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sábado, 23 de março de 2013

O Brasil e o seu "pleno emprego" (de políticos) - Leandro Roque (Von Mises Brasil)

Leandro Roque refaz os cálculos, de maneira mais cuidadosa, e encontra a verdadeira taxa de desemprego no Brasil, quatro vezes superior à que é divulgada, e incensada, pelo governo.
Que os números oficiais do IBGE, e mesmo do DIEESE fossem subestimados, disso eu já sabia. Mas como nunca havia "torturado" os números para que eles confessassem a realidade, eu não tinha ideia de quão mais alta era a verdadeira taxa de desemprego, de subemprego, de emprego precário e outras qualificações que o Brasil não poderia deixar de ter, dado o quadro de miseráveis que vemos de maneira sistemática em todas as partes (e o número anormalmente elevado de candidatos a qualquer porcaria no serviço público).
Grato ao Leandro Roque por esclarecer tão importante questão.
O Brasil, é evidente, não poderia estar exibindo esses números estupendos de emprego geral. Agora já sabemos a dimensão da verdade, e ela não é a que o governo anuncia.
Paulo Roberto de Almeida

A real taxa de desemprego no Brasil
Instituto Ludwig von Mises Brasil, sexta-feira, 30 de novembro de 2012

image001.jpgNão são poucas as pessoas que nos escrevem pedindo comentários e explicações sobre a supostamente baixa taxa de desemprego no Brasil.  De fato, um estrangeiro mais desinformado que olhe para os números brasileiros irá se sentir tentado a arrumar suas malas, vender sua casa europeia e vir voando com toda a família para o Brasil. Quando me perguntam minha opinião sobre a taxa de desemprego no Brasil, apenas respondo: qual taxa?  A do IBGE ou a do DIEESE?  A do DIEESE é simplesmente o dobro da do IBGE.  Enquanto o IBGE fala que a taxa de desemprego de outubro foi de 5,3%, o DIEESE afirma que foi de 10,5%.  Dois indicadores iguais, uma margem de erro de incríveis 100%.  E as implicações disso são enormes.  Ao passo que uma taxa de desemprego de 5,3% é menor que a de todos os países europeus (exceto Suíça e Áustria), norte-americanos, asiáticos e da Oceania, uma taxa de 10,5% só é inferior à francesa, portuguesa, irlandesa, grega e espanhola.  Ou seja: o mesmo país, o mesmo indicador, duas realidades totalmente opostas.
Desde que comecei a prestar mais atenção no assunto — e, principalmente, desde que me inteirei melhor da metodologia —, perdi completamente o interesse pelo indicador.  Ele não indica nada.  A metodologia do IBGE é totalmente ridícula.  Um malabarista de semáforo é considerado empregado.  Um sujeito que vende bala no semáforo também está empregadíssimo.  Um sujeito que lavou o carro do vizinho na semana passada em troca de um favor é considerado empregado (ele entra na rubrica de 'trabalhador não remunerado').  Se um sujeito estava procurando emprego há 6 meses, não encontrou nada e desistiu temporariamente da procura, ele não está empregado mas também não é considerado desempregado.  Ele é um "desalentado".  Como não entra na conta dos desempregados, ele não eleva o índice de desemprego.
Além disso, o índice também coloca na rubrica 'empregado' todas aquelas pessoas que exercem trabalhos considerados precários, como o sujeito que trabalha poucas horas por semana e gostaria de trabalhar mais, mas não consegue (muito provavelmente por causa das regulamentações trabalhistas), e o sujeito que faz vários bicos, mas cujo rendimento mensal é menor que o salário mínimo.  Ou seja, você substitui seu vizinho na barraca de pipoca dele por três dias.  Em troca, ele lha dá R$250.  Você foi considerado pelo IBGE como estando empregado — tendo efetivamente trabalhado 3 dias no mês.
Com todos esses truques, não é de se estranhar que o Brasil esteja com "pleno emprego", mesmo com sua arcaica legislação trabalhista, sua escandinava carga tributária e seus espoliadores encargos sociais e trabalhistas.
Mas isso, sejamos francos, não é uma exclusividade brasileira, não.  O governo americano, por exemplo, também divulga 2 índices, cada um com uma metodologia diferente.  Obviamente, ele se pauta apenas por aquele que fornece o mais róseo resultado.  Uma fonte privada complementa fornecendo o terceiro índice, bem mais rigoroso.  Veja abaixo:
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Na Europa, a coisa é ainda mais discrepante.  Alguém realmente acredita que o real desemprego na França e em Portugal é a metade do espanhol?  A impressão que tenho é que a Espanha é o único país que de fato adota uma metodologia mais rigorosa.
Indo para os finalmentes
Felizmente, o IBGE disponibiliza em seu site todos os dados coletados desde março de 2002, possibilitando que uma pessoa mais interessada em fatos e menos em ideologias possa analisar um pouco melhor a realidade do país.  A tabela divulgada para o mês de outubro está aqui.  Veja lá todas as categorias que mencionei acima: Pessoas Desalentadas, Pessoas Subocupadas por Insuficiência de Horas Trabalhadas, Pessoas Ocupadas com Rendimento/Hora menor que o Salário Mínimo/Hora, Pessoas Marginalmente Ligadas à PEA (População Economicamente Ativa).
Em termos práticos, na atual metodologia, se um gerente de banco é demitido e passa a fazer malabarismo no semáforo, a taxa de desemprego não se altera.  Se um desempregado lava o carro do vizinho em troca de um favor, a taxa de desemprego cai.
O leitor interessado pode baixar aqui uma enorme planilha de Excel com os valores de todas essas variáveis coletadas desde março de 2002.  Eu fiz isso e calculei uma taxa de desemprego mais realista. 
Coletei os seguintes dados:
1) pessoas desocupadas;
2) trabalhadores não remunerados;
3) pessoas com rendimento/hora menor que o salário mínimo/hora (aquele sujeito que faz vários bicos, mas cujo rendimento mensal é menor que o salário mínimo);
4) pessoas marginalmente ligadas à PEA (pessoas que não estavam trabalhando na semana da pesquisa mas que trabalharam em algum momento dos 358 dias anteriores à pesquisa e que estavam dispostas a trabalhar); e
5) pessoas desalentadas.
De canja para o governo, deixei de fora as pessoas subocupadas, pois uma pessoa que trabalha regularmente um determinado número de horas por semana não está tecnicamente desempregada.
Somei estes cinco itens e dividi pelo total da população economicamente ativa.
Logo, a real taxa de desemprego brasileiro é essa abaixo:
taxadesemprego.png
Portanto, a real taxa de desemprego no Brasil em outubro foi de 21,4%.  Nada surpreendente quando levamos em conta nossa legislação trabalhista e tributária.  Encargos sociais e trabalhistas onerosos em conjunto com uma paquidérmica carga tributária sobre as empresas não poderiam permitir outro resultado senão esse.  Um quinto da população sem emprego fixo após três anos de economia "pujante", segundo o animador de circo que habita o Ministério da Fazenda.
Observe o efeito da expansão artificial do crédito criada pelo Banco Central em conjunto com o sistema bancário de reservas fracionárias a partir de meados de 2009.  Sem que nenhuma alteração na estrutura da economia brasileira houvesse sido feita, a taxa de desemprego caiu para o historicamente baixo nível de 20%.  Por isso ela é insustentável: ela é totalmente guiada pela expansão do crédito, um mecanismo de curto prazo
A economia, como foi previsto neste site ainda no segundo semestre do ano passado, já está parada.  O desemprego, como em todos os outros países, tende a ser a última variável a ser afetada.

