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quinta-feira, 28 de maio de 2020

Itamaraty cancela apoio ao CEBRI após carta crítica a Ernesto - Edoardo Ghirotto (Veja)

Itamaraty cancela apoio a centro de estudos após carta crítica a Ernesto
Chanceler ordenou que a Fundação Alexandre de Gusmão revogasse um contrato de operação técnica com o Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri)

Por Edoardo Ghirotto - Revista VEJA, 28 maio 2020, 13h56 

O chanceler Ernesto Araújo promoveu nova retaliação contra críticos de sua gestão no Itamaraty. Na última semana, Araújo ordenou que a Fundação Alexandre de Gusmão (Funag), órgão do Ministério das Relações Exteriores voltado para pesquisas e divulgação, rompesse um contrato de parceria técnica com o Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), um think thank independente e suprapartidário composto por diplomatas e acadêmicos de renome.
O motivo para o fim da parceria foi uma carta divulgada no último dia 10 por 27 membros do Cebri, entre eles o ex-chanceler Rubens Ricupero, os ex-ministros Aldo Rebelo e Pedro Malan e os diplomatas Marcos Azambuja, Luiz Augusto de Castro Neves e Roberto Abdenur. O documento expressava “grave e urgente preocupação” com a condução da política externa brasileira e os “prejuízos” que ela trouxe ao país.
Na semana seguinte à divulgação da carta, a Funag entrou em contato com a direção do Cebri para informar que um contrato de cooperação técnica assinado em 2017 seria rompido. A parceria não previa o aporte de fundos, mas servia para que os dois centros de estudo organizassem eventos e projetos de pesquisa em conjunto. O Cebri também utilizava as dependências de prédios do Itamaraty para realizar conferências.
Araújo tem demonstrado maior irritação com os críticos desde que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso se uniu a Ricupero e a outros ex-chanceleres para divulgar um artigo com questionamentos à gestão do Itamaraty e ao governo de Jair Bolsonaro. O documento foi publicado em inglês e espanhol e teve ampla repercussão no exterior. Fora do tom diplomático, Araújo declarou que o artigo fora escrito por “paladinos da hipocrisia” e “figuras menores”.
Recentemente, o jornal O Globo publicou uma reportagem em que mostra como a Funag se transformou num think thank dedicado ao pensamento conspiracionista do escritor Olavo de Carvalho, que foi responsável pela indicação de Araújo ao Itamaraty. Sob a direção de Roberto Goidanich, a Funag abriu espaço para blogueiros e militantes bolsonaristas darem palestras em vez de professores e diplomatas.
Nas exposições que o jornal acompanhou, palestrantes disseram que o ex-presidente americano Barack Obama é um “radical de extrema esquerda” e que o uso de máscaras contra a Covid-19 se assemelha aos gulags criados pelo ditador soviético Josef Stalin.
O aparelhamento ideológico tem preocupado diplomatas e acadêmicos porque a Funag sempre exerceu um papel importante na formação do pensamento de jovens que ingressam na carreira. Há o temor de que, no futuro, obras de Olavo de Carvalho sejam incluídas nos exames do Instituto Rio Branco, que organiza os concursos para diplomatas.


quinta-feira, 18 de julho de 2019

Entrevista de Paulo Roberto de Almeida ao jornal Metrópoles

“Indicação de Eduardo é grande bobagem de Bolsonaro”, diz embaixador

Lotado na Divisão do Arquivo do Itamaraty, Paulo Roberto de Almeida diz que filho do presidente demonstra "adesão sabuja" aos EUA




Foto: Igo Estrela, 17/07/2019
 O embaixador Paulo Roberto de Almeida, de 69 anos, tornou-se personagem de um dos episódios mais simbólicos das mudanças implantadas no Itamaraty pelo governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL). Em pleno Carnaval, ele recebeu a notícia de que estava demitido da presidência do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (IPRI).

Ainda na ativa, mas indesejado pelo governo, Almeida está agora lotado na Divisão do Arquivo do Itamaraty, onde tem tempo para se dedicar à produção intelectual. Entre os diplomatas, o embaixador se destaca por ser um dos poucos profissionais que faz críticas públicas na área em que atua.

