacré où l'être humain et la réalité ultime qu'on appelle Allâh se rencontrent. Il y a en Terre d'islam et partout dans les communautés musulmanes du monde des consciences fortes et libres, mais elles restent condamnées à vivre leur liberté sans assurance, sans reconnaissance d'un véritable droit, à leurs risques et périls face au contrôle communautaire ou bien même parfois face à la police religieuse. Jamais pour l'instant le droit de dire « Je choisis mon islam », « J'ai mon propre rapport à l'islam » n'a été reconnu par « l'islam officiel » des dignitaires. Ceux-là au contraire s'acharnent à imposer que « La doctrine de l'islam est unique » et que « L'obéissance aux piliers de l'islam est la seule voie droite » (sirâtou-l-moustaqîm).
Ce refus du droit à la liberté vis-à-vis de la religion est l'une de ces racines du mal dont tu souffres, ô mon cher monde musulman, l'un de ces ventres obscurs où grandissent les monstres que tu fais bondir depuis quelques années au visage effrayé du monde entier. Car cette religion de fer impose à tes sociétés tout entières une violence insoutenable. Elle enferme toujours trop de tes filles et tous tes fils dans la cage d'un Bien et d'un Mal, d'un licite (halâl) et d'un illicite (harâm) que personne ne choisit, mais que tout le monde subit. Elle emprisonne les volontés, elle conditionne les esprits, elle empêche ou entrave tout choix de vie personnel. Dans trop de tes contrées, tu associes encore la religion et la violence - contre les femmes, contre les « mauvais croyants », contre les minorités chrétiennes ou autres, contre les penseurs et les esprits libres, contre les rebelles - de telle sorte que cette religion et cette violence finissent par se confondre, chez les plus déséquilibrés et les plus fragiles de tes fils, dans la monstruosité du jihad !
Alors, ne t'étonne donc pas, ne fais plus semblant de t'étonner, je t'en prie, que des démons tels que le soi-disant État islamique t'aient pris ton visage ! Car les monstres et les démons ne volent que les visages qui sont déjà déformés par trop de grimaces ! Et si tu veux savoir comment ne plus enfanter de tels monstres, je vais te le dire. C'est simple et très difficile à la fois. Il faut que tu commences par réformer toute l'éducation que tu donnes à tes enfants, que tu réformes chacune de tes écoles, chacun de tes lieux de savoir et de pouvoir. Que tu les réformes pour les diriger selon des principes universels (même si tu n'es pas le seul à les transgresser ou à persister dans leur ignorance) : la liberté de conscience, la démocratie, la tolérance et le droit de cité pour toute la diversité des visions du monde et des croyances, l'égalité des sexes et l'émancipation des femmes de toute tutelle masculine, la réflexion et la culture critique du religieux dans les universités, la littérature, les médias. Tu ne peux plus reculer, tu ne peux plus faire moins que tout cela ! Tu ne peux plus faire moins que ta révolution spirituelle la plus complète ! C'est le seul moyen pour toi de ne plus enfanter de tels monstres, et si tu ne le fais pas tu seras bientôt dévasté par leur puissance de destruction. Quand tu auras mené à bien cette tâche colossale - au lieu de te réfugier encore et toujours dans la mauvaise foi et l'aveuglement volontaire, alors plus aucun monstre abject ne pourra plus venir te voler ton visage.
Cher monde musulman... Je ne suis qu'un philosophe, et comme d'habitude certains diront que le philosophe est un hérétique. Je ne cherche pourtant qu'à faire resplendir à nouveau la lumière - c'est le nom que tu m'as donné qui me le commande, Abdennour, « Serviteur de la Lumière ».
Je n'aurais pas été si sévère dans cette lettre si je ne croyais pas en toi. Comme on dit en français: «Qui aime bien châtie bien». Et au contraire tous ceux qui aujourd'hui ne sont pas assez sévères avec toi - qui te trouvent toujours des excuses, qui veulent faire de toi une victime, ou qui ne voient pas ta responsabilité dans ce qui t'arrive - tous ceux-là en réalité ne te rendent pas service ! Je crois en toi, je crois en ta contribution à faire demain de notre planète un univers à la fois plus humain et plus spirituel ! Salâm, que la paix soit sur toi.
LIRE AUSSI SUR LES BLOGUES - Pour Cabu, Charb, Wolinski et tous les autres... - l'hommage d'Anne Sinclair et la rédaction du HuffPost France - Tuerie à Charlie Hebdo: soutien à mes collègues - Xavier Delucq - Je cherche Charlie partout - Charly Bouchara - Couvrez ce Saint que je ne saurais voir - Sylvain Raymond - Le monde de Charlie - Yanick Barrette - Pas si solitaires, les loups... - Yves-François Blanchet - Nommer l'ennemi - Jacques Tarnero - À fleur de peau - Caroline Dubois - À Bernard Maris, homme délicieux - Jacques Sapir - Ils ont tué deux de mes plus chers amis, mais pas leur essence - Mohamed Sifaoui 


Charlie Hebdo: un journal iconoclaste, et fier de l'etre...

Para os que não compreendem o francês (mas as palavras são simples):

Um jornal iconoclasta, e orgulhoso de sê-lo...


De fato, não existe nenhuma vantagem, nem coragem, em ser conformista.

 O importante é nadar contra a corrente, ser antagonista, ou contrarianista, em qualquer regime, e em qualquer circunstância.


Minha pequena homenagem a esse jornal excepcional, que já conhecia de sua fase Hara Kiri, exatamente igual, tão irreverente quanto, e que depois ficou ainda pior, quero dizer, melhor, para desespero de todos os poderes constituídos, de todas as igrejas consolidadas, de todas as religiões estabelecidas, e dos carolas e fundamentalistas de todas as cores...



Un journal comme il faut, ou seja, feito para incomodar, ou, como dizia Millor, "jornalismo é oposição, o resto é armazem de secos e molhados...".
Paulo Roberto de Almeida 

Allons enfants! - Charlie Hebdo vai publicar o numero mais importante de sua historia...

