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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

domingo, 9 de novembro de 2014

O processo de desenvolvimento segundo Peter Temin (resumido por Drunkeynesian)

Salários altos, Revolução Industrial e o Brasil de hoje 
The Drunkeynesian, quarta-feira, 2 de julho de 2014

 
"As coisas estão no mundo, só que eu preciso aprender" (Paulinho da Viola em Coisas do mundo, minha nêga)

Nessa pausa da Copa, aproveite o tempo para ler este paper de Peter Temin (professor emérito do MIT), uma revisão, em linguagem simples e acessível, da evolução da "Nova História Econômica" (que também atende pelo nome de cliometria.) A cliometria é produto tanto da quantificação da economia, cujo marco inicial foi a publicação do The Foundations of Economic Analysis, de Paul Samuelson, em 1947 (Samuelson tinha 32 anos, mortais—e é uma das celebridades que compartilham o dia de aniversário com este que vos escreve, como Raí e os gêmeos De Boer), quanto da evolução das técnicas econométricas, da disponibilidade de dados e do poder dos computadores para processá-los.

Temin destaca a pesquisa recente de Robert C. Allen, Hans-Joachim Voth e Nico Voigtländer (os dois últimos são coautores), que tenta responder a pergunta mais clássica de história econômica: por que a Revolução Industrial ocorreu na Inglaterra no século XVIII? A narrativa que emerge desses trabalhos é fascinante. Vou tentar resumir em um parágrafo (já me perdoem pela heresia):

A Peste Negra, no século XIV, foi a mãe de todos os choques exógenos: surgiu inesperadamente e, em pouco tempo, reduziu drasticamente a oferta de mão de obra na Europa. Como consequências, para cultivar plantações cujo tamanho não mudou: i) salários subiram, ii) aumentaram os incentivos para adoção de novas tecnologias, iii) mulheres passaram a fazer parte da força de trabalho (tanto pela demanda por trabalhadores quanto pela adoção de tecnologias que diminuíram a necessidade de força física para o trabalho agrícola.) Com isso, mulheres passaram a se casar mais tarde e a ter menos filhos. A população passou a crescer mais lentamente, o que manteve a oferta de mão de obra restrita e os salários mais altos. Começava a se romper a "armadilha malthusiana": as famílias, menores, passaram a dispor de mais renda e puderam incrementar a alimentação (comer mais proteína animal), que, por sua vez, seguiu alterando o padrão da agricultura. A Revolução Industrial surge como uma tentativa de produtores reduzirem custos (já que empregar gente ficou permanentemente mais caro), alimentada pela criatividade de pequenos empreendedores que passaram a ter renda acima do nível de subsistência e tempo livre para experimentar (falta a peça do quebra-cabeça que explica o porquê da Inglaterra e não outro país europeu: energia barata, segundo Allen.)

Temin liga a história do desenvolvimento da Europa (depois replicada para outros continentes) aos problemas atuais de economia do desenvolvimento. A diferença entre a Europa pobre, pré-Revolução Industrial e a Europa rica que veio depois é similar à diferença corrente entre países pobres e países ricos: estes pagam salários maiores e usam tecnologia mais avançada. Ambos os fatores são, claro, interligados: salários mais altos justificam o investimento em tecnologia, e o aumento de produtividade sustenta níveis de renda maiores. A dificuldade está na transição: como fazê-la em (muito) menos que 400 anos e sem depender de um enorme choque exógeno. Se buscarmos respostas na história de sucesso da Europa, um bom começo passa por inclusão de mais mulheres na força de trabalho e redução da taxa de fertilidade.

Corta para o Brasil de hoje: um dos fatores mais importantes e menos alardeados da história econômica do país desde a redemocratização é uma profunda transição demográfica, que segue surpreendendo nós, pobres economistas. A taxa de fertilidade caiu muito rápido: lembro de um texto de Roberto Campos, acho que do início dos anos 1980 (estou sem o livro aqui, é um dos primeiros do Ensaios Imprudentes, salvo engano) que a listava como "o" principal problema do país. Tal problema desapareceu em pouco mais de uma geração: em 1980 esperava-se que cada mulher tivesse 4 filhos durante sua vida; hoje, menos de 2. Em mais uma geração, a população total do país deve começar a declinar, a partir de um pico de 220 milhões. A surpresa mais recente, e que ajuda a explicar porque o desemprego segue baixo mesmo após anos de atividade econômica fraca e salários subindo, é o baixo crescimento da população economicamente ativa (está bem explicado neste artigo do Marcelo Muinhos). Não só a população total cresce pouco como também, aparentemente, demora-se mais para entrar no mercado de trabalho, já que o aumento da renda das famílias permite financiar mais anos de educação e diminui a pressão para que jovens comecem a trabalhar o quanto antes.

A tragédia do Brasil recente é a produtividade, que é frequentemente ligada à adoção de tecnologia. Além dos dados, anedotas não faltam: os ônibus nas grandes cidades ainda empregam cobradores, o enorme contingente de empregadas domésticas, manobristas, garçons, frentistas, recepcionistas, porteiros... Claro que não se trata de simplesmente extinguir esse tipo de trabalho, mas criar condições para que os que se empregam nele consigam trabalhos melhores e sejam substituídos por tecnologia e processos mais avançados (exemplo: grandes prefeituras poderiam aproveitar o mercado de trabalho aquecido e criar projetos para acabar com cobradores de ônibus em poucos anos, oferecendo um pacote de alguns meses de salário e cursos de qualificação. Há, claro, uma briga necesária a ser comprada com sindicatos e afins.) É preciso criar um círculo virtuoso onde empregadores concluam que só conseguirão ser competitivos se diminuírem o uso de mão de obra, invistam em tecnologia e a mão de obra dispensada, suficientemente qualificada, consiga outros empregos, criados por novos investimentos visando um mercado consumidor maior e com mais poder aquisitivo. Mais fácil falar do que fazer, evidentemente, mas boa parte das condições de uma "revolução industrial contemporânea" estão dadas pela transição demográfica descrita acima. Essas condições precisam ser aproveitadas antes que prevaleça a história do "país que envelheceu antes de ficar rico."