Leandro Roque é o editor e tradutor do site do Instituto Ludwig von Mises Brasil.

postado por Leandro Roque | 30/11/2012

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Economia brasileira: devagar, quase parando - Leandro Roque

Economia brasileira: um resumo de final de ano
Leandro Roque
Instituto Mises Brasil, 21/12/201
http://www.mises.org.br/Article.aspx?id=1489

O frenesi intervencionista 
 O ano de 2012 certamente já tem seu lugar garantido na história econômica brasileira: foi o ano em que o governo mais exacerbou suas intervenções na economia.
Sim, é verdade que a economia brasileira da década de 1980 e da primeira metade da década de 1990, com seus congelamentos de preços, monopólios estatais e hiperinflação, era muito mais estatizada e bem menos livre que a atual.  Porém, mesmo naquela época, havia uma tendência de adoção de medidas de desestatização.  Se, de um lado, o governo congelava preços e hiperinflacionava a moeda, de outro, ele reduzia tarifas de importação, extinguia reservas de mercado e privatizava estatais deficitárias.  Se o governo se intrometia demais em alguns campos, em outros ele dava sinais de que iria se retirar.
Em 2012, só houve notícias ruins.  O estado se agigantou em todos os setores da economia.  Mesmo a única notícia aparentemente positiva — a redução do IPI dos automóveis — veio acompanhada 1) de um aumento sanguinário das tarifas de importação e do IPI para automóveis estrangeiros, fazendo com que seu a carga tributária total sobre eles chegue a soviéticos 340%; 2) da imposição de quotas para a importação de automóveis do México, 3) da proibição de demissões por parte das montadoras, e finalmente 4) da ideia ainda não descartada de que o governo iria supervisionar os balancetes das montadoras, estipulando um teto para suas margens de lucro.
Qual foi a consequência de tamanho protecionismo e intervencionismo no setor automotivo?  Com a palavra, a própria beneficiada: "a ANFAVEA (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) calcula uma queda de 1,5% na produção neste ano ante 2011. Esta será a primeira queda na produção desde 2002."
Ou seja, ocorreu exatamente o oposto do intencionado pelo governo, que era aumentar a produção e o emprego. 
Com efeito, o mesmo fenômeno pôde ser observado em todo o setor industrial.  Incontáveis medidas intervencionistas e protecionistas foram colocadas em prática, como os seguidos recordes de apreensão de bagagens em aeroportos, o aumento do PIS/COFINS sobre produtos importados, os sucessivos recordes de arrecadação com o imposto de importação contra 'o importado barato', os desembolsos recordes do BNDES para as grandes empresas, a exigência de uma enorme fatia de conteúdo nacional para as produções industriais de todos os tipos, a proteção explícita aos setores têxtil, de calçados, de brinquedos, de artefatos de madeira, de palha, de cortiça, de vime e material trançado e transformados de plástico, além do aumento da taxa de importação sobre lâmpadas e sapatos chineses, pneus, batata, tijolos, vidros, vários tipos de máquinas, reatores para lâmpadas ou tubos de descarga, vagões de carga, disjuntores, cordas e cabos, móveis, triciclos, patinetes, bonecos, trens elétricos, quebra-cabeças, produtos lácteos (leite integral, leite parcialmente desnatado e queijo muçarela) e pêssegos (sério!). 
Adicionalmente, o câmbio em 2012 foi substancialmente desvalorizado em relação a 2011 (de R$1,60/US$ para R$2,10/US$).