Em entrevista ao Metrópoles, o embaixador deu opiniões fortes, por exemplo, sobre a indicação de Eduardo Bolsonaro, filho do presidente, para embaixador do Brasil no Estados Unidos.
“A indicação de Eduardo é uma grande bobagem de Bolsonaro”, disse o embaixador. “Esse filho do presidente não está qualificado para o cargo e, no plano das relações políticas e diplomáticas Brasil-Estados Unidos, já demonstrou uma adesão sabuja ao Trump”, acrescentou. 

Como exemplo, ele lembra as duas vezes que Eduardo passeou nos EUA com um boné de campanha pela reeleição do presidente Donald Trump em 2020. Ao interferir na política interna de outro país, lembra Almeida, Eduardo contraria a Constituição brasileira.
A razão da perda do cargo no IPRI foram artigos que ele publicou com questionamentos sobre política externa brasileira implementada pelo chanceler Ernesto Araújo. Um dos textos era de autoria do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
Crítico contumaz dos governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff – chamados por ele de lulo-petistas -, Almeida entrou em choque direto também com as ideias e as práticas de Araújo, a quem conheceu ainda na década de 1990.
Em consequência das novas diretrizes, aponta o diplomata, o Brasil abandonou a tradição de dar prioridade aos organismos multilaterais, desprezados pelas diretrizes atuais. Almeida também discorda da pregação do atual governo de que atua sem ideologia. 

“O que mais tem nesse governo é ideologia. Uma ideologia de direita, uma ideologia conservadora, ou até uma grande confusão mental sobre o que significa ser de direita, conservador ou antimarxista”, afirma.

As impressões do embaixador sobre as mudanças ocorridas no Itamaraty nos últimos anos estão registradas no livro Miséria da Diplomacia: a destruição da inteligência no Itamaraty, edição de autor, lançado agora em plataforma digital.
Trata-se de uma obra de grande relevância para se entender o que se passa no Ministério das Relações Exteriores (MRE) no governo atual. Para o embaixador, o Itamaraty vive uma “revolução cultural” em decorrência da agenda defendida por Araújo, com base no pensamento do escritor Olavo de Carvalho, a quem chama de “sofista da Virgínia”.
Ao Metrópoles, o embaixador também avaliou a importância do acordo fechado entre o Mercosul e a União Europeia. Na sua opinião, Bolsonaro e Araújo nada têm a ver com esse feito, mas sim com o ministro da Economia, Paulo Guedes, e sua equipe.

Por fim, Almeida fala sobre o impacto das mudanças implantadas pelo governo Bolsonaro no MRE. “Há um retrocesso mental muito penoso para diplomatas”, disse. “ Eu me expresso livremente. A maior parte dos diplomatas considera deploráveis as posições adotadas atualmente, mas eles não ousam se pronunciar porque todos eles dependem um pouco do gabinete para a sua promoção, para a sua remoção para postos de prestígio ou para a assunção para cargos de chefia no Itamaraty.”.

Veja a entrevista em vídeo aqui: https://youtu.be/gfZ4EPaiJv4

terça-feira, 4 de junho de 2019

Mensagem aos navegantes, de direita e de esquerda - Paulo Roberto de Almeida

Declaração à praça 
(que os antigos gregos chamavam de ágora) 

Aos meus habituais leitores (devem ser algo próximo a 18, segundo copio de meu amigo Alexandre Schwartsman), amigos e inimigos (não os tenho, pessoalmente, mas muitos se consideram meus inimigos políticos, ou ideológicos), petistas e antipetistas, bolsonaristas e lulistas, olavistas e marxistas, enfim, esquerdistas e direitistas em geral: 

