“Indicação de Eduardo é grande bobagem de Bolsonaro”, diz embaixador
Lotado na Divisão do Arquivo do Itamaraty, Paulo Roberto de Almeida diz que filho do presidente demonstra "adesão sabuja" aos EUA
Foto: Igo Estrela, 17/07/2019
O embaixador Paulo Roberto de
Almeida, de 69 anos, tornou-se personagem de um dos episódios mais simbólicos
das mudanças implantadas no Itamaraty pelo governo do presidente Jair Bolsonaro
(PSL). Em pleno Carnaval, ele recebeu a notícia de que estava demitido da
presidência do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (IPRI).
Ainda na ativa, mas indesejado pelo governo, Almeida
está agora lotado na Divisão do Arquivo do Itamaraty, onde tem tempo para se
dedicar à produção intelectual. Entre os diplomatas, o embaixador se destaca
por ser um dos poucos profissionais que faz críticas públicas na área em que
atua.
Em entrevista ao Metrópoles, o
embaixador deu opiniões fortes, por exemplo, sobre a indicação de Eduardo
Bolsonaro, filho do presidente, para embaixador do Brasil no
Estados Unidos.
“A indicação de
Eduardo é uma grande bobagem de Bolsonaro”, disse o embaixador. “Esse filho do
presidente não está qualificado para o cargo e, no plano das relações políticas
e diplomáticas Brasil-Estados Unidos, já demonstrou uma adesão sabuja ao
Trump”, acrescentou.
Como exemplo, ele
lembra as duas vezes que Eduardo passeou nos EUA com um boné de campanha pela
reeleição do presidente Donald Trump em 2020. Ao interferir na política interna
de outro país, lembra Almeida, Eduardo contraria a Constituição brasileira.
A razão da perda do cargo no IPRI foram
artigos que ele publicou com questionamentos sobre política externa brasileira
implementada pelo chanceler Ernesto
Araújo.
Um dos textos era de autoria do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
Crítico contumaz dos governos Luiz
Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff – chamados por ele de lulo-petistas -,
Almeida entrou em choque direto também com as ideias e as práticas de Araújo, a
quem conheceu ainda na década de 1990.
Em consequência das novas diretrizes, aponta o
diplomata, o Brasil abandonou a tradição de dar prioridade aos organismos
multilaterais, desprezados pelas diretrizes atuais. Almeida também discorda da
pregação do atual governo de que atua sem ideologia.
“O
que mais tem nesse governo é ideologia. Uma ideologia de direita, uma ideologia
conservadora, ou até uma grande confusão mental sobre o que significa ser de
direita, conservador ou antimarxista”, afirma.
Trata-se de uma obra de grande
relevância para se entender o que se passa no Ministério das Relações
Exteriores (MRE) no governo atual. Para o embaixador, o Itamaraty vive uma
“revolução cultural” em decorrência da agenda defendida por Araújo, com base no
pensamento do escritor Olavo de Carvalho, a quem chama de “sofista da Virgínia”.
Ao Metrópoles, o embaixador também avaliou
a importância do acordo fechado entre o Mercosul
e a União Europeia. Na sua opinião, Bolsonaro e Araújo nada têm a ver
com esse feito, mas sim com o ministro da Economia, Paulo Guedes, e sua equipe.
Por fim, Almeida fala sobre o impacto das mudanças
implantadas pelo governo Bolsonaro no MRE. “Há um retrocesso mental muito
penoso para diplomatas”, disse. “ Eu me expresso livremente. A maior parte dos diplomatas considera
deploráveis as posições adotadas atualmente, mas eles não ousam se pronunciar
porque todos eles dependem um pouco do gabinete para a sua promoção, para a sua
remoção para postos de prestígio ou para a assunção para cargos de chefia no
Itamaraty.”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário