O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

domingo, 21 de janeiro de 2018

A correlacao entre ideias e pessoas: uma questao nao trivial - Adonai Sant'Anna

Apenas hoje, 21/01/2018, por causa de vários outros trabalhos e obrigações no pipeline, pude ir buscar, e ler, uma postagem do matemático da UFPR, Adonai Sant'Anna, que me tinha sido recomendada por um doutorando da USP, Danilo R. Sousa, que acompanhou o "entrevero" – não ouso classificar como debate – entre este modesto blogueiro e um polemista profissional, Olavo de Carvalho, que se dispôs a atacar-me, sem que eu o atacasse diretamente, apenas porque eu tenho profunda discordância com o que chamo de "teoria conspiratória", que ele parece defender como verdadeira, relativamente a um projeto de governo mundial proposto por poderosos não exatamente identificados (enfim, alguns nomes aparecem, mas não se sabe bem o que fazem para promover tal governo mundial).
Transcrevo o que interessa, sobre a questão.
Paulo Roberto de Almeida  
Brasília, 21 de janeiro de 2018

O doutorando Danilo R. Sousa escreveu o que segue, em mensagem de 15/01/2018: 

Faz tempo que vejo ele (Olavo) falar algumas bobagens absurdas, tais como essas registradas pelo renomado professor Adonai Sant'Anna, matemático de renome da UFPR:  http://adonaisantanna.blogspot.com.br/2015/02/olavo-de-carvalho.html

PRA: Pois bem, fui buscar tal postagem e ela interessou-me, não exatamente pelo debate em torno de questões da física newtoniana e einsteiniana (que não pretendo entender), mas pelas palavras iniciais e finais do matemático Adonai Sant'Anna (com cujo blog já colaborei a propósito da situação das universidades brasileiras), a propósito da diferenciação que se há de fazer entre IDEIAS e seus PROPONENTES.

Eu geralmente tendo a discutir ideias, independentemente de quem as emite. Não tenho aquele comportamento de quem, sendo de esquerda (ou direita), costuma dizer, ao rejeitar a leitura de algum texto: "Ah, esse cara é de direita (ou de esquerda), e assim eu descarto a leitura."
Não tenho tal tipo de preconceito: simplesmente leio tudo que me parece interessante ou inteligente, de qualquer tendência política, e por vezes leio até bobagens absurdas, de um ou outro lado, apenas para constatar que, mais do que má-fé, é a ignorância que motiva certos desentendimentos no cenário político.

Pois bem, li o seguinte (transcrito apenas seletivamente), de uma imensa discussão sobre física teórica, na postagem abaixo reproduzida: 


segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015


Recebi hoje e-mail de um leitor deste blog perguntando por que citei Olavo de Carvalho em uma postagem recentemente veiculada. Essa pergunta foi motivada por questionamentos a respeito de certas afirmações deste jornalista comumente conhecido por alguns como um filósofo. 

Uma vez que Olavo de Carvalho consegue combinar discursos brilhantes com outros escandalosamente absurdos, creio que a indagação feita por este leitor merece ser respondida aqui. 

Citei uma entrevista com Olavo de Carvalho simplesmente porque ela continha uma discussão extremamente pertinente. E jamais deixarei de aproveitar boas ideias baseado em quem as defende. A correlação entre pessoas e ideias é assunto altamente não trivial.

No entanto, preciso também esclarecer alguns pontos sobre os quais devemos ser extremamente cuidadosos quando Olavo de Carvalho decide falar ou escrever. E ele fala e escreve muito!


(...) [segue-se o debate que está no link acima, mas vou ao final da postagem:]

Há muitas outras questões controversas sobre Carvalho, incluindo sua proposta de incluir a astrologia como um ramo da ciência. Mas discutir sobre astrologia como ciência já chega a um absurdo que temo desrespeitar o leitor. Por isso prefiro não discutir sobre este tema aqui.

Mesmo físicos extremamente experientes conseguem fazer afirmações absurdas sobre física. E Olavo de Carvalho demonstra claramente não ter a mais remota familiaridade com física a não ser, talvez, a partir de textos de divulgação científica destinados a leigos. No entanto, ainda assim insiste em opinar sobre temas da física moderna. Isso me faz questionar se há algum sentido em suas afirmações sobre outros temas, como história da religião e política. 

Portanto, o leitor deve ter muito cuidado com o que Carvalho afirma. Suas declarações nesta entrevista são incisivas, mas pertinentes. No entanto, são pertinentes sob o meu ponto de vista. Não sei dizer se eu compartilharia com as justificativas que ele teria para apresentar às suas declarações sobre a educação brasileira. 

É óbvio que o leitor deve aprender a filtrar qualquer informação que receba, seja de onde for. Isso não se aplica somente a Olavo de Carvalho, mas a qualquer pessoa. No entanto, Carvalho demonstra o persistente hábito de opinar sobre o que não demonstra conhecer. Ele faz isso quando discute sobre o aquecimento global, o darwinismo e a história da ciência. 