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Gráfico 1: taxa de câmbio real/dólar; Fonte: Banco Central
Pela lógica dos intervencionistas, tamanha desvalorização cambial em conjunto com toda aquela cornucópia de medidas protecionistas deveria ter colocado a indústria em estado de extrema pujança.  E o que houve?  Tanto a produção industrial quanto o emprego na indústria caíram em relação ao ano passado.
Óbvio: desvalorizar a moeda e encarecer importações serve apenas para reduzir o poder de compra da população, que agora terá de gastar mais dinheiro com produtos de menor qualidade, e consequentemente terá menos dinheiro para gastar em outros bens e serviços.  Isso é um ataque direto ao padrão de vida.  Uma população com menos poder de compra não ativa indústria nenhuma.
O que vimos em 2012 foi mais um exemplo da arrogância fatal de burocratas e planejadores que juram saber exatamente como os indivíduos irão reagir em decorrência de suas intervenções no mercado.  Para eles, empreendedores e consumidores padecem do condicionamento clássico do cão de Pavlov: estão sempre prontos a agir estritamente de acordo com estímulos recebidos do governo.  Porém, quando o plano dá errado e tudo sai exatamente ao contrário do planejado, em vez de humildemente reconhecerem o erro e reverterem suas intervenções, eles simplesmente dizem, com toda a arrogância, que o que fizeram foi certo mas insuficiente, de modo que mais estímulos se fazem necessários.
Curiosamente, nas últimas recessões brasileiras, em 2003 e em 2009, o governo não saiu baixando pacotes e nem recorreu a medidas intervencionistas mais proeminentes.  Em 2003, ele seguiu a cartilha clássica: elevou juros e congelou os gastos.  Adicionalmente, não tentou controlar preços e nem privilegiar nenhuma indústria.  Também não recorreu ao protecionismo.  Por não ter atrapalhado e nem ter gerado incertezas, a economia se recuperou em um ano.  Em 2009, embora tenha havido um pouco mais intervenção do que em 2003, o governo não interveio no câmbio e nem recorreu a políticas protecionistas.  Principalmente, ele permitiu que preços e salários se ajustassem para baixo.  Isso, novamente, permitiu uma rápida recuperação.
O atual governo Dilma, o qual reinstituiu a figura do czar da economia — Guido Mantega é, ao mesmo tempo, Ministro da Fazenda, presidente do Banco Central, ministro do Planejamento e ministro do Desenvolvimento — já é, sem rivais, o mais intervencionista desde a criação do real.  Ela conseguiu a façanha de fazer seu antecessor parecer um moderado.
E não há muitos indícios de que isso será revertido no curto prazo.  Uma das possíveis próximas tragédias desse intervencionismo já está se desenhando no setor elétrico.  Aguardemos.
A estagnação econômica
A principal debilidade da economia brasileira é que ela não se baseia em poupança e nem em investimento, mas sim no fomento ao consumismo puro e simples.  Para o iluminado que comanda a Fazenda, se você estourar o seu cartão de crédito e depois pedir empréstimo no banco para cobrir o rombo em sua fatura e voltar a consumir ainda mais, você está estimulando a economia.
Todo o modelo de crescimento se baseia na expansão do crédito.  E tal modelo possui óbvias limitações.  A mais visível delas é o aumento do endividamento.  Se o governo estimula as pessoas a se endividarem para consumir, não é de se espantar que cheguemos a um momento em que tanto o nível de endividamento quanto os gastos das famílias com o serviço de suas dívidas (pagar juros e amortização) seja intolerável.  De acordo com as últimas estatísticas, o endividamento das famílias (linha azul) é de quase 45% da renda nacional, e os gastos das famílias para cumprirem o serviço de suas dívidas (linha vermelha) é de 22,5% de sua renda.
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Gráfico 2: endividamento das famílias e gastos com serviço da dívida; Fonte: Banco Central
A título de comparação, como é possível ver no gráfico deste artigo, esta mesma variável (linha vermelha) para os americanos é de 11%.
Em um cenário destes, resta óbvio que adicionais estímulos ao consumo não apenas são ineficazes em termos de crescimento econômico, como também são extremamente perigosos.
E esse endividamento explica boa parte da atual estagnação econômica.
Explicando a mecânica da estagnação
Para entender a estagnação, é necessário analisar o que está acontecendo com aquela variável que representa a metade de toda e qualquer transação econômica: o dinheiro.  Dado que o dinheiro é o elo entre todas as atividades econômicas, qualquer alteração na quantidade de dinheiro — e, principalmente, na taxa de crescimento da quantidade de dinheiro — irá inevitavelmente provocar movimentos generalizados em uma economia.  Todo e qualquer ciclo econômico é causado por variações na quantidade de dinheiro na economia.
Portanto, para entender os ciclos de expansão e recessão de uma economia, para entender por que há períodos de crescimento econômico seguidos de períodos de estagnação/recessão, é necessário estudarmos as variações no meio geral de troca, que é o dinheiro.
No atual sistema monetário e bancário, o Banco Central controla a base monetária do país.  Porém, a quantidade de dinheiro produzida pelo Banco Central é insignificante se comparada à quantidade de dinheiro eletrônico que o sistema bancário cria por meio da expansão do crédito através de seu sistema de reservas fracionadas.  Sempre que uma empresa ou um indivíduo qualquer vão a um banco e pedem um empréstimo, o banco cria do nada dinheiro eletrônico na conta-corrente deste tomador de empréstimo.  O dinheiro não foi retirado de nenhuma outra conta.  Ele simplesmente foi criado ex nihilo.  O bancário apertou algumas teclas no computador e dígitos eletrônicos surgiram na conta-corrente do mutuário.  É assim que o dinheiro entra na economia no sistema monetário atual e é assim que a quantidade de dinheiro em uma economia aumenta. (Todo este processo foi explicado em detalhes neste artigo, de modo que, pelo bem da brevidade, ele não será repetido aqui).
Embora toda a concessão de crédito represente criação de dinheiro, existe também a operação inversa, que é a destruição deste dinheiro que entrou na economia.  Por exemplo, quando um banco quer aumentar seu capital, ele vende um papel.  A pessoa ou empresa que comprar este papel irá transferir dinheiro da sua conta-corrente para este banco.  O banco pegará este dinheiro (totalmente eletrônico) e irá contabilizá-lo como 'reservas bancárias', que é um ativo em seu balancete.  Ao final do processo, houve uma redução da quantidade de dinheiro na economia e um aumento das reservas bancárias, que é um dinheiro que não está na economia.  Exatamente o mesmo procedimento ocorre quando um banco vende dólares em sua carteira para algum cliente ou mesmo quando ele toma empréstimos junto a corretoras, distribuidoras, sociedades de arrendamento mercantil e fundos de investimento financeiro.
Fiz essa digressão técnica apenas para explicar por que a quantidade de dinheiro na economia não é idêntica à quantidade de crédito criada pelo setor bancário.  Embora bancos criem dinheiro concedendo crédito, eles também destroem dinheiro quando vendem algum papel para se recapitalizar.
Entendido isso, o gráfico a seguir mostra a evolução da quantidade total de dinheiro na economia.  Trata-se de papel-moeda em posse de indivíduos e empresas, mais o total de dinheiro eletrônico em conta-corrente, em poupança, em depósitos a prazo e em outros depósitos no sistema bancário.  Em suma, o gráfico mostra todo o dinheiro que foi criado via concessão de crédito, e já descontado de todo o dinheiro que foi retirado da economia.  Trata-se de um bom indicador para saber se o ritmo da concessão de crédito está maior, igual ou menor do que o ritmo da retirada de dinheiro da economia, o que, por sua vez, indicaria uma maior cautela dos bancos.
(Infelizmente as duas variáveis não são fornecidas já somadas, de modo que tal operação aritmética será feita no segundo gráfico).
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Gráfico 3: papel-moeda em poder do público mais depósitos em conta-corrente (moeda) mais depósitos em poupança, depósitos a prazo e outros depósitos em bancos (quase-moeda); Fonte: Banco Central
Abaixo, a soma das duas variáveis acima, desde janeiro de 2009, ano da última recessão.  Observe que a partir de meados de 2009, começa a haver uma aceleração do crescimento da quantidade de moeda na economia.  Tal aceleração se intensifica em 2010.  Essa foi a época do crescimento econômico forte, porém artificial.  Em 2011, começa a haver uma desaceleração.  Em 2012, o crescimento monetário praticamente se estanca no segundo semestre.
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Gráfico 4: crescimento da quantidade total de moeda na economia; Fonte: Banco Central
No Brasil, desde 2009, os indivíduos intensificaram seu endividamento (ver gráfico 2) para poder consumir, na crença de que a expansão do crédito continuaria farta e que sua renda futura continuaria aumentando, o que facilitaria a quitação destas dívidas.  Já as empresas embarcaram em investimentos de longo prazo levadas tanto pela redução artificial dos juros criada pela expansão monetária do Banco Central (o que fez com que os investimentos se tornassem mais financeiramente viáveis) quanto pela expectativa de que o aumento futuro da renda possibilitaria o consumo dos produtos criados pelos seus investimentos.
No entanto, tão logo o endividamento foi aumentando, a demanda por mais empréstimos foi se arrefecendo e o modelo de expansão do crédito foi se esgotando.  Consequentemente, a taxa de crescimento da quantidade de dinheiro na economia brasileira começou a desacelerar.  Isso fez com que os projetos das empresas, das indústrias e dos indivíduos se comprovassem irrealizáveis.  No caso dos indivíduos, esta redução na taxa de crescimento da oferta monetária fez com que suas rendas não aumentassem como haviam previsto ainda no ápice do boom econômico, o que tornou suas dívidas difíceis de serem quitadas.  No caso das empresas, tal redução faz com que suas receitas futuras não fossem as previstas (vide o caso das indústrias e, mais recentemente, da Gol e de empresas do setor imobiliário), ao mesmo tempo em que seus custos (com mão-de-obra e bens de capital) seguiram crescendo em decorrência da inflação passada.
Vale ressaltar que não são reduções forçadas nos juros que irão resolver esse problema.  Reduções nos juros estimulam consumismo, mas não estimulam mais poupança, que é justamente do que endividados necessitam. 
Caso não haja reversão da tendência acima, o ano de 2013 promete dificuldades. 
Para mais detalhes e mais dados sobre o mecanismo de expansão do crédito no Brasil e seu efeito direito sobre vários indicadores da economia brasileira, sugere-se este artigo.
O maior problema do Brasil para o longo prazo
Enquanto a imprensa se ocupa em alardear os previsíveis e desimportantes números do PIB (para entender por que o PIB nada diz de concreto ver aqui, aqui, aqui e aqui), fatores realmente importantes e decisivos estão sendo ignorados. 
Por exemplo, a destruição do poder de compra da moeda em conjunto com as proibitivas tarifas de importação.  Temos hoje uma moeda continuamente inflacionada e desvalorizada em relação às outras moedas, o que encarece sobremaneira as importações de bens de capital e bens de consumo.  Além de a unidade monetária comprar cada vez menos, o governo ainda impõe tarifas de importação para encarecer ainda mais as compras do exterior.  Ou seja, ao mesmo tempo em que encarece as coisas aqui dentro, o governo proíbe a população de comprar barato do exterior.
A consequência desse fechamento das fronteiras?  Coube ao Financial Times nos mostrar.  O gráfico abaixo ilustra a produtividade de alguns países em relação aos EUA.
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Gráfico 5: produtividade da mão-de-obra em de vários países em relação à mão-de-obra americana
Observe que a produtividade dos trabalhadores brasileiros não apenas está em queda livre, como é a única que vem caindo década após década.  Um trabalhador brasileiro médio tem apenas 20% da produtividade de um americano.  No ano de 1980 (atenção, ano; e não década), ele tinha 30% da produtividade.  (Deve-se levar em conta que toda a década de 1970 foi de estagflação para os EUA, sendo aquela a sua década perdida; daí o salto brasileiro observado entre 1970 e 1980.  Já em 1990, após a década perdida de 1980 para o Brasil, as coisas voltaram a ser como antes).
Por que essa queda contínua?  Meu palpite: porque além de termos uma mão-de-obra pouco instruída, as tarifas protecionistas impostas pelo governo encareceram ainda mais a importação de bens de capital, justamente o que poderia aumentar nossa produtividade no curto prazo.  Alexandre Schwartsman comentou isso recentemente:
Desde o terceiro trimestre de 2011 os preços em dólares dos bens de capital importados recuaram 1%, mas a depreciação da moeda, 24% no período, implicou uma elevação de 23% no preço em reais destes bens (19% descontada a inflação).
Esta não é, provavelmente, a única causa da queda do investimento, mas é difícil comprar a ideia que um aumento desta magnitude no preço dos bens de capital não representa um impacto negativo na decisão de investir...
Com uma mão-de-obra mal instruída e pouco produtiva, dificultar o acesso a bens de capital seria a última coisa que qualquer ser racional defenderia.  Mas estamos falando do governo, que opera em outra dimensão de inteligência.
O padrão de vida de um país é determinado pela abundância de bens e serviços.  Quanto maior a quantidade de bens e serviços ofertados, e quanto maior a diversidade dessa oferta, maior será o padrão de vida da população.  Por exemplo, quanto maior a oferta de alimentos, quanto maior a variedade de restaurantes e de supermercados, de serviços de saúde e de educação, de bens como vestuário, materiais de construção, eletroeletrônicos e livros, de pontos comerciais, de shoppings, de cinemas etc., maior tende a ser a qualidade de vida da população. 
Porém, a quantidade e a diversidade não bastam.  A facilidade de acesso a estes bens e serviços — no caso, quão caros eles são — também é essencial.  Por isso, é de suprema importância termos uma moeda forte.
12273_493509127356490_2092759000_n.jpgNo Brasil, além de a qualidade dos serviços no geral ser ruim, a quantidade e a variedade de bens de consumo é muito baixa, pois além de o governo dificultar ao máximo as importações, nossa desvalorizada moeda não tem poder de compra em relação às principais moedas do mundo.  E não bastasse a pouca oferta e a pequena variedade de bens e serviços, o acesso a eles é caro, justamente porque o governo destrói continuamente o poder de compra da moeda.
Portanto, eis a realidade atual do Brasil: qualidade da mão-de-obra em queda livre, quantidade e variedade de bens e serviços bastante insatisfatória, e acesso a eles cada vez mais caro.  Em vez de facilitar a aquisição de bens de capital, o que poderia remediar a questão da baixa produtividade e da qualidade dos bens e serviços, o governo dificulta o acesso, tanto por meio de tarifas quanto por desvalorizações cambiais.  E, para piorar, não há absolutamente nenhuma tendência de melhora na qualidade da mão-de-obra.  Esse é o nosso padrão de vida
Mais ainda: a julgar pelas políticas adotadas pelo atual governo no que tange a protecionismo, câmbio e inflação, não há nenhuma indicação de que isso irá mudar no futuro próximo. 
Isso sim será definitivo para o futuro do país — e não o acréscimo de meros dígitos artificiais ao PIB.