Será um sucesso editorial absoluto, e os exemplares se venderão como des petits pains, se os editores me permitem a comparação talvez pouco apropriada.
Se eu pudesse compraria o meu exemplar, mas vou pedir a algum colega de Paris, para comprar um para mim. Um número histórico, ainda que na tragédia e no sofrimento de tantos colaboradores e dos jornalistas e de suas famílias.
Mas essa é a resposta apropriada aos bárbaros: mostrar que a liberdade, ainda quando reprimida, é a maior força civilizatória, e que ela termina vencendo qualquer ditadura, qualquer repressão.
Todos os franceses, com a possível exceção de um punhado de fundamentalistas de várias tendências religiosas e políticas, irão comprar o seu exemplor de Charlie Hebdo.
Allons, enfants, de certa forma, será un jour de gloire qui est arrivé, ainda que na dor...
Marchons, marchons...
Paulo Roberto de Almeida

Colunista do jornal Charlie Hebdo diz que publicação irá sair na próxima semana

Correio do Brasil, 8/1/2015 12:22
Por Redação, com ABr - de Paris

O colunista do jornal Charlie Hebdo, Patrick Pelloux
O colunista do jornal Charlie Hebdo, Patrick Pelloux

O colunista do jornal Charlie Hebdo, Patrick Pelloux, afirmou nesta quinta-feira que o jornal será publicado na próxima semana, mesmo após o ataque terrorista desta quarta que matou oito dos seus jornalistas e cartunistas.
– Vamos continuar, decidimos sair na próxima semana. Estamos todos de acordo – disse Pelloux, adiantando que a equipe do jornal deve se reunir em breve.
Pelloux, que também é médico de emergência, disse que os escritórios do jornal satírico não estão acessíveis por causa da investigação policial. Ele assegurou que a equipe trabalhará em casa. “Vamos nos arranjar”, acrescentou.
– É muito duro, estamos todos com a nossa dor, os nossos medos, mas vamos fazê-lo porque não é a estupidez que vai ganhar. Charb [diretor da publicação, morto no atentado] dizia sempre que o jornal deveria sair custasse o que custasse – disse o colunista.
Doze pessoas,  entre as quais cinco dos principais caricaturistas do semanário (Charb, Wolinski, Cabu, Tignous e Honoré) e o economista Bernard Maris, foram mortas no ataque aos escritórios do jornal, no centro de Paris.
O atentado, o mais violento dos últimos 50 anos na França, provocou uma onda de comoção e solidariedade, principalmente entre os veículos de comunicação que já propuseram ajudar oCharlie Hebdo.
Em 2011, quando os escritórios do jornal foram incendiados, presumivelmente em represália pela publicação de caricaturas do profeta Maomé, o diário Libération acolheu a redação do Charlie Hebdo. Afetado pelo ataque, o Charlie Hebdo já estava ameaçado de falência. Deficitário, vende em média cerca de 30 mil exemplares e lançou recentemente um apelo por doações para que não encerrasse os trabalhos.

quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

O Hobbes companheiro prepara uma nova obra seminal - Samuel Pinheiro Guimaraes

A despeito de alguns simplismos e banalidades conceituais, aquele que sempre foi o guru ideológico dos companheiros, não apenas na política externa, mas em outras áreas também, perpetra aqui uma coisa que deve ser uma introdução a uma nova obra a ser publicada, saudada e incensada nas hostes companheiras. Não encontrei nada que justificasse a caracterização do título de que seu autor pudesse ser uma espécie de Hobbes tropical, mas nunca se perde por esperar. Pode ser que daí saia um novo tratado de ciência política companheira, aquela que vai justificar todas as patifarias cometidas ao longo desses doze anos (e mais quatro, presumivelmente, salvo incidente de percurso) de roubalheiras generalizadas em nome de causas populares.
Por enquanto só ficamos sabendo que Estado, Economia, Direito e Sociedade Civil só existem em função um dos outros, e vice versa e em todos os sentidos, o que não deixa de ser uma revelação importante para todos aqueles que estudam direito, sociologia, economia ou política. Caso alguém corra o risco de misturar todas essas coisas, não tem problema: o novo Hobbes avisa que está tudo misturado mesmo, mas o que garante a coerência de tudo é -- como não poderia deixar de ser -- o Estado. Imaginem como estaríamos sem Estado, minha gente: nem a sociedade civil existiria!
Existe uma certa "fragância", se ouso dizer, de um texto clássico, que poderia ser uma mistura de Ideologia Alemã (1845) com a Introdução à Crítica da Economia Política (1859), o que aparece de forma mais nítida até nesta linguagem meio antiquada dos "modos de produção", que a gente acreditava que não era mais usada pelos marxistas mais modernos:
"...agências do Estado, garantem a observação das relações entre trabalho e capital (lato sensu), qualquer que seja o sistema econômico de uma determinada sociedade: agrária primitiva, antiga, feudal, capitalista, socialista ou comunista."
[Acho que ele esqueceu o "modo asiático de produção", mas podemos deixar esse detalhe de lado.]

É isso aí minha gente: esperem, nos próximos números desse vibrante órgão do poder companheiro -- devidamente financiado por ele -- os capítulos sucessivos desta fabulosa novela hobbesiana-gramsciana, que vai nos revelar os segredos da ideologia companheira, na conquista e na manutenção do poder idem...
Paulo Roberto de Almeida

Carta Maior, 08/01/2015 - Copyleft

Do Estado, do Direito e da Política: reflexões

Os conceitos de Estado, de Direito e de Política se encontram tão profundamente interligados que não se pode com proveito analisá-los de forma separada.


Samuel Pinheiro Guimarães
Márcia Kalume/Agência Senado
Introdução

Os conceitos de Estado, de Direito e de Política muitas vezes, em teoria, são apresentados e discutidos de forma distinta. Em realidade, se encontram tão profundamente interligados que não se pode com proveito analisá-los de forma separada.

