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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

quarta-feira, 25 de março de 2009

1040) Formatura de alunos de Relações Internacionais

Não é a primeira vez que sou convidado para ser patrono de uma turma de bachareis em relações internacionais, também chamados internacionalistas.
Nesta quarta-feira, 25 de março de 2009, foram os formando do 2o. semestre de 2008 da Universidade Católica de Brasília.
Abaixo, o texto guia que serviu para minha preleção nessa ocasião.

Elogio da Persistência

Paulo Roberto de Almeida
Alocução de patrono da turma de Relações internacionais
(2º semestre de 2008) da Universidade Católica de Brasília
(25/03/2008, 20h, Auditório da UCB)

Diretora do Curso de RI: Profa. Tânia Maria Pechir Gomes Manzur
Paraninfo: Prof. Rodrigo Pires Campos
Padrinho: José Romero Pereira Júnior
Profs. Homenageados: Egidio Lessinger, Flavio Cardoso, Francisco Wollman
Funcionária homenageada: Valesca Gomes de Souza Matos
Oradora, Juramentista e Homenageadoras dos pais e dos mestres, além dos membros da Comissão de Formatura,

Meus caros novos internacionalistas, desta vez com um canudo acompanhando a designação, o que lhes dá plena legitimidade para ostentar orgulhosamente o título conquistado.
Estas minhas palavras foram colocadas sob o signo da persistência, tanto minha, ao insistir em complementar meu trabalho profissional com algumas horas noturnas dedicadas ao trabalho de pesquisa e redação de ensaios em temas internacionais, como, sobretudo, de vocês, ao insistirem num curso que correspondia às mais nobres aspirações de cada um. De fato, meu texto leva por título “Elogio da Persistência” e vocês tiveram, justamente, a persistência requerida para conquistar um título formal.
Num mundo em constante mutação, tão incerto e cambiante, agora agitado por crises financeiras, logo transformada em crise econômica de grande magnitude, cujas duração, intensidade e abrangência não estão ainda indefinidas, podendo inclusive levar a uma depressão cujo último grande exemplo remonta oitenta anos atrás, devemos saudar a persistência de um punhado de jovens, agora não mais que duas dezenas, que iniciaram, continuaram e, finalmente, concluíram o curso que constituiu a escolha original de vocês.
Meu primeiro elogio, portanto, vai para vocês mesmos, que persistiram no empreendimento, mesmo sentindo crescer, a cada momento, as incertezas e indefinições quanto ao vosso futuro profissional. Vocês são vencedores, na plena acepção do termo. Meus sinceros parabéns, portanto, e isto vai dito de todo o coração.
Meu segundo elogio vai para todos aqueles que contribuíram para o final exitoso da jornada que vocês empreenderam alguns anos atrás: os pais certamente, num sentido amplo, o que inclui toda a família, sem esquecer cachorro, gato e passarinho, este hoje mais raro, num mundo politicamente correto e cada vez mais controlador de velhos hábitos politicamente incorretos. Não importa: todos aqueles que cercam vocês, nas lides da semana e nos fins de semana, incluindo namorados, namoradas, companheiros, ficantes e outras companhias ocasionais, contribuíram, cada qual ao seu modo, para o final feliz de uma longa caminhada que parecia interminável no meio do caminho. A todos eles, vocês oferecem sorrisos no dia de hoje, e recebem em troca beijos, abraços, apertos de mão e outros gestos carinhosos de cumprimentos. Todos eles foram importantes e vocês sabem disso.
Um terceiro e grande elogio deve ser dirigido aos que mais diretamente foram responsáveis pela formação de vocês, num sentido amplo: os professores certamente, como todo o respeito que eles merecem, mas também os funcionários, as bibliotecárias, os empregados da lanchonete, o guarda do estacionamento (se houver), a rede de internet da Faculdade (nem sempre tão rápida quanto desejável), o Google, a Wikipédia, e com esses programas tudo aquilo que ajudou a confeccionar os trabalhos acadêmicos, o copiar e colar e todos aqueles expedientes utilizados para convencer os professores que vocês de fato fizeram uma pesquisa original e altamente inovadora...
Alguns ainda ficam me devendo copyright, os meus direitos de autor (com royalties a 5%), pois eu sei que se vocês me convidaram para estar aqui esta noite, foi porque se utilizaram eventualmente de alguns dos meus textos, voluntariamente disponíveis na internet, com a intenção, justamente, de servir ao enriquecimento intelectual de jovens como vocês, interessados na cultura e no saber, e que vêm se abastecer no meu site, como se faz regularmente com um carro no posto de combustível...
Mas acredito que não foi por remorso que vocês me convidaram, e sim por sincera admiração, como descubro por vezes pela correspondência eletrônica de algum aluno mais ousado, ou talvez interessado em alguma ajuda extra para um trabalho. Eu sei, mesmo sem controlar ou contar os acessos ao meu site, que meus textos, penosamente trabalhados nessas noites de horas extras na pesquisa e na redação, são utilizados para finalidades nobres na atividade acadêmica. Mas eles estão ali para isso mesmo. Só me desculpo por não colocar um número ainda maior deles em acesso total, mas é para não fazer concorrência desleal aos meus editores, que poderiam não achar graça em gastar com papel e tinta e depois descobrir todos eles sob a forma de bits and bytes livremente disponíveis no meu site. A isto se dá o nome de propriedade intelectual, embora vários deles, talvez a maior parte, não me pertençam, pois as idéias neles desenvolvidas também foram coletadas em minhas leituras noite adentro. Na verdade, eu também fico devendo copyright a muitos outros estudiosos nesta área de estudos cada vez mais ampla e diversificada.
Devemos, portanto, também fazer um elogio a todos esses autores distantes, muitos deles estrangeiros, mas que frequentaram nossas leituras e que passaram por nossas teclas de control-c e control-v, provando que tudo na vida se aproveita, tudo se transforma e renasce sob novas formas... Esses sites de revistas e jornais com temas internacionais fazem hoje parte do cenário acadêmico, tanto quanto os professores e os livros impressos, e o meu trabalho representa apenas uma gota d’água nesse oceano de conhecimento.