Como filtrar ideias? Bem, não há procedimento efetivo para isso. Mas pensar e discutir com uma variedade grande de pessoas compromissadas com o conhecimento já ajuda.


Nota: Em virtude de grande volume de comentários nesta postagem, decidi complementar este texto. Para detalhes, clique aqui.

Esta postagem suscitou 239 comentários. Transcrevo um: 

Eu desconfio fortemente de que o problema não seja a ignorância dele [OC] quanto à história da ciência, mas o conveniente conhecimento só das partes da história que ratificam a posição dele. Isso se aplica a qualquer área em que eu já o vi emitir um julgamento. A explicação mais plausível que vejo pra isso é a necessidade de vencer um debate mesmo sem ter razão. Por isso, eu não consigo confiar em nada do que ele diz, mesmo quando o assunto é filosofia. Fico triste de haver tantas pessoas que não vêem isso.


Volto a comentar (PRA):
 Pois é, eu tenho uma vocação pedagógica que por vezes me impele a entrar em debate sobre questões que ultrapassam a possibilidade de um diálogo racional segundo procedimentos estabelecidos. Tendo a ser muito mais empirista do que teórico em meus argumentos, e por isso essa tendência praticar um ceticismo sadio e a demandar PROVAS de quem apresenta um argumento qualquer.
Creio que foi isso que deixo furiosos tanto o Sr. Olavo de Carvalho e seus seguidores, quando eu contestei a ideia do globalismo, e sugeri que se tratava apenas de uma teoria conspiratória. Eles passaram a me atacar de uma forma tão irracional que não havia sequer possibilidade de diálogo.
Agora, tendo lido o que vai acima por parte de Adonai Sant'Anna, creio que o mesmo demonstrado para a física vale para as ciências humanas também.

Paulo Roberto de Almeida  
Brasília, 21 de janeiro de 2018

 PS: Creio que esta postagem vai motivar mais ataques a este blogueiro no Mídia Sem Máscara, ou em outros blogs, como sempre naquele "estilo" que já mencionei em postagens anteriores: 

  3224. “Globalismo e globobagens: um debate que nunca ocorreu”, Bento Gonçalves, 3 janeiro 2018, 4 p. Tentando encerrar o debate sobre o fantasma do globalismo. Postado no Diplomatizzando (http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2018/01/globalismo-e-globobagens-um-debate-que.html) e no Facebook (https://www.facebook.com/paulobooks/posts/1769060946490681). Consequências ulteriores (link: http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2018/01/olavo-de-carvalho-o-estilo-faz-o-homem.html).

Confirmo que não pretendo debate com tal personagem, e apenas lamento que o pessoal do Brasil Paralelo ainda não tenha se manifestado sobre os ataques que a mim foram dirigidos na sequência  da exibição do "debate" Globalização vs Globalismo.

Oliveira Lima Library, em Washington: a caminho da recuperacao? (OESP 21/01/2018)

Matéria deste domingo no Estadão (Caderno 2, p. C5, 21/01/2018), por Roberta Jensen, aborda a situação atual da Biblioteca Oliveira Lima, junto à Universidade Católica da América, em Washington, que muito frequentei, atualmente necessitada de um bom plano de recuperação, passando por significativo apoio financeiro.
Recentemente, com meu colega André Heráclio do Rego, publicamos um livro sobre Oliveira Lima, cuja informação trasncrevo ao final desta postagem.
Paulo Roberto de Almeida 


Astrofísica da Nasa assume reitoria de universidade nos EUA e resgata acervo de diplomata brasileiro

Duília de Mello quer recuperar a biblioteca do diplomata, historiador e jornalista Manoel de Oliveira Lima (1867-1928)


Roberta Jansen
O Estado de S. Paulo, 21 Janeiro 2018, p. C5.

RIO - Pesquisadora da Nasa, especialista na análise de imagens do Telescópio Espacial Hubble, Duília de Mello acaba de assumir a vice-reitoria da Universidade Católica da América, em Washington. Por ser brasileira, recebeu de seu chefe uma incumbência inusitada para uma astrofísica: recuperar a biblioteca do diplomata, historiador e jornalista Manoel de Oliveira Lima (1867-1928). No porão da universidade, ela encontrou nada menos que 58 mil itens, entre livros raros, manuscritos, cartas, mapas e obras de arte, que formam um dos mais importantes acervos do mundo de história do Brasil. Uma autêntica ‘brasiliana’ – como são chamadas as grandes coleções sobre o País.
Além de livros raros, como a primeira edição dos Lusíadas, fazem parte da coleção milhares de cartas trocadas com intelectuais da época, como Lima Barreto, Euclides da Cunha e Monteiro Lobato. De dentro de um livro aberto aleatoriamente, surgiu uma carta assinada por Machado de Assis. “Toda hora encontramos algo novo”, afirma a pesquisadora, entusiasmada com o projeto inesperado. Diversos quadros de Taunay (1755-1830) e Antonio Parreiras (1860-1937), e um Frans Post (1612-1680) avaliado em nada menos que US$ 4 milhões, também pertencem ao acervo.