A grande conquista dos governos no PT (muito ajudados por um grande choque de termos de troca entre 2002 e 2012, é sempre bom reconhecer), e que, na minha visão, é totalmente coerente com a história do partido, foi o aumento consistente dos salários reais. Como isso ocorreu com produtividade em queda, dependeu de uma grande redistribuição que está culminando, acredito, em taxas de lucro das empresas que não justificam novos investimentos (além da inflação persistentemente alta.) Se isso está correto, a política econômica dos próximos anos deve ser fortemente voltada para o lado da oferta, assumindo que, corretamente, as conquistas recentes em salários não podem retroceder e serão naturalmente defendidas pelos enormes grupos de interesse que se criaram em torno delas (a obviedade aparente do suicídio eleitoral que seria defender a desindexação do salário mínimo é um bom indicador da força dessa defesa.) Acho que, dentro da conjuntura, há pouco espaço para mais "trabalhismo" e muito para um "desenvolvimentismo" que tem pouco a ver com o significado que tem se dado à palavra. Criá-lo vai requerer muita criatividade e esforço de economistas e políticos que, por enquanto, ainda precisam gastar tempo e energia discutindo e pensando em questões como controle da inflação e disciplina fiscal.

Outros links:
—O paper de Voth e Voigtländer;
—Um resumo da pesquisa de Robert C. Allen;
—Se não conseguirem acessar o Temin no NBER, uma alternativa.

Economia brasileira: companheiros neoliberais provocam desemprego,inflaçao e juros altos, baixo crescimento, cortam subsidios, o diabo...

Mais de 700 economistas, antirecessivos, estão justamente alertando o governo para não fazer essas políticas de austeridade, de cortes de investimentos, não aumentar os juros, nem cortar programas de estímulo, mas não adianta: o governo é neoliberal e vai fazer todas essas maldades mesmo contra a opinião de economistas amigos, que todos apoiaram o governo, ficaram contentes que a oposição tenha sido derrotada, e estavam esperando um outro cenário, que não esse do neoliberalismo aplicado. Esse governo é traidor, eles devem estar pensando.
Paulo Roberto de Almeida

Até agosto, 31,5 mil vagas já foram cortadas no estado, o pior resultado em 5 anos
por João Sorima Neto
O Globo, 26/09/2014


SÃO PAULO - O próximo ano será marcado por “uma crise brava”, com novas interrupções na produção industrial e desemprego elevado, avalia o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Benjamin Steinbruch. Para o empresário, o assunto estará na pauta dos candidatos à Presidência no segundo turno. A entidade estima que, apenas neste ano, cem mil trabalhadores deverão ser dispensados na indústria paulista. Até agosto, 31,5 mil vagas já tinham sido cortadas no estado de São Paulo, no pior resultado dos últimos cinco anos.
Que cenário esperar em 2015 para a indústria, que já está patinando este ano? Depende de quem for eleito?
Acredito que 2015 não será um ano fácil. Vamos viver uma crise brava. Já estamos prestes a ver demissões em massa e mais paradas na produção, que já começaram. Não só na indústria, mas em todos os setores. É um período dos mais difíceis que vivi em termos profissionais. Mas acredito que 2015 também será uma oportunidade de ajustar o país para voltar à normalidade.
O que mais prejudica a indústria?
Precisamos de uma condição compatível com a que existe no mundo. O câmbio, por exemplo, tem que flutuar. Hoje, o real ainda está muito valorizado. Precisamos de um dólar a R$ 2,50 ou R$ 2,52 para que haja uma perspectiva de exportação e, ao mesmo tempo, se dificulte um pouco a importação. Se você começa a alterar artificialmente esses quesitos (o câmbio), você impede o desempenho normal da indústria e dos outros setores produtivos. Além disso, os juros altos asfixiaram a economia.
Mas o governo elevou os juros e vinha tentando manter o o câmbio em torno de R$ 2,25 para evitar mais inflação, cenário que também prejudica a indústria, não?
A preocupação do governo sempre foi a inflação, mas por causa da reeleição. Agora, essa preocupação é legítima. Mas acho que o desemprego é um risco maior ainda. Hoje, apesar de o governo estar segurando a inflação, o risco de demissões já está presente em todas as empresas. Além disso, os juros absurdos para o consumidor também trouxeram falta de confiança das pessoas para consumir, aliado ao medo do desemprego. Houve um desmonte do mercado interno, que sustentou o país nos últimos 12 anos.

O modelo de crescimento da economia via consumo se esgotou?
Eu acho que não. Acho que se tivéssemos uma gestão forte e o governo tivesse gastado menos poderia manter esse modelo de crescimento pelo consumo.
O que é necessário para retomar o investimento privado?
Se as reformas forem feitas no ano que vem, acredito que será preciso pelo menos dois anos para resgatar a confiança dos empresários e os investimentos voltarem. Há uma crise de confiança do capital privado com a falta de previsibilidade.
O intervencionismo do governo na economia atrapalhou a indústria?
Isso causou um mal-estar geral. Na nossa visão, o governo não tem que ser gestor. Tem que legislar e cobrar. A indústria, o sistema financeiro e o setor de serviços são maduros o suficiente para tocar as coisas.
É viável ter como interlocutor um ministro da Fazenda demissionário?
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Até sair, o ministro estará lutando para fazer o melhor pelo país. Nós também. Ele não tem interesse em sair e deixar o país numa situação perigosa.
Como analisar o uso do Fundo Soberano para fechar as contas?
Acho que isso é direito do governo. Mas mostra que a gente continua usando de artifícios para atingir os números desejados. Era melhor partir para uma redução do déficit e do gasto para buscar o equilíbrio. Se a gente arrecada menos tem que gastar menos. As coisas têm que ser bem administradas e de forma transparente, o que não está ocorrendo hoje.
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ECONOMIA
Segundo o documento, assinado por mais de 700 economistas, mercado está pressionando o governo a adotar austeridade fiscal e monetária, o que foi chamado de 'pragmatismo sob coação'
07.11.2014 | 18:15
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Fernando Ladeira - O Estado de S. Paulo
Description: elluzzoLuiz Gonzaga Belluzzo é um dos economistas que assina o documento