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Estado: ame-o, deteste-o, mas leia este livro: Edward P. Stringham

Não preciso sequer fazer a introdução: está tudo dito abaixo (e subscrevo).
Paulo Roberto de Almeida 
Se você detesta o estado, leia este livro. Se você ama o estado, leia esse livro!
Instituto Ludwig Von Mises Brasil, quinta-feira, 11 de outubro de 2012


[Este artigo foi extraído do prefácio do livro Governo e Mercado: a economia da intervenção estatal, que está sendo lançado hoje pelo Instituto Ludwig von Mises Brasil]

governo_mercado.jpgINSTRUÇÕES PARA USO: Se você detesta o estado, leia este livro.  Se você ama o estado, leia esse livro!  Estudantes, pesquisadores e demais pessoas instruídas poderão se beneficiar com a leitura de Governo e Mercado.  No presente volume, Murray N. Rothbard (1926-1995), usa a teoria econômica para analisar diferentes projetos e propostas visando alterar ou eliminar as soluções de mercado.  Num cenário no qual os partidários da ação governamental apresentam inúmeros motivos pelos quais o governo "precisa" fazer isso ou aquilo, Rothbard põe limites às fantasias políticas.  Ele demonstra como o estado não é uma entidade benigna que poderá facilmente corrigir os problemas no mundo.  Ao contrário, o estado é um aparato imperfeito e inerentemente coercitivo.

O presente livro, após trinta e cinco anos da primeira edição, ainda é a mais sistemática análise da intervenção governamental[1].  Man, Economy, and State [Homem, economia e estado], o principal tratado de Rothbard, descreve as trocas na economia de mercado, ao passo queGoverno e Mercado analisa a economia da intervenção governamental.  Rothbard deixa claro que a economia é desprovida de juízos morais, não oferecendo nenhum julgamento ético final, ao mesmo tempo em que, também, aponta como a ciência econômica pode ser utilizada para criticar determinados posicionamentos morais, da seguinte forma: "Caso a autocontradição e a impossibilidade conceitual de execução de uma finalidade ética possam ser demonstradas, então nitidamente tal fim é um absurdo e deve ser abandonado por todos"[2].  Em certos aspectos, o livro poderia ser considerado um dos primeiros exemplos de economia da escolha pública, porque utiliza o instrumental econômico para analisar governo, e certamente elimina as visões românticas sobre a política.  No entanto, Rothbard diferia dos economistas da escolha pública, tais como James M. Buchanan e Gordon Tullock — e, a esse respeito, de todos os seus contemporâneos —, pois sempre viu o estado como um agente coercitivo, uma instituição que não foi criada para fazer o bem[3].
Os capítulos centrais de Governo e Mercado oferecem uma tipologia e debatem os diferentes tipos de intervenção estatal.  A intervenção binária ocorre quando o estado interfere diretamente num grupo privado (por exemplo, impostos e gastos do governo), e a intervenção triangular ocorre quando o estado interfere na interação de dois grupos (por exemplo, controles de preços ou regulamentos de produtos).  As pessoas estão em melhor situação quando o estado tutela o dinheiro delas contra a sua própria vontade?  As pessoas estão em melhor situação quando o estado gasta o seu dinheiro em algo que você não teria comprado por conta própria?  As entidades privadas se tornam melhores quando são impedidas de se envolver em trocas que consideram mutuamente benéficas?  Dica: A resposta correta é não! Leia os capítulos III, IV e V para ver as análises de Rothbard.
Ao longo desse volume, Rothbard descreve o porquê do governo não ser uma força benigna, como muitos defensores dessa instituição acreditam.  O governo é um aparato de coerção que interfere nas relações voluntárias no mercado.  Apenas para se ter uma ideia de até onde vai a lógica do autor, Rothbard inicia já no capítulo I com uma argumentação sobre o porquê do governo ser desnecessário!  Governo e Mercado é importante pois "é a primeira análise da economia governamental a argumentar que o fornecimento de bens ou serviços não requer a existência de governos".  Antes de Rothbard, até mesmo a maioria dos teóricos do livre mercado, tais como Ludwig von Mises (1881-1973), Henry Hazlitt (1894-1993), Ayn Rand (1905-1982) e Friedrich Hayek (1899-1992) pressupunham simplesmente que os serviços, assim como a aplicação da lei, deveriam ser fornecidos pelo estado.  Rothbard entende que a aplicação da lei deve ser analisada em termos de unidades marginais e, como outros bens, essas unidades podem ser fornecidas por agentes privados.  Ele menciona brevemente alguns exemplos históricos da aplicação privada da lei e, em seguida, especula como um sistema puramente privado poderia funcionar.  A proposta de Rothbard é demasiado utópica? Ele responde:
O conceito apresentado é bem mais funcional do que a ideia verdadeiramente utópica de um governo rigorosamente limitado; uma ideia que nunca funcionou na história. E é muito compreensível, pois o monopólio da agressão e a ausência de freios de mercado inerentes à estrutura estatal, possibilitaram a destruição de quaisquer amarras que indivíduos bem intencionados tentaram aplicar a um governo limitado[4].
O anarquismo libertário de Murray Rothbard influenciou muitos pensadores subsequentes, que, desde então, escreveram vários artigos e livros sobre o porquê do governo ser desnecessário.[5]
Além de desbravar novos caminhos na sua época, o livro é extremamente relevante para a economia política hoje.  Por exemplo, o capítulo final de Governo e Mercado é uma crítica contundente da ética antimercado, que se manteve como resquício de uma visão pré-moderna e que vem ganhando popularidade em nossos dias.  Tomemos como exemplo a visão de muitos economistas comportamentais que argumentam que a sociedade não deve confiar no livre mercado, porque as pessoas nem sempre sabem o que é melhor para elas[6].  Rothbard concorda que muitas vezes as pessoas cometem erros, mas discorda se isso é motivo para a existência do paternalismo.  Se as pessoas não sabem o que é melhor para elas, como podem estar aptas para eleger líderes que tomarão as decisões por elas?[7]  O livro serve para desmitificar a visão popular de muitos economistas da escolha pública que argumentam em favor da aplicação da coerção governamental porque a natureza humana é imperfeita.  Rothbard concorda que os homens não são anjos, mas isso não justifica, para ele, o governo[8].  Se os seres humanos são tão ruins, como podemos esperar que um governo coercitivo composto de seres humanos melhore a situação?[9]  Rothbard adota esses argumentos e muitos mais[10].
Em Governo e Mercado, nenhum aspecto da intervenção governamental é poupado.  Os argumentos de Rothbard podem servir como uma pausa e meio de reflexão para as pessoas que desejam resolver os problemas sociais usando meios políticos.  Para Rothbard, o estado não é perfeito, desejável, ou necessário, é totalmente o oposto!  O estado, em todas as suas formas, é prejudicial para a sociedade civil, e se realmente queremos melhorar o mundo, devemos olhar para além do governo.  Soluções reais não estão no poder político, mas nas forças do livre mercado.