Manoel de Oliveira
Duília de Mello. Formando uma autêntica ‘brasiliana’  
Foto: TOMMY WIKLIND
Toda a coleção foi legada à universidade pelo diplomata, enterrado em Washington, sob lápide onde se lê apenas “aqui jaz um homem que ama os livros”. Um epitáfio à altura do intelectual corpulento, bigodudo e polêmico, que colecionava livros e desafetos.  

A biblioteca estava fechada e praticamente abandonada até o início deste ano, quando foi reaberta por Duília. Agora, ela busca patrocínio para criar um Centro Oliveira Lima onde todo o acervo possa ser acomodado de forma correta e acessível a pesquisadores e ao público. 
Formado no Curso Superior de Letras de Lisboa em 1897, o pernambucano Oliveira Lima começou a trabalhar para o Ministério das Relações Exteriores do Brasil em 1890. Trabalhou como diplomata em Portugal, Bélgica, Alemanha, Venezuela e Estados Unidos. Foi o encarregado de negócios da primeira missão diplomática brasileira no Japão e um dos primeiros brasileiros a escrever um livro sobre o país. 
Como historiador, escreveu a biografia de d. João VI, tida até hoje como uma obra de referência sobre o rei português que transferiu a corte para o Brasil. Como jornalista, escreveu para o Estado entre 1904 e 1923, assinando inclusive uma série de colunas sobre a Primeira Guerra Mundial, enviadas da Europa. Foi professor da Universidade Harvard, nos EUA, e da Sorbonne, em Paris. Foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras (ABL).
Amigo de grandes intelectuais da época, como Gilberto Freyre, Machado de Assis, Lima Barreto, entre outros, Oliveira Lima tinha uma profícua correspondência com vários deles. Também se notabilizou por seus grandes inimigos públicos, como Joaquim Nabuco e o Barão do Rio Branco. Sobretudo, foi um bibliófilo, um grande colecionador de livros raros, obras de arte, manuscritos e recortes de jornais.
“Apesar de toda a sua produção e do reconhecimento que tinha na época, Oliveira Lima não é tão conhecido no País quanto deveria ser”, afirma o professor do Departamento de Literatura Brasileira da USP Ricardo Souza de Carvalho. “Mas é um dos mais importantes historiadores brasileiros dos séculos 19 e 20”, atesta. 


Manoel de Oliveira Lima
Trajetória. De Pernambuco, onde nasceu, a Washington, um homem que amava os livros
Coordenador do Laboratório Líber de Tecnologia da Informação, da Universidade Federal de Pernambuco, Marcos Galindo destaca a importância de Oliveira Lima como jornalista. “Ele escrevia sobre política internacional, sobre literatura, artes”, enumera o especialista. 

“Fui para Washington estudar as cartas, ele tinha cerca de 1.500 correspondentes, praticamente toda a intelectualidade do Brasil e da América Latina”, conta a socióloga Nathalia Henrich, biógrafa de Oliveira Lima, que ajuda Duília na catalogação do material. “Mas aí eu me deparei com os scrapbooks, os álbuns de recortes em que ele reunia notícias de jornais, cópias de artigos, cartas, fotos, cartões-postais, menus; uma janela para entender o que estava acontecendo no Brasil e no mundo.”
Já Duília confessa não conhecer Oliveira Lima, mas destaca a importância do acervo.
“Eu sou uma astrofísica, não entendo muito disso”, diz Duília. “Mas sei que não posso deixar um tesouro histórico desses num porão, sem catalogação e preservação adequadas: quero criar um espaço que seja uma biblioteca, um centro de estudos e também um local de reunião de intelectuais brasileiros na capital americana.” 


QUEM É - Manoel de Oliveira, escritor
 Manoel de Oliveira Lima (1867-1928) foi um diplomata, historiador e jornalista brasileiro. Viveu no Japão, na Europa e nos EUA e legou à Universidade Católica, em Washington, um acervo de 58 mil itens. 