Não há Direito sem Estado, pois a aceitação e a observância das normas jurídicas e sua eventual sanção em caso de descumprimento dependem da existência e da força do Estado que se expressam através de suas agências, entre elas e muito em especial sua polícia. A afirmação de que não há Direito sem Estado não significa negar a existência de direitos humanos inalienáveis. Todavia, somente a luta política pela consagração desses direitos e pelo seu reconhecimento pela legislação e pelo Estado é que permite impor sua observância.

Não há Direito sem Política, pois as normas jurídicas não são elaboradas, executadas e interpretadas em gabinetes acadêmicos a partir de conceitos e de estruturas lógicas cartesianas, mas, sim, em processos conflituosos de disputa de interesses no seio da sociedade e dos organismos do Estado, ainda que cada grupo de interesses conte nestes processos com o auxílio precioso de seus juristas para melhor articular a defesa de seus pontos de vista.

Não há Estado sem Política, pois os dirigentes das distintas agências do Estado, isto é das múltiplas agencias que compõem os seus três Poderes -  Legislativo, Executivo e Judiciário - são escolhidos através de processos políticos, mesmo quando esses processos são disfarçados como procedimentos de aparência tecnocrática, de reduzida transparência e nenhuma participação popular, como ocorre em regimes ditatoriais.

Há uma tendência em certas áreas de estudos acadêmicos e de certos autores a se estabelecer uma distinção e uma separação entre Sociedade Civil e Estado, entre Economia e Estado. A Sociedade Civil é apresentada com uma aura e uma natureza inerentemente boa, um lugar ideal onde os cidadãos, iguais e livres, conviveriam em harmonia se não fora pela existência do Estado, ente maléfico e autoritário que perturba e impede o desabrochar da sociedade civil. A Economia é representada como um espaço livre, dinâmico e criativo, onde empresários, capitalistas e investidores são responsáveis pelo progresso e pela prosperidade de todos enquanto que o Estado aparece como uma entidade intervencionista, ineficiente, corrupta e corruptora.

Todavia, não existe Sociedade Civil sem Estado, mesmo quando este aparece como instrumento de um regime ditatorial ou autoritário, pois sem o Estado e sem normas jurídicas, a sociedade seria tão somente um emaranhado confuso de lutas violentas de interesses. A não ser nos territórios coloniais, onde as instituições do Estado colonial aparecem como criaturas da potência estrangeira, alheia e opressora da sociedade local, se pode falar de separação entre Sociedade Civil e Estado.

Por outro lado, não há Economia sem Estado, pois são as normas jurídicas que regulam as atividades econômicas e que, através das agências do Estado, garantem a observação das relações entre trabalho e capital (lato sensu), qualquer que seja o sistema econômico de uma determinada sociedade: agrária primitiva, antiga, feudal, capitalista, socialista ou comunista.

Hoje há uma tendência a considerar que a expressão mais moderna da Sociedade Civil seriam as organizações não governamentais, que representariam melhor os interesses do povo, principalmente em Estados em que as classes hegemônicas são conservadoras e opressoras. Todavia, em muitas circunstâncias, as organizações não governamentais que atuam em um país, em especial quando é ele subdesenvolvido, representam em realidade interesses particulares e estrangeiros e estão longe de representar a sociedade civil. De toda forma, não têm essas organizações representatividade e legitimidade já que seus integrantes se auto-escolheram, e assim é de estranhar e de preocupar a tendência atual de incorporar representantes de ONGs em organismos do Estado.

Ao tratar dos temas do Estado, do Direito, da Política, da Sociedade e da Economia há sempre uma certa repetição de ideias e de argumentos, devido à sua estreita interelação, pelo que me penitencio

Academia: um aliado dos companheiros reclama da mediocidade dos seus companheiros de academia - Rogerio Cerqueira Leite

O que esse cientista afirma não me surpreende nem um pouco, pois eu sempre soube que nossa academia ficava abaixo da crítica. Só me espantou um pouco a extensão da mediocridade também nas hard sciences e nas biológicas. Pensava que as humanidades fossem hors concours na competição de baixa produtividade e de mediocridade na produção. Agora vejo que o mal se estende a todas as áreas. 
Esses caras não merecem mais dinheiro público enquanto não melhorarem os padrões. 
Sintomático que esse companheiro acadêmico que apoiou estridentenente a companheira política na última campanha presidencial, se exime de botar o dedo na ferida e dizer que é justamente o modelo isonomista e sem cobrança de 'produtivismo' dos seus amigos no poder que mantem, reforça e aumenta essa mediocridade e esse desperdício de recursos nas sinecuras acadêmicas dos seus colegas. Eu os colocaria a pão e água e só entregaria recursos em contrapartida a uma "academia de resultados", como diriam alguns. Faltam metas, falta cobrança e falta sobretudo vergonha na cara. Começaria por retirar o cargo de reitor e administrador financeiro da mão (e dos pés) dos clérigos acadêmicos e colocaria gente de "Wall Street" e do "Walmart" administrando as universidades. Claro, acabaria com a estabilidade e a remuneração isonômica. E com várias prebendas indevidas. Sou cruel? Provavelmente: só quero uma universidade decente, embora eu ache que ela não tem conserto com os companheiros medíocres no poder. 
Paulo Roberto de Almeida

ROGÉRIO CEZAR DE CERQUEIRA LEITE

TENDÊNCIAS/DEBATES

Produção científica e lixo acadêmico no Brasil

A resistência dos medíocres e a falta de coragem política das autoridades impedem o crescimento da ciência de alta qualidade no nosso país

Dois artigos publicados recentemente pela revista britânica "Nature", especializada em ciência, deixam o Brasil e, em especial, a comunidade acadêmica brasileira, profundamente envergonhados.

A "Nature" nos acusa, em primeiro lugar, de produzir mais lixo do que conhecimento em ciência. Nas revistas mais severas quanto à qualidade de ciência, selecionadas como de excelência pelo periódico, cientistas brasileiros preenchem apenas 1% das publicações.