Um grupo de mais de 700 economistas assinou um manifesto online criticando a ideia de que a austeridade fiscal e monetária seja o único meio para resolver os problemas brasileiros. "Esperamos contribuir para que os meios de comunicação não sejam o veículo da campanha pela austeridade sob coação e estejam, ao contrário, abertos para o pluralismo do debate econômico em nossa democracia", diz o texto. 
Sem citar nomes, o documento afirma que um dos vocalizadores do mantra pela austeridade chegou a afirmar que um segundo mandato de Dilma Rousseff só seria levado a caminhar em direção à austeridade sob pressão substancial do mercado, o que foi chamado de "pragmatismo sob coação".
O manifesto, que conta com a assinatura de nomes como Maria da Conceição Tavares, Luiz Gonzaga Belluzzo, Marcio Pochmann e João Sicsú, argumenta que durante a campanha presidencial foram colocados em votação dois projetos para o País, e o vencedor foi o projeto favorável ao desenvolvimento econômico com redistribuição de renda e inclusão social. O documento conta, até o fim da tarde desta sexta-feira, com 774 assinaturas.
Os economistas afirmaram que, na contramão deste projeto, desde o primeiro dia após a reeleição de Dilma "a difusão de ideias deu a impressão de que existe um pensamento único no diagnóstico e nas propostas para os graves problemas da sociedade e da economia brasileira".
A avaliação de representantes do mercado financeiro de que a desaceleração da economia teria que ser combatida com a credibilidade proveniente de uma austeridade fiscal e monetária, afirma o manifesto, "é inócuo para retomar o crescimento e para combater a inflação em uma economia que sofre a ameaça de recessão prolongada e não a expectativa de sobreaquecimento". Para eles, se essa proposta for adotada isso irá deprimir o consumo das famílias e os investimentos privados, levando a um círculo vicioso de desaceleração ou queda na arrecadação tributária, baixo crescimento econômico e aumento na carga da dívida pública líquida na renda nacional. 
O manifesto acrescenta que é fundamental a preservação da estabilidade da moeda e acrescenta que os signatários do documento também são favoráveis "à máxima eficiência e ao mínimo desperdício no trato de recursos tributários". "Rejeitamos, porém, o discurso dos porta-vozes do mercado financeiro que chama de 'inflacionário' o gasto social e o investimento público em qualquer fase do ciclo econômico." 
O texto ainda critica o argumento de que as desonerações aumentam os gastos públicos e a inflação. Os economistas também avaliam que a inflação manteve-se dentro do limite da meta inflacionária no governo Dilma Rousseff, "a despeito de notáveis choques de custos como a correção cambial, o encarecimento da energia elétrica e a inflação de commodities no mercado internacional".
Para estes economistas, "é essencial manter taxas de juros reais em níveis baixos e anunciar publicamente um regime fiscal comprometido com a retomada do crescimento, adiando iniciativas contracionistas, se necessárias, para quando voltar a crescer". Na semana passada, porém, em uma decisão surpreendente, o Copom decidiu elevar a taxa básica de juros Selic para 11,25% ao ano.
Eles argumentam que a proporção da dívida pública líquida na renda nacional não é preocupante, sob qualquer comparação internacional. A possibilidade de recessão e a carência de bens públicas e infraestrutura social foram citados no manifesto como questões que preocupam os economistas. 
Os países desenvolvidos que adotaram um programa de austeridade registraram um agravamento da recessão, do desemprego, da desigualdade e da situação fiscal, complementa o texto. 

sábado, 8 de novembro de 2014

Politica externa irritada. Politica externa? So irritacao... - Protesto no Itamaraty

Da coluna desse fofoqueiro irrecuperável, mas bem informado, que se chama Claudio Humberto (8/11/2014):
MINISTRO ADVERTE SERVIDOR: DILMA PODE SE IRRITAR…

MINISTRO FIGUEIREDO ADVERTE FUNCIONÁRIOS DO ITAMARATY CONTRA PROTESTO MARCADO: “DILMA PODE SE IRRITAR”

 8 de novembro de 2014 

Em reunião a portas fechadas com a direção do sindicato dos servidores (SindItamaraty), nesta sexta-feira, o ministro Luiz Alberto Figueiredo (Relações Exteriores) advertiu para o risco de “irritar Dilma” o protesto previsto para a próxima semana, contra o atraso na liberação do auxílio-residência para aqueles que trabalham no exterior. Segundo ele, uma vez irritada, Dilma pode cortar de vez o auxílio.

O chanceler Luiz Alberto Figueiredo tem motivos para preocupação: o auxílio-residência, de fato, não está previsto em lei.

O protesto será na segunda (10), enquanto Dilma vai almoçar com 32 embaixadores que esperam há meses para apresentar credenciais.

O chanceler usou a estratégia do medo contra jovens diplomatas que criticaram o engessamento da carreira e o sucateamento do Itamaraty. 

Leia na Coluna Cláudio Humberto.


Addendum: trata-se de novo critério para aferir a qualidade da política externa e a gestão no Itamaraty: o grau de irritabilidade presidencial. Só um pouquinho pode, muito não...

Dois livros: as quatro liberdades de Roosevelt e um projeto para o Brasil de Oswaldo Aranha


As Quatro Liberdades e um Projeto para o Brasil
Leitura de dois livros recentes 
Paulo Roberto de Almeida

Como sempre fazemos quando temos tempo e estamos pela região, para compras ou a lazer, Carmen Lícia e eu costumamos frequentar a biblioteca pública de West Hartford, pequena, para os padrões das bibliotecas universitárias, mas enorme, para os padrões das pequenas cidades americanas de interior. Na verdade, ela não é bem de interior, uma vez que está adjacente à capital de Connecticut, Hartford, e é onde mora boa parte da comunidade afluente que trabalha nesta região: belas casas, excelentes restaurantes, supermercados e lojas superiores à média, e esta boa biblioteca, que leva o nome do primeiro dicionarista da língua americana (sim, ele dicionarizou vários coloquialismos do inglês da América) e provavelmente o segundo da língua inglesa: Noah Webster, que é, aliás, o nome de um famoso dicionário, tradicional, mas ainda hoje vibrante e atualizado, nos mais diversos formatos.
Não se trata de uma biblioteca de pesquisa ou de estudo, mas daquilo que se pode tranquilamente chamar de biblioteca comunitária, embora muito bem guarnecida dos grandes títulos da literatura americana e universal, e podendo servir também para pesquisas escolares. Eu costumo frequentá-la sobretudo para emprestar os novos livros que acabam de ser lançados, e que ainda custam mais de 30 dólares no formato hard cover, antes que a edição brochura os torne mais acessíveis a orçamentos controlados. Pois foi com essa intenção que lá fomos no último domingo. Saí de lá com dois livros novos (que só podem ser emprestados por 15 dias) e com um antigo, de meio século atrás, mas que me interessava consultar: uma edição da Modern Library contendo as duas grandes obras políticas de Maquiavel, O Príncipe e Os Discursos (assim, não mais, ou seja, Tito Lívio reinterpretado pelo grande pensador florentino).
Nada de original neste último livro, a não ser a bela introdução a Maquiavel pelo professor Max Lerner (datada de março de 1940 e de maio de 1950), com alguma bibliografia clássica sobre o grande patriota italiano, inclusive a recomendação, que vou buscar, de ler a introdução ao Príncipe por Lord Acton, feita originalmente para uma edição italiana de 1891, depois incluída no volume editado por John N. Figgis e Reginald V Laurence, The History of Freedom and Other Essays (London: 1907). Para este eu tenho de recorrer à biblioteca da Universidade de Yale, onde aliás tenho de ir para devolver vários outros livros que retirei sobre Bretton Woods. Provavelmente na próxima terça-feira, quando vou para uma palestra sobre a Rússia e Ocidente, por um diplomata do Department of State encarregado do setor.