Flora, a parceira que ficou em segundo plano
Mulher de Oliveira Lima falava cinco idiomas, era arquivista e escrevia as cartas e os manuscritos do diplomata
A astrofísica Duília de Mello, vice-reitora da Universidade Católica da América, em Washington, quer dar um destaque especial ao papel fundamental da mulher de Manoel de Oliveira Lima, Flora Cavalcanti de Albuquerque (1863-1940), na construção do acervo da biblioteca. O Centro Oliveira Lima terá, entre seus grandes alicerces, homenagear a memória de Flora e seu legado.
Filha da aristocracia de Pernambuco, Flora falava cinco idiomas fluentemente. Era fotógrafa, arquivista, bibliotecária, responsável pela organização de todo o acervo de Oliveira Lima e como o marido também amava os livros.
“Se não houvesse a Flora, não haveria a produção do Oliveira Lima”, garante a socióloga Nathalia Henrich, que está escrevendo a biografia do diplomata e trabalhando na catalogação do acervo. Segundo a especialista, todas as cartas de Oliveira Lima eram escritas por Flora, bem como os manuscritos originais de seus livros. “Imagino que ela desse muito palpite enquanto ele ditava, mas nunca recebeu a devida coautoria.”
 =================
Nosso livro sobre o Oliveira Lima, recentemente publicado: 

Paulo Roberto de Almeida, André Heráclio do Rêgo:
 Oliveira Lima: um historiador das Américas 
(Recife: CEPE, 2017, 175 p.; ISBN: 978-85-7858-561-7). 
Anunciado no Diplomatizzando 

Meira Penna: um intelectual brasileiro - Paulo Roberto de Almeida

José Osvaldo de Meira Penna: um intelectual brasileiro


Paulo Roberto de Almeida
Diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (IPRI).


Qualquer que seja a qualificação que se lhe atribua – liberal, conservador, direitista –, Meira Penna foi um dos grandes intelectuais brasileiros, certamente o maior da carreira diplomática, talvez até mais, na variedade e volume dos escritos, que os dois outros colegas que poderiam legitimamente lhe ser equiparados: Roberto Campos e José Guilherme Merquior. Já conhecedor de boa parte de sua obra, para preparar esta nota fui consultar as entradas sob seu nome nas bibliotecas próximas. As do Itamaraty, possuem apenas 27 obras (mas em vários exemplares), sendo 17 na SERE, oito no Rio de Janeiro e duas no Instituto Rio Branco. A do Senado Federal, mais copiosa em artigos do que em livros, exibe 16 obras no catálogo, mas 104 artigos – parte ínfima de seus “sueltos” em periódicos, durante décadas –, sendo o último deles significativamente intitulado “Por que escrever memórias?” (2006).
Suas memórias, justamente, ficaram por terminar, e ainda permanecem sob a guarda da família. Um excelente verbete na Wikipedia registra 23 livros publicados, dos quais eu destacaria os seguintes: O Brasil na Idade da Razão (1980); O Evangelho segundo Marx (1982); O Dinossauro (1988); Utopia brasileira (1988); Opção preferencial pela riqueza (1991); O espírito das revoluções (1997); A Ideologia do século XX (1994); Em berço esplêndido: ensaios de psicologia coletiva brasileira (1999); Da moral em economia (2002). Esse verbete, provavelmente escrito pelo amigo Ricardo Vélez-Rodríguez, trata de suas análises sobre o patrimonialismo brasileiro, nosso cartorialismo, o burocratismo, e vários ismos também fustigados pelo seu colega – e contemporâneo na carreira – Roberto Campos. Ambos ingressaram em 1938, ainda na fase dos concursos do DASP, (mal) acompanhados por muitos outros “empistolados” que entraram pela janela, o que prolongou-se até a criação do Instituto Rio Branco.
Antes de entrar no Itamaraty eu já o conhecia de nome, pelos artigos publicados no Estadão ou no Jornal do Brasil. Quando ingressei, fui ler um de seus livros: Política externa: segurança e desenvolvimento (1967), obra que discute de forma inteligente os dois princípios da era militar. O primeiro livro emergiu no segundo posto: Shanghai: aspectos históricos da China moderna (1944). Ao partir para missão temporária nessa cidade, em 2010, eu o contatei, para conversar sobre a cidade que ele tinha conhecido antes da dominação comunista. Em mensagem de 8/11/2009, ele me escreveu:
Estive duas vezes em Xanghai [sic]. Da primeira, 1941-42, como Vice-Cônsul sob as ordens do Cônsul Geral James F. Mee. Da segunda, em 1949, assistindo ao fim da guerra civil que trouxe Mao ao poder. Dessa segunda vez, fiquei quase um ano em Nanking como Encarregado de Negócios, até a chegada do novo Embaixador, Paranhos da Silva. Saí da cidade duas semanas antes da entrada dos maoístas. (...) Terei grande prazer em conversar consigo. Meu telefone é...