Quando se incluem revistas menos qualificadas, porém, ainda incluídas dentre as indexadas, o Brasil se responsabiliza por 2,5%. O que a "Nature" generosamente omite são as publicações em revistas não indexadas, que contêm número significativo de publicações brasileiras, um verdadeiro lixo acadêmico.

O segundo golpe humilhante para a ciência brasileira exposto pela revista se refere à eficiência no uso de recursos aplicados à pesquisa. Dentre 53 países analisados, o Brasil está em 50º lugar. Melhor apenas que Egito, Turquia e Malásia.

Tomemos um exemplo. O Brasil publicou 670 artigos em revistas de grande prestígio, enquanto no mesmo período o Chile publicou 717, nessas mesmas revistas. O dado profundamente inquietante é que enquanto o Brasil despendeu em ciência US$ 30 bilhões, o Chile gastou apenas US$ 2 bilhões.

Quer dizer, o Chile, que aliás não está entre os primeiros em eficiência no mundo científico, é 15 vezes mais eficiente que o Brasil. Alguma coisa está errada, profundamente errada. A academia brasileira, isto é, universidades e institutos de pesquisas produzem mais pesquisa de baixa do que de boa qualidade e as produz a custos muito elevados. Há certamente causas, talvez muitas, para essa inadequação.

A primeira decorre de um "distributivismo" demagógico. É evidente que seria desejável que novos centros de pesquisas se desenvolvessem em regiões ainda não desenvolvidas do país. Mas é um erro crasso esperar que uma atividade de pesquisas qualquer venha a desenvolver economicamente uma região sem cultura adequada para conviver com essa pesquisa.

Seria desejável que investimentos maciços fossem aplicados em pesquisas em instituições localizadas em regiões pouco desenvolvidas, mas cujo meio ambiente é capaz de absorver os benefícios dessa inserção.

O segundo mal que é causa inquestionável da diminuta e dispendiosa produção de conhecimento é o obsoleto regime de trabalho que regula a mão de obra do setor de pesquisas em universidades públicas e na maioria dos institutos.

O pesquisador faz um concurso --frequentemente falsificado-- no começo de sua carreira. Torna-se vitalício. Quase sempre não precisa trabalhar para ter aumento de salário e galgar postos em sua carreira. Ora, qual seria, então, a motivação para fazer pesquisas?

O terceiro problema é o sistema de gestão de universidades públicas e instituições de pesquisa, cuja burocracia soterra qualquer iniciativa dos poucos bem-intencionados professores e pesquisadores que ainda não esmoreceram.

Pois bem. Há uma fórmula que evita todos esses males e que já foi experimentada com sucesso em algumas das instituições científicas do Brasil: a organização social. A resistência dos medíocres e parasitas e a falta de coragem política de algumas de nossas autoridades impedem a solução desse problema.

ROGÉRIO CEZAR DE CERQUEIRA LEITE, físico, é professor emérito da Unicamp e membro do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia e do Conselho Editorial da Folha

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br - www.folha.com/tendencias

Historia no New York Times: os 18 pontos de Woodrow Wilson, 8/01/1918

This day in History, nas páginas do New York Times, de 1918.
Parece que o presidente Wilson estava mal informado sobre o putsch bolchevique conduzido por Lênin na Rússia, cuja intenção unilateral foi a de retirar o país da guerra, negociando uma paz em seoarado com a Alemanha, o desastroso tratado de Brest-Litowski, que resultaria na demissão de Trotsky como comissário do povo para assuntos estrangeiros, esse título meio ridículo que ainda é usado na Venezuela bolivariana.
Mas o jornal também chamou a atenção para isto:

Russia Seen On Verge Of Utter Collapse: Petrograd Faces Famine and Paralysis, While Anarchy Reigns in Provinces.

E para o fato de que os republicanos (Wilson era um democrata, mas super-racista) temiam o livre comércio. As coisas não mudaram muito desde entào, embora os demicratas sejam mais protecionistas atualmente.
Em todo caso, esta é a história como retratada no momento dos fatos.
Paulo Roberto de Almeida

 Buy a Reproduction
Front Page Image

President Specifies Terms Basis For World Peace; Asks Justice For Alsace-Lorraine, Applauds Russia, Tells Germany She May Be An Equal But Not A Master



APPEALS TO GERMAN PEOPLE
Wilson Declares We Must Know for Whom Their Rulers Speak
READY TO FIGHT TO END
Insists That Principle of Justice to All Nations Is Only Basis for Peace.
DEMANDS FREEDOM OF SEAS
Congress Cheers Utterance as Momentous Declaration of Entente War Aims.
Special to The New York Times

RELATED HEADLINES

Text of President Wilson's Speech

OTHER HEADLINES

London Sees No Peace: Fierce Fighting Ahead Despite the Lloyd George Statement: Necessity Prompted by It: Solidification of Public Opinion by Removing Doubt Was Imperative: Teuton Press Hostile: Derisive Comment by German and Austrian Papers, Which Say Sword Will Force Peace.

Trotzky Distrusts Allies: Thinks They Want Him to Give In to Berlin and Make Peace: Thus Helping Their Ends: Bolsheviki Will Fight, He Asserts, Unless Terms Desired Are Accepted by Teutons: Says Their Troops Rebel: Jump From Trains When Sent West -- Confirms Report of 25,000 Intrenched.

Haig Victory Clearly Visibly Nearer: Says the Allies Have Discounted the Enemy's Gains Through Russia's Collapse: Weather His Chief Foe: Only That Prevented Complete Victory in Flanders -- Warm Welcome to Our Troops.

German Press Say 'No' To Lloyd George: Talks Like a Conqueror, They Say -- Refuse to Take Speech as Peace Offer.

Germans Starve by Hundreds; Vorwaerts Sees Catastrophe

Germany Announces Extension of the Submarine Barred Zone

Russia Seen On Verge Of Utter Collapse: Petrograd Faces Famine and Paralysis, While Anarchy Reigns in Provinces.

