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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

domingo, 19 de abril de 2020

Dia 20 de abril, dia do Diplomata, nascimento do Barão do Rio Branco - Paulo Roberto de Almeida (1996)

Tendo em vista a pandemia do Codiv-19, em 2020, não será comemorado neste dia 20 de abril, data do nascimento de José Maria da Silva Paranhos Jr. – futuro Barão do Rio Branco e chanceler do Brasil (1902-1912) – o tradicional Dia do Diplomata, ocasião na qual são agraciados "brasileiros ilustres" com a Ordem do Rio Branco, e tem lugar a formatura da turma deste ano do Instituto Rio Branco, ou seja, os novos diplomatas.
Estou coletando minhas obras sobre o Barão, o que informarei em próxima postagem, e já posto meu primeiro trabalho especificamente sobre nosso patrono, redigida em 1996.
Paulo Roberto de Almeida


O legado do Barão:
Rio Branco e a moderna diplomacia brasileira

Paulo Roberto de Almeida *

O Barão do Rio Branco é, incontestavelmente, um dos founding Fathers da moderna diplomacia nacional, ou talvez mesmo a única personagem histórica brasileira capaz de verdadeiramente representar, no terreno da política externa, o que poderíamos chamar de — parafraseando a imagem que Euclides da Cunha empregou para caracterizar D. Pedro II em Contrastes e Confrontos — um “epítome vivo do Brasil”. Em sua donairosa figura talhada num estilo belle époque, ele condensa, presumivelmente, o que as tradições nacionais em política internacional produziram de melhor na longa história institucional do Itamaraty. Coincidentemente, sua permanência física no primeiro Palácio que leva esse nome no Rio de Janeiro — excetuando-se a curta gestão inicial do Chanceler Olinto de Magalhães (1899-1901), que no entanto nele não residiu — confunde-se com o próprio surgimento do Itamaraty enquanto cenário da diplomacia brasileira, que foi ali forjada ao longo de sete décadas de regime republicano.

O Homem e o Mito

Figura solitária no panteão quase deserto dos 174 anos de diplomacia nacional — onde sobressaem-se, é verdade, algumas outras fortes personalidades, vindas entretanto do mundo político, como Oswaldo Aranha, Raul Fernandes, João Neves da Fontoura, Afonso Arinos de Mello Franco ou San Tiago Dantas —, o Barão é, simultaneamente, uma figura emblemática e o marco fundador de uma política externa posta manifesta e exclusivamente a serviço dos interesses nacionais. Tendo primeiro construído, segundo suas próprias palavras, “o mapa do Brasil”, ele pôde dedicar-se depois à difícil tarefa de consolidar a união e a amizade dos povos sul-americanos. Pragmático, antes de mais nada, no sentido de não ater-se a princípios rígidos de atuação diplomática — privilegiando a arbitragem ou a negociação direta, segundo o que melhor conviesse no momento em causa —, mas profundo conhecedor do direito internacional e da história e geografia brasileiras, o Barão permanece praticamente solitário nessa condição de demiurgo de nossa política externa, descontando-se, eventualmente, as míticas figuras ancestrais, mas eminentemente simbólicas, de Alexandre de Gusmão e do “Patriarca da Independência”, Bonifácio de Andrada. 
A reverência para com ele, na Casa, é de praxe, como bem sabem os poucos iconoclastas localizados (e provavelmente isolados pelos demais colegas): não se fala do Barão como de um “simples” chanceler. Ele sempre foi bem mais do que isso: rara combinação de forjador da unidade territorial brasileira e de mentor de uma diplomacia imaginativa, afirmativa e supostamente clarividente — no estabelecimento da chamada “aliança não-escrita” com os Estados Unidos, por exemplo —, o “mito” do Barão há muito extrapolou o âmbito restrito do serviço exterior brasileiro e mesmo os limites geográficos do território nacional. 
Na verdade, o mito já existia antes que sua elegante figura — quase que diretamente saída, poder-se-ia dizer, de um dos romances de Eça de Queiróz —, ocupasse durante praticamente uma década inteira (e quatro presidências) o velho Palácio do Itamaraty do Rio de Janeiro: sua recepção triunfal no porto do Rio de Janeiro, chegando de um “exílio” de quase um quarto de século na Europa para ocupar o posto ministerial oferecido por Rodrigues Alves, atestou o quanto a pátria era reconhecida ao defensor vitorioso de nossas pendências lindeiras em casos de difícil comprovação de um direito “original” ao território contestado. Exemplos de sua incrível capacidade em reverter em benefício do País casos de difícil solução pelas vias “normais” de solução de controvérsias são encontrados no encaminhamento das delimitações de fronteiras com a Argentina — em relação ao qual um primeiro acordo desastradamente costurado por Quintino Bocaiúva não tinha conseguido passar pelo crivo do Congresso — e com a Bolívia, aqui envolvendo reconhecidamente cessão e compra de território estrangeiro: combinando habilmente o recurso ao uti possidetis — em áreas cuja comprovação de posse efetiva teria sido difícil a outrém que não o eminente conhecedor dos mais diminutos recônditos da ocupação colonial lusa e bandeirante — com doses variadas de argumentação diplomática e de firme persuasão, o Barão (“mero” Consul em Liverpool no primeiro caso) assegurou para o Brasil vitórias consagradoras em dois difíceis litígios. 