Eu já o conhecia desde os anos 1980, tendo feito uma visita à sua residência, a “Vila Castália”, na Park Way, depois de retornar do doutorado e começar a dar aulas no Instituto Rio Branco e na UnB, onde ele também se exercia como professor do então Departamento de Relações Internacionais. Ele me presenteou com um de seus livros, e nos anos seguintes fui adquirindo ou sendo agraciado com vários outros, todos eles fortemente estimulantes de um diálogo de alto nível sobre as razões do atraso brasileiro em perspectiva histórica e comparada, com base em grandes nomes da cultura ocidental: Weber, Tocqueville, Marx e outros pensadores. Meira Penna foi, salvo engano, o primeiro brasileiro a ser admitido na Sociedade do Mont Pèlerin, o grupo liberal criado no imediato pós-guerra por Friedrich Hayek para se contrapor ao keynesianismo, já dominante nas universidades e nas políticas econômicas de quase todos os países.
Por sua vez, ele se contrapôs desde o início ao pensamento estatizante e terceiro-mundista, que prevalecia nas elites brasileiras, independentemente do regime político ou das chefias do Itamaraty. Em plena atividade como embaixador nos anos 1970, Meira Penna nunca se eximiu de criticar as orientações da política externa, em especial as dos últimos governos da era militar. Tais críticas recrudesceram na democratização, a despeito da boa disposição inicial em relação ao banqueiro Olavo Setúbal. Aposentado desde 1981, seu último grande embate se deu pela denúncia das “polonetas”, os créditos oferecidos a países socialistas para a exportação de manufaturas brasileiras sem quaisquer garantias credíveis. O mesmo ocorreu nos financiamentos oferecidos a países do Terceiro Mundo, na África e na América Latina, redundando em grandes perdas para o país, quando as insolvências passaram a exame, e desconto, no âmbito do Clube de Paris, onde o Brasil era admitido como credor.
Em meados dos anos 1980 ele funda, com amigos e intelectuais de renome, a Sociedade Tocqueville, assim como esteve na origem do Instituto Liberal de Brasília. Suas principais contribuições no campo intelectual se dão na crítica ao patrimonialismo e à mentalidade estatizante e intervencionista no Brasil, entranhada na psicologia social, que interpreta com base em teses de Carl Gustav Jung. Uma das últimas manifestações de Meira Penna se deu em entrevista a Bruno Garschagen, do Instituto Mises Brasil, em 6/12/2013 – no link: https://www.youtube.com/watch?v=XkE00n0ZYNk –, na qual ele revela inicialmente que sua orientação liberal surgiu ainda em 1935, quando ele iniciava estudos de Direito e ocorreu a intentona comunista de novembro daquele ano. As leituras de Hayek, Mises e Milton Friedman foram solidificando suas convicções liberais, e sua oposição ao ambiente positivista, intervencionista, nacionalista míope, predominante no Brasil e na grande maioria dos países dominados pelo keynesianismo.
Sua morte, aos cem anos, em 29 de julho de 2017, deixou o Brasil mais pobre na vertente liberal, num ambiente intelectual carente de grandes nomes nessa área, pois já rarefeito desde o desaparecimento de Roberto Campos e de José Guilherme Merquior. Uma coleção de ensaios em sua homenagem seria bem vinda, a exemplo daquela que se fez por ocasião do centenário de Roberto Campos: O homem que pensou o Brasil. Uma coletânea de seus escritos mais representativos seria ainda melhor...



Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 21 de janeiro de 2018

sábado, 20 de janeiro de 2018

Fragmentos de memória - Paulo Roberto de Almeida

Sob o título acima eu publiquei, neste espaço, um artigo de Bolívar Lamounier, de 1 de setembro de 2016, sobre episódios de perseguição no passado do Brasil, no caso dele durante o governo militar. A postagem está aqui: 

http://diplomatizzando.blogspot.com/2016/09/de-memorias-e-lembrancas-bolivar.html

A esse artigo, eu agreguei comentários pessoais sobre o meu caso, que transcrevo mais abaixo novamente.
Mas gostaria agora de agregar um outro fragmento de memória que me foi reportado por um colega, mas cujo teor eu já pressentia e cuja realidade eu já desconfiava existir.
Todos sabem que, durante todo o reinado lulopetista, eu passei 13 longos anos numa longa travessia do deserto, sem qualquer cargo na Secretaria de Estado, fazendo da Biblioteca o meu escritório de trabalho, o meu perímetro de estudos, em substituição ao famoso DEC, o "Departamento de Escadas e Corredores", agora rebatizado com outro nome.
Permaneci no ostracismo, ou no limbo, como já referi diversas vezes, porque eu dizia e escrevia coisas que os companheiros, inclusive diplomatas, não gostavam de ouvir ou ler.
Eu, que durante o governo militar, passei sete anos num exílio voluntário, e tive de escrever e publicar artigos sob um "nom de plume", voltei a essa prática durante o reinado companheiro. Mas agora tomei conhecimento, indireto, obviamente, de outra realidade.  Esta é a realidade que me foi reportada recentemente:
A situação chegou a tal ponto que , mesmo tendo votos para Quadro de Acesso e promoção, o SG chegou a dizer claramente aos demais embaixadores, que meu nome estava proibido de ser sequer mencionado nessas reuniões.
Ou seja, o veto ao meu nome, a barreira ao meu desempenho funcional foi total.
O que dizer, agora, desses gestos que apenas rebaixam seus responsáveis, ou seja, os responsáveis pela diplomacia lulopetista na Casa de Rio Branco?
Não preciso me pronunciar: cada leitor que tire suas próprias conclusões.
Eu posso, talvez, agradecer aos meus verdugos pelo tempo extra que me foi concedido, sem qualquer função na Secretaria de Estado, para ler, refletir, escrever e publicar algumas outras coisas, que devem ter deixado meus "inimigos" ainda mais raivosos, e confirmados em sua missão de me manter afastado do trabalho corrente em minha carreira, aliás uma irregularidade administrativa, que poderia ser sancionada pelos órgãos de controle.
Transcrevo abaixo o que escrevi em setembro de 2016, com apenas um novo acréscimo: espero que a Secretaria de Estado, o Itamaraty em seu conjunto, não volte mais a esses tempos de perseguição ideológica, que nos remetem aos tempos infelizes dos dois totalismos mais conhecidos no mundo: o comunista e o nazifascista. Os companheiros se esforçam para retomar o seu reinado de "pensamento único".
Paulo Roberto de Almeida  
Brasília, 20 de janeiro de 2018