[1] O presente volume foi originalmente escrito como a terceira e última parte do manuscrito de 1.500 páginas de Man, Economy and State.  O tamanho do manuscrito e o fato das conclusões políticas de Rothbard divergirem das visões dominantes sobre a análise do papel do governo na sociedade foram demais para alguns, por isso,Man, Economy, and State Power and Market foram publicados como volumes separados em 1962 e em 1970.  Ver: STROMBERG, Joseph. "Introduction to Man, Economy, and State with Power and Market". In: ROTHBARD, Murray N. Man, Economy, and State with Power and Market: Scholar's edition. Auburn: Mises Institute, 2004. pp. lxv—lxxi.
[2] ROTHBARD. Power and Market. p. 251. Na presente edição, Capítulo VI (primeiro parágrafo).
[3] A visão dos economistas da Public Choice [escolha pública] sobre o governo e a anarquia são apresentados em: STRINGHAM, Edward (Ed.). Anarchy, State, and Public Choice. Cheltenham: Edward Elgar, 2006.
[4] ROTHBARD. Power and Market. p. 9. (Capítulo I).
[5] Ver por exemplo: BARNETT, Randy. The Structure of Liberty: Justice and the Rule of Law. Oxford: Clarendon Press, 1998; BENSON, Bruce. The Enterprise of Law: Justice Without the State. San Francisco: Pacific Research Institute for Public Policy, 1990; BENSON, Bruce. To Serve and Protect: Privatization and Community in Criminal Justice. New York: New York University Press, 1998; HOPPE, Hans-Hermann. Theory of Socialism and Capitalism. Boston: Kluwer, 1989; HOPPE, Hans-Hermann. Democracy — The God That Failed: The Economic and Politics of Monarchy, Democracy, and Natural Order. New Brunswick: Transaction Publishers, 2001; HOPPE, Hans-Hermann. (Ed.). The Myth of National Defense: Essays on the Theory and History of Security Production. Auburn: Mises Institute, 2003; DE JASAY, Anthony. Against Politics: On Government, Anarchy, and Order. London: Routledge, 1997; STRINGHAM, Edward (Ed.). Anarchy, State, and Public Choice. Cheltenham: Edward Elgar Publishing, 2006; e STRINGHAM, Edward (Ed.). Anarchy and the Law: The Political Economy of Choice. New Brunswick: Transaction Publishers, 2006.
[6] THALER, Richard H. & SUNSTEIN, Cass R. "Libertarian Paternalism". American Economic Review, Volume 93, Number 2 (May 2003): 175-79.
[7] ROTHBARD. Power and Market. p. 254. (Capítulo VI).
[8] Ver: McGUIRE, Martin C. & OLSON, Mancur. "The Economics of Autocracy and Majority Rule: The Invisible Hand and the Use of Force". Journal of Economic Literature, Volume 34, Number 1 (March 1996): 72-96. O argumento libertário sobre o ponto de vista dos economistas da escolha pública aparece na já citada obra Anarchy, State, and Public Choice organizada por Edward Stringham.
[9] ROTHBARD. Power and Market. p. 260. (Capítulo VI). Ver também: POWELL, Benjamin & COYNE, Christopher. "Do Pessimistic Assumptions About Human Behavior Justify Government?" Journal of Libertarian Studies, Volume 17 (Fall, 2003): 17-38.
[10] A abrangência de muitos tópicos impediu que Rothbard descesse a minúcias em qualquer um deles. Essa amplitude de tópicos, no entanto, é parte do atrativo do livro.  Desta perspectiva, a obra de Rothbard pode ser vista como um trampolim para o aprofundamento de muitos tópicos do moderno libertarianismo.  Rothbard escreveu: "A argumentação ao longo deste livro é, primariamente, teórica. Não foi feita nenhuma tentativa de enumerar exemplos institucionais de intervenção governamental no mundo de hoje, uma tentativa que, é claro, iria requerer muitíssimos volumes" (Power and Market [1970], p. vii).  A boa notícia é que o salvo-conduto inicial de Rothbard deu aos estudiosos do libertarianismo de hoje oportunidade para ilustrar ou ampliar as ideias teóricas de Governo e Mercado.  Por exemplo, muitos de meus artigos sobre a coercibilidade das regras privadas tentam mostrar exatamente isso: STRINGHAM, Edward. "Market Chosen Law". Journal of Libertarian Studies, Volume 14, Number 1 (Winter, 1998-1999): 53-77; STRINGHAM, Edward. "The Emergence of the London Stock Exchange as a Self-Policing Club". Journal of Private Enterprise, Volume 17, Number 2 (2002): 1-19; STRINGHAM, Edward. "The Extralegal Development of Securities Trading in Seventeenth Century Amsterdam". Quarterly Review of Economics and Finance, Volume 43, Number 2 (Summer, 2003): 321-44; BRYAN, Caplan & STRINGHAM, Edward. "Networks, Law, and the Paradox of Cooperation". Review of Austrian Economics, Volume 16, Number 4 (December 2003): 309-26; STRINGHAM, Edward. "Overlapping Jurisdictions, Proprietary Communities, and Competition in the Realm of Law". Journal of Institutional and Theoretical Economics, Volume 162, Number 3 (September 2006): 516-34.
Edward P. Stringham ocupa a cadeira Lloyd Hackley Endowed de Estudos Sobre o Capitalismo e Livre Iniciativa na Fayetteville State University. Mande um e-mail para ele.

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Ocupem Wall Street! Mas tirem os idiotas, por favor...