Carisma e diplomacia

A figura patriarcal do “velho” Barão constitui, para a diplomacia brasileira, um excelente exemplo do que, na terminologia sociológica weberiana, chamaríamos de “liderança carismática”, ou seja, uma autoridade inconteste dotada de suas próprias fontes de legitimidade intrínseca, baseada na experiência e no saber. O Itamaraty como um todo, aliás, sempre foi afirmadamente weberiano, ainda que malgré-lui: tendo começado a funcionar sob uma sociedade manifestamente “patrimonialista”, a Casa adquiriu sua aura de prestígio sob a administração decididamente “carismática” do Barão. Neste século, ela soube acompanhar o processo de modernização do Estado, passando por diversos experimentos de racionalização burocrática — de inspiração “daspiana” ou autônoma — para afirmar sua crescente profissionalização, segundo o modelo da administração “racional-legal”, por intermédio do Instituto que leva o nome do patrono da Casa, criado em 1945. 
O Itamaraty passa e repassa, constantemente, toda a tipologia do mestre de Heidelberg, combinando carisma e poder, tradição e burocracia, segundo um modelo no qual a própria burocracia diplomática apresenta-se como carismática, em face das demais corporações do Estado: cultiva-se muito, dentro e fora da Casa, o mito da excelência. Por outro lado, ele tampouco deixa de ter uma espécie de iron cage: uma personalização extremamente rebuscada das relações de poder dificulta, em última instância, a rotinização do diplomata brasileiro, isto é, a institucionalização definitiva da carreira, esse obscuro objeto do desejo da maior parte dos diplomatas. 
Em todo caso, se alguma vez praticamos no Brasil o culto a uma personalidade política qualquer, essa palma reverte integralmente ao Senhor Barão, já que o candidato alternativo — ou melhor dito, “oficial” —, Getúlio Vargas, não pode razoavelmente ter sua preeminência histórica derivada “geneticamente” de algum entusiasmo espontâneo das “grandes massas”, sendo antes o resultado de um processo largamente conduzido a partir do alto, isto é, da própria máquina do Estado, com fins claramente orientados à popularização do estadista gaúcho. 
Em contraste com a personalidade exuberante do caudilho gaúcho, o Barão foi um “retraído” político e um homem de estudo, mais afeto aos gabinetes de leitura do que aos ministeriais: ele nunca buscou a promoção auto-dirigida ou outra causa que não a da defesa silenciosa e constante dos interesses do Brasil no exterior e no trato com nossos vizinhos imediatos. Longe dele a propaganda pessoal ou a busca de cargos políticos: seu próprio estilo de vida e necessidades familiares o teriam isolado em missões burocráticas do trabalho consular ou de representação diplomática, não fosse a lembrança benevolente dos amigos e a reputação adquirida nas negociações de fronteira a tirá-lo de postos relativamente periféricos no exterior para guindá-lo às honras de um ministério ele mesmo colocado no centro das atenções nacionais e regionais.
A despeito de sua proverbial oposição ao ingresso de mulheres e de um certo arbítrio na seleção (pessoal) dos candidatos à carrière — explicáveis porém em termos de Zeitgeist —, o Barão é parte indissociável do “inconsciente coletivo” dos diplomatas brasileiros, referência incontornável da história diplomática nacional, presença obrigatória nos estudos conduzidos em sua academia profissional — que aliás leva o seu nome e acaba de comemorar os 50 anos da formação de sua primeira turma de alunos —, uma espécie de “espírito-que-anda” nos salões e corredores do Itamaraty e paradigma incontestado da “boa” política externa, ainda que segundo os padrões clássicos, e talvez algo antiquados, da prática diplomática. Na historiografia diplomática brasileira existe claramente um a.B. e um d.B, antes e depois do Barão, mesmo se o culto à personalidade não chega às raias do sagrado. Em todo caso, nenhum “rito iniciático”, nenhuma “prova de passagem” ou teste de “idade adulta”, se pode fazer, na Casa de Rio Branco, sem algum tipo de referência, remissão, citação ou alusão ao velho Barão. Tanta unanimidade poderia fazer sorrir o incauto, um outsider pouco afeto a nossas idiossincrasias diplomáticas ou algum “estranho no ninho”, mas não causa maior espécie ou surpresa aos habitués do Itamaraty: afinal de contas, o Barão é o próprio Itamaraty e a imagem do Itamaraty só se construiu, neste século, a partir da figura e da gestão dessa personagem ímpar da transição monárquico-republicana do Brasil. No dizer de um diplomata argentino da primeira metade do século: Rio Branco “era el Brasil mismo”. Em suma, Barão só tem um em toda a história brasileira: é Rio Branco, ponto final.

Memória do Barão

Para comemorar os cento e cinquenta anos de seu nascimento, a Fundação Alexandre de Gusmão, do Itamaraty, sob a presidência do Embaixador Baena Soares, ex-Secretário-Geral do Ministério das Relações Exteriores e ex-Secretário-Geral da Organização dos Estados Americanos, organizou em 1995 uma primorosa exposição de fotografias, cujo sucesso se deveu muito ao entusiasmo da Chefe da Mapoteca do Itamaraty no Rio de Janeiro, Sra. Maria Marlene de Souza. Essa rica coleção fotográfica, exibida no Palácio Itamaraty de Brasília por ocasião das festividades do dia do diplomata (coincidentemente comemorado todo dia 20 de abril, natalício do Barão), serviu por sua vez de suporte iconográfico ao magnífico volume organizado pelo Embaixador João Hermes Pereira de Araujo (igualmente autor das legendas das fotos) em torno da vida de José Maria da Silva Paranhos: Barão do Rio Branco, Uma Biografia Fotográfica,1845-1995, com texto do Embaixador Rubens Ricupero.
O livro, carinhosamente preparado e editado pelos herdeiros espirituais e institucionais do Barão, corresponde inteiramente ao que dele se anuncia no título: combina com rara felicidade texto e imagem, para oferecer uma biografia ilustrada do assim chamado patrono da diplomacia brasileira. Os marcos cronológicos indicados são inteiramente preenchidos, pois que, à preciosa reconstituição do itinerário pessoal, intelectual e profissional do Barão, nos limites cronológicos de sua existência (1845-1912), segue-se uma reflexão sobre a influência de seu pensamento e ação nas décadas posteriores (o “destino do paradigma”), um capítulo comportando uma indagação pertinente, e contemporânea (“o que faria o Barão hoje?”), finalizando com uma avaliação global da grande personagem histórica (“contrastes e confrontos”). O autor da excelente biografia comentada que acompanha (ou melhor, que sustenta soberbamente) a sucessão de fotos e caricaturas coletadas especialmente para esta edição, o Embaixador Rubens Ricupero, tinha todas as qualificações intelectuais e profissionais para retraçar com maestria a vida e a obra da “esfinge Rio Branco”, segundo ele o “último grande representante da escola de estadistas do século XIX brasileiro”. 
As “afinidades eletivas” de Ricupero com a personalidade moral e intelectual do Barão o levam, aliás, um pouco mais além da mera reconstituição biográfica, já que foi ele próprio professor de história diplomática do Brasil e de relações internacionais contemporâneas, no Instituto Rio Branco e na Universidade de Brasília. Reconhecidamente um dos melhores idealizadores e formuladores da política externa governamental — com forte ênfase na área americana — e um de seus pensadores mais abalizados, Ricupero completou, de uma certa maneira, a obra do Barão, ao contribuir, por meio de um arcabouço jurídico de notória complexidade (Tratados da Bacia do Prata e de Cooperação Amazônica, início do processo de integração Brasil-Argentina), com os processos de aprofundamento da cooperação e interdependência entre Estados que tinham seu relacionamento baseado, até então, no mero reconhecimento mútuo das fronteiras traçadas por Rio Branco. Não fosse o arriscado e talvez o inadequado da comparação, poderíamos chamá-lo de “George Kennan brasileiro”, no sentido de ser Ricupero um diplomata sobretudo conceitual, preocupado em não apenas enquadrar sua atuação profissional num determinado contexto filosófico e moral, mas também em dar-lhe uma perspectiva histórica de mais largo alcance, ao estilo da “longa duração” cara a Fernand Braudel (não por acaso, Ricupero é igualmente o presidente do Instituto de Economia Mundial, de São Paulo, que leva o nome do grande historiador francês). 
Ninguém melhor do que Ricupero poderia, portanto, apresentar de maneira inovadora os principais lances de uma vida a serviço do Brasil, assim como os elementos mais relevantes de um pensamento diplomático feito de rupturas e continuidades, de tradição e modernidade. Ele não se contenta, entretanto, em recolher episódios pessoais ou exemplos de desempenho profissional contidos nas conhecidas biografias dedicadas ao Barão — das quais as mais conhecidas são, sem dúvida, a de Alvaro Lins e a de Luiz Viana Filho —, ou os julgamentos por vezes peremptórios glanados em obras como as de Oliveira Lima, considerado uma espécie de “anti-Rio Branco”: segundo esse autor contemporâneo do Barão, “se a sua alma tinha refolhos, a sua inteligência era toda banhada em luz”. 
Ricupero oferece, antes de mais nada, uma reflexão pessoal sobre o papel do Barão no contexto histórico da diplomacia brasileira em sua época, marcada pela transição entre uma monarquia segura de si, num mundo ainda largamente dominado por realezas e sistemas dinásticos, e um regime republicano hesitante e incerto de sua legitimidade original, desejoso de inserir-se na supostamente “solidária” família americana e buscando exemplo e emulação na grande República da América do Norte. Nesse particular, Rio Branco, um “monarquista de formação e gostos europeus”, teria feito, segundo Ricupero, uma “opção preferencial pelos Estados Unidos”, visto como o grande aliado no relacionamento com as potências predominantes do sistema mundial no começo do século (não obstante o fato de um grande amigo de Rio Branco, Eduardo Prado, ter escrito um forte líbelo “anti-imperialista”, A Ilusão Americana). Razões econômicas, ademais de geopolíticas, certamente não faltaram para justificar a escolha do “novo paradigma” de nosso relacionamento externo: desde 1870 os Estados Unidos compravam mais da metade das exportações brasileiras de café e, na virada do século, 60% da nossa borracha.