Mas volto aos dois livros novos que retirei, ambos conectados ao meu período atual de pesquisas, a primeira metade do século XX e as relações internacionais do Brasil na primeira república e na era Vargas. Eles são, respectivamente, os seguintes:

Harvey J. Kaye: The Fight for the Four Freedoms: What Made FDR and the Greatest Generation Truly Great (New York: Simon & Schuster, 2014, 292 p.).

Neill Lochery: Brazil: The Fortunes of War, World War II and the Making of Modern Brazil (New York: Basic Books, 2014, 314 p.)

O primeiro livro é um exemplo evidente do chamado pensamento liberal americano, ou seja, um autor socialdemocrata, praticamente de esquerda, em todo caso, um rooseveltiano convencido e um new dealer engajado, se o New Deal ainda estivesse em vigor (mas ele acredita que Obama está nessa linha, embora não tenha feito tanto quanto deveria, contra as corporações e a oposição reacionária). Quando eu li, logo na Introdução, que os Estados Unidos estiveram submetidos, nos trinta anos anteriores, às corporate priorities e ao private greed, eu pensei que o autor estivesse brincando, mas é isso mesmo: ele acha que a grande geração de Roosevelt teve de enfrentar uma powerful conservative, reactionaire opposition, para salvar o país da economic ruin and political oblivion. Deve ter sido isso mesmo, mas eu não estava acostumado com uma história em preto e branco desde algum tempo.
Em todo caso, se trata de uma boa história, feita a partir dos papeis deixados por FDR em seus arquivos de Hyde Park, sobre a construção dos Estados Unidos como hoje eles se apresentam ao mundo: não mais isolacionistas, não mais voltados para si mesmos, mas engajados no mundo, e mais igualitários (ou pelo menos deveria ser assim) e mais democráticos. O eixo central é dado obviamente pelas quatro liberdades que Roosevelt moldou logo ao início da guerra europeia, e que ele proclamou em sua mensagem ao Congresso de janeiro de 1941, logo após conquistar o seu terceiro mandato e antes, portanto, que os Estados Unidos fossem atacados e entrassem, finalmente, na guerra (da qual eles já vinham participando pelo apoio irresoluto concedido ao Reino Unido, praticamente sozinho no enfrentamento da máquina de guerra de Hitler).
Os quatro grandes conceitos foram expostos com invulgar clareza no seu State of the Union, na tarde do dia 6 de janeiro de 1941, em face de todo o Congresso reunido para ouvi-lo. Roosevelt, que já vinha procurando superar as resistências isolacionistas do Congresso, para converter os EUA no “Arsenal da Democracia”, insistiu na tecla de que seria ilusório tentar esconder-se atrás de grandes muralhas defensivas, daí a necessidade de preparar adequadamente a nação para qualquer eventualidade. Ele então proclamou a sua visão do mundo, os grandes princípios em torno dos quais todos os americanos estariam unidos, não apenas para si mesmos, mas para todo o mundo:
In the future days, which we seek to make secure, we look forward to a world founded upon four essential freedoms. The first is freedom of speech and expression … The second is freedom of every person to worship God in his own way … The third is freedom from want … The fourth is freedom from fear…” E ele acrescentou logo em seguida: “That is no vision of a distant millennium. It is a definite basis for a kind of world attainable in our own time and generation.” (p. 75)
Esses princípios seriam inscritos na Carta do Atlântico, que Roosevelt assinou com Winston Churchill, em agosto seguinte, nas costas do Canadá, e foram consagrados depois na carta das nações unidas, no ano seguinte; eles constituíram uma espécie de “New Deal for the world”, como afirmou a historiadora Elizabeth Borgwardt p. 88). O livro dela (citado em nota da p. 239), é este aqui: A New Deal for the World: America’s Vision for Human Rights (Cambridge, MA: Harvard University Press, 2005).