Bem, se retirarem todos os idiotas que estão ocupando Wall Street sem nenhuma ideia na cabeça, só com frases idiotas daqueles grandes idiotas que são Zizek e Klein, sobram apenas 1% de pessoas, justamente aqueles que se dedicam a ganhar dinheiro e com isso criam riqueza e distribuem renda...
Tem gente que escreve para este blogueiro -- Anônimos Adesistas em sua maior parte -- para reclamar que estou me desviando de meus assuntos habituais, e contradizendo os dizeres acima, que falam de ideias inteligentes para pessoas inteligentes, ao colocar todas essas ideais idiotas de pessoas idiotas. Acham que estou com o "idiota" um pouco solto, quase obsessivo.
Mas confesso que tenho alergia à burrice, horror à idiotice  e asco da desonestidade intelectual. Não posso fazer nada se aqueles que se reunem para gritar frases sem sentido são realmente idiotas.
Mas pelo menos coloco coisas inteligentes para deleite dos mais chegados a argumentos de peso.


Todo o seu conforto você deve ao capitalismo e aos ricos
Instituto Von Mises Brasil. quinta-feira, 27 de outubro de 2011
Os pacotes de socorro ao sistema financeiro mundial — o qual, após incorrer em práticas insensatas de expansão de crédito estimuladas pelos seus respectivos governos e bancos centrais, foi socorrido justamente por eles — em conjunto com um quadro de recessão aguda que vai se prolongando ao redor do mundo — recessão essa causada justamente por políticas governamentais — se combinaram para gerar um fenômeno semelhante ao colapso de uma enorme represa, desencadeando uma torrente não de água mas sim de ódio: ódio ao capitalismo e aos seus mais visíveis e valorosos representantes — as grandes empresas e os grandes empreendedores. 
Grandes empresas e sua "ganância epidêmica" por lucros estão sendo responsabilizadas pela causa do colapso.  Uma turba ignara de jornalistas e manifestantes doidivanas — que não sabem ao certo o que querem —, armados com câmeras, microfones e toda uma infinidade de guarnições da mais moderna tecnologia, em vez de se dedicarem ao tricô, estão salivando para ver grandes empresas e grandes empreendedores sendo capturados e demolidos em público, exatamente como faziam as multidões da Revolução Francesa que queriam ver os odiados aristocratas sendo levados para a guilhotina.
O que está ocorrendo atualmente ao redor do mundo não pode ser entendido sem se levar em conta a profunda ignorância que domina os intelectuais da atualidade no que diz respeito à natureza e ao funcionamento do capitalismo e da busca por lucros.  Não obstante o colapso mundial do socialismo e o inegável e visível sucesso do capitalismo, grande parte do mundo intelectual apresenta uma predisposição ao socialismo e uma oposição ao capitalismo como raramente já se viu.
A grande maioria dos intelectuais de hoje — desde comentaristas de jornais e televisão até professores universitários, incluindo-se aí a maioria dos professores de economia, para não mencionar políticos e seus apologistas — considera o fracasso do socialismo e o sucesso do capitalismo como meros "fatos brutos", isto é, fatos sem bases inteligíveis, fatos que desafiam e contradizem toda a compreensão.  Se quisessem realmente pensar de maneira racional, tais pessoas teriam de ler e estudar as obras de Ludwig von Mises e dos outros proeminentes teóricos da Escola Austríaca de pensamento econômico, bem como também da Escola Britânica clássica.  Mas isso eles não irão fazer. 
Como resultado dessa fundamental incapacidade intelectual e moral da parte deles, e de acordo com tudo em que eles ainda acreditam, o socialismo, com sua suposta preocupação para com o bem-estar de todos e sua suposta racionalidade de planejamento, deveria ter prosperado e prevalecido, ao passo que o capitalismo, com sua preocupação exclusiva com o lucro individual e sua suposta 'anarquia no sistema de produção', é quem deveria ter fracassado.  Na mente dos intelectuais da atualidade, o fato de ter ocorrido o resultado oposto no mundo real é algo que deve colocar em dúvida a confiabilidade da própria razão em si — postura essa que, creio eu, ajuda enormemente a explicar a ascensão de um ostensivamente declarado irracionalismo nas últimas décadas, cujo melhor exemplo são os ataques à ciência e à tecnologia oriundos do movimento ambientalista. 
Os intelectuais se agarram aos eventos da atualidade porque tais eventos parecem oferecer um alento para o desmoronamento do seu universo intelectual.  Eles acreditam, pelo menos por enquanto, estarem mais uma vez na posição de professar ao mundo que seus conceitos sobre o capitalismo foram confirmados pela realidade.
Não será o objetivo deste artigo explicar as reais causas do atual cenário econômico, como a criação de dinheiro fiduciário, a expansão artificial do crédito e a manipulação dos juros, tudo isso realizado integralmente pelos bancos centrais mundiais, que nada mais são do que órgãos estatais.  Tal tarefa já foi proficuamente apresentada em outros artigos deste site.  O objetivo aqui será o de apresentar uma contra-argumentação aos aspectos relevantes dessa ignorância anticapitalista dos intelectuais da atualidade, demonstrando como toda a população se beneficia justamente daquilo que os intelectuais mais atacam: o interesse próprio e a busca pelo lucro dos capitalistas.
A busca pelo lucro é a base de todas as melhorias econômicas
O que os intelectuais e sua hostilidade ao lucro ignoram é que a busca pelo lucro em um livre mercado é exatamente a fonte de virtualmente todas as melhorias econômicas de uma sociedade.
Em um livre mercado, todo e qualquer indivíduo tem a liberdade de empreender e consumir sem ser tolhido por decretos, regulamentações e burocracias.  Sua liberdade deve ser plena, desde que, em suas atividades, ele não agrida a propriedade, a vida e a liberdade de terceiros.  Ele é livre para não sofrer coerção e força física, mas também é proibido de adquirir a propriedade de terceiros por meios desonestos, inclusive por meio da fraude. Tudo que um indivíduo receber de outros deve ser por meio da escolha voluntária destes.
Se tais condições não são respeitadas, e alguns indivíduos conseguem ganhar à custa de todos os outros por meio de força, fraude, coerção, tributação ou regulamentações, então tal situação representa uma falha de governo, não do livre mercado.  O fracasso do governo está precisamente no fato de ter feito com que os indivíduos que participam do mercado fossem submetidos a tais tipos de agressão. 
Em um livre mercado, a maneira de um indivíduo obter dinheiro de terceiros é ofertando algo que eles julgam ser valioso e que desejam possuir.  Esses são os tipos de bens e serviços que um indivíduo busca produzir e vender em um livre mercado: bens e serviços valiosos para os consumidores.  Desta maneira, a busca pelo lucro é a base de um contínuo processo de inovação, no qual são constantemente introduzidos novos e melhores produtos e novos e menos custosos métodos de produção.  O desenvolvimento de novos e melhores produtos que as pessoas desejam comprar, e o aprimoramento de mais eficientes e menos custosos métodos de produção daqueles produtos que já existem e que as pessoas continuam querendo comprar, são as principais formas de um empreendedor obter lucros em um livre mercado.
Tão ignorado quanto isso pelos intelectuais de hoje é o fato de que a esmagadora maioria dos lucros obtidos em uma economia livre é poupada e reinvestida, e que a acumulação de qualquer fortuna em uma economia livre é o resultado da introdução de toda uma série de aprimoramentos nos bens e serviços adquiridos voluntariamente pelos consumidores.  E a maneira de se criar os meios para produzir esses aprimoramentos é reinvestindo justamente a quase totalidade dos lucros obtidos.  É por meio desse processo que o público geral se beneficia da riqueza dos capitalistas.
