O chanceler paraguaio acaba de renunciar ao posto, e o presidente corre risco de sofrer processo no Parlamento, que julga lesivo ao Paraguai a revisão do acordo sobre Itaipu Binacional com o Brasil.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 30 de julho de 2019
Acordo sobre Itaipu abre crise no
Paraguai
O Estado de S. Paulo, 27/07/2019
Críticas.
Oposição diz que termos do pacto assinado por representantes do presidente
Mario Abdo Benítez são ‘extorsivos’, afetariam o preço da energia pago pelos
paraguaios e ameaça abrir processo de impeachment por mau desempenho das
funções presidenciais.
O acordo
firmado entre Brasil e Paraguai para a exploração da energia gerada pela usina
hidrelétrica de Itaipu criou uma crise para o presidente Mario Abdo Benítez. O
Partido Liberal, principal da oposição paraguaia, criticou os termos assinados,
que seriam “extorsivos e degradantes”, e planeja abrir um “julgamento por mau
desempenho das funções presidenciais” contra Abdo Benítez.
A mudança nos
termos do acordo para a exploração da energia da usina hidrelétrica,
compartilhada pelos dois países, estava sendo negociada desde março, mas apenas
em maio Brasil e Paraguai chegaram a um acordo. A oposição diz que as novas
condições impostas aumentariam o preço que os paraguaios pagam pela energia.
O presidente
do Partido Liberal, Efraín Alegre, disse ontem em entrevista que o acordo,
assinado no último dia 24 de maio, deve ser “rejeitado de maneira categórica
por atentar contra os direitos do Paraguai em Itaipu”.
Além disso,
Alegre criticou Abdo Benítez pela demora em divulgar o acordo, só revelado ao
público após a renúncia do presidente da Administração Nacional de Eletricidade
(Ande), Pedro Ferreira, que teria entregado o cargo por discordar dos termos do
acordo.
A renúncia de
Ferreira foi aceita na quinta-feira pelo presidente paraguaio, que indicou para
substituí-lo o ex-ministro da Fazenda Alcides Jiménez. Segundo o novo
presidente da Ande, o acordo não lesa a soberania nacional nem afetará as
tarifas de energia no país, como afirmam a oposição e alguns veículos da
imprensa.
O ex-chanceler
do Paraguai Miguel Abdón Saguier, também do Partido Liberal, afirmou que a
Constituição obriga o presidente a submeter o acordo à avaliação do Congresso.
“Ele vai incorrer em mau desempenho das suas funções”, disse Saguier, abrindo
caminho para um possível processo de impeachment.
Axel Benítez,
assessor técnico do Partido Liberal, explicou à agência EFE que o acordo
representará um aumento do custo da energia para os paraguaios. Segundo ele, o
documento estabelece dois tipos de energia diferentes, a “garantida” e a “excedente”,
e prevê que o Paraguai receba maior quantidade da primeira, de custo mais
elevado.
Transparência.
Os termos do atual acordo foram estabelecidos em 2009, quando o então
presidente do Paraguai, Fernando Lugo, negociou com o ex-presidente Luiz Inácio
Lula da Silva condições que permitiram ao Paraguai receber US$ 360 milhões ao
ano por negociar a energia excedente de Itaipu com o Brasil. Antes, o montante
era de US$ 120 milhões.
Ontem,
Fernando Lugo, que atualmente ocupa uma cadeira no Senado pelo partido de
oposição Frente Guasú, disse que não é aconselhável se apressar quando se fala
de impeachment de Abdo Benítez por mau desempenho das funções.
Lugo, que foi
destituído em um julgamento político relâmpago em 2012, expressou cautela.
“Muitas vezes nos apressamos. Deve haver muitos condimentos para um julgamento
político e uma discussão muito mais ampla em todos os partidos políticos que
fazem parte do Congresso Nacional”, disse o senador.
O embaixador
paraguaio em Brasília, Hugo Saguier, que colocou sua assinatura no acordo,
esclareceu que não houve “nenhuma renúncia de soberania” do Paraguai em relação
ao Brasil.
O documento
foi assinado sem que nenhuma autoridade tivesse informado à opinião pública, o
que fez com que parte da oposição denunciasse que o governo paraguaio estaria
fazendo concessões ao Brasil.
Impasse.
Saguier reconheceu que a questão não foi resolvida em nível técnico e disse
que, por esse motivo, os representantes diplomáticos dos dois países se
reuniram novamente. “Mas isso não representará nenhum aumento de tarifa de
energia elétrica para os paraguaios”, garantiu o embaixador.