Atualidade de Rio Branco

O que cativa particularmente no texto de Ricupero, e o que nos interessa especialmente reter aqui, não é tanto o itinerário pessoal de uma vida nômade a serviço do Estado brasileiro, os lances gloriosos na confirmação (ou na própria construção) de nossas fronteiras ou, ainda, o pensamento político de um monarquista conservador típico do século XIX, mas, sobretudo, o significado de sua diplomacia original (mas ainda eivada de características oitocentistas) para os problemas de nossa época e para os desafios do momento. Deixando de lado, por dificuldades práticas e óbvios óbices políticos, a “antecipação [talvez utópica] do futuro” consubstanciada no projeto de Pacto A.B.C., esquema de não-agressão, entendimento e cooperação entre os três maiores países sul-americanos que deveria complementar, na visão do Barão, a “aliança não-escrita” com os Estados Unidos, Paranhos já vislumbrava para o País um importante papel mundial. Em artigo ao Jornal do Comércio ele dizia: 

“Desinteressando-se das rivalidades estéreis dos países sul-americanos, entretendo com esses Estados uma cordial simpatia, o Brasil entrou resolutamente na esfera das grandes amizades internacionais, a que tem direito pela aspiração de sua cultura, pelo prestígio de sua grandeza territorial e pela força de sua população”.

Muito embora território e população não sejam, hoje em dia, critérios exclusivos de afirmação internacional, a visão do mundo do Barão tem muito a ver com o encaminhamento dos principais desafios enfrentados hoje pelo Brasil. Ele tinha consciência do limitado poder de projeção externa do País e por isso mesmo, ainda que recusando o militarismo, era um “partidário ativo”, como coloca Ricupero, “da modernização das forças armadas, tendo seu nome ficado ligado ao programa de renovação da frota”. Não proclamava, contudo, a necessidade de “armamentos formidáveis” ou a “aquisição de máquinas de guerra colossais”: tratava-se, tão simplesmente, de cuidarmos “seriamente de organizar a defesa nacional, seguindo o exemplo de alguns países vizinhos”. Ele descartava as pretensões à preeminência de alguns países latino-americanos — usando palavras como “loucura das hegemonias” ou “delírio das grandezas” — e voltava a afirmar sua convicção íntima: 

“Estou persuadido de que o Brasil do futuro há de continuar invariavelmente a confiar acima de tudo na força do Direito e, como hoje, pela sua cordura, desinteresse e amor da justiça, a conquistar a consideração e o afeto de todos os povos vizinhos em cuja vida interna se absterá de intervir”.

Sua intenção de conquistar para o Brasil, com a retórica e a força da argumentação de Rui Barbosa, uma cadeira permanente na Corte Internacional de Justiça — então em discussão na segunda conferência da Paz da Haia, em 1907 — logo chocou-se com a proposta “oligárquica” que defendiam as grandes potências imperiais, inclusive os Estados Unidos. O episódio, humilhante para o País na visão de Rio Branco, não é destituído de ensinamentos, como lembra Ricupero, para o debate atual em torno da reforma da Carta da ONU e da eventual assunção do Brasil a uma cadeira permanente no Conselho de Segurança. Sem qualquer consulta prévia ou consideração diplomática, Estados Unidos, Grã-Bretanha e Alemanha relegaram o Brasil a uma terceira categoria (membros não-permanentes), ainda inferior a países europeus menos populosos. 
O Barão, tentando de diversas maneiras salvar o prestígio e a honra do Brasil, sugeriu várias fórmulas alternativas (indicação de um juiz por cada país membro, para seleção ulterior em função dos casos, como num painel do GATT; designação de representantes permanentes para cada um dos três maiores países sul-americanos, Argentina, Brasil e Chile, e um quarto, rotativo entre os demais; constituição de um tribunal com 21 membros, sendo 15 permanentes para os países com mais de dez milhões de habitantes), sem lograr contudo nenhum avanço; pior: essas mudanças de posição “nos estavam fazendo perder terreno junto aos latino-americanos e aos países europeus menores”. 
Atendendo então à tese igualitária, desde o princípio defendida por Rui, Paranhos assume uma posição de rejeição a compromissos que implicassem a existência de nações de terceira, quarta ou quinta ordem: 

“Agora que não mais podemos ocultar a nossa divergência [com as potências européias e com os Estados Unidos], cumpre-nos tomar francamente a defesa do nosso direito e do das demais nações americanas. Estamos certos de que Vossência [Rui] o há de fazer..., atraindo para o nosso país a simpatia dos povos fracos e o respeito dos fortes”. 