Assim, para utilizar um exemplo clássico, Henry Ford, que começou com um capital de aproximadamente US$ 25.000 em 1903 e terminou com um capital de aproximadamente US$ 1 bilhão à época de sua morte em 1946, foi responsável pela maior parte do tremendo progresso ocorrido nos automóveis produzidos ao longo desse período, bem como na eficiência com que eles passaram a ser produzidos.  Foi amplamente graças a ele que os automóveis de 1946 eram incrivelmente superiores àqueles produzidos em 1903.  Mais ainda: foi graças a ele — que reinvestiu quase todo o seu lucro para aprimorar o processo de produção — que os automóveis apresentaram uma espetacular redução real de custo, indo de um preço hoje comparável ao de um iate para um preço que praticamente qualquer pessoa podia bancar.  Ou seja, à medida que sua fortuna ia crescendo, Ford ia reinvestido-a exatamente na expansão da produção destes automóveis aprimorados.  Em outras palavras, o outro lado da moeda da crescente fortuna de Ford foi o crescente beneficiamento do público em geral.
Um exemplo mais recente e igualmente óbvio destes mesmos princípios é o caso da Intel.  No início da década de 1980, a Intel estava na vanguarda da produção daquilo que, à época, era o mais avançado chip para uso em computadores pessoais: o 8086.  No entanto, a concorrência entrou no mercado e não permitiu que os altos lucros obtidos pela Intel com a comercialização deste chip durassem muito tempo.  Para continuar à frente da concorrência e obtendo uma alta taxa de lucro na indústria de computadores, foi necessário que a Intel introduzisse o amplamente aprimorado chip 80286.  E então a mesma história se repetiu.  Para continuar obtendo uma alta taxa de lucro frente à concorrência, que estava sempre em seus calcanhares, a Intel teve de desenvolver e introduzir o 80386, e depois o 80486 e então sucessivas gerações do chamado chip Pentium.
A Intel foi capaz de fazer uma fortuna durante todo este processo.  Sua fortuna foi investida exatamente na produção dos radicalmente aprimorados chips que atualmente são produzidos a uma fração do custo dos chips de uma década ou duas atrás.  (Obviamente, os lucros obtidos com qualquer tipo de aprimoramento podem ser também investidos na expansão da produção de outros produtos completamente diferentes).
Tais exemplos não são isolados.  O princípio que eles ilustram funcionam universalmente, e mostram a importância de se ter um livre mercado, sem regulamentações e sem a tributação do lucro. 
As fortunas empresariais, em um livre mercado, são acumuladas por meio dos altos lucros gerados pela introdução de novos e aperfeiçoados produtos e também pela introdução de métodos de produção mais eficientes e menos custosos.  Estes altos lucros são seguidamente poupados e reinvestidos justamente para ampliar e melhorar a produção destes mesmos produtos ou até mesmo de produtos distintos.  Por exemplo, a fortuna de $6 bilhões do falecido Steve Jobs foi construída em decorrência de Jobs ter feito com que fosse possível que a Apple Computer introduzisse novos e aperfeiçoados produtos, como o iPod, o iPhone e o iPad, e então poupasse e reinvestisse uma expressiva fatia dos lucros que vieram pra ele.
Isso é algo que vale a pena ser repetido e enfatizado: as fortunas que são acumuladas desta forma são normalmente direcionadas à produção em larga escala justamente dos produtos que forneceram os lucros utilizados para acumular esta fortuna.  Assim, por exemplo, os bilhões de dólares de Jobs serviram em grande parte para aprimorar a invenção e a produção de produtos da Apple.  Similarmente, a grande fortuna pessoal do velho Henry Ford — adquirida em decorrência da introdução de grandes aprimoramentos na eficiência da produção automotiva, o que fez com que o preço de um automóvel novo caísse de US$ 10.000 no início do século XX para US$ 300 em meados da década de 1920 — foi utilizada para tornar possível a produção em larga escala de milhões de automóveis Ford.
Adicionalmente, as altas taxas de lucro adquiridas com produtos novos e aprimorados e com métodos de produção mais eficientes são meramente temporárias.  Assim que a produção de um novo produto ou o uso de um novo método de produção mais eficiente se torna padrão em uma indústria, ele deixa de gerar lucros excepcionais.  Com efeito, novos e contínuos aprimoramentos fazem com que os aprimoramentos anteriores tornem-se completamente não-rentáveis.  Por exemplo, a primeira geração do iPhone, que era altamente lucrativa há apenas alguns anos, já deixou de ser ou rapidamente deixará de ser lucrativa, pois novos avanços a deixaram obsoleta.
Como resultado, a acumulação de grandes fortunas empreendedoriais requer a introdução de uma série de aprimoramentos nos produtos criados ou nos métodos de produção utilizados.  Isto é um pré-requisito para se manter uma alta taxa de lucro frente à concorrência em um livre mercado.  A capacidade da Intel de manter sua alta taxa de lucro ao longo de vários anos dependia completamente de sua capacidade de introduzir melhorias sequenciais em seus chips de computador.  O efeito líquido desse processo foi o de fazer com que os usuários de computadores se beneficiassem de contínuas melhorias e avanços tecnológicos; e não apenas não houve nenhum custo adicional, como na verdade ocorreu um drástico declínio nos preços destes chips.  Enquanto os altos lucros se basearem na redução dos custos de produção, a concorrência fará com que os preços dos produtos sejam reduzidos correspondentemente à redução dos custos de produção, o que obrigará as empresas a descobrirem novos métodos de reduzir ainda mais seus custos para manter seus altos lucros.
O mesmo resultado, é claro, é válido não somente para a Intel e seus microprocessadores, mas também para o resto da indústria da computação, na qual gigabytes de memória e terabytes de capacidade de armazenamento de disco rígido hoje são vendidos a preços menores que os preços de megabytes de memória e de disco rígido há algumas décadas atrás.  Como efeito, se olharmos cuidadosamente, este princípio de produtos cada vez melhores e mais baratos a custos cada vez menores se aplica a todo o sistema econômico.  Está presente tanto na produção de comida, de roupas e de abrigos quanto nas indústrias de alta tecnologia, e em praticamente todas as indústrias entre estes dois extremos.
Está presente em todas estas indústrias não obstante a inflação da oferta monetária — totalmente gerenciada pelo governo — ter feito com que os preços dos produtos aumentassem acentuadamente ao longo dos anos.  Apesar disso, quando calculados em termos da quantidade de trabalho que o cidadão comum deve despender a fim de adquirir o salário necessário para comprar tais produtos, os preços de tais bens caíram fortemente.
A melhor ilustração deste raciocínio pode ser vista no aumento do padrão de vida que ocorreu ao longo dos últimos 100 anos.  Em 1911, o cidadão comum trabalhava 60 horas por semana.  O que ele recebia em troca da sua mão-de-obra era exatamente o padrão de vida de 1911 — um padrão de vida que não incluía bens como automóveis, ar condicionado, viagens aéreas, antibióticos, geladeiras, congeladores, filmes, televisão, videocassetes, aparelhos de DVD, Blu-ray, rádios, toca-discos, CD players, computadores, notebooks, celulares, moradias confortáveis, comidas e roupas abundantes e de qualidade, medicina e odontologia modernas, máquina de lavar e secar, forno de microondas e por aí vai.  Em 1911, telefones e energia elétrica eram raros.  Aparelhos elétricos eram praticamente desconhecidos.  Telefones celulares não eram nem objetos de ficção.
Os bens que podiam ser produzidos à época, como vários tipos de comida, roupas e moradias, eram de menor qualidade e muito mais caros em termos reais do que são hoje — isto é, em termos do tempo necessário para ganhar o dinheiro necessário para adquiri-los.  A alimentação, o vestuário e a moradia do cidadão comum eram muito mais modestos do que são hoje.  Todos esses bens só se tornaram mais acessíveis e aumentaram em qualidade e variedade porque a busca por lucros levou ao necessário processo de corte de custos e a outros aprimoramentos no processo de produção.  E todos aqueles bens que não existiam em 1911 só passaram a existir por causa da busca por lucros.