Coloquei, com certo destaque neste quilombo de resistência intelectual – dando chamada inclusive para o FB, que eu já tinha abandonado temporariamente –, a entrevista ao The Intercept de meu colega diplomata, grande representante do chamado lulopetismo diplomático (mas possuindo ele mesmo sua autonomia intelectual, como aderente ao nacionalismo desenvolvimentista), Samuel Pinheiro Guimarães, na qual ele classifica o atual chanceler de louco e ridículo, e tece ainda considerações várias sobre o governo Bolsonaro, sua política externa (se existe) e outras questões paralelas. A entrevista, tal como transcrita neste blog, encontra-se neste link: 

https://diplomatizzando.blogspot.com/2019/06/samuel-pinheiro-guimaraes-ernesto.html

Antes que alguém me identifique como partidário ou aderente a qualquer uma das ideias de SPG, apresso-me em dizer que discordo de várias, muitas, quase todas as suas posições diplomáticas, mas o respeito como pensador que é, leitor dedicado e observador atento da realidade, e corajoso defensor de suas ideias e posições políticas e diplomáticas. Ele nunca se eximiu de expressar seu pensamento, sob qualquer governo ou orientação política, e nisso partilhamos da mesma atitude, para não dizer que somos iguais em comportamento. Trata-se aqui de simples reconhecimento de sua integridade, de sua dignidade, de sua honestidade intelectual, ainda que eu possa, como já adiantei, discordar de suas posições e propostas de política externa para o Brasil, e de orientações diplomáticas em particular.

Gostaria de deixar claro, mais um vez, se isso ainda não ficou explícito para certas pessoas, que eu não opus, como me opus, desde antes que assumisse o governo, em 2003, ao regime lulopetista porque este fosse de esquerda, marxista, promotor do dirigismo estatal ou de qualquer outra medida que seus governos tinham o direito legítimo de adotar, dada a sua clara vitória eleitoral, mesmo nos quadros de nossa democracia de baixa qualidade, na qual a demagogia e o populismo não são sancionadas por um eleitorado consciente sobre os fundamentos empíricos das promessas eleitorais. Este não é o ponto.

Eu me opus ao lulopetismo porque, conhecedor direto das bases frágeis de suas posições econômicas – o velho desenvolvimentismo nacionalista inconsequente para resultados positivos em termos de crescimento sustentado do país –, assim da incongruência total de suas posições em política externa – sabedor de suas conexões com o comunismo cubano e suas notórias simpatias por ditaduras execráveis –, sabia que tal regime não seria positivo para o Brasil, sua inserção econômica global e sua diplomacia universalista e não ideológica.

Mas, basicamente, eu me opus ao lulopetismo por duas razões fundamentais, que foram ficando bastante claras desde o início desse regime: por ele ser totalmente INEPTO em economia e profundamente CORRUPTO em termos de ética política. Sempre achei suas principais lideranças tremendamente ambiciosas, sedentas de poder e de riqueza, e que não hesitariam ante qualquer método para assegurar o monopólio do poder. Foi por isso que me opus, desde antes da assunção ao poder, volto a dizer, e sempre declarei isso, em artigos e notas que não hesitei em divulgar, seja em textos publicados em revistas ou comentários feitos em redes de comunicação social (como este veículo, por exemplo). 

Como resultado dessas posições, passei praticamente todo o regime lulopetista no deserto de minhas ocupações funcionais, obstado de servir na Secretaria de Estado das Relações Exteriores, fazendo durante anos da Biblioteca do Itamaraty o meu escritório de trabalho. Como Samuel Pinheiro Guimarães, em outras circunstâncias, paguei o preço de minha coerência e adesão a certas ideias, antes que subserviência ao pensamento único e aos poderosos do momento. Nisso somos iguais, ainda que as divergências sobre política externa e diplomacia sejam evidentes, como deixei claro em diversas obras, livros e artigos.

No momento atual, voltamos, ele e eu, a convergir por razões circunstanciais, na comum oposição a um governo que consideramos inadequado ao Brasil, por diferentes razões, talvez, e também na política externa, mas profundamente conscientes de que a "política externa" (se ela existe, o que não está claro) defendida pelos arautos do regime bolsonarista (e os principais não estão no Itamaraty) é totalmente desajustada às realidades brasileiras e profundamente equivocada no que tange métodos, objetivos, fundamentos e princípios.

