Samuel Pinheiro Guimarães: uma avaliação pessoal
Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor.
Nota a partir de postagem de Oliver Stuenkel sobre SPG, cordato, mas equivocado nas ideias.
Escrevi isto em resposta a uma postagem de Oliver Stuenkel, feita no próprio dia da morte de Samuel Pinheiro Guimarães Neto, um charme de pessoa, envelopando ideias mal concebidas. Mais abaixo a postagem original.
PRA: SPG era um caso especial naquilo que eu chamo de universo paralelo da diplomacia brasileira, sempre subordinada ao poder político, por mais equivocado que este pudesse estar (com base numa observação factual dos dados e no estudo das experiências obtidas): uma capacidade de convencer neófitos de fora da carreira de que as posturas adotadas são as melhores possíveis do ponto de vista do interesse nacional, quando partem de suposições equivocadas e não produzem o resultado desejado, apenas ilusões nacionalistas que contentam observadores ingênuos ou mal informados.
SPG era cordato, cordial e simpático, mas defendeu posturas equivocadas ao longo da carreira, posturas que se conformavam à média do pensamento mediocre das elites. Do contrário, o Brasil poderia ter sido um país mais avançado ao longo do último meio século, que corresponde ao ativismo desse pessoal nacionalista e protecionista. Eles atrasaram o Brasil, mas têm orgulho do que fizeram. Preservaram a soberania e autonomia no subdesenvolvimento e no atraso do País.
Vou resumir: em 1960, quando SPG consolidou o seu pensamento, que aplicou sistematicamente nos 50 anos seguintes, a Coreia do Sul tinha exatamente a METADE da renda per capita do Brasil. Hoje, ela tem o TRIPLO do Brasil. Ou seja, algo eles fizeram de certo, e algo nós fizemos de errado. Examinei esses erros nos livros Nunca Antes na Diplomacia (2014) e nos meus ensaios contrarianistas de Contra a Corrente (2019).
Paulo Roberto de Almeida
Oliver Stuenkel:
“Faleceu hoje, aos 84 anos, o Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, que foi ministro-chefe de Assuntos Estratégicos entre 2009 e 2010, durante o segundo governo Lula e antes, entre 2003 e 2009, havia sido secretário-geral do Itamaraty, época em que Celso Amorim era o chanceler. Pinheiro Guimarães também é autor dos livros “Quinhentos Anos de Periferia” e “Desafios Brasileiros na Era dos Gigantes”. Apesar de nunca ter liderado uma embaixada brasileira no exterior, tornou-se uma pessoa influente no Itamaraty durante o governo Lula — em parte porque o chanceler Celso Amorim tinha pouco interesse nos assuntos administrativos do Ministério das Relações Exteriores (MRE) e Pinheiro Guimarães era um profundo conhecedor da política brasiliense, que garantiu que o Itamaraty recebesse quantias inéditas de recursos. A carreira de Pinheiro Guimarães foi bastante atípica: em vez de passar muitos anos no exterior, construiu o que ele chamava de “carreira de funções” e investiu, por anos, na construção de uma rede ímpar de contatos entre na capital. Senadores, deputados, diplomatas, e militares — todo mundo era “amicíssimo”, como costumava dizer. Anotava e lembrava detalhes pessoais de cada conhecido, elemento-chave da arte do networking. Eu sempre concordei com sua convicção de que o Brasil precisava de um MRE mais possante, mas discordamos bastante sobre a política externa brasileira em relação à Venezuela e sobre política comercial, entre várias outras questões. Porém, mesmo ciente das nossas divergências, ele nunca deixou de me enviar seus ensaios, sempre pedindo sugestões e comentários. Em fevereiro de 2012, o convidamos para a Aula Inaugural de Relações Internacionais da FGV (nas fotos, com o Prof. @casaroes).”
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 4576, 5 fevereiro 2024, 1 p.
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