O Brasil viria a assinar a carta das nações unidas logo em seguida ao seu engajamento ao lado dos Estados Unidos no esforço de guerra, no seguimento do ataque japonês a Pearl Harbor e da declaração de guerra pela Alemanha, o que determinou o rompimento de relações diplomáticas do Brasil com as potências do Eixo, uma decisão que leva sobretudo a marca de Oswaldo Aranha. Vargas e o seu chanceler de 1938 até 1944 estão justamente no centro do segundo livro aqui registrado, pelo historiador britânico Neill Lochery, professor de Mediterranean and Middle Eastern Studies do College University of London, já autor de um livro sobre a neutralidade de Portugal na Segunda Guerra Mundial, mais especificamente sobre o papel de Lisboa, enquanto centro de intrigas, espionagem e negociações durante todo o decorrer da guerra.
A Introdução do livro já começa destacando o famoso documento-guia que Oswaldo Aranha preparou para as conversas de Vargas com Roosevelt, no encontro que ambos tiveram no Rio Grande do Norte, em janeiro de 1943, uma lista de objetivos de guerra que o Brasil declarava aos EUA, mas que também podem ser vistos como uma espécie de planejamento estratégico feito pelo grande chanceler para assegurar uma posição de realce para o Brasil na ordem internacional que estaria sendo desenhada pouco mais à frente para assegurar a paz e reconstruir o mundo. Seu caráter de lista de demandas não esconde a visão grandiosa que Oswaldo Aranha mantinha quanto ao papel do Brasil naquele mundo em efervescência. Vale a pena citá-las, uma por uma, e verificar, hoje, onde estamos, ou como ficamos, em relação a cada um dos pontos. O autor cita a partir do artigo de Frank D. McCann, um conhecido historiador brasilianista do exército brasileiro e da aliança militar dos anos de guerra: “Brazil and World War II: The Forgotten Ally. What Did You Do in the War, Zé Carioca?”, Estudios Interdisciplinarios de América Latina y el Caribe 6, n. 2 (Tel Aviv University, July-December 1995, 35-70; mas o link citado à p. 309 deve ser substituído por este aqui: http://www1.tau.ac.il/eial/index.php?option=com_content&task=view&id=741&Itemid=283). Antes de reproduzir a lista, vale retomar os argumentos iniciais de Aranha.
Oswaldo Aranha acreditava, pragmaticamente, que a política tradicional do Brasil, de apoiar os Estados Unidos no mundo, em troca do seu apoio na América do Sul, deveria ser mantida “até a vitória das armas americanas na guerra e até a vitória e a consolidação dos ideais americanos na paz.” Os Estados Unidos iriam liderar o mundo quando a paz fosse restaurada e seria um grave erro se o Brasil não estivesse do seu lado. Ambas nações eram “cósmicas e universais”, com características continentais e globais. Ele tinha plena consciência de que o Brasil era uma “nação economicamente e militarmente fraca”, mas o seu crescimento natural, ou as migrações do pós-guerra, lhe dariam o capital e a população que o fariam tornar-se, “inevitavelmente um dos grandes poderes políticos do mundo”. A sua lista combinava objetivos imediatos e de mais longo prazo, como reproduzida no artigo de McCann e no livro de Lochery (p. xv):
1)   a better position in world politics;
2)   consolidation of its superiority in South America;
3)   a more secure and intimate cooperation with the United States;
4)   greater influence over Portugal and its possessions;
5)   development of maritime power;
6)   development of air power;
7)   development of heavy industries;
8)   creation of war industries;
9)   creation of industries -agricultural, extractive, and light mineral- complementary to those of the United States and essential for world reconstruction;
10) expansion of Brazil's railways and highways for economic and strategic purposes;
11) exploration for essential combustible fuels.
Observando-se a lista de Oswaldo Aranha, com os olhos de 2014, o que poderia ser dito dos seus objetivos de guerra, do ponto de vista do atingimento de cada um deles em tempos de paz e nos setenta anos decorridos desde a sua redação? Registro aqui que os argumentos dos próximos parágrafos são meus, e não constam do livro de Lochery.
Uma melhor posição na política mundial? Um objetivo certamente avançado depois da democratização e da estabilização macroeconômica, esta última iniciada sob Fernando Henrique Cardoso no governo Itamar Franco, e consolidada nos dois governos FHC, o que foi plenamente aproveitado pelo governo Lula para desenvolver uma diplomacia ativa, beneficiado ainda pelo enorme impulso dado pela demanda chinesa por produtos brasileiros de exportação para acumular alguma riqueza e projetar influência na região e no mundo. Não é seguro que essa posição tenha sido consolidada com a visível retração registrada no período recente, mas também por iniciativas pouco avisadas ou altamente controversas, ainda sob Lula e mantidas por sua sucessora, com alianças dúbias com regimes pouco recomendáveis, e uma retração formidável na defesa da democracia e dos direitos humanos nos planos regional e mundial. Talvez se consiga, novamente, num futuro indefinido, uma “melhor posição na política mundial”, mas isso vai depender, seriamente, de uma melhoria na qualidade da política externa, hoje dominada por companheiros viciados numa visão do mundo anacrônica e distorcida quanto aos reais interesses do Brasil.
Uma consolidação da “superioridade” brasileira na América do Sul? Trata-se bem mais de uma ilusão do que de um objetivo, mas ele deve ser visto numa outra perspectiva, que era a de Oswaldo Aranha, em face de uma Argentina superior nos planos econômico e militar, e que tinha, sim, uma vocação de afirmar sua influência no entorno imediato e nas relações com as grandes potências, a Grã-Bretanha e os próprios Estados Unidos. A Argentina era o “inimigo principal” em qualquer cálculo que os militares brasileiros pudessem fazem no plano estratégico e no contexto tático, e os maiores recursos de segurança e defesa, não necessariamente ofensivos, estavam dispostos ao longo das fronteiras meridionais. Apenas por isso Aranha colocou esse objetivo em segundo lugar, e não necessariamente para impor uma liderança imperial do Brasil na região; a superioridade deveria ser vista aqui apenas como uma agregação suficiente de forças para tornar o país “inatacável” por qualquer vizinho, a começar pelo mais “íntimo inimigo”. Essa situação está agora completamente superada, mas só os ingênuos e os amadores em diplomacia – entre eles vários companheiros, mas também alguns homens de negócios – falam em liderança brasileira na região; para o Itamaraty, esse tema é tabu, embora haja a percepção de que a consolidação de um espaço econômico integrado, baseado em abertura de mercados e intensa cooperação em projetos de integração física, seriam suficientes, junto com a afirmação plena dos valores da democracia e dos direitos humanos, para assegurar essa liderança, que seria natural, e não imposta. Mas, parece que estamos recuando em todas essas frentes, para maior tristeza dos diplomatas profissionais e dos liberais econômicos (que são poucos, mas ainda existem em nosso país).
Uma cooperação mais íntima e mais segura com os Estados Unidos? Difícil dizer em quais termos, pois impérios universais não mantém relações de igual para igual nem mesmo com seus mais “íntimos” aliados. O Brasil sempre manteve desconfiança em relação ao gigante do norte, mesmo nos anos de aliança não escrita dos tempos do Barão, e naqueles de aliança militar no imediato pós-guerra, o que só fez crescer nos anos seguintes, com os desejos dos militares – e de vários diplomatas – de uma rápida nuclearização do Brasil, em face dos esforços americanos de contenção da proliferação nessa área (e não apenas como cálculo estratégico, e sim também em função de uma visão do mundo menos belicoso, digamos assim). Essa cooperação sempre foi difícil e não parece que tenha se tornado mais plausível no período recente, muito pelo contrário (já que o antiamericanismo dos companheiros salta aos olhos de qualquer neófito). Este não pode ser um objetivo em si, mas é uma possibilidade, dentro de certas condições e circunstâncias, que provavelmente vão exigir maior grau de capacitação brasileira para ser colocado novamente na agenda bilateral; mas, paradoxalmente, parece que o Brasil só vai se capacitar mais rapidamente por meio de uma “cooperação mais íntima e mais segura com os Estados Unidos”, o que pode parecer bizarro a mais de um título.
O quarto objetivo, com respeito a Portugal e suas “possessões”, mudou de caráter, mas essa influência é certamente maior hoje do que foi no passado colonial, e tende a se tornar ainda mais relevante, inclusive em direção de Portugal, embora o lento crescimento e a perda de competitividade dos últimos anos tenham diminuído o ímpeto brasileiro na “reconquista” da antiga metrópole.
Os objetivos 5 a 11, são todos eles instrumentais, alinhados numa época em que o Brasil era um país economicamente atrasado, em todas as áreas, e se esperava que os Estados Unidos financiassem, e fornecessem a tecnologia, para nossa capacitação em todas elas. Aos trancos e barrancos fomos avançando nas décadas seguintes, tanto com os fluxos de investimentos estrangeiros e de financiamento externo, quanto com a cooperação bilateral nas áreas científicas e tecnológicas, um processo que continua sem cessar, tanto na vertente pública, quanto nas diversas interfaces privadas. Em alguns ramos industriais, e certamente em quase todo o setor agrícola, o Brasil se tornou um país avançado, até mesmo um “killer”, em matéria de competitividade agrícola, e isso tem tanto a ver com a cooperação externa (basicamente americana), quanto com a construção de uma base própria de capital humano e científico. Não se pode dizer que tenhamos nos tornado uma formidável potência militar, mas o que existe garante um mínimo de dissuasão, quando não de projeção externa em dimensões limitadas. Para se ter mais nessa área, seria preciso convencer a sociedade a aceitar mais gastos militares, ou com segurança, de modo geral, o que não parece compatível com necessidades bem mais prementes em várias áreas sociais. Aliás, o Brasil não é mais forte militarmente não porque invista pouco nessa área, mas porque seus recursos humanos são deficientes de maneira geral, na inovação tecnológica em especial. Trata-se de um resultado de políticas erradas na área educacional, que não têm nada a ver com debilidades próprias do establishment militar.
Bem, mas o livro de Neill Lochery, Brazil: The Fortunes of War, não trata dessas questões senão em sua introdução e conclusões, pois o essencial do livro está dedicado ao envolvimento do Brasil na guerra, o que é feito de maneira minuciosa e competente. No conjunto, os dois livros constituem leitura muito agradável e, nos dois casos, altamente instrutiva quanto aos dois temas foco de cada um Kaye é bem mais ideológico, no seu rooseveltismo radical, do que Lochery, um inglês equilibrado e bastante objetivo em suas considerações analíticas sobre o Brasil. Seu livro me confirmou a impressão, que já tenho desde longos anos, de que o Brasil perdeu uma enorme oportunidade ao não ter tido uma personalidade como Oswaldo Aranha na liderança efetiva do país, em algumas das chances em que a história poderia ter aberto uma janela para ele: em 1934, em 1937, em 1945, em 1950, ou mesmo em 1955; em todas elas ele poderia, hipoteticamente, estar à frente de uma coalizão liberal para fazer do Brasil um país muito diferente do que foi, sob a condução de políticos populistas, de líderes militares muito próximos do corporatismo de corte fascista, ou de incompetentes manifestos, como podem ter sido Dutra, Goulart ou mesmo alguns outros em fases subsequentes. Oswaldo Aranha foi muito obsequioso com seu chefe e amigo, mas poderia ter continuado a ser a “estrela da revolução”, que foi na coalizão liberal de 1930, e que depois se perdeu no labirinto do varguismo maquiavélico. Foi uma pena para o país, uma pena para todos nós.

