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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

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segunda-feira, 5 de fevereiro de 2024

Samuel Pinheiro Guimarães: uma avaliação pessoal - Paulo Roberto de Almeida

Samuel Pinheiro Guimarães: uma avaliação pessoal 

 

Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor.

Nota a partir de postagem de Oliver Stuenkel sobre SPG, cordato, mas equivocado nas ideias. 

 

Escrevi isto em resposta a uma postagem de Oliver Stuenkel, feita no próprio dia da morte de Samuel Pinheiro Guimarães Neto, um charme de pessoa, envelopando ideias mal concebidas. Mais abaixo a postagem original.

PRA: SPG era um caso especial naquilo que eu chamo de universo paralelo da diplomacia brasileira, sempre subordinada ao poder político, por mais equivocado que este pudesse estar (com base numa observação factual dos dados e no estudo das experiências obtidas): uma capacidade de convencer neófitos de fora da carreira de que as posturas adotadas são as melhores possíveis do ponto de vista do interesse nacional, quando partem de suposições equivocadas e não produzem o resultado desejado, apenas ilusões nacionalistas que contentam observadores ingênuos ou mal informados. 

SPG era cordato, cordial e simpático, mas defendeu posturas equivocadas ao longo da carreira, posturas que se conformavam à média do pensamento mediocre das elites. Do contrário, o Brasil poderia ter sido um país mais avançado ao longo do último meio século, que corresponde ao ativismo desse pessoal nacionalista e protecionista. Eles atrasaram o Brasil, mas têm orgulho do que fizeram. Preservaram a soberania e autonomia no subdesenvolvimento e no atraso do País.

Vou resumir: em 1960, quando SPG consolidou o seu pensamento, que aplicou sistematicamente nos 50 anos seguintes, a Coreia do Sul tinha exatamente a METADE da renda per capita do Brasil. Hoje, ela tem o TRIPLO do Brasil. Ou seja, algo eles fizeram de certo, e algo nós fizemos de errado. Examinei esses erros nos livros Nunca Antes na Diplomacia (2014) e nos meus ensaios contrarianistas de Contra a Corrente (2019).

Paulo Roberto de Almeida 


Oliver Stuenkel:

“Faleceu hoje, aos 84 anos, o Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, que foi ministro-chefe de Assuntos Estratégicos entre 2009 e 2010, durante o segundo governo Lula e antes, entre 2003 e 2009, havia sido secretário-geral do Itamaraty, época em que Celso Amorim era o chanceler.  Pinheiro Guimarães também é autor dos livros “Quinhentos Anos de Periferia” e “Desafios Brasileiros na Era dos Gigantes”. Apesar de nunca ter liderado uma embaixada brasileira no exterior, tornou-se uma pessoa influente no Itamaraty durante o governo Lula — em parte porque o chanceler Celso Amorim tinha pouco interesse nos assuntos administrativos do Ministério das Relações Exteriores (MRE) e Pinheiro Guimarães era um profundo conhecedor da política brasiliense, que garantiu que o Itamaraty recebesse quantias inéditas de recursos. A carreira de Pinheiro Guimarães foi bastante atípica: em vez de passar muitos anos no exterior, construiu o que ele chamava de “carreira de funções” e investiu, por anos, na construção de uma rede ímpar de contatos entre na capital. Senadores, deputados, diplomatas, e militares — todo mundo era “amicíssimo”, como costumava dizer. Anotava e lembrava detalhes pessoais de cada conhecido, elemento-chave da arte do networking. Eu sempre concordei com sua convicção de que o Brasil precisava de um MRE mais possante, mas discordamos bastante sobre a política externa brasileira em relação à Venezuela e sobre política comercial, entre várias outras questões. Porém, mesmo ciente das nossas divergências, ele nunca deixou de me enviar seus ensaios, sempre pedindo sugestões e comentários. Em fevereiro de 2012, o convidamos para a Aula Inaugural de Relações Internacionais da FGV (nas fotos, com o Prof. @casaroes).”