Minha postura em relação ao regime lulopetista sempre ficou clara, e coloquei neste espaço de liberdade, neste meu quilombo de resistência intelectual, muitas matérias sobre o que designei como "crimes econômicos do lulopetismo" (mas muitos deles eram também crimes comuns, o que ficou claro na Lava Jato). Como evidenciado em inúmeras matérias de jornalismo investigativo, não contaminadas pela simpatia esquerdista que caracteriza boa parte da imprensa no Brasil, o regime lulopetista demonstrou apoio a ditaduras execráveis do continente, submeteu-se a diretrizes do Foro de S. Paulo, um instrumento do Partido Comunista Cubano para controlar e orientar os partidos de esquerda da América Latina – ao estilo do malfadado Cominform, do stalinismo tardio –, financiou e subsidiou outros governos corruptos na região e alhures, envolveu-se em corrupção notória, não apenas com o objetivo de sustentar o seu monopólio de poder, como também para enriquecer seus dirigentes corruptos e a caixa do partido, transformado em organização criminosa. 

O governo Bolsonaro está demonstrando sua inépcia em várias frentes, e sua total loucura especificamente na frente diplomática. Como sempre fiz, não deixo de registrar minha posição, mesmo ao custo de uma nova travessia do deserto, de um novo ostracismo no Itamaraty, de mais um exílio involuntário, numa trajetória de vida já marcada por um exílio voluntário durante a ditadura militar e um longo limbo durante o lulopetismo.

Independentemente do menor ou maior sucesso do governo na solução dos angustiantes problemas na frente econômica, deixo claro meu repúdio por uma política externa que está alinhando o Brasil a outras personalidades e governos execráveis do ponto de vista dos valores e princípios democráticos e de defesa dos direitos humanos, posições absolutamente ridículas, para usar o adjetivo empregado por SPG em sua entrevista, em face dos interesses concretos do Brasil em terrenos como comércio internacional, meio ambiente, defesa e promoção dos direitos humanos, liberdades democráticas nos ambientes educacionais e em outros foros de debates sobre políticas públicas. 

Registro, por fim, que esse termo "ridículo" foi justamente utilizado por mim num comentário a artigos de política externa que eu postei em meu  blog Diplomatizzando, pouco antes de ser exonerado de meu cargo como Diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais do Itamaraty, o mesmo cargo, aliás, que detinha Samuel Pinheiro Guimarães em 2001, e de onde foi também expurgado pelo arbítrio dos poderosos daquele momento.

Eu me solidarizei imediatamente com Samuel assim que soube de sua exoneração, assim como ele se solidarizou comigo, alguns meses depois, por ter sido sancionado pela chamada "Lei da Mordaça"– aliás, criada especialmente com o objetivo de "controlar" SPG, que começava a propagar sua oposição a determinadas posturas da política externa, como a participação nas negociações da Alca, cujo início, diga-se de passagem, contou com a concordância do então chanceler do presidente Itamar Franco, em 1994, embaixador Celso Amorim, novamente chanceler sob o lulopetismo –, o que ocorreu duas vezes por telegrama da SERE, no seguimento de artigos ou entrevistas que eu concedi, sem qualquer desrespeito à Lei do Serviço Exterior, cuja legitimidade sempre defendi, o que não ocorria com a famigerada Lei da Mordaça, uma espécie de censura prévia a qualquer manifestação pública dos diplomatas. Isso ocorreu entre 2001 e 2002, antes, portanto, da chegada ao poder do primeiro dos governos lulopetistas. Agora, em 2019, Samuel me telefonou para se solidarizar comigo quando de minha exoneração.

Relembrando que os mesmos gestos de solidariedade recíproca já tinham ocorrido naquela primeira oportunidade, combinei com Samuel tomar umas cervejas, o que ainda não ocorreu, e tratar da criação de um "clube dos defenestrados", do qual seríamos os primeiros sócios originais.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 4 de junho de 2019