Washington, Jan. 8 -- The terms upon which Germany may obtain peace were given to the American Congress for the benefit of the whole world by President Wilson today. With scant notice of his coming, notice barely sufficient to enable the Senate and the House to make the necessary arrangements for a joint session, the President appeared at the Capitol, and in an address, brief by comparison to the momentous issues discussed, enumerated the conditions for a cessation of hostilities, the rejection of which will place upon Germany the responsibility for the further bloodshed that must precede the final victory of the allied nations.

President Wilson's address bore a striking resemblance to the speech made last Saturday by Mr. Lloyd George, the British Prime Minister, before the Trade Union Conference on Man Power in which he specified the war aims and peace conditions of the British Government. The diversions in the President's address from statements of the Prime Minister were for the most part more in the form than in the substance.

But in the opinion of many of those who compared Mr. Wilson's address with the utterances of Mr. Lloyd George, the President was more definite in declaring that the wrong done to France though the annexation of Alsace-Lorraine must be righted and he differed from Mr. Lloyd George with regard to the Russian situation in that he held out to the Russian people an offer of assistance from America, and tendered sympathy for the aims that those now in control of the affairs of that perturbed country are seeking to achieve.

Leaves No Doubt of Unity

By the President's official utterances he has pledged this Government to the achievement of ends that affect Europe more intimately and deeply than the United States. No doubt was left in the minds of those who listened to the President's words that this Government has entered heart and soul into the cause of the Entente Allies, to fight for the objects for which they are fighting to free Europe from the menace of Prussianism, to take Alsace-Lorraine from German domination, to prevent Russia from becoming part of the German Empire, to see that Italy has restored to her those portions of the Austro-Hungarian Empire that are inhabited by a people who are Italian in heart and blood, to bring all the Polish peoples into a common Government, to restore Belgium, Serbia, and the small nations that have been devastated by Teuton hordes, to their own, to give the separate nationalities of Austria-Hungary, Turkey and the Balkan States the right to govern themselves as separate entities, to have Northern France restored to French control.

And, in addition to these aims, the allied nations, in order to find a peace acceptable to them, must be assured of freedom of the seas, the establishment of an equality of trade conditions among the nations of the world, the reduction of armaments and an association of nations in a league to enforce peace. There must also be no secret agreements among nations that would threaten again the peace of the world.

Immediately following the delivery of the President's address, there was a disposition manifest to refer to his outline of the conditions which Germany must accept before the war could end as a definition of peace terms. But in the official quarters best qualified to interpret the meaning of the President, it was declared that his statement must be taken as a definition of war aims. The President left no doubt that, unless Germany consented to enter into peace exchanges on the basis of the conditions set forth in his address, the United States and the Allies would fight on until the Central Powers realized that there could be no peace in any other way. "It was an outline of war aims, not a peace address," declared one official.

Terms Clear and Definite

Never before has President Wilson or any other spokesman for a nation at war with Germany made such a clear and definite exposition of the conditions upon which the war must be fought or put another way, the conditions upon which peace might be obtained. Until today the President had refrained from making any official expression whatever as to the views of the Washington Government concerning Alsace-Lorraine. Nor had he indicated how the Government felt toward the aspiration of Italy to regain the territory that Austria had obtained through the Treaty of Vienna. He had refrained also from expression of sentiment concerning the disposition of the German colonies which have been taken from her since the war began. But today he made clear that in these as in other questions that must be adjusted around the peace council table, the United States and the Allies are fighting to achieve common objects, and each has assumed its share of helping its partners to gain the ends that more immediately pertain to their welfare and future happiness and stability.

Washington- that is, official and diplomatic Washington- was never more interested by any official utterance since the United States entered the war than by the words spoken by President Wilson in the hall of the House of Representatives today. No statement has come from any Administration source to give closer interpretation of any of his declarations. Those who are anxious to know whether the President delivered his definition of war aims with the knowledge and consent of the Allied Governments could obtain no satisfaction. Upon that point the State Department had no comment, but there was a very general opinion that exchanges had taken place between Washington, London, Paris, Rome, and possibly Tokyo and an agreement reached along general lines as to what the President should say.

Counseled with Colonel House

It is believed also that the speech of Mr. Lloyd George was not prepared until its substance or its text had been communicated to the capitals of the other Allies and their views obtained.

The President is supposed to have begun the preparation of today's address last Saturday, the day that Mr. Lloyd George delivered his speech. Colonel E. M. House, the President's unofficial emissary and adviser in war matters, who returned recently from a mission to Europe which resulted in the establishment of an interallied war council, came to Washington on Saturday evening and has been the President's guest since. No inkling was given by the President that he contemplated delivering an address defining the war aims of America. Even some of those who ordinarily would have known of this work were apparently kept in the dark.

The manuscript of the address was sent to the Government Printing Office last night, and copies of it were delivered at the White House this morning. When the Senate and the House assembled, Vice President Marshall and Speaker Clark had been notified that the President desired to address the two houses in joint session at 12 o'clock, and the half hour intervening after the hour of assembling was spent in putting through the necessary resolution for the joint meeting and the march of the Senators to the House wing of the Capitol.

The President's statement was generally approved in Congress. Republicans were as enthusiastic as Democrats in endorsing the President's outline of the conditions for world peace. There was an under-current of private criticism over his statement with reference to Alsace-Lorraine on the ground that he was so specific that Germany might find this a stumbling block to peace overtures, but those who voiced this sentiment wished to be understood that they felt that the address was otherwise so commendable that it would be poor taste for them to find cause for dissent in this particular feature.

Republican Fear Free Trade

The only real outspoken criticism came from Republicans who saw in one of the war aims specified by the President a declaration that would commit the Allies and their enemies to the establishment of free trade for all the world for a basis of peace. This condition of war stated by the President in these words: "The removal, so far as possible, of all economic barriers and the establishment of an equality of trade conditions among all the nations consenting to the peace and associating themselves for its maintenance."