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4576, 5 fevereiro 2024, 1 p.


quinta-feira, 1 de fevereiro de 2024

Uma palavra de caução diplomática, acima da simplificação política-ideológica - Paulo Roberto de Almeida sobre a PEI

 Uma palavra de caução diplomática, acima da simplificação política-ideológica

Paulo Roberto de Almeida

A morte de Samuel Pinheiro Guimarães, um grande diplomata que ingressou no Itamaraty sob a PEI, trabalhou metade da carreira sob a ditadura militar e que depois foi protagonista de certa inflexão na política externa sob influência do PT, deu vezo a um tipo de aproximação ou analogia com os tempos passados da PEI e a uma comparação indevida com sua suposta deformação “neoliberal” pela postura externa do Brasil dos anos 1980 e 90 como sendo “submissa” a Washington ou contrária ao tipo de nacionalismo econômico que teria vigorado nos anos 1961-64.

O problema dos rótulos diplomáticos — muito em vigor na própria era militar — é que eles são simplistas e auto atribuídos, dificultando uma análise séria das especificidades contextuais em cada uma das épocas, pois os países dominam apenas uma parte da agenda diplomática, o resto vindo de fora, ao que cada governo tem de reagir, responder, aproveitar as oportunidades externas para alcançar certos beneficios internos.

Creio que tanto a PEI original quanto seu suposto renascimento sob o lulopetismo diplomático estão sendo oversold, com base apenas no slogan, sem que se faça um exame circunstanciado de cada contexto e da própria substância de cada uma das políticas efetivas. 

Análise de PExt tem certos requerimento que ultrapassam os rótulos. Vamos fugir da superfície autodeclarada e examinar o conteúdo de cada proposta. Do contrário é triunfalismo autoproclamado.

Paulo Roberto de Almeida 

Brasília, 1/02/2024

quinta-feira, 7 de novembro de 2019

O Itamaraty de volta a antigas práticas: exoneração do embaixador Samuel Pinheiro Guimarães em 2001

Sempre é bom registrar a história. Tem precedente para qualquer coisa, ou quase.
Dezoito anos depois do embaixador Samuel, foi a minha vez de ser exonerado do IPRI, por razões, digamos, similares, se não semelhantes.
Paulo Roberto de Almeida
São Paulo, quarta-feira, 11 de abril de 2001 
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Embaixador contra a Alca cai no ItamaratyDA REPORTAGEM LOCAL

O embaixador Samuel Pinheiro Guimarães foi demitido do Ipri (Instituto de Pesquisas de Relações Internacionais), do qual era diretor, por manter uma posição diferente da do Itamaraty em relação à Alca (Área de Livre Comércio das Américas).
Para exonerá-lo da função, o Ministério das Relações Exteriores baseou-se na circular baixada pelo ministro Celso Lafer, em fevereiro deste ano, que proíbe qualquer manifestação pública sobre política externa, por parte dos diplomatas, sem autorização superior.
Foi a primeira exoneração de um embaixador de seu cargo com base na "lei da mordaça", como ficou conhecida a norma do ministério.
A posição de Pinheiro Guimarães contra a criação da Alca era pública, o que incomodava o Itamaraty. A gota d'água teria sido a divulgação do texto "A Alca É o Fim do Mercosul", de autoria do embaixador.
De acordo com ele, a indústria nacional não está pronta para competir com a norte-americana, o que poderia causar forte abalo no setor.
A posição do Itamaraty criou polêmica também no meio jurídico, por poder ferir o artigo 5º da Constituição, que garante a todos os brasileiros a inviolabilidade do direito à livre manifestação do pensamento, independentemente de censura ou licença (incisos IV e IX).
O conselheiro Carlos Henrique Cardim assumirá as funções de Pinheiro Guimarães no Ipri. Não está definido ainda para que área do Itamaraty o embaixador será transferido.