Obviamente, eu fico particularmente feliz pelo fato de vocês terem se lembrado deste professor indireto e virtual, e de terem arriscado a idéia de convidá-lo para partilhar um pouco da alegria de vocês nesta noite. Para mim isso é especialmente gratificante, pois que sou normalmente tímido e reservado, preferindo ficar no meu canto com os livros e a internet, a circular muito pelos centros de ensino. A rigor, eu nem deveria dedicar-me a atividades acadêmicas, posto que esta não é minha atividade principal ou meu ganha-pão tradicional, a não ser pelo lado da pesquisa e da elaboração de textos, eventualmente publicados.
Mas se eu me dedico também um pouco ao ensino e à orientação, é porque a docência e a direção de trabalhos acadêmicos representam um complemento indispensável aos esforços de leitura, de síntese e de redação de novos textos nessas áreas de minha predileção. Sem a necessidade de apresentar problemas complexos de forma inteligível aos mais jovens, sem a obrigação de resumir o que aprendemos nos livros para mentes curiosas, sem as cobranças surpreendentes e as indagações provocadoras dos alunos, muito do conhecimento adquirido ficaria enterrado entre dois neurônios do meu cérebro, sem aproveitamento útil em escala mais ampla. Pessoalmente, sem a necessidade estrita de dar aulas, eu o faço por prazer intelectual e até por motivo de interação social, sem o que eu permaneceria enterrado nos livros como aqueles eremitas de caverna, com longas barbas e cabelos brancos...
Por esses e outros motivos, sou eu quem deve agradecer a vocês esta homenagem e esta oportunidade de conhecer, diretamente, alguns de meus leitores secretos. Não vou cobrar copyright de ninguém, apenas dizer que fico especialmente feliz de saber que meu esforço solitário possa ter servido a alguma finalidade útil, ainda que fosse para terminar rapidamente um trabalho de última hora. Não tenho muito a acrescentar em termos de lições de vida ou de recomendações de carreira: algumas de minhas preleções nesse sentido já são conhecidas de vocês nesses mergulhos no meu site algo caótico, em busca de alguma coisa mais utilitária.
As principais lições vocês certamente já aprenderam: a honestidade intelectual no esforço de pesquisa e elaboração de trabalhos; o esforço próprio engajado na busca de conhecimentos originais e na exposição bem fundamentada dos argumentos e pontos de vista que vocês defenderam ao longo da jornada acadêmica; a solidariedade e a amizade com os colegas de estudo; o respeito pelos mestres; o carinho agora devolvido aos pais, que se esforçaram muito para que vocês chegassem até aqui (inclusive no que se refere à conta poupança); o reconhecimento aos técnicos da Google, da Microsoft ou da Apple, que facilitaram tanto essa coisa de copiar e colar; enfim, a consciência moral que vocês têm o direito de exibir, posto que vocês certamente mereceram o título que agora levam para casa, e que é o início de uma nova jornada de trabalho e de estudos, já que o ciclo de atividades nunca cessa em sua dinâmica ascensional.
Como vocês, eu também sou persistente, e essa é, provavelmente, uma das principais virtudes que devemos cultivar, incessantemente, sem querer ser redundante. Persistência na busca de nossos objetivos maiores, na realização dos nossos sonhos, na correção dos aspectos mais deletérios da vida política e social do Brasil na atualidade, posto que esta é a nossa sociedade, e, por pior que ela pareça hoje, por mais desalento que possamos ter em face de tantas patifarias cotidianas, de tantos crimes impunes e de tantas quebras de decoro justamente naqueles escalões mais altos, devemos ser persistentes em tentar transformar o País em algo melhor do que isso que existe atualmente, e tentar legar a nossos filhos e netos um Brasil mais justo, menos corrupto, economicamente mais avançado, mais globalizado, mais internacional, enfim, mais parecido, justamente, com o que admiramos em outros povos e nações, aqueles que possuem um índice de felicidade bruta mais elevado do que o nosso.
Foi para isso, finalmente, que vocês estudaram. Não apenas para atingir objetivos individuais de lucro e riqueza, pois que para isso existem os cursos de administração, de direito, de engenharia. O internacionalista é, antes de tudo, um idealista, mesmo quando ele adere à escola realista de relações internacionais: todos nós queremos um mundo mais justo e solidário, todos nós desejamos contribuir com nosso grão de conhecimento e de esforço individual para transformá-lo numa plataforma de sonhos, num porto mais seguro, numa morada mais próspera e pacífica do que o cenário algo caótico que ainda existe atualmente.
Vocês já sabem o que devem ou deveriam fazer, ainda que não saibam, exatamente, o que vão fazer da vida, ou como vão ganhar dinheiro, ou com quais instrumentos e ferramentas vão transformar o mundo. O quê fazer, salvar o mundo, vocês provavelmente já sabem, em grande medida, pelo menos, ainda que possam discutir como fazer isso. Em todo caso, eu fico muito feliz de saber que mais uma tribo de internacionalistas vai ser solta no mundo: alguns serão futuros colegas na diplomacia ou na academia; outros serão batalhadores em empresas privados; ou então concurseiros bem sucedidos, se tornarão servidores estáveis em agências públicas. Em qualquer hipótese, vocês são pessoas dignas do título que passam a ostentar desde hoje e certamente merecedoras das homenagens que seus familiares e amigos vão lhes prestar nestes dias.
Enfim, sejam felizes na vida pessoal e profissional, amem o trabalho de vocês, sejam amados pelos que os cercam e por todos aqueles que partilharão um pouco ou muito de suas vidas, façam do Brasil e do mundo lugares melhores do que eles são hoje, pois este é todo o sentido, não apenas da profissão de vocês, mas de nossas vidas como cidadãos do País e do mundo. Sobretudo, persistam no caminho iniciado alguns anos atrás, para poderem dizer aos amigos e filhos: eu lutei, mantive a fé, persisti nos meus ideais e aqui estou, feliz e realizado.
Muita felicidade e muito obrigado pela oportunidade que me foi dada. Vamos dar um grande viva pela persistência de vocês e os parabéns a todas e a todos...