If this meant an acceptance of the principle of free trade that would permit Germany as well as other nations to dump their products in American ports and bring them into competition with American production, the Republicans, it was asserted, would enter a vigorous protest and would not consent to any peace that included such a condition.

Generally, however, Congress gave hearty approval to practically everything that was said by the President.

Cheers for Alsace-Lorraine

Perhaps the most surprising evidence of responsiveness was given when the President referred to Alsace-Lorraine. He declared that "the wrong, done to France by Prussia in 1871 in the matter of Alsace-Lorraine should be righted." Up to that time there had been hearty applause for several of the sentiments and war aims enunciated by Mr. Wilson. But when he referred to Alsace-Lorraine, floor and gallery made known its sympathy with this view in a way that left no doubt of the heartiest endorsement of the thing nearest to the heart of France.

With more feeling than he had shown at any time in the delivery of his address today or in any other important utterance made to the Congress, the President began reading his declaration with reference to the lost French provinces.

"All French territory," he said, "should be freed and the invaded portions restored, and the wrong done to France by Prussia in 1871 in the matter of Alsace-Lorraine --" But here he was obliged to pause. A great shout went up from the Senators and Representatives. The whole Congress came to its feet and continued to express its approval with shouts and hand clapping. The galleries too rose to the occasion and soon the House was in a turmoil of enthusiasm that showed the President how deeply the American people were interested in the realization of France's dearest hope.

Demonstration for Russia

The President had read a page and a half of his address before the enthusiasm, which grew in volume with each successive outburst, was manifested. A reference to Mr. Lloyd George's speech was greeted with a round of hand clapping. A minute later his expression of sympathy for the Russian people brought a longer demonstration of approval. It was apparent that the President's words struck home when he declared the intention of the Government to assist the Russians in realizing the ideals that they had set forth in their statement of peace terms to the German envoys at Brest-Litovsk. In this connection, it was noted by many Senators and Representatives that the President's expressions differed somewhat from the declaration made by Mr. Lloyd George with reference to Russia.

The view of the British Prime Minister had been interpreted here as meaning that the British Ministry believed that Russia was lost to the Allies, and that no good could be accomplished by any further effort to bring that country back into the war on the side of the Allies. But according to the opinion most prevalent in Washington after the delivery of the President's address, the United States Government will use every endeavor to make the present Russian authority realize that its views are those of America and that this nation in fighting on is seeking to help Russia achieve the aims laid down at Brest-Litovsk. A view rather generally held among Senators and Representatives is that the President delivered his address today partly to encourage Russia to adhere to the principles proposed to the German Peace Commissioners and to understand that America and the other allied Governments would help her in every way.

Means have already been taken by the Government to have copies of the President's address distributed in Russian, and it is felt in official circles that the heads of the Petrograd authority are bound to be impressed by the sympathy with Russian democratic ideals shown in Mr. Wilson's words.


Hora da saudade: um pouco de humor portugues (involuntario), e antigo

Já que eu estava num antigo blog, aproveitei para dar uma olhada para ver o que havia ainda de aproveitável.
Encontrei estas piadas portuguêsas de dez anos atrás, e espero que a coisa por lá tenha evoluido...
Paulo Roberto de Almeida

08 FEVEREIRO 2006

210) Um pouco de humor não faz mal a ninguém, mas desta vez é de verdade, ó pá!...


Oiça aqui, ó gajo, esta história de embalagens portuguesas é pura verdade.
Assim, pelo menos, m'o asseguraram.
Ou seria uma peta?

Da Lista RIBrasil (ribrasil@grupos.com.br)
Em 8 Fevereiro 2006

Dá para acreditar que estas advertências estão realmente escritas em embalagens de produtos vendidos em Portugal? As advertências aos consumidores abaixo foram colecionadas em hipermercados portugueses, em duas horas apenas, por um médico brasileiro que ministrou curso em Lisboa, a convite da OMS. Todas são absolutamente verdadeiras, inclusive os nomes dos produtos:

Num secador de cabelos:
"NAO USE QUANDO ESTIVER DORMINDO"
(Sei lá, você pode querer ganhar tempo....)

Na embalagem do sabonete anti-séptico Dial:
"INDICAÇÕES: UTILIZAR COMO SABONETE NORMAL"
(Boa! Cabe a cada um imaginar pra que serve um sabonete anormal...)

Em alguns pacotes de refeições congeladas Swan:
"SUGESTÃO DE APRESENTAÇÃO: DESCONGELAR PRIMEIRO"
(É só sugestão! De repente o pessoal pode estar a fim de chupá-las como picolé...)

Numa touca para a ducha:
"VÁLIDO PARA UMA CABEÇA"
(Alguém muito romântico poderia colocar a sua e a da amada na mesma touca...)

Na sobremesa Tiramisú da marca Tesco, impresso no lado de baixo da caixa:
"NÃO INVERTER A EMBALAGEM"
(Oops!!! leu o aviso...é porque já inverteu!)

No pudim da Marks & Spencer:
"ATENÇÃO: O PUDIM ESTARÁ QUENTE DEPOIS DE AQUECIDO"
(Brilhante!)

Na embalagem do ferro de passar Rowenta de fabricação alemã:
"NÃO ENGOMAR A ROUPA SOBRE O CORPO"
(Gostaria de conhecer a infeliz criatura que não deu ouvidos a este aviso)

Num medicamento pediátrico contra o catarro infantil, da Boots:
"NÃO CONDUZA AUTOMÓVEIS NEM MANEJE MAQUINÁRIA PESADA DEPOIS DE TOMAR ESTE MEDICAMENTO"
(Tantos acidentes poderiam ser evitados se fosse possível manter esses travessos miúdos de 4 anos longe dos volantes dos carros e dos tratores Caterpillars)

Nas pastilhas para dormir da Nytol:
"ADVERTÊNCIA: PODE PRODUZIR SONOLÊNCIA"
(Pode não, deve!!!! Foi prá isso que eu comprei!!!!).