Da arte de suportar o arbítrio reservadamente
Paulo Roberto de Almeida 
Gramado, RS, 2/09/2016

Depoimento pessoal de Bolívar Lamounier sobre as graves consequências dos anos de chumbo da ditadura militar sobre sua carreira acadêmica, que ele relembra agora por motivo de mais um arbítrio cometido contra a democracia num momento em que todos acreditávamos ser justamente de início da correção dos muitos arbítrios cometidos contra essa mesma democracia já de muito baixa qualidade nos anos companheiros que agora se encerram (não por um bang, mas por um bimp, como se diz). 
Compreendo inteiramente este tipo de rememoração dolorosa de Bolivar Lamounier pois eu também teria meu depoimento pessoal a fazer no momento em que encerro, já no atual "governo golpista", um longo ostracismo, um segundo exílio com o dobro da duração do primeiro (sob o regime militar justamente), a que fui levado durante todos os 13 anos do reinado companheiro, sem qualquer cargo ou função na carreira diplomática, por ter, desde o início, ousado escrever o que eu pensava sobre o o governo que se iniciava em 2003, e que despertaram o meu ceticismo desde aquele primeiro momento. 
Só voltei a ter um cargo no Itamaraty agora, a partir de 3/08/2016, quando o último tinha sido no século passado, e ainda assim não exatamente no Itamaraty, pois se trata da função de Diretor do IPRI, um órgão subordinado à Fundação Alexandre de Gusmão, uma autarquia da administração indireta vinculada ao MRE.
 Durante todos estes longos 13 anos suportei quase silenciosamente (a não ser por meus muitos escritos de resistência ao regime que eu sempre considerei espúrio) minha travessia de um deserto funcional humilhante, durante  os quais fiz da biblioteca do Itamaraty o meu gabinete de trabalho, e do meu blog Diplomatizzando o meu "quilombo de resistência intelectual ".
Fiz um relatório parcial sobre a retomada de funções nesta postagem que fazia o balanço de um ano de atividades desde a minha volta do "exílio diplomático": 

3147. “Retomada do trabalho no Itamaraty, depois de 13 anos de regime companheiro: um relatório das atividades desde a volta do exterior”, Brasília, 6 agosto 2017, 21 p. Junção dos dois últimos trabalhos, 3145 e 3146, num único arquivo para fins de informação nas plataformas Academia.edu (https://www.academia.edu/34143789/Retomada_do_trabalho_no_Itamaraty_depois_de_13_anos_de_regime_companheiro_um_relatorio_das_atividades_desde_a_volta_do_exterior) e Research Gate (https://www.researchgate.net/publication/318940308_Retomada_do_trabalho_no_Itamaraty_depois_de_13_anos_de_regime_companheiro_um_relatorio_das_atividades_desde_a_volta_do_exterior), com uma breve introdução sobre as razões dos dois textos. Postado parcialmente no blog Diplomatizzando (https://diplomatizzando.blogspot.com.br/2017/08/retomada-do-trabalho-no-itamaraty.html).  
Não tenho certeza de que tudo terminou agora, pois obstáculos por ousar dizer o que se pensa sempre vão acontecer, mas não deixarei de oferecer, futuramente, o meu depoimento sincero sobre estes novos anos de chumbo, pelo menos no âmbito da diplomacia companheira, uma perversão completa do que possa ou deva ser uma política externa credível e legítima para uma nação democrática. 
Nunca me rendi aos totalitários de um partido que agora se revela ser uma vulgar organização criminosa.

Paulo Roberto de Almeida 
Gramado, RS, 2/09/2016
Addendum em 20/01/2018: 
Meus escritos mais conceituais sobre a diplomacia lulopetista foram publicados neste livro: 

Nunca Antes na Diplomacia...: A política externa brasileira em tempos não convencionais (Curitiba: Editora Appris, 2014, 289 p.; ISBN: 978-85-8192-429-8); disponível em formato impresso ou online, nas livrarias e sebos, ou junto à própria editora.