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segunda-feira, 23 de setembro de 2019

Política Externa Brasileira e Soberania Nacional - Samuel Pinheiro Guimaraes e Paulo Roberto de Almeida (26/09, Brasilia)

Nesta quinta-feira (26 de setembro) o Seminário Diálogos em Construção terá como tema a 
Política Externa Brasileira e Soberania Nacional 

O evento vai acontecer às 19h30, no Centro Cultural de Brasília (Jesuítas), com a participação dos embaixadores Paulo Roberto de Almeida e Samuel Pinheiro Guimarães Neto.
Mais informações: https://bit.ly/2kR1gKt
O evento terá transmissão ao vivo no canal do youtube do OLMA: https://www.youtube.com/channel/UCLmHVrMFDzLXx0u9mFrom6g 
Fone: 3426-0400






terça-feira, 20 de agosto de 2019

Stalinismo no Itamaraty, não importa se de direita...

Camaradas:
Stalin vive!
O que não quer dizer Viva Stalin!
Ou talvez sim, mas dito de outro lado.
Os camaradas, companheiros, militantes, devotos da causa, compagnons de route, fellow travelers, profissionais do ramo que se instalaram no Itamaraty a partir de 1o. de janeiro de 2019 estão revivendo o Guia Genial dos Povos, em suas técnicas mais conhecidas.
Stalin primeiro apagava seus inimigos ou competidores das fotos e dos livros de história, depois ele os apagava tout court: julgamento sumário, expulsão, condenação ao Gulag, fuzilamento, forca, veneno ou a picareta, como aconteceu com Trotsky.
O Itamaraty ainda não chegou a essa segunda etapa, mas eles já estão seguindo o Stalin da primeira etapa.

Depois que eu fui exonerado do IPRI, numa segunda-feira de Carnaval – o que me deixou livre para aproveitar plenamente o tempo livre para escrever um livro inteiro –, os novos censores, tão stalinistas quanto os apparatchiks que serviam servilmente o Guia Genial do Povos, estão limpando o IPRI e a Funag de todas as más influências que eu possa ter deixado por lá, um pouco de marxismo cultural certamente, mais trotskismo que outras vertentes, uma condenação do lulopetismo diplomático também, acompanhado da condenação à ditadura militar, a nossa e a todas as demais ditaduras do mundo, civis ou militares, enfim, um espírito libertário que não combina com qualquer tipo de pensamento único, de direita ou de esquerda.

Comecei a constatar isso desde o primeiro dia deste ano, quando se opuseram ao número deixado pronto, em dezembro de 2018 da revista do IPRI, Cadernos de Política Exterior.
Como Stalin fazia com as edições sucessivas da História do Partido Comunista da União Soviética, sobretudo depois dos grandes expurgos e fuzilamentos dos anos 1930, quando não só os nomes dos principais bolcheviques de 1917 – com exceção de Lênin, e Djerjinsky, da Tcheca, mas esse fez o favor de morrer antes, do contrário seria eliminado igual –, mas também os próprios foram sumariamente eliminados da face da terra: Bukharin foi um dos primeiros, mas todos os outros passaram pelo moedor de carne stalinista.

Pois não é que o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, ex-secretário geral do Itamaraty nos governos Lula, foi sumariamente apagado dos registros da série "Percursos Diplomáticos", que eu havia criado com o embaixador Stanislau, diretor do Rio Branco, para homenagear os grandes embaixadores aposentados da carreira?
Descobri isso recentemente, ao tentar acessar um a um os vídeos gravados.
Descobri que vários vídeos também sofreram cortes seletivos, para eliminar aquelas más influências que eu mencionei antes.

Tentem vocês mesmos, no site do IPRI:
http://www.funag.gov.br/ipri/index.php/percursos-diplomaticos

SamuelPinheiro

Este vídeo não está disponível.