Numa faca de cozinha:
"IMPORTANTE: MANTER LONGE DAS CRIANÇAS E ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO"
(Será que lá os cachorros e gatos são ninjas disfarçados? Nunca vi nenhum mexer em faca!!)

Numa caixa de luzes decoração de Natal:
"USAR APENAS NO INTERIOR OU NO EXTERIOR"
(Alguém pode me dizer qual é a 3ª opção??)

Nos pacotes de amendoim da Sainsbury:
"AVISO: CONTÉM AMENDOINS"
(Mania de estragar as surpresas!!)

Numa serra elétrica da Husqvarna, de fabricação sueca:
"NÃO TENTE DETER A SERRA COM AS MÃOS OU OS GENITAIS"
(Kit de castração caseira??!!)

Num saquinho de batatas fritas:
"VOCÊ PODE SER O VENCEDOR. NÃO É NECESSÁRIO COMPRAR. DETALHES DENTRO".
(sem comentários)

Numa fantasia infantil de Super-Homem:
"O USO DESSE TRAJE NÃO O TORNA APTO A VOAR".
(Traumatizante...Olha como isso destrói a imaginação da criança.)

Ainda tem McDonald's na Venezuela? Entao se trata de um pais democratico, dirao os companheiros, mesmo sem batata frita...

Bem, daqui a pouco vão precisar introduzir aquelas tablitas de racionamento como existem em Cuba: cada cliente do McDonald's da Venezuela só terá direito a um Big Mac por mês, dois cones de mandioca, mais três arepas, e um refrigerante bolivariano. O resto fica para ser entregue depois que acabar esse governo miserável...
Paulo Roberto de Almeida

Sem batatas fritas, McDonald's da Venezuela serve mandioca aos clientes

Uol, 7/01/2015

A subsidiária venezuelana do McDonald's começou a servir mandioca frita como acompanhamento principal de seus hambúrgueres devido à escassez de batatas fritas no país.

"O McDonald's Venezuela está trabalhando para resolver essa situação pontual de distribuição. Seguimos brindando a experiência McDonald's com acompanhamentos 100% venezuelanos como mandiocas fritas e 'arepas' (um tipo de pão de farinha de milho) frescas", afirma em comunicado a diretora de comunicações da Arcos Dourados, franquia da empresa americana na América Latina e no Caribe, Sonia Ruseler.

Além dos dois "novos" produtos, a rede também tem oferecido iogurtes, sorvetes ou saladas aos clientes.

"Não temos batatas fritas desde o início de janeiro. Servimos as que estavam no estoque", disse à Agência Efe uma funcionária do McDonald's que não quis ser identificada e afirmou não saber quando o item retornará ao menu.

No final do ano passado, os McDonald's japoneses sofreram um problema similar e limitaram as vendas de batata frita devido a um atraso no fornecimento do produto, algo que ocorreu por causa de greves nos portos dos Estados Unidos.

A Venezuela também recebe batatas colhidas em fazendas americanas.

Questionada via email, Ruseler não respondeu se essa era causa da escassez. Outra possibilidade seria um problema com a entrega de divisas para importar o produto congelado por parte do governo venezuelano.

Na Venezuela existe um controle de câmbio que garante ao Estado o monopólio na compra e venda de moedas. Os valores são taxados pelas autoridades de acordo com o uso do dinheiro.

A situação econômica do país, com uma queda de receita de 30% por causa da crise dos preços do petróleo, reduziu a entrega de dólares às empresas importadoras por parte do Executivo.

No entanto, a ausência de batata frita não tem desestimulado os clientes da rede de fast food, que hoje faziam fila nas lojas visitadas pela Efe. Em uma delas, inclusive, a mandioca também tinha se esgotado.

Quem também não parece preocupado pela situação é um dos principais concorrentes do McDonald's, o Burguer King.

"Motivos para sorriso: as batatas fritas. (Não são exatamente um café da manhã, mas... sim, são deliciosas!)", escreveu em seu perfil no Twitter o Burguer King da Venezuela.

O papel das religioes no progresso civilizatorio (se existe...) - Paulo Roberto de Almeida

Um texto da mesma época do debate sobre os cartoons dinamarqueses. Não reivindico nenhum conhecimento especializado sobre as religiões em geral, e sobre algumas religiões em particular. O que escrevi reflete meu próprio pensamento, num determinado momento. Estou aberto ao debate e ao confronto de ideias...
Paulo Roberto de Almeida
Hartford, 7 de janeiro de 2015