Outros escritos acumulados ao longo desses anos, foram compilados por mim neste arquivo depositado na plataforma Academia.edu: 
  Quinze anos de política externa: ensaios sobre a diplomacia brasileira, 2002-2017 (Brasília: Edição do Autor, 2017, 366 p. )Volume de ensaios compilados, disponibilizado na Academia.edu (link: https://www.academia.edu/33186849/QUINZE_ANOS_DE_POLITICA_EXTERNA_ENSAIOS_SOBRE_A_DIPLOMACIA_BRASILEIRA_2002-2017). Informado no blog Diplomatizzando (http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2017/05/quinze-anos-de-politica-externa-ensaios.html).
 
Este outro arquivo é formado por artigos mais leves: 
Um contrarianista no limbo: artigos em Via Política, 2006-2009 (Brasília: Edição do Autor), Brasília, 26 dezembro 2017, 247 p. Compilação de três dezenas de escritos publicados em Via Política, dentro as oito dezenas constantes do registro. Feito em formato pdf, e divulgado através de Academia.edu (https://www.academia.edu/35509310/3219ViaPoliticaBook2006a2009.pdf), informado no blog Diplomatizzando (http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2017/12/um-contrarianista-no-limbo-artigos-em.html

Carta Capital e o velho Ipea: um artigo perverso de 2013

Só agora conheci, mas não me surpreendeu.
Carta Capital, junto com Carta Maior e outros instrumentos companheiros, são o que são, e não preciso explicar aos cognoscenti o que eles representam em termis de ideologia. Neste caso não é só ideologia, e sim má-fé e desonestidade deliberada. Eu estava fora do Brasil em 2013, e por isso só agora, a partir de outra matéria perversa publicada, pude tomar conhecimente deste lixo escrito pelo mesmo autor sobre Ipea.
Paulo Roberto de Almeida  
Brasília, 20 de janeiro de 2018

Há um Neri para o consumo externo. E outro para o consumo interno
Há um Neri para o consumo externo. E outro para o consumo interno
 

O politburo ortodoxo

Marcelo Neri reabilita no Ipea a turma anti-Estado e a favor do atrelamento aos EUA
Oinstituto de Pesquisa Econômica Aplicada é um dos principais formuladores do pensamento do Estado brasileiro. Investe 300 milhões de reais por ano na produção e disseminação de conhecimento e informações. Reúne um grupo preparado de pesquisadores de diversas correntes ideológicas e influente, em graus distintos, na mídia. Nas últimas décadas, como um pêndulo, as turmas disputam a primazia no órgão.
Neste momento, a força está de novo com os liberais. À frente do Ipea desde setembro de 2012, o economista Marcelo Neri confirmou o temor dos desenvolvimentistas. Se em público Neri dissemina trunfos eleitorais do Palácio do Planalto, entre eles o conceito de “nova classe média”, no comando do instituto ele fortaleceu os inimigos de bandeiras históricas do lulismo. A ortodoxia que tomou conta da instituição na década de 90 do século passado, na era Fernando Henrique Cardoso, está em alta. O legado da gestão de Marcio Pochmann, antecessor de Neri, foi desmontado com a demissão de todos os diretores a ele ligados e o corte de projetos.
Quatro técnicos simbolizam a ascensão liberal a partir da chegada de Neri. Renato Baumann dirige desde dezembro de 2012 os estudos sobre relações econômicas e políticas internacionais. É ardoroso defensor de um velho projeto sepultado neste início do século XXI: a Área de Livre Comércio das Américas (Alca), pensada sob medida para os interesses dos Estados Unidos. Segundo ele, o Brasil perde energia e dinheiro ao se aproximar da África e deveria apostar no irmão do Norte. Ele defendeu essa visão na abertura do IV Encontro Nacional da Associação Brasileira de Relações Internacionais, em julho.
Um mês antes de contratar Baumann, Neri premiou Mansueto Almeida, atual chefe da divisão de estudos em sistemas produtivos. Almeida é a versão 2.0 de Fábio Giambiagi, queridinho da mídia nos anos 90 por defender uma agenda neoliberal de controle feroz dos gastos públicos e contenção do Estado. Entre colegas, vangloria-se de escrever discursos do presidenciável Aécio Neves. Em entrevista ao Correio Braziliense em setembro, chamou o governo de “perdulário” e ironizou a capacidade gerencial de Dilma Rousseff. Também participa de jantares com empresários e banqueiros descontentes.
Neri diz desconhecer ligações partidárias no Ipea e não levar o fato em conta. No caso de Adolfo Sachsida, coordenador de estudos em desenvolvimento urbano, o vínculo partidário é formal e nasceu dois meses após a sua nomeação para o cargo. Está filiado ao DEM desde maio. Em um vídeo no YouTube, apontou afinidades ideológicas: “O conservadorismo em termos morais, juntamente com o liberalismo em termos econômicos”. Fã de Ronald Reagan, foi incumbido de rever um curso de mestrado que a equipe de Pochmann havia preparado para servidores públicos. O curso é uma das heranças recebidas por Neri deixadas de escanteio.