Paulo Roberto de Almeida
Hartford, 7 de novembro de 2014

PS.: Vou programar uma nova visita ao museu Norman Rockwell onde estão expostas suas quatro grandes telas sobre as quatro liberdades, tal como feitas para apoiar Roosevelt em seu esforço didático de convencimento da nação americana a empreender uma "good war", pelas boas causas.

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Mudancas na politica externa: quando tudo parecia possivel - Helena Celestino (O Globo)

Calma pessoal: nenhuma mudança em vista, repito: NENHUMA.
O artigo abaixo, retirado das catacumbas de meus arquivos eletrônicos, reflete apenas um momento de otimismo indevido: quando a candidata sustentável parecia imbatível e já se começava a pensar em uma outra política externa.
O artigo é dessa época, e abaixo dele seguem os comentários de um embaixador, falando da diplomacia do lulo-petismo.
Depois disso os companheiros se recompuseram, esmagaram a trator, a caneladas, a tiros de canhão e a mísseis teleguiados a dita candidata, até conseguir tirá-la do páreo. Depois fizeram o mesmo com o candidato oposicionista. Os mafiosos usaram dos mesmos recursos, insistindo na calúnio, nas mentiras e também no terrorismo eleitoral para conseguir ganhar mais quatro anos de roubos, malfeitos, malversações, deterioração da economia, erosão das instituições e retrocessos mentais.
Enfim, o artigo é de quando se pensava que algo iria mudar.
Não custa sonhar...
Paulo Roberto de Almeida