Assim, a despeito de uma tentativa inicial de colaboração e de entendimento com os Estados Unidos, lembra Ricupero que o “choque com a posição americana tornou-se frontal e o Brasil assumiu a liderança dos países latino-americanos e de países menores europeus na luta pela igualdade”. O Barão teve de constatar os limites da política de cooperação, a primazia da diplomacia do poder e a própria “opção preferencial” dos norte-americanos pelas grandes potências européias.

Integração hemisférica e questão social no Brasil

Na vertente econômica, de outra parte, o Brasil da virada do século era mais favorável do que os demais países latino-americanos ao projeto americano de estabelecimento de uma união aduaneira do Alasca à Terra do Fogo, a que se opunha veementemente, por sua vez, a Argentina, muito mais vinculada aos interesses comerciais e financeiros britânicos. Atualmente (e não apenas no terreno econômico), parece ter ocorrido, no dizer de Ricupero, uma “inversão de papéis”, segundo a imagem coerográfica do changez de place: a Argentina apressou-se, por exemplo, em saudar a “Iniciativa para as Américas” de George Bush e em manifestar-se candidata a ingressar no NAFTA de Bill Clinton, enquanto o Brasil mantinha a natural reserva diplomática de um global trader.
É bem verdade que a dependência da exportação primária e a questão crucial do acesso ao mercado norte-americano para nosso principal produto da pauta comercial ditavam em grande medida, um século atrás, o interesse brasileiro nesse tipo de aproximação, situação bem diferente da relativa diversificação geográfica e de oferta exportadora de hoje em dia. Armado de um pragmatismo exemplar, o Barão não hesitaria em subscrever, nesse como em outros casos, uma diplomacia adaptável às circunstâncias de cada momento, unicamente comprometida com o interesse nacional, que ele soube encarnar como poucos no decorrer da história nacional. 
Seu biógrafo e “inimigo cordial”, Oliveira Lima, sublinha que, em Rio Branco, “o interesse pessoal se confundia com o público, assim como sua personalidade mergulhava toda na nacionalidade”. Longe da pátria, na Europa, o Barão — consoante seu lema Ubique Patriae Memor, “em todo lugar lembrar-se da Pátria” — continuava ocupando-se continuamente da terra natal, lendo e anotando livros e mais livros de e sobre nossa história. Jovem pesquisador de história do Brasil, ele tinha sido eleito para o Instituto Histórico e Geográfico em 1867, aos 22 anos, nele permanecendo como sócio ativo até seu falecimento.
Seu Esquisse de l’Histoire du Brésil, destinado a integrar o volume Le Brésil en 1889, preparado para a Exposição Universal de Paris, revela muito dessas leituras cuidadosas das obras de viajantes e observadores estrangeiros, assim como das dos cronistas portugueses da era colonial. Consciente de uma das principais deficiências sociais brasileiras de então, ele dedica largas passagens desse livro ao problema da escravidão e sua abolição, consumada praticamente no momento em que o terminava de escrever. Da mesma forma como o dramático problema social brasileiro do final do século XX, o parágrafo final dessa obra de cem anos atrás soa curiosamente atual:

“Nos últimos quarenta anos, ... o Brasil fez grandes esforços... para difundir a instrução, melhorar o nível do ensino, para desenvolver a agricultura, a indústria e o comércio, tirando partido das riquezas naturais... Os resultados obtidos ... são já consideráveis. Em nenhuma parte do continente americano, salvo nos Estados Unidos e no Canadá, a marcha do progresso tem sido mais firme e mais rápida”. 

A perspectiva promissora traçada pelo Barão do Rio Branco para o Brasil monárquico de então demorou (e ainda demora) um certo tempo para ser cumprida, em grande medida devido precisamente à abolição tardia do regime da escravidão e sua preservação de fato, ainda que em forma disfarçada, nas relações sociais de produção de regiões inteiras de seu vasto hinterland, quando não no coração mesmo de zonas urbanas. A permanência de um certo ancien Régime nas estruturas sociais de dominação e de apropriação do Brasil tem algo a ver, aliás, com a visão conservadora da cidadania ostentada mesmo por personalidades de refinada educação européia como o Barão. Ainda que ele não tenha sido um positivista e muito menos um jacobino republicano, ele certamente concordaria com o princípio inspirador do regime então inaugurado: o progresso, sem dúvida, mas a ordem antes de mais nada.
Em que pese esse conservadorismo social, em matéria de política externa o Barão foi propriamente um revolucionário: sua visão funcional e pragmática do relacionamento internacional do País e seu legado inovador na prática da política externa constituem, evidentemente, meios seguros para converter a diplomacia profissional e especializada de nossos dias num instrumento eficaz de desenvolvimento econômico e social do Brasil. Para isso, e finalizando com um conceito utilizado por Ricupero, precisamos ter, como o Barão, um “grande desígnio de política exterior”, suscetível de converter-se em novo paradigma de nossa diplomacia. Agora, como nos tempos do Barão, o critério básico matem-se o mesmo: a inserção soberana do País na ordem econômica e política internacional. Quase cem anos depois de concebido por seu mentor intelectual, o modelo fornecido por Rio Branco permanece vigorosamente atual.

Nota: Os livros citados, José Maria da Silva Paranhos, Barão do Rio Branco:Uma Biografia Fotográfica,1845-1995 (Brasília: FUNAG, 1995) e Esboço da História do Brasil (Brasília: FUNAG, 1992), podem ser adquiridos junto à Fundação Alexandre de Gusmão no Itamaraty de Brasília: Telefone: (061) 211-6033/34; Fax: 322-2931.
  
[Brasília, 26/04/1996; revisão: 02/05/1996]
[Relação de Trabalhos n. 526]

526. “O legado do Barão: Rio Branco e a moderna diplomacia brasileira”, Brasília, 26 abril 1996, 7 p.; revisão: 02/05/96, 11 p. Apresentação e comentários ao livro José Maria da Silva Paranhos, Barão do Rio Branco: Uma Biografia Fotográfica,1845-1995, Texto de Rubens Ricupero; organização, iconografia e legendas de João Hermes Pereira de Araujo (Brasília: FUNAG, 1995, 132 p.). Enviado para a revista Política Externa: não considerado; publicado na Revista Brasileira de Política Internacional  (vol. 39, n° 2, julho-dezembro 1996, p. 125-135). Relação de Publicados n° 198.