Brasília, 22 de março de 2009

Um comentário:

Gustavo Tenório Trancoso Viana disse...

Belo discurso, bem original.
Aproveito a oportunidade para, igualmente, parabenizar os formandos. Um deles é um grande amigo meu (Guilherme Sheldon) que, certamente, será um grande profissional na vida pública, ou privada.
Aproveito, ainda, para destacar o importante papel dos internacionalistas que, devido sua formação generalista e diversificada, não pode negar assistência para as diversas áreas da sociedade e, principalmente, do mundo. Os diversos segmentos de estudos, a multiplicidade de teorias: seja no ramo da economia; do direito; das relações internacionais; nos dão sustentação para um olhar mais profundo e atento aos acontecimentos mundanos, como diriam alguns diplomatas: "mais importante do que o tamanho da lente, é a profundidade do alcance de seu olhar", este sim é o ensinamento, creio, que deveria ser básico para todo internacionalista; estudioso do mundo, das relações entre Estados, das relações entre homens, das relações de Poder, de integração, de fronteiras. Nosso olhar é diferenciado, cada qual com sua perspectiva de mundo, entretanto, o internacionalista consegue observar algo mais. Com uma bagagem de conhecimentos que possibilita, ao capacitado, observar o mundo de forma integralista, como um todo, e não somente de vertentes específicas. Muitos diriam que nosso papel na sociedade ainda esta por descobrir, eu diria: nosso papel não é somente para com a sociedade, é para com o mundo e a humanidade, talvez por isso não tenham conseguido nos inserir em algo que, possivelmente, possa nos restringir à funções aquém da nossa habilidade. Nosso foco é o todo, cada qual tem sua função, a nossa é conseguir adequar as diferenças e convergir em algo produtivo para todos, não de forma igualitária, mas sim prático, idealista ou não.