No caso de Regis Bonelli, Neri fez o contrário: reabilitou um nome na geladeira durante a gestão Pochmann. Bonelli recebeu em outubro uma bolsa de estudos para pesquisar política industrial. Também vai coordenar a produção de um livro sobre os 50 anos do instituto, a serem comemorados em 2014. Como Baumann e Almeida, é um habitué da Casa das Garças, um think tank liberal ligado ao PSDB. Ali desfilam expoentes da era FHC, entre eles Edmar Bacha, Pérsio Arida, André Lara Resende e Arminio Fraga.
Bonelli integrava o grupo de liberais que alimentava a mídia com a versão de que Pochmann promovia um “expurgo” de adversários e um “aparelhamento” do instituto. Agora é a vez de os desenvolvimentistas sentirem-se “expurgados” e falarem em “aparelhamento”, conforme o relato de cinco técnicos que ocuparam ou ocupam postos destacados no Ipea.
Sobre a troca de diretores, o atual presidente argumenta que era preciso deixar a diretoria mais plural. O escritório do Ipea no Rio de Janeiro, dominado pelo pensamento liberal da PUC, foi reforçado. Cargos de confiança foram deslocados de Brasília para lá e Neri, até pela origem fluminense, passou a despachar e promover eventos na cidade de vez em quando. Segundo ele, há “forte complementaridade” entre o Rio e a sede na capital federal.
A Diretoria de Estudos Macroeconômicos, antes crítica da alta taxa de juros do Banco Central e do elevado pagamento de juros da dívida, foi silenciada, segundo os opositores de Neri. Uma pesquisa mensal sobre as expectativas das famílias, criada para influenciar a opinião pública e o governo nos moldes do levantamento com integrantes do sistema financeiro, foi cancelada. Segundo Neri, ela era cara, tinha falhas e acrescentava pouco ao debate.
O economista limitou ainda a concessão de bolsas de doutorado. A restrição e as regras propostas para a seleção dos candidatos custaram a Neri um abaixo-assinado com a assinatura de 74 pesquisadores. Foi um dos maiores atos de oposição da história da casa.
Embora tenha fertilizado a ortodoxia, Neri revelou-se individualmente o presidente mais governista da história do Ipea, dizem os críticos. O motivo seria a ênfase dada ao tema da “nova classe média”. A prioridade se explica por sua escolha. Ao nomeá-lo, Dilma Rousseff pediu-lhe que mantivesse a linha adotada no Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas: estudasse a pobreza, cuja redução é a principal meta do governo.

Duas semanas depois de Neri assumir o cargo, a página do Ipea na internet informava que um livro do economista, A Nova Classe Média, ilustrativo de sua carreira e da afinidade com os planos de Dilma, disputaria o Prêmio Jabuti, o mais badalado do setor de livros. É o tipo de situação que nutre ataques internos contra ele. Se a obra foi lançada antes de sua entrada no Ipea e por outra editora, sua divulgação não seria promoção pessoal?
Outra alfinetada: em 2010, a OCDE lançou um livro sobre desigualdades no Brasil, China, Índia e África do Sul. Um dos capítulos foi escrito pelo economista. No texto, ele mostrava seis fórmulas que permitiam identificar o peso específico dos salários, dos programas sociais e das aposentadorias na queda da desigualdade. As equações tinham sido desenvolvidas por outro brasileiro, o economista Rodolfo Hoffmann, que as apresentou em 2006 em uma revista da Universidade Federal Fluminense. “Considero-me plagiado”, disse Hoffmann a CartaCapital. Neri nega a acusação. Diz ter sempre citado o pesquisador da UFF. E revida: o próprio Hoffmann omite que fórmulas de decomposição do Índice de Gini existem na literatura internacional há 17 anos.
Desde março, Neri acumula a presidência do Ipea e o cargo de ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. E também enfrenta problemas por lá. O entrevero se dá no Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, vinculado à secretaria. Formado por empresários, sindicalistas e acadêmicos, o “conselhão” foi criado em 2003 para expor a posição da sociedade sobre políticas públicas. Seus conselheiros sentem-se ignorados por Dilma.
O sentimento piorou sob o comando de Neri. O economista organizou uma reunião em agosto em que os conselheiros só puderam ouvir a opinião de representantes do governo. A então secretária do conselho, Angela Gomes, ficou ao lado dos representantes da sociedade civil. Foi demitida pelo ministro em setembro. Os conselheiros não querem mais dialogar com o presidente do Ipea e defendem que a Secretaria-Geral da Presidência assuma a coordenação do conselhão.
Neri, parece, deixa Dilma Rousseff contente. Mas ele se encaixaria perfeitamente no gabinete da senhora Thatcher.