* Paulo Roberto de Almeida é Doutor em Ciências Sociais pela Universidade de Bruxelas.


Ministros do STF e parlamentares reagem à presença de Bolsonaro em protesto com pedidos de intervenção militar - João Paulo Saconi e Natália Portinari (O Globo)

Ministros do STF e parlamentares reagem à presença de Bolsonaro em protesto com pedidos de intervenção militar

Presidente esteve em ato no qual apoiadores pediam afrouxamento de medidas contra a Covid-19, o fechamento do Congresso e do Supremo e um novo AI-5; ex-presidente Fernando Henrique Cardoso classifica atitude como 'lamentável'
RIO e BRASÍLIA - A presença do presidente JairBolsonaro em um protesto em frente ao Quartel General do Exército, em Brasília, gerou reações de autoridades ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e parlamentares . No ato, os manifestantes utilizaram cartazes e gritos de ordem para expressar demanda inconstitucionais, como uma intervenção militar, o fechamento do Congresso e do STF e um novo AI-5, ato que marcou o início da fase mais violenta da ditadura militar. Entre os principais pedidos estava também a retomada de atividades econômicas não-essenciais, interrompidas por prefeitos e governadores como forma de combater o avanço do novo coronavírus.
O incômodo com o episódio ficou evidente em mensagens publicadas nas redes sociais pelos ministros do Supremo Marco Aurélio Mello e Luis Roberto Barroso, recém-eleito para presidir o Superior Tribunal Eleitoral (TSE). Também se manifestaram o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e os governadores João Doria (SP), Wilson Witzel (RJ), Flávio Dino (MA), Camilo Santa (CE) e Rui Costa (BA). Além desses, outros governadores assinaram uma carta em defesa do Congresso e contrária às manifestações recentes de Bolsonaro.
Houve ainda falas de senadores e deputados, incluindo o presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Ele afirmou que, além da ameaça do coronavírus, o Brasil tem que lutar contra o autoritarismo. Ao repudiar "todo e qualquer ato que defenda a ditadura, atentando contra a Constituição", Maia afirmou que os pedidos por intervenção militar estimulam a desordem e flertam com o caos. Na concepção dele, o país não tem tempo a perder com retóricas golpistas".
O PSDB, partido de FH e Doria, se expressou por meio de nota assinada pelo presidente da sigla, Bruno Araújo. O PSL, antigo partido de Bolsonaro, também se manifestou. Houve ainda manifestação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), por meio de seu presidente Felipe Santa Cruz.
Além de ter se encontrado com os manifestantes, que estavam aglomerados e contrariavam recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do próprio Ministério da Saúde, Bolsonaro discursou para eles e depois reproduziu um vídeo da reunião nas redes sociais. Em um dos trechos, é possível ver uma das faixas com pedido de intervenção militar. Hoje, 19 de março, é comemorado o Dia do Exército.
O ministro Marco Aurélio disse ao GLOBO que o ato é uma atitude de "saudosistas inoportunos":
— Tempos estranhos! Não há espaço para retrocesso. Os ares são democráticos e assim continuarão. Visão totalitária merece a excomunhão maior. Saudosistas inoportunos. As instituições estão funcionando.
Barroso publicou duas mensagens no Twitter nas quais classificou o traço autoritário do movimento como "assustador" e afirmou que "pessoas de bem e que amam o Brasil" não desejam o retorno do estado de exceção vivido entre as décadas de 1960 e 1980.
"É assustador ver manifestações pela volta do regime militar, após 30 anos de democracia. Defender a Constituição e as instituições democráticas faz parte do meu papel e do meu dever. Pior do que o grito dos maus é o silêncio dos bons (Martin Luther King). Só pode desejar intervenção militar quem perdeu a fé no futuro e sonha com um passado que nunca houve. Ditaduras vêm com violência contra os adversários, censura e intolerância. Pessoas de bem e que amam o Brasil não desejam isso", escreveu Barroso.
O ministro Gilmar Mendes replicou em sua rede social a fala de Barroso, apesar de os dois pouco se falarem, e também escreveu uma mensagem:
"A crise do #coronavirus só vai ser superada com responsabilidade política, união de todos e solidariedade. Invocar o AI-5 e a volta da Ditadura é rasgar o compromisso com a Constituição e com a ordem democrática #DitaduraNuncaMais".
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse, em rede social, que é "lamentável que o PR adira a manifestações antidemocráticas. É hora de união ao redor da Constituição contra toda ameaça à democracia. Ideal que deve unir civis e militares; ricos e pobres. Juntos pela liberdade e pelo Brasil".
O ex-presidente Lula também se manifestou. "A mesma Constituição que permite que um presidente seja eleito democraticamente têm mecanismos para impedir que ele conduza o país ao esfacelamento da democracia e a um genocídio da população", escreveu o petista.
Adversário político de Bolsonaro, João Doria fez menção direta à atitude do presidente e cobrou respeito às instituições brasileiras.
"Lamentável que o presidente da república apoie um ato antidemocrático, que afronta a democracia e exalta o AI-5. Repudio também os ataques ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal. O Brasil precisa vencer a pandemia e deve preservar sua democracia", publicou o governador.
Witzel, que também tem se oposto às posições do presidente, disse que Bolsonaro ataca governadores e comanda uma rede de notícias falsas.
"Em vez de o presidente incitar a população contra os governadores e comandar uma grande rede de fake news para tentar assassinar nossas reputações, deveria cuidar da saúde dos brasileiros. Seguimos na missão de enfrentamento do Covid-19.#rjcontraocoronavirus".
Para Flávio Dino, Bolsonaro busca "desviar o foco de suas absurdas atitudes quanto ao coronavírus e a sua péssima gestão econômica" e que o presidente "não sabe e não quer governar". Camilo Santana disse que os pedidos por intervenção militar são "inaceitáveis e repugnantes". Rui Costa defendeu "o trabalho e o equilíbrio de quem foi eleito para governar" e que "o momento é de união para salvar vidas".
Felipe Santa Cruz, presidente da OAB, disse que "o presidente da República atravessou o Rubicão" e, após mencionar que "a sorte da democracia brasileira está lançada", completou afirmando que é "hora dos democratas se unirem, superando dificuldades e divergências, em nome do bem maior chamado liberdade".
Mais ecos no Congresso
Também por meio do Twitter, senadores e deputados se manifestaram sobre a presença de Bolsonaro na manifestação. Houve publicações de Randolfe Rodrigues (Rede-AP) — líder da oposição no Senado — e dos deputados Marcelo Freixo (PSOL-RJ); Ivan Valente (PSOL-RJ), Jandira Feghali (PCdoB-RJ); Paulo Pimenta (PT-RS); Helder Salomão (PT-ES); Alessandro Molon (PSB-RJ), Tabata Amaral (PDT-SP), entre outros.
"Enquanto enfrentamos a pior crise da nossa geração, com a capacidade do nosso sistema de Saúde comprometida, com pessoas morrendo e os casos aumentando, Bolsonaro vai às ruas, além de aglomerar pessoas, atacar as instituições democráticas. É patético!", diz trecho da mensagem compartilhada por Randolfe.
O senador ainda cobrou atitudes do procurador-geral da República, Augusto Aras, para que a participação de Bolsonaro no ato tenha consequências jurídicas:
"Agora cabe ao procurador-geral da República, Augusto Aras, abrir processo contra o Presidente da República por mais esse atentado ao povo brasileiro. Se Bolsonaro não respeita a Constituição Federal, as instituições devem funcionar tanto para ele, enquanto presidente, como para qualquer cidadão que comete crimes!", defendeu Randolfe.