Diplomacia de oposição
COLUNA
Helena Celestino
O Globo, 07/09/2014

“O Itamaraty poderia ter sido mais valorizado nos últimos anos, foi esvaziado com a partidarização e ideologização da política externa”. A frase de Marina Silva, em destaque no seu programa de governo, soou como música nos ouvidos dos diplomatas brasileiros, a maioria convicta de que a presidente Dilma Rousseff não gosta nada de relações internacionais e tem um olhar atravessado para os punhos de renda que enxerga no ritual da diplomacia. Quatro anos de governo Dilma transformaram o Itamaraty num poço de mágoas por causa das inúmeras trombadas com o Planalto, reforçadas pela decisão de impor uma redução de 40% nas verbas, entendida como sinal de desprestígio.
O programa de Marina é mais verde e tem mais verve, o de Aécio Neves tem uma visão mais comercial e financeira da política externa, mas nesta diplomacia de oposição há muitos pontos em comum.
Política externa, a gente sabe, não elege ninguém. Nem no Brasil nem nos EUA, o país onde cada geração tem uma guerra para chamar de sua. O discurso pacifista de Obama empolgou os americanos, mas provavelmente foram a crise econômica, as milhões de casas retomadas pelos bancos por falta de pagamento e as falcatruas no mercado financeiro que derrotaram os republicanos nas eleições americanas de 2008 e 2012. Não por acaso, o papel do Brasil neste enlouquecido mundo está fora dos palanques, até agora relegado aos palavrosos programas de partido e a uma longa entrevista na revista “Política Externa” — Dilma não mandou resposta às perguntas.
Duas certezas para o próximo governo se a oposição ganhar. As relações com os EUA vão recuperar o espaço perdido, e o Brasil tentará se livrar das correntes pesadas do Mercosul — como define um embaixador. Tentará ficar só com o lado bom de pertencer ao bloco, apostando também em acordos bilaterais e com a União Europeia. “Marina desenha uma política externa mais equilibrada, admitindo que o Brasil tem vários eixos de interesse”, diz ele. Numa tradução livre, significa que acabará o alinhamento automático com os governos de esquerda da América Latina e a paciência irrestrita com a Argentina.
Outra barbada: o verde será a cor dominante no governo se a candidata do PSB for eleita. Marina tem prestígio internacional como ambientalista; na ONU é recebida com reverência, nas Olimpíadas de Londres de 2012 estava ao lado do secretário-geral Ban Ki-moon, reconhecida como uma das personalidades que fazem diferença no mundo. Ela certamente fará da defesa do meio ambiente a marca do Brasil nos fóruns internacionais, um pouco no estilo do presidente Lula quando o Brasil virou referência nos programas contra a fome e de redução de pobreza.
Uma novidade bacana trazida por Marina é a criação de um conselho, nos moldes do British Council, para promover a cultura brasileira e a língua portuguesa no exterior. Num momento em que programações do Itamaraty são canceladas por falta de dinheiro, parece delírio de candidato, mas é o simples reconhecimento do poder do soft power, a capacidade de um país influenciar pessoas e fazer amigos sem recorrer à força. A ideia é dar incentivos fiscais para atividades culturais no exterior, numa espécie de Lei Rouanet com alcance internacional. “ Seria ótimo. A China vem investindo muito nisso, o Brasil também tem muitas iniciativas culturais, mas nada coordenado”, diz o professor Anthony Pereira, diretor do Instituto Brasil no King’s College.
A outra promessa de Marina é obvia, mas sempre reconforta: atualizar as posições do Brasil no Conselho de Direitos Humanos da ONU e no tratamento dos conflitos regionais. Todo candidato ou recém-eleito faz isso: Dilma, ao assumir, deu uma entrevista ao “Washington Post”, em que contou que o Brasil votaria na ONU a condenação do Irã pelo apedrejamento da adúltera Sakineh — lembram? —, criticando Lula por ter optado pelas relações com o aliado em vez da defesa dos direitos humanos. Depois, o assunto direitos humanos ficou adormecido, e o país acabou de receber os presidentes da China e Rússia na reunião dos Brics sem levantar questões incômodas.
Aécio defende especificamente a missão de paz do Brasil no Haiti — como modelo para uma participação maior do país no mundo — e critica o governo Dilma pela condução do caso do asilo ao senador boliviano Pinto Molina, que teve salvo-conduto negado por Evo Morales e acabou sendo retirado escondido da Bolívia.
Independentemente de quem ganhar a eleição, está na hora de reconhecer a competência técnica e visão estratégica dos profissionais treinados para isso. Quando a política externa vai bem, a imagem do Brasil no exterior nos conforta, o comércio cresce, a solidariedade com países em dificuldades recompensa, os conflitos viram acordos, o cidadão comum se sente acolhido quando precisa de ajuda no exterior.

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De:
Enviada: Quinta-feira, 11 de Setembro de 2014 22:50
Para:
Assunto: Artículo de periódico O Globo sobre Itamaraty.

Comentários em alguns aspectos interessantes e válidos. Mas o diagnóstico de Marina, citado pela Helena Celestino (de quem sou leitor " fanático"), sofre de um defeito básico: ignora todos os graves desvios, equívocos e êrros cometidos já durante a era Lula. Foi àquela época que teve início, e de forma por assim dizer dramática, a dita " partidarização e ideologização" de nossa política externa - para o quê, cumpre dizer, não faltaram recursos ao Itamaraty, que foi amplamente "valorizado" em troca de seu então incansável empenho por servir aos desígnios do lulopetismo em questões de política externa. Falo de "lulopetismo" porque sim houve um outro element a distorcer nossa política externa, que foi o da submissão do Itamaraty aos desígnios de engrandecimento, mundo afora, da " persona" de Lula. O charisma de Lula foi, inegavelmente, de valia para os interesses do país em alguns casos.
Isso merece uma avaliação serena e objetiva. Mas o hiperativismo por isso estimulado levou a um excesso de protagonismo nem sempre saudável.
Nem tudo o que era bom para o Presidente resultaria bom para os objetivos do país.
O problema, assim, não é o de proceder-se a uma "revalorização" do Ministério.O que urge é uma ampla reformulação da própria política externa, começando pela revisão de suas bases conceituais e doutrinárias. E incluindo a extinção da dualidade de comando herdada por Dilma de Lula, com a presença, em paralelo ao Chanceler, de um assessor presidencial munido de vôo próprio. Voando mesmo, não poucas vezes, bem mais alto do que o titular do MRE.
A esta altura, com a possibilidade de mudança de rumos em nossa política exterior, é inevitável um voltar de olhos para os últimos quase quatorze anos. Mas as referências à plataforma de Marina - e o que pensam sobre as questões de política externa os outros candidatos - naturalmente requerem reflexão detida sobre o que convém fazer em termos de " aggiornamento" de nossas posturas, e de calibragem de nossa atividade, num mundo que hoje se apresenta substancialmente diferente daquele em que surgiu, e ao longo do tempo desdobrou-se, a era "lulopetista" de nossa política externa.
Há muito mais o que dizer sobre o assunto.
Volto depois ao tema. Se fizer sentido, eu talvez até tente colocar algo a respeito na imprensa.
 [Xxxxx]

Inculta e feia: a lingua sofre sob os companheiros, e recua, como alias a economia, a politica, a moral...

O assunto é antigo mas sempre cabe refrescar a lembrança sobre o festival de besteiras que assola o país, o Febeapá III, ou IV, talvez até V (se computarmos todos os "causos" de linguagem).
O que dizer de tudo isso?
Estupidez, subserviência, patetice, enfim, várias outras coisas.
Por vezes a gente sente vergonha do país.
Em outras vezes a gente cansa...
Paulo Roberto de Almeida

Diplomas terão de flexionar gênero segundo sexo do diplomado

Projeto de lei consumiu cinco anos no Senado e foi sancionado por Dilma Rousseff

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RIO - No governo da primeira mulher presidente, chamada de “presidenta” nos textos do Planalto, mulheres que se formarem em Engenharia ou Biologia, por exemplo, podem agora exigir: o diploma tem de vir não só com a palavra “engenheira” ou “bióloga”, mas também com “bacharela”. Projeto de lei que consumiu cinco anos de tramitação no Senado, mais outros dois na Câmara, e que acaba de ser sancionado por Dilma Rousseff, determina que instituições de ensino públicas e privadas passem a emitir diplomas e certificados com “flexão de gênero correspondente ao sexo” do diplomado, “ao designar a profissão e o grau”. Para acadêmicos e linguistas, porém, a mudança é inócua, além de confundir o título - de bacharel, mestre ou doutor, por exemplo - com o tratamento à pessoa.