12 FEVEREIRO 2006

218) Sobre a intolerância


Religiões são construções humanas, profundamente humanas (no sentido social ou “societal”, da palavra). Elas podem ter sido elaboradas por algum “profeta” individual, mas são mais exatamente uma construção envolvendo mais de um ator. Como resultado de seu processo de “fabricação”, elas guardam íntima relação com os valores e as crenças normalmente partilhados por uma dada sociedade num determinado momento histórico. 
Este é o caso das grandes religiões modernas – cristianismo, islamismo, budismo –, criadas entre os últimos séculos da antiguidade (inclusive o judaismo moderno) e os primeiros séculos da “era Cristã” (não há como evitar, aqui, o padrão universal de contagem do tempo, criado pelo cristianismo, uma das mais poderosas forças sociais de todo o mundo). Excluo das presentes considerações o hinduismo, que não se tornou tão “universal” como as duas grandes religiões concorrentes, o cristianismo e o islamismo.
Todas as grandes religiões apresentam “benfeitorias”, do ponto de vista da “ideologia” e da “vida social” de uma certa época, sem o que elas não teriam tido sucesso e se disseminado de modo tão amplo. Nem todas essas benfeitorias representam, contudo, progresso absoluto do ponto de vista dos direitos humanos e dos direitos da mulher, mais especificamente, se é possível aceitar o conceito de “progresso” num sentido lato (não parece haver progresso moral da humanidade, stricto senso, como uma interpretação estritamente darwinista da vida social poderia deixar entender).
O judaismo, por exemplo, ao ressaltar os valores da vida humana, da igualdade entre os seres, da submissão a um conjunto de regras para a conduta em sociedade – como evidenciado na lei mosaica –, representou um progresso em relação às religiões de cunho vingativo então existentes. O cristianismo, por sua vez, enfatizou a fraternidade dos homens, ao amor ao próximo, o perdão e a caridade como “benfeitorias” que muito fizeram para elevar o padrão moral da humanidade. Da mesma forma, o budismo trouxe o respeito à vida humana, ou melhor, a qualquer forma de vida a um patamar certamente elevado, enfatizando, como o cristianismo, o respeito a todo ser humano, como pincípio universalmente válido. Essas três religiões me parecem assumir plenamente a tolerância como regra de conduta válida na vida social, mesmo se variantes “fundamentalistas” do cristianismo militante (“evangelizador”, ou de “conversão”) tenham conspurcado a mensagem cristã da aceitação das opiniões de terceiros. 
Em momentos diversos de suas trajetórias históricas, as sociedades que abrigaram essas três grandes religiões com vocação “universalista” passaram por processos reais de secularização e de laicização que diminuiram em muito o papel da religião (e da liturgia, isto é a forma organizada e talvez “burocratizada” da religião) na organização da vida social, na socialização das pessoas, na condução da vida diária. A religião passou à esfera do privado e a vida política e social passou a ser organizada em bases legais e racionais. Este “caminho weberiano” não parece ter sido experimentado, ainda, pelo islamismo, que permanece como um “bloco” indivisível e praticamente impermeável a variações interpretativas. Não houve, como na história do cristianismo, por exemplo, nenhuma divisão entre escolas dotadas de liturgias diferentes (como ocorreu, primeiro, com a cisão entre ortodoxia e catolicismo, depois com a divisão deste na reforma protestante). 
O islamismo “penetra” e domina a vida individual como nenhuma outra religião de vocação universalista o faz. Ele comanda uma submissão total, ocupando não apenas os espaços da vida familiar e social, mas também, em grande medida, os campos político e econômico. Mesmo sociedades islâmicas contemporâneas que passaram por processos de relativa secularização ressentem uma enorme pressão para a aplicação da sharia, isto é, a lei costumeira dos tempos do profeta, cujos princípios parecem ser mais vingativos do que propriamente retributivos.
Essa submissão não se submete, ela mesma, ao crivo da razão, isto é, ao trabalho exegético, eventualmente contestador, que caracteriza o cristianismo como um todo. A “profissão” de teólogo, ou intérprete dos preceitos “divinos” – típica dos povos da Bíblia – praticamente inexiste no islamismo, que abriga apenas “conhecedores” da palavra do profeta. Não há propriamente um “diálogo” com deus, ou com seus “intérpretes oficiais”, uma vez que o que está escrito no livro sagrado é considerado como a própria palavra de deus, insuscetível, portanto, de interpretações ou de “aperfeiçoamentos”. 
A característica mais importante a separar essas religiões, porém, não é apenas a capacidade de interpretar a palavra divina, e sim a faculdade de contestá-la. É possível, dentro da religião cristã, contestar a palavra de Deus, o que pode levar, no máximo, à excomunhão do “incréu”, o que em outros tempos poderia resultar na fogueira. O fato histórico é que essas sociedades evoluiram ao ponto de abolir a condenação da pregação anti-religiosa. É possível ser ateu, iconoclasta, blasfemo militante e até mesmo apóstata, sem incorrer nas iras da lei ou no castigo da instituição religiosa. É possível abandonar ou trocar de religião, sem ter de temer acusação de apostasia ou de crime contra a religião.
Nada disso é possível na religião islâmica: viver à margem ou contra a religião é extremamente perigoso, proclamar publicamente apostasia ou blasfêmia constitui um grave crime contra a religião do profeta, passível da pena de morte. Mas é possível, publicamente, em terras do Islã, repudiar a religião cristã, ou qualquer outra, que não a do profeta. É possível, à esposa não muçulmana de um verdadeiro “crente”, conservar a sua fé, mas ela não poderá educar os seus filhos senão na religião do profeta. 
Trata-se de um verdadeiro “imperialismo” da religião, que assume aspectos por vezes trágico na vida individual ou no relacionamento com pessoas de outros credos. O assunto das charges dinamarquesas, no início de fevereiro de 2006, revelou, por outro lado, todo o potencial de conflito embutido numa religião que pode ser utilizada para fins de mobilização popular. O que esta questão revela é, sobretudo, a intolerância total em relação a “contestações” do sentimento religioso dos seguidores do profeta: mesmo os incréus são passíveis da “pena de morte”, na interpretação dos verdadeiros crentes. 
Não se trata, aqui, de um “conflito entre civilizações”, como muitos proclamam, mas simplesmente de um conflito entre “religião” e “sociedade”, ou seja, de uma dada configuração da estrutura mental das sociedades islâmicas, que as impede de conciliar, ou mais propriamente de separar, manifestações de pensamento e expressões da crença. Não há fissura entre ambas, daí o totalitarismo da palavra se convertendo em totalitarismo da ação. 
Isso se chama intolerância. Ela constitui, no meu modo de ver, uma das mais poderosas barreiras ao necessário processo de “aggiornamento” do islamismo, sem o qual ele será incapaz de juntar às correntes modernas de produção científica e intelectual, ou de oferecer um terreno seguro para o desenvolvimento de formas de organização políticas mais democráticas e abertas à inovação e à criatividade individuais. Essa é uma batalha que vai separar profundamente o islamismo, mas que terá de ser travada algum dia.


Brasília, 12 de fevereiro de 2006

P.S.: Remeto, igualmente, a meu artigo “Tradicionalismo e modernização nas sociedades islâmicas: uma impossível transição entre o fundamentalismo e a tolerância?”, Espaço Acadêmico(Ano I, nº 6, novembro de 2001;http://www.espacoacademico.com.br/06almeida_isla.htm).