À Espera dos Bárbaros, de Constantine Cavafy - tradução de Marcelo Raffaelli

Já descrevi, diversas vezes, a chegada ao poder dos novos "companheiros", como sendo uma bizarra invasão dos novos bárbaros, esses que nos assediam, de diversas maneiras.
Lembrava-me, vagamente, daquele prêmio Nobel dado a um poeta grego, muitos anos atrás, que havia escrito um poema sobre essa temática, da expectativa de uma invasão de bárbaros.
Quando ele ganhou o Prêmio Nobel de Literatura, lembro-me de ter lido esse poema, em algum lugar, talvez na New York Review of Books, mas não tenho certeza. Em todo caso, ficou na minha lembrança.
No intervalo, lembrei-me de um romance de temática similar, de Dino Buzatti, O Deserto dos Tártaros. 
O problema é que, tanto no romance, quanto no poema, os bárbaros nunca chegam, e os “nossos” já estão aqui, invadindo tudo e destruindo todas as instituições.
Agora, fui salvo pelo meu amigo e colega, embaixador aposentado, Marcelo Raffaelli, que não apenas me remeteu esse poema, como o traduziu não do grego, mas a partir de sua versão em inglês, como está dito abaixo.
Cabe fazer este registro…
Grato ao embaixador Marcelo Raffaelli.
Paulo Roberto de Almeida

À ESPERA DOS BÁRBAROS
POEMA DE CONSTANTINE CAVAFY, TRADUZIDO DO GREGO PARA O INGLÊS POR EDMUND KEELEY, RETRADUZIDO PARA O PORTUGUÊS POR MARCELO RAFFAELLI, QUE NÃO FALA GREGO
O que estamos esperando, todos juntos no fórum?
            Os bárbaros vão chegar hoje.
Por que nada se passa no Senado?
Por que os senadores lá se sentam, sem legislar? 
            Porque os bárbaros vão chegar hoje.
            Para que os senadores fariam leis agora?
            Quando os bárbaros chegarem, eles farão as leis.
Por que nosso imperador madrugou, tão cedo,
E sentou-se em seu trono, à porta da cidade,
Em traje solene, com sua coroa?
            Porque os bárbaros vão chegar hoje
            E o imperador quer receber seu chefe,
            Mesmo tem um pergaminho para lhe dar.
Por que nossos dois cônsules e pretores envergam hoje
Suas togas escarlates, todas bordadas?
Por que puseram braceletes com pedras preciosas,
Anéis luxuosos, de esmeraldas magníficas?
Por que envergam elegantes bengalas,
Lindamente trabalhadas em ouro e prata?
            Porque os bárbaros vão chegar hoje
            E coisas assim encantam os bárbaros.
Por que nossos grandes oradores não vêm, como sempre,
Fazer seus discursos, dizer o que têm a dizer?
            Porque os bárbaros vão chegar hoje e
            Eles detestam retórica, discurso empolado.
Por que esta perplexidade, esta súbita confusão?
(Como as caras das gentes ficaram sérias!) 
Por que praças e ruas se esvaziam tão depressa,
Todos se recolhendo com ar pensativo?
            Por que a noite caiu e os bárbaros não vieram?
            E alguns dos nossos, recém-vindos da fronteira,
            Disseram que não existem mais bárbaros.
E agora, que nos acontecerá, sem os bárbaros?
Eles podiam ter sido uma solução...

Please: participate in a survey for a doctoral dissertation - Luisa de Mello Barreto

Meu pedido pessoal, para a filha do meu grande amigo, colega de turma e de carreira no Itamaraty, desde nosso ingresso conjunto, no milênio passado, para participar, quem puder, desta pesquisa científica para a conclusão de sua dissertação doutoral.
É importante, e isso me faz lembrar uma leitura que fiz quando estava fazendo a minha, de um psicólogo de NY justamente: How to Complete, and Survive, a Doctoral Dissertation...
E ainda dá para ganhar US$ 50.- numa tiragem ao acaso. Ver ao final.

Muito obrigado
Paulo Roberto de Almeida

Hello, 

I am a doctoral student in clinical psychology. I was hoping you may have some time to complete the following survey for my Doctoral Project. 

The study is designed for any person who is NOT a mental/behavioral health provider, speaks fluent English, and is 18 years old and over.

The survey includes: a few demographic questions, one short video of someone receiving treatment for OCD, a few questions about your opinion on the treatment, and two brief educational videos. It should take 15-20 minutes to complete. All answers are completely confidential.

Thank you for your consideration and I greatly appreciate your help if you do decide to participate. If you believe there is anyone else who would be interested in completing this survey, please feel free to forward this message.
Please click on the following link to proceed to the survey: ERP study

If the link above doesn’t work, please copy and paste this link in your browser:https://williamjames.co1.qualtrics.com/jfe/form/SV_6AwHIFTUgKXb1u5
Of note, this survey will work best if taken on the computer.

Thank you so much in advance!