Preciso avisar meu amigo Samuel para que ele se precavenha.
Vai que o stalinismo dos novos companheiros do Itamaraty passe à segunda etapa...
Nunca se sabe...
Paulo Roberto de Almeida

domingo, 7 de julho de 2019

Outras Palavras: o último reduto dos socialistas utópicos? - leituras edificantes

Em meio a tantas bobagens dos derradeiros defensores do socialismo em nossa imprensa alternativa, o que nos faz sorrir de ver quanto tanta tinta e papel (como aos tempos de Marx), ou quantos bits and bytes, em nossa época, se continua a verter em defesa de causas indefensáveis, pode-se sempre ter boas surpresas, como as "chinesices" brasileiras, trazidas pelos Portugueses que também tinham um enclave no gigante asiático, aliás por 500 anos, e que ainda vai perdurar numa autonomia ilusória até 2049, ainda que Macau nunca tenha tido, como Hong Kong, uma verdadeira autonomia em relação aos desejos da corte em Beijing.
Também tem um artigo que faria corar de vergonha qualquer militante da UNE, sobre a submissão de Paulo Guedes aos "mercados", esse demônio eterno dos anti-mercadistas, socialistas ou não, keynesianos ou cepalianos radicais, como é o caso do meu colega Samuel Pinheiro Guimarães. Poucas vezes li coisas de um simplismo tão vulgar, e de um maniqueísmo tão atroz.
No mais, é a cantilena habitual contra os mercados, os acordos "globalistas", como essa entre a União Europeia e o Mercosul, que os socialistas esperam ardentemente que os ecologistas cumpram suas promessas de destruição, e várias outras bobagens de tamanho família ou em volume reduzido.
Como digo sempre, eu leio de tudo, da extrema esquerda à extrema direita, com muitas bobagens pelo caminho. Sempre procurando aprender, mesmo por vias traversas ou equivocadas como a maior parte dos textos aqui presentes.
Quem não tiver nada a fazer num domingo de inverno, pode se divertir, criticamente, com a leitura de alguns textos aqui apresentados a partir do boletim de Outras Palavras...
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 7 de julho de 2019

Europa-Mercosul: o acordo de Recolonização
Nada assegura que o pré-compromisso de “livre” comércio assinado em 28/6 torne-se realidade um dia. Se assim for, haverá retrocesso secular. Felizmente, já se anuncia resistência — e não apenas na América do Sul
Por Antonio Martins
Socialismo, utopia inviável?
Paradoxo: há pós-capitalismo latente no Big Datae na Inteligência Artificial. Agora, tornou-se possível superar o mercado e planejar a produção de modo democrático, sem o peso da burocracia estatal. Desta brecha surgirá uma das disputas centrais no século XXI
Por Eleutério F. S. Prado
A esquerda volta a pensar além do capital
Surpresa: nos EUA e Inglaterra, uma nova geração de economistas rejeita a ideia de adaptar-se ao sistema e formula projetos opostos à ditadura das corporações e das finanças. Quem são eles? Que ambiente político favorece esta ousadia?
Por Andy Beckett
O (humaníssimo) Direito ao Reparo
Contra a alienação e a obsolescência programada surge uma reivindicação prosaica, mas cheia de sentido. É preciso recobrar o poder de consertar os aparatos que se danificam -- ao invés de descartá-los e afundar no consumismo
Por Valerie Vande Panne
Sanções, arma brutal de um império em apuros
Enfraquecidos diplomaticamente, EUA apelam a sua supremacia financeira e naval para submeter países “desobedientes”. Lista, pouco conhecida, inclui Irã, Venezuela e mais 18. Ilegal, ação mata dezenas de milhares -- mas é cada vez mais ineficaz
Por Medea Benjamin e Nicolas J. S. Davies
Um “liberal” à moda Pinochet
Paulo Guedes é o ministro do ataque à Previdência, da destruição da indústria e da submissão aos EUA. Mas é também o ex-assessor da ditadura chilena que aprendeu a esconder este projeto por trás de gritos em defesa da família, da moral e dos costumes
Um ensaio de Samuel Pinheiro Guimarães
O crime hediondo de Moro, Dallagnol & Companhia
Em parábola do país contemporâneo, papagaio da Disney encontra um Rio diferente do que apresentou ao mundo e aos próprios brasileiros. Há ufanismo e malandros românticos -- mas também a desigualdade brutal que a idealização oculta
Uma crônica de Gabriel Bayarri
Uma resposta popular à gentrificação
Nos EUA, uma cooperativa de trabalhadores, ameaçada pela alta dos alugueis, enfrenta a especulação de forma instigante. Em rede, e por meio de fundo solidário, conseguiu comprar um prédio e transformá-lo em moradias e comércios populares
Por Oscar Perry Abello
“Chinesices”, traço oculto de nossa história colonial
Em pelo menos 30 cidades brasileiras há influência da China na arte e arquitetura. Trazidas pelo portugueses, obras vão além do exotismo, comungam sagrado e profano e inspiraram escritores como Guimarães Rosa e Cora Coralina
Por Sílvio Reis
Previdência, o retrato de um país desigual -- e cruel
84% dos aposentados e pensionistas recebem menos de 2 salários -- os grandes privilegiados, para Paulo Guedes. Enquanto isso, governo dá tratamento VIP a bancos: vista grossa com sonegação, perdão de dívidas e isenção fiscal em seus lucros obscenos
Por Paulo Kliass 