De número 12.605, a lei, de 3 de abril, veio de um projeto de lei de 2005 da então senadora petista Serys Slhessarenko. O texto também determina que quem já se formou pode requerer outro diploma “com a devida correção”.

- É uma perda de tempo e esforço - diz a escritora Ana Maria Machado, presidente da Academia Brasileira de Letras (ABL). - Não estou falando como presidente da ABL, mas como autora. O país tem outras prioridades. Se o objetivo era igualdade de gênero, que se construam creches, para que as mulheres possam trabalhar e ter independência econômica. Que sejam então proibidos nomes como Juraci e Alcione, que a gente nunca sabe se é homem ou mulher.

Além de ter efeito discutível, a mudança é um erro, avalia o acadêmico Evanildo Bechara, do setor de Lexicografia e Lexicologia da ABL:

- A lei confunde título com tratamento. Os certificados e diplomas concedem o título de doutor. Na hora em que você vai tratar o diplomado, é que muda o tratamento para doutor ou doutora conforme o sexo. Dizer que um diploma concede título de mestra é erro de redação. A culpa nem é da presidente, a ideia veio do Congresso; mas faltou orientação a ela. Além disso, nos regimes democráticos os governos não interferem na língua. Quem fez isso foi Mussolini.

- Gênero não tem a ver com sexo - afirma o professor de Língua Portuguesa Sérgio Nogueira. - Não é machismo; a forma masculina, na norma da língua, é neutra. “Todos os presentes no local” não se refere só a homens. Machismo não está na palavra, está na mente da pessoa.

Muro de Berlim: a 25 anos de sua queda, milhoes ainda vivem sob tiranias comunistas - Marion Smith (WSJ)

Não se trata apenas dessas tiranias abjetas, desses despotismos ordinários, dessas ditaduras miseráveis, pois existem, também, muitos comunistas em diversos outros lugares do mundo, aliás no próprio Brasil, gente delirante, que pretende controlar, censurar, dominar, estatizar, conforme seus instintos comunistas e fascistas...
Paulo Roberto de Almeida

The Berlin Wall Fell, but Communism Didn’t
From North Korea to Cuba, millions still live under tyrannous regimes
By  Marion Smith       
Nov. 6, 2014   WALL STREET JOURNAL   

As the world marks the 25th anniversary of the fall of the Berlin Wall on Nov. 9, 1989, we should also remember the many dozens of people who died trying to get past it.

Ida Siekmann, the wall’s first casualty, died jumping out of her fourth-floor window while attempting to escape from East Berlin in August 1961. In January 1973, a young mother named Ingrid hid with her infant son in a crate in the back of a truck crossing from East to West. When the child began to cry at the East Berlin checkpoint, a desperate Ingrid covered his mouth with her hand, not realizing the child had an infection and couldn’t breathe through his nose. She made her way to freedom, but in the process suffocated her 15-month-old son. Chris Gueffroy, an East German buoyed by the ease of tensions between East and West in early 1989, believed that the shoot-on-sight order for the Berlin Wall had been lifted. He was mistaken. Gueffroy would be the last person shot attempting to flee Communist-occupied East Berlin.

But Gueffroy was far from the last victim of communism. Millions of people are still ruled by Communist regimes in places like Pyongyang, Hanoi and Havana.

As important as the fall of the Berlin Wall was, it was not the end of what John F. Kennedy called the “long, twilight struggle” against a sinister ideology. By looking at the population statistics of several nations we can estimate that 1.5 billion people still live under communism. Political prisoners continue to be rounded up, gulags still exist, millions are being starved, and untold numbers are being torn from families and friends simply because of their opposition to a totalitarian state.

Today, Communist regimes continue to brutalize and repress the  hapless men, women and children unlucky enough to be born in the wrong country.

In China, thousands of Hong Kong protesters recently took to the streets demanding the right to elect their chief executive in open and honest elections. This democratic movement—the most important protests in China since the Tiananmen Square demonstrations and massacre 25 years ago—was met with tear gas and pepper spray from a regime that does not tolerate dissent or criticism. The Communist Party routinely censors, beats and jails dissidents, and through the barbaric one-child policy has caused some 400 million abortions, according to statements by a Chinese official in 2011.

In Vietnam, every morning the unelected Communist government blasts state-sponsored propaganda over loud speakers across Hanoi, like a scene out of George Orwell ’s “1984.”

In Laos, where the Lao People’s Revolutionary Party tolerates no other political parties, the government owns all the media, restricts religious freedom, denies property rights, jails dissidents and tortures prisoners.

In Cuba, a moribund Communist junta maintains a chokehold on the island nation. Arbitrary arrests, beatings, intimidation and total  media control are among the tools of the current regime, which has never owned up to its bloody past.

The Stalinesque abuses of North Korea are among the most shocking. As South Korea’s President Park Geun-hye recently told the United Nations, “This year marks the 25th anniversary of the fall of the Berlin Wall, but the Korean Peninsula remains stifled by a wall of division.” On both sides of that wall—a 400-mile-long, 61-year-old demilitarized zone—are people with the same history, language and often family.

But whereas the capitalist South is free and prosperous, the Communist North is a prison of torture and starvation run by a family of dictators at war with freedom of religion, freedom of movement and freedom of thought. President Park is now challenging the U.N. General Assembly “to stand with us in tearing down the world’s last remaining wall of division.”

To tear down that wall will require the same moral clarity that brought down the concrete and barbed-wire barrier that divided Berlin 25 years ago. The Cold War may be over, but the battle on behalf of human freedom is still being waged every day. The triumph of liberty we celebrate on this anniversary of the Berlin Wall’s destruction must not be allowed to turn to complacency in the 21st century. Victory in the struggle again totalitarian oppression is far from inevitable, but this week we remember that it can be achieved.

Mr. Smith is executive director of the Victims of Communism Memorial Foundation in Washington, D.C.