Luisa de Mello Barreto, Ed.M, M.A

Luisa de Mello Barreto, M.Ed, MA
Clinical Psychology Doctoral Student
William James College

Vou fazer e transmitir a todos os familiares e amigos...
Paulo Roberto de Almeida

Once you have completed the survey, you will be asked if you want to enter a raffle for one of two $50 American Express gift cards. You will be asked to send an email to erpresearchstudy@gmail.com with the subject line: “Raffle.” There are no correct or incorrect answers in this study. Your responses will not be tied to your chances of winning the gift card. The winner will be selected through a random drawing once all entries have been submitted. The winner will be contacted through the email address used to enter the raffle. 

Venezuela: um novo desastre da diplomacia brasileira - Elianah Jorge (RFI)

Sem representação diplomática, brasileiros aguardam resgate na Venezuela... 
Elianah Jorge
Correspondente da RFI Brasil em Caracas
18/04/2020 10h33
Os brasileiros que moram, estavam de passagem ou os que estão em prisões na Venezuela, foram pegos de surpresa pelo encerramento das atividades da embaixada e dos consulados do Brasil no país comandado por Nicolás Maduro. 
Nem mesmo a quarentena imposta pela pandemia da Covid-19 fez Brasília adiar os planos divulgados em fevereiro passado. Com a radical decisão, o governo de Jair Bolsonaro congelou as atividades diplomáticas na Venezuela para isolar politicamente o governo bolivariano.
A rusga acabou gerando um grande problema para os brasileiros. Entre eles, estão os que anseiam ser resgatados pelo Itamaraty para voltar ao Brasil.
É o caso da cirurgiã-dentista Telma Lúcia Mota de Castro. Ela chegou na Venezuela em 27 de fevereiro para participar da formatura do filho. Quando foi ao consulado brasileiro em Caracas pedir um documento, soube que o local seria fechado.
Tanto o consulado-geral como os três vice-consulados do Brasil na Venezuela encerraram as atividades em 26 de março deste ano. Os mais de 10 mil brasileiros inscritos no cadastro consular não foram avisados.
Com o voo de volta cancelado por causa da pandemia, Telma recorreu ao Itamaraty. A princípio, não obteve resposta. Dias depois, recebeu informações através do número do Gabinete de Gestão de Crise para a América do Sul.
"Eu realmente preciso voltar. Onde eu estou não tem água; a luz vai e vem, assim como a internet. Antes a gente tinha racionamento e agora a gente está sem água, realmente. Está muito difícil", afirma ela à RFI.
O site do Consulado-Geral do Brasil em Caracas informa que "a comunidade brasileira residente na Venezuela poderá acessar o Portal Consular do Itamaraty para obter informações sobre assistência consular".
Até o fechamento desta matéria, o Itamaraty não havia respondido à RFI onde os brasileiros podem fazer os trâmites consulares após o encerramento das atividades diplomáticas na Venezuela.
No entanto, o Ministério de Relações Exteriores (MRE) informou que "temos conhecimento de nove brasileiros não residentes que lá se encontram. Há outros brasileiros, residentes permanentes no país, que procuraram o grupo especial de crise para inquirir sobre a possibilidade de apoio consular. Até o momento, sabemos de 32 nacionais nessa categoria, cujas condições estão sendo estudadas para verificarmos que tipo de auxílio pode ser prestado".

Resgate sob pressão

Os brasileiros veem o voo de resgate como a única alternativa para voltar ao Brasil. Foi o que declarou um empresário à RFI, mas sem se identificar: "Se a gente não conseguir embarcar, vamos ficar presos aqui por tempo indeterminado".
O Itamaraty havia organizado apenas o voo para levar de volta os diplomatas e adidos militares que estavam em missão na Venezuela. Mas a pressão gerada pelos incessantes pedidos de resgate levou Brasília a reavaliar a situação. No avião que levou os integrantes do corpo diplomático na última sexta-feira (17), embarcaram pelo menos 14 cidadãos brasileiros.
Outro voo organizado pelo Itamaraty para a retirada de brasileiros está sendo esperado para esta segunda-feira (20). É nele que o jogador de futebol Igor Brodani da Luz pretende voltar pra casa. Após mais de 20 dias tentando contato com o Itamaraty, foi avisado sobre o possível voo.
O problema é que ele está em Maturin, no nordeste venezuelano e a pelo menos nove horas de estrada até Caracas. Não bastasse a distância, há outro empecilho. "Na região onde eu estou não está tendo gasolina, então estamos tentando achar alguma forma em conjunto", diz.
Apesar de a Venezuela possuir uma das maiores reservas de petróleo do mundo, falta combustível em todo o país. As filas diante dos postos de gasolina são quilométricas. Boa parte da frota está parada.
Por causa da rígida quarentena, o jogador do Monagas Sport Club precisa pedir um documento às autoridades venezuelanas para poder passar de um estado ao outro até chegar a Caracas, onde irá se encontrar com outros brasileiros que serão resgatados pelo Itamaraty.

Ajuda das Forças Armadas da Venezuela

Já Maria Luiza Rodrigues Motta, ex-funcionária do vice-consulado brasileiro em Puerto Ayacucho (no sul venezuelano), precisou recorrer à Força Armada Nacional Bolivariana (FANB) para conseguir sair da Venezuela com a filha.
Antes, porém, ela entrou em contato com a Divisão de Assistência Consular (DAC) para pedir vaga no avião da Força Aérea Brasileira (FAB), o mesmo no qual voltarão ao Brasil os funcionários do Itamaraty na Venezuela.
"Eu tive que sair com o apoio dos militares venezuelanos, não do governo brasileiro porque eu não tive resposta de ninguém. Até cheguei, praticamente, a suplicar que me ajudassem mas, infelizmente, a ordem era retirar apenas os diplomatas. E os cidadãos brasileiras (ficaram) à deriva".
Já o garimpeiro Luis Rodrigues Amorim decidiu tentar a sorte em uma nova jazida, localizada nas imediações da região amazônica de Puerto Ayacucho. Não teve sorte. "A mina era ruim", segundo ele. Sem dinheiro para voltar para casa em Boa Vista, no norte do Brasil, graças à solidariedade de uma família brasileira ele "não dorme na rua, nem passa fome".
Os recursos nesta cidade são escassos. Falta sinal de telefonia e a conexão de internet é precária."A gente procurou o consulado, mas o consulado já estava fechado. Tinha encerrado todas as atividades. Então a gente não pôde fazer mais nada", contou.
O brasileiro Roberto Coimbra é um publicitário renomado na Venezuela. Foi nomeado cônsul honorário do Brasil no estado Nueva Esparta (onde está a caribenha Ilha de Margarita) pelo presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2003). Os seguintes presidentes brasileiros o mantiveram a designação no cargo até que, em 31 de março deste ano, as funções de Roberto foram cessadas com a saída do corpo diplomático.
Foi através da cônsul-geral do Brasil em Caracas que ele soube do encerramento das atividades diplomáticas do Brasil na Venezuela. "Oficialmente o Brasil não tem mais nenhum representante consular ou diplomático no território venezuelano. Nós, brasileiros, estamos de certa maneira esperando algum tipo de informação por parte do Brasil sobre como proceder em caso de necessidade. Ou resolver atividades corriqueiras como é tirar ou renovar um passaporte ou oficializar algum tipo de documentação".
A gravidade da falta de representação diplomática representa um risco para os brasileiros, sobretudo aos que estão nas cadeias venezuelanas. Funcionários do Itamaraty faziam as visitas e os auxiliavam nos trâmites com a Justiça venezuelana.
"Abandonam cerca de 25 presos que estão em situação catastrófica nas prisões venezuelanas, e de longe não vai ajudar em nada a resolver a situação política que a gente está enfrentando", reitera.
Na opinião de Roberto Coimbra, faltou informação: "Eu estou seguro de que nenhum dos brasileiros que vivem aqui receberam nenhum tipo de informação oficial sobre essa saída".
Questionado pela RFI, o Itamaraty, não respondeu, até o fechamento desta reportagem, onde os brasileiros que moram na Venezuela devem se dirigir para fazer os trâmites consulares.
Para Coimbra, "a decisão (de fechar os postos diplomáticos na Venezuela) foi precipitada porque abandona os interesses que o Brasil tem na Venezuela, de longa data. Abandona os brasileiros que estão aqui - os residentes e os em viagem".