terça-feira, 4 de junho de 2019

Mensagem aos navegantes, de direita e de esquerda - Paulo Roberto de Almeida

Declaração à praça 
(que os antigos gregos chamavam de ágora) 

Aos meus habituais leitores (devem ser algo próximo a 18, segundo copio de meu amigo Alexandre Schwartsman), amigos e inimigos (não os tenho, pessoalmente, mas muitos se consideram meus inimigos políticos, ou ideológicos), petistas e antipetistas, bolsonaristas e lulistas, olavistas e marxistas, enfim, esquerdistas e direitistas em geral: 

Coloquei, com certo destaque neste quilombo de resistência intelectual – dando chamada inclusive para o FB, que eu já tinha abandonado temporariamente –, a entrevista ao The Intercept de meu colega diplomata, grande representante do chamado lulopetismo diplomático (mas possuindo ele mesmo sua autonomia intelectual, como aderente ao nacionalismo desenvolvimentista), Samuel Pinheiro Guimarães, na qual ele classifica o atual chanceler de louco e ridículo, e tece ainda considerações várias sobre o governo Bolsonaro, sua política externa (se existe) e outras questões paralelas. A entrevista, tal como transcrita neste blog, encontra-se neste link: 

https://diplomatizzando.blogspot.com/2019/06/samuel-pinheiro-guimaraes-ernesto.html

Antes que alguém me identifique como partidário ou aderente a qualquer uma das ideias de SPG, apresso-me em dizer que discordo de várias, muitas, quase todas as suas posições diplomáticas, mas o respeito como pensador que é, leitor dedicado e observador atento da realidade, e corajoso defensor de suas ideias e posições políticas e diplomáticas. Ele nunca se eximiu de expressar seu pensamento, sob qualquer governo ou orientação política, e nisso partilhamos da mesma atitude, para não dizer que somos iguais em comportamento. Trata-se aqui de simples reconhecimento de sua integridade, de sua dignidade, de sua honestidade intelectual, ainda que eu possa, como já adiantei, discordar de suas posições e propostas de política externa para o Brasil, e de orientações diplomáticas em particular.

Gostaria de deixar claro, mais um vez, se isso ainda não ficou explícito para certas pessoas, que eu não opus, como me opus, desde antes que assumisse o governo, em 2003, ao regime lulopetista porque este fosse de esquerda, marxista, promotor do dirigismo estatal ou de qualquer outra medida que seus governos tinham o direito legítimo de adotar, dada a sua clara vitória eleitoral, mesmo nos quadros de nossa democracia de baixa qualidade, na qual a demagogia e o populismo não são sancionadas por um eleitorado consciente sobre os fundamentos empíricos das promessas eleitorais. Este não é o ponto.