O impasse
entre as empresas de energia do Brasil e do Paraguai, Eletrobrás e Ande, existe
por conta da diferença no preço que cada uma paga pela energia de Itaipu. Essa
questão tem sido objeto de tensão entre os dois países porque, enquanto a
Eletrobrás contrata toda a potência de que vai necessitar, dos 75 milhões de
megawatts-hora (MWh) que Itaipu produz anualmente, a Ande contrata praticamente
a metade do que vai consumir.
No entanto,
sempre que precisa de mais energia, o Paraguai usa essa chamada energia
adicional, que é bem mais barata, o que desagrada ao Brasil. Essa diferença
impacta no preço diferenciado, muito menor, pago pelos paraguaios pela energia
de Itaipu, em relação aos brasileiros. Em 2018, o Brasil pagou, em média, US$
38,72 por megawatt-hora (MWh), enquanto o Paraguai pagou, em média, US$ 24,60.
“(O acordo)
deve ser discutido e depois rejeitado pelo Congresso por ser extorsivo e
degradante”
Efraín Alegre, PRESIDENTE DO
PARTIDO LIBERAL, PRINCIPAL DA OPOSIÇÃO NO PARAGUAI
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Paraguai decide deixar "sem efeito" acordo com Brasil sobre Itaipu
O ministro das Relações Exteriores do
Paraguai, Luis Alberto Castiglioni, anunciou na noite desse domingo (28/07/2019) a decisão do governo de
Mario Abdo Benítez de “deixar sem efeito o acordo bilateral” com o Brasil de contratação de energia da
represa de Itaipu, documento que estabelecia um cronograma de compra até 2022. São informações do
Estadão.
Embora a assinatura do acordo tenha acontecido em maio, os paraguaios só souberam de sua existência na semana passada. O ex-titular da estatal paraguaia Administração Nacional de Energia (Ande) Pedro Ferreira renunciou na semana passada após vazamento do conteúdo da ata que tinha solicitado em fevereiro a intervenção do ministério para solucionar uma crise de contratação entre a Ande e a brasileira Eletrobras.
O governo paraguaio também pedirá ao Brasil uma convocação das Altas Partes Contratantes para que o acordo volte a ser tratado na esfera técnica e não na diplomática, como ocorreu nesta ocasião por desavenças entre ambas as partes.
“Decidimos solicitar ao Brasil a convocação das Altas Partes no transcurso desta semana que se inicia, quando solicitaremos a anulação – deixar sem efeito – o acordo bilateral e, ao mesmo tempo, que volte às instâncias eminentemente técnicas, onde sempre se tem decidido e tratado”, disse o chanceler em entrevista coletiva.
Castiglioni adiantou que já se comunicou com seu colega brasileiro Ernesto Araújo para informá-lo sobre a decisão do Paraguai de convocar a reunião e afirmou que ele aceitou “com muito gosto”.
Déficit na comunicação
Com esta decisão, o governo paraguaio, segundo o chanceler, espera que “no transcurso desta semana tudo isto seja resolvido”, depois da repercussão causada entre a oposição paraguaia e parte dos cidadãos, após o acordo chegar ao conhecimento da opinião pública.
Sobre este ponto, Castiglioni reconheceu que houve “um déficit na comunicação e na informação” e que isso provocou “grande desinformação e manipulação por parte de setores interessados”.
Apesar disso, ele afirmou que houve comunicação prévia desses encontros entre os representantes da Ande e da Eletrobras, assim como dos encontros posteriores entre diplomatas.
Tratado de Itaipu
Brasil e Paraguai assinaram em 24 de maio uma ata que estabelecia um cronograma de compra de energia de Itaipu até 2022, um ano antes que ambas as partes tenham de negociar o Anexo C do Tratado de Itaipu, de 1973.
Os dois países estabelecem no início de cada ano a sua contratação de energia da usina geradora de Itaipu, mas este ano o acordo de compra não pôde ser fechado no âmbito técnico e teve de recorrer à esfera diplomática, já que o Brasil solicitou ao Paraguai que cumprisse com o tratado e estabelecesse seu cronograma de compra adequado a seu consumo.
A oposição paraguaia criticou o documento ao considerá-lo uma entrega de soberania energética para o governo brasileiro de
Jair Bolsonaro (PSL) e ameaçou o presidente Abdo Benítez com a abertura de um procedimento de impeachment, acusando-o de “vendedor da pátria”.
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