Avião de guerra para diplomatas

Um problema de logística quase colocou por água abaixo o voo que sairia esta sexta-feira com os diplomatas, adidos militares e suas respectivas famílias. Para fazer o traslado pessoal e de parte da mudança dos funcionários em missão na Venezuela, a Força Aérea Brasileira tinha previsto aterrissar um avião Hércules na Rampa Quatro, setor do principal aeroporto da Venezuela destinado a aeronaves de caráter estatal.
No entanto, na hora do recebimento da autorização para pousar, o Ministério da Defesa venezuelano impôs empecilhos alegando que o Hércules é uma aeronave de guerra.

O destino de um povo - Paulo Roberto de Almeida

A semente do mal e a hora da verdade
Paulo Roberto de Almeida

Quando se assiste ao espetáculo de muitas pessoas, de carro ou a pé, cultuando a morte e zombando da epidemia, que grassa até entre os fanáticos do capitão, pois que ela não poupa ninguém, podemos ter certeza de que a estupidez tomou definitivamente conta do país, uma vez que vem impulsionada diretamente desde acima, por aquela figura tenebrosa que passa por chefe de governo e de Estado.
Confesso que, conhecedor como sou da história do Brasil, não tenho NENHUM registro de que algo semelhante tenha JAMAIS ocorrido em nosso país.
Relativamente sabedor da história mundial, posso detectar alguns episódios semelhantes ou similares que afetaram outros povos, descontando pequenas turbas de fanáticos religiosos aqui e ali.
O mais próximo, entre a era moderna e a contemporânea, é o espetáculo da plebe parisiense urrando de satisfação a cada nova cabeça sangrenta sendo erguida da guilhotina, sob o período do Terror, na Revolução francesa.
Dois outros do mesmo gênero, há apenas três gerações, foram representados pela queima de livros, em 1933, e pela Kristalnacht, em 1934, sob os aplausos da turba de fanáticos seduzidos pelo poder hitlerista recém inaugurado na Alemanha de Beethoven e de Goethe.
Um outro exemplo de fascismo macabro vem da guerra civil espanhola, quando um general franquista soltou o seu tristemente famoso grito de “Viva la Muerte!” Estavam fuzilando poetas também.
Não faltam certamente muitos outros exemplos desse tipo, nas dobras da História e nos fracassos da Razão.
Mas, o que fazer, o que pensar, o que dizer, quando esses instintos primitivos, de espíritos ensandecidos, chegam ou se manifestam aqui no Brasil?
Um poeta romântico expressou a mesma surpresa aos fenômenos do tráfico e da escravidão: por que, meu Deus, “tanto horror perante os céus?”
Sabemos que o populacho irado é capaz de matar, de linchar bandidos, e até pessoas totalmente inocentes, das formas mais horríveis possíveis.
Mas, o que estamos vendo são pessoas de classe média, aliás até alta, bem vestidas, desfilando o seu ódio a partir de belos carros, em família, numa pedagogia de rancor e de desprezo pelo sofrimento alheio, sendo passada a seus filhos ainda pré-adolescentes.
O que está acontecendo com o Brasil?
Como fomos chegar a esse espetáculo indigno da suposta bonomia do nosso povo? Ou nos enganamos totalmente?
O que esperar de tudo isso, quando os exemplos e os estímulos vêm de cima?
Como fomos cair tão baixo, na infinita gradação das paixões humanas, que vai do despreendimento mais nobre de si mesmo à suprema abjeção moral de indivíduos frustrados e vingativos?
Seria uma loucura coletiva?
Talvez, mas sempre tem um gatilho e um exemplo, nesses estados catatônicos, que arrastam multidões para o despenhadeiro do opróbrio.
Sabemos o nome e o sobrenome do referido gatilho, sendo que o nome intermediário pode representar tanto a salvação quanto a loucura.
Acho que não tivemos sorte desta vez.
Imagino que muita gente pensa como eu, e já concluiu que não podemos mais nos permitir continuar por esta via.
Eu tenho apenas o poder da escrita, não a da espada, e nunca seria capaz de empunhá-la, por opção filosófica e moral.
Em certas circunstâncias, porém, o mal absoluto não se vence apenas com o poder das palavras.
Hitler não foi contido por acordos ou negociações. E se tivesse sido contido a tempo, a Humanidade teria sido poupada de pelo menos cinquenta milhões de mortos, em todas as categorias.
A destruição moral de todo um povo foi igualmente monumental, tanto quanto a barbárie perpetrada contra o povo chinês, não apenas em Nanjing.
Em certos momentos, o destino de todo um povo depende da vontade de poucos bravos, pela palavra, mas também pela vontade decisiva de alguns.
Este talvez seja um desses momentos da história do Brasil, da trajetória moral do nosso povo.
Quero crer que não falharemos em nosso julgamento, que provavelmente não é só o meu.
Castro Alves, do alto do seu legado imortal, ainda que apenas por palavras, continua cobrando alguma ação das pessoas de bem. Vale reler algumas daquelas estrofes memoráveis.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 19/04/2020