Eu me opus ao lulopetismo porque, conhecedor direto das bases frágeis de suas posições econômicas – o velho desenvolvimentismo nacionalista inconsequente para resultados positivos em termos de crescimento sustentado do país –, assim da incongruência total de suas posições em política externa – sabedor de suas conexões com o comunismo cubano e suas notórias simpatias por ditaduras execráveis –, sabia que tal regime não seria positivo para o Brasil, sua inserção econômica global e sua diplomacia universalista e não ideológica.

Mas, basicamente, eu me opus ao lulopetismo por duas razões fundamentais, que foram ficando bastante claras desde o início desse regime: por ele ser totalmente INEPTO em economia e profundamente CORRUPTO em termos de ética política. Sempre achei suas principais lideranças tremendamente ambiciosas, sedentas de poder e de riqueza, e que não hesitariam ante qualquer método para assegurar o monopólio do poder. Foi por isso que me opus, desde antes da assunção ao poder, volto a dizer, e sempre declarei isso, em artigos e notas que não hesitei em divulgar, seja em textos publicados em revistas ou comentários feitos em redes de comunicação social (como este veículo, por exemplo). 

Como resultado dessas posições, passei praticamente todo o regime lulopetista no deserto de minhas ocupações funcionais, obstado de servir na Secretaria de Estado das Relações Exteriores, fazendo durante anos da Biblioteca do Itamaraty o meu escritório de trabalho. Como Samuel Pinheiro Guimarães, em outras circunstâncias, paguei o preço de minha coerência e adesão a certas ideias, antes que subserviência ao pensamento único e aos poderosos do momento. Nisso somos iguais, ainda que as divergências sobre política externa e diplomacia sejam evidentes, como deixei claro em diversas obras, livros e artigos.

No momento atual, voltamos, ele e eu, a convergir por razões circunstanciais, na comum oposição a um governo que consideramos inadequado ao Brasil, por diferentes razões, talvez, e também na política externa, mas profundamente conscientes de que a "política externa" (se ela existe, o que não está claro) defendida pelos arautos do regime bolsonarista (e os principais não estão no Itamaraty) é totalmente desajustada às realidades brasileiras e profundamente equivocada no que tange métodos, objetivos, fundamentos e princípios.

Minha postura em relação ao regime lulopetista sempre ficou clara, e coloquei neste espaço de liberdade, neste meu quilombo de resistência intelectual, muitas matérias sobre o que designei como "crimes econômicos do lulopetismo" (mas muitos deles eram também crimes comuns, o que ficou claro na Lava Jato). Como evidenciado em inúmeras matérias de jornalismo investigativo, não contaminadas pela simpatia esquerdista que caracteriza boa parte da imprensa no Brasil, o regime lulopetista demonstrou apoio a ditaduras execráveis do continente, submeteu-se a diretrizes do Foro de S. Paulo, um instrumento do Partido Comunista Cubano para controlar e orientar os partidos de esquerda da América Latina – ao estilo do malfadado Cominform, do stalinismo tardio –, financiou e subsidiou outros governos corruptos na região e alhures, envolveu-se em corrupção notória, não apenas com o objetivo de sustentar o seu monopólio de poder, como também para enriquecer seus dirigentes corruptos e a caixa do partido, transformado em organização criminosa. 

O governo Bolsonaro está demonstrando sua inépcia em várias frentes, e sua total loucura especificamente na frente diplomática. Como sempre fiz, não deixo de registrar minha posição, mesmo ao custo de uma nova travessia do deserto, de um novo ostracismo no Itamaraty, de mais um exílio involuntário, numa trajetória de vida já marcada por um exílio voluntário durante a ditadura militar e um longo limbo durante o lulopetismo.

Independentemente do menor ou maior sucesso do governo na solução dos angustiantes problemas na frente econômica, deixo claro meu repúdio por uma política externa que está alinhando o Brasil a outras personalidades e governos execráveis do ponto de vista dos valores e princípios democráticos e de defesa dos direitos humanos, posições absolutamente ridículas, para usar o adjetivo empregado por SPG em sua entrevista, em face dos interesses concretos do Brasil em terrenos como comércio internacional, meio ambiente, defesa e promoção dos direitos humanos, liberdades democráticas nos ambientes educacionais e em outros foros de debates sobre políticas públicas. 

Registro, por fim, que esse termo "ridículo" foi justamente utilizado por mim num comentário a artigos de política externa que eu postei em meu  blog Diplomatizzando, pouco antes de ser exonerado de meu cargo como Diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais do Itamaraty, o mesmo cargo, aliás, que detinha Samuel Pinheiro Guimarães em 2001, e de onde foi também expurgado pelo arbítrio dos poderosos daquele momento.

Eu me solidarizei imediatamente com Samuel assim que soube de sua exoneração, assim como ele se solidarizou comigo, alguns meses depois, por ter sido sancionado pela chamada "Lei da Mordaça"– aliás, criada especialmente com o objetivo de "controlar" SPG, que começava a propagar sua oposição a determinadas posturas da política externa, como a participação nas negociações da Alca, cujo início, diga-se de passagem, contou com a concordância do então chanceler do presidente Itamar Franco, em 1994, embaixador Celso Amorim, novamente chanceler sob o lulopetismo –, o que ocorreu duas vezes por telegrama da SERE, no seguimento de artigos ou entrevistas que eu concedi, sem qualquer desrespeito à Lei do Serviço Exterior, cuja legitimidade sempre defendi, o que não ocorria com a famigerada Lei da Mordaça, uma espécie de censura prévia a qualquer manifestação pública dos diplomatas. Isso ocorreu entre 2001 e 2002, antes, portanto, da chegada ao poder do primeiro dos governos lulopetistas. Agora, em 2019, Samuel me telefonou para se solidarizar comigo quando de minha exoneração.

Relembrando que os mesmos gestos de solidariedade recíproca já tinham ocorrido naquela primeira oportunidade, combinei com Samuel tomar umas cervejas, o que ainda não ocorreu, e tratar da criação de um "clube dos defenestrados", do qual seríamos os primeiros sócios originais.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 4 de junho de 2019

Samuel Pinheiro Guimarães critica atual política externa - The Intercept

Faço a transcrição completa da entrevista com SPG em postagem colada a esta: 

que remete à íntegra da entrevista de Samuel, no site do The Intercept
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 4 de junho de 2019

Samuel Guimarães: Ernesto Araújo é “ridículo” e “um louco” e Bolsonaro não deve passar de julho

“Uma eventual presidência de Hamilton Mourão não deve causar receios de uma nova ditadura militar”, afirmou também o embaixador
Revista Fórum, 3 de junho de 2019


Foto: Agência Brasil
O embaixador Samuel Pinheiro Guimarães Neto, ex-secretário-geral do Itamaraty durante o governo Lula, entre 2003 e 2009, declarou, em entrevista publicada no The Intercept Brasil, nesta segunda-feira (3), que o chanceler Ernesto Araújo é “ridículo” e “um louco”.
Além disso, ele disse também que o governo Jair Bolsonaro não deve passar de julho e uma eventual presidência de Hamilton Mourão não deve causar receios de uma nova ditadura militar.
Guimarães trabalhou no Itamaraty de 1963 a 2009 e depois foi professor de política internacional e política externa do Instituto Rio Branco, a escola de formação dos diplomatas brasileiros, até 2016. Muito ligado ao PT – mas respeitado por colegas como Paulo Roberto de Almeida, crítico feroz do que chama de “lulo-petismo” –, ele defendeu, ao longo de quase duas horas de conversa, as bandeiras da política externa do governo Lula, inclusive o alinhamento com o chavismo na Venezuela.

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Addendum: O link colocado por The Intercetp ao meu nome, remete à palestra efetuada por Samuel Pinheiro Guimarães no quadro da série "Percursos Diplomáticos", para a qual eu o convidei em agosto de 2018: 
https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/08/percursos-diplomaticos-samuel-pinheiro_24.html