Em outras palavras, o que aumentou tão radicalmente o padrão de vida de todos foi nada mais do que a busca por lucros e a liberdade de agir de acordo com esse objetivo.  A busca por lucros foi a força-motriz da produção e da atividade econômica.  Em todos os lugares, em cada indústria, em cada cidade, havia homens ávidos para lucrar aprimorando produtos e métodos de produção.  Eles tiveram a liberdade de fazer isso e foram bem sucedidos.  Essa "ganância", "epidêmica" a ponto de se tornar generalizada, foi o que aprimorou tão radicalmente o padrão de vida do cidadão comum.  É algo pelo qual todos nós devemos ser profundamente agradecidos.  Caso tal "ganância" fosse menos "epidêmica" e menos generalizada, o aprimoramento do nosso padrão de vida teria sido, sem a menor sombra de dúvida, muito menos intenso. 
O grau de aprimoramento do padrão de vida do cidadão médio pode ser mensurado utilizando-se o fato de que seu padrão de vida é hoje pelo menos 10 vezes maior do que era em 1911 (e essa é uma estimativa conservadora), e tal padrão é obtido trabalhando-se em média apenas dois terços do que se trabalhava em 1911 — 40 horas de trabalho por semana ao invés de 60.  Assim, dois terços do trabalho realizado em 1911 hoje consegue adquirir dinheiro suficiente para comprar 10 vezes a quantidade de bens.  Ou, colocando de outra forma, um simples décimo daqueles dois terços — ou 6,66% — é hoje suficiente para comprar bens equivalentes ao padrão de vida médio de 1911.  Isso significa que, na média, graças à ganância de empreendedores e capitalistas, houve, desde 1911, uma queda nos preços reais da ordem de 93,33%!
Apenas este fato já deveria servir para demonstrar que o capitalismo de livre mercado — o capitalismo laissez-faire — é o sistema econômico mais ético e moral que existe.  Ele é a materialização das liberdades individuais e da busca pelo interesse próprio.  Ele resulta no progressivo aumento no bem-estar material de todos, algo que se manifesta no aumento das expectativas de vida e no contínuo aprimoramento do padrão de vida das pessoas.
O papel dos ricos capitalistas na melhora do nosso bem-estar
Os atuais protestos contra os ricos, contra os lucros das grandes empresas e contra a ganância partem do velho princípio marxista de que uma pequena fatia de abastados vive à custa da exploração da esmagadora maioria da população mundial.  Tal raciocínio seria verdadeiro caso a revolta se direcionasse especificamente para aqueles indivíduos cuja riqueza foi adquirida por meios que atentam justamente contra o capitalismo, como subsídios governamentais, protecionismo e outras formas de governo que obstruem a livre concorrência.  Nesse caso, os protestos mereceriam o apoio de todos os pró-capitalistas. No entanto, a gritaria tem sido generalizada e o alvo comum tem sido os ricos, os lucros e a ganância de forma geral.
A óbvia solução apresentada é que a população explorada — a esmagadora maioria da população mundial — confisque a riqueza da ínfima minoria abastada e a utilize para seu beneficio próprio ao invés de permitir que ela continue sendo utilizada para o benefício dessa ínfima minoria, que é supostamente formada por indignos e gananciosos capitalistas exploradores.  Em outras palavras, o programa implícito por trás das atuais manifestações é o socialismo e a redistribuição de riqueza.
Deixando de lado as hipérboles utilizadas nos protestos, é verdade que uma relativamente pequena minoria da população de fato detém uma excepcionalmente grande fatia da riqueza da economia.  Mas o que os manifestantes não percebem é que a riqueza dessa ínfima minoria é exatamente o que fornece o padrão de vida da esmagadora maioria.
Os manifestantes não se dão conta disso porque veem o mundo através de uma lente intelectual totalmente inapropriada para a vida sob o capitalismo e sua economia de mercado.  Eles veem um mundo — que ainda existe em alguns lugares atrasados, e que era prevalecente há alguns séculos — povoado de famílias autossuficientes que vivem da agricultura de subsistência, cada uma produzindo para consumo próprio, sem nenhuma ligação com um mercado de compra e venda de bens e serviços.
Em tal mundo, quando alguém vê uma plantação, ou um celeiro, ou um arado, ou animais de carga, e pergunta a quem tais meios de produção servem, a resposta é "ao agricultor e sua família, e a ninguém mais".  Neste mundo, à exceção de algum ocasional gesto de caridade dos proprietários, aqueles que não possuem meios de produção não podem se beneficiar dos meios de produção existentes, a menos que eles próprios de alguma maneira também se tornem proprietários de meios de produção.  Eles não podem se beneficiar dos meios de produção de terceiros, a menos que herdem-nos ou confisquem-nos.
No mundo dos manifestantes, os meios de produção possuem essencialmente a mesma característica de bens de consumo, os quais, em regra, beneficiam apenas os seus proprietários.  Justamente por seguirem esta mesma visão de mundo, aqueles que compartilham da mesma mentalidade dos manifestantes tipicamente imaginam os capitalistas como homens obesos, cujos pratos estão repletos de comida enquanto as massas de assalariados têm de viver à beira da fome.  De acordo com essa mentalidade, a redistribuição de riqueza é simplesmente uma questão retirar a comida do prato transbordante dos capitalistas e redistribuí-la para os trabalhadores esfomeados.
Porém, ao contrário de tais crenças, no mundo moderno em que realmente vivemos, a riqueza dos capitalistas simplesmente não está na forma de bens de consumos, pelo menos não de maneira significativa.  Não apenas ela está predominantemente na forma de meios de produção, como também esses meios de produção estão empregados na produção de bens e serviços que são vendidos no mercado.  Em total antagonismo às condições das famílias agrárias autossuficientes, os beneficiários dos meios de produção dos capitalistas são todos os membros do público consumidor em geral, que compram os produtos dos capitalistas.
Por exemplo, sem ser dono de uma única ação de alguma grande montadora (GM, Daimler, Ford, BMW, Scania, VW, Toyota, Volvo) ou de alguma petrolífera (Exxon Mobil, BP, Shell, Chevron), qualquer pessoa em uma economia capitalista que compre os produtos destas empresas se beneficia de seus meios de produção: o comprador de um automóvel Volvo se beneficia da fábrica da Volvo que produziu aquele automóvel; o comprador da gasolina da Shell se beneficia de seus poços petrolíferos, oleodutos e caminhões-tanque.  Adicionalmente, também se beneficiam destes meios de produção todas aquelas pessoas que compram produtos de clientes da Volvo ou da Shell, desde que tais meios de produção indiretamente contribuam para os produtos destes seus clientes.  Por exemplo, os clientes dos supermercados cujos produtos foram entregues em caminhões feitos pela Volvo ou abastecidos com diesel produzido nas refinarias da Shell se beneficiam da existência da fábrica de caminhões da Volvo e das refinarias da Shell.  Mesmo aqueles que compram produtos dos concorrentes da Volvo e da Shell, ou dos clientes destes concorrentes, também se beneficiam da existência dos meios de produção da Volvo e da Shell.  Isso porque os meios de produção da Volvo e da Shell resultam em uma oferta mais abundante — e, logo, mais barata — dos bens que os concorrentes vendem.
Em outras palavras, todos nós, 100% de nós, nos beneficiamos da riqueza dos odiados capitalistas.  Nós nos beneficiamos sem que nós mesmos tenhamos de ser capitalistas.  Os críticos do capitalismo são literalmente mantidos vivos em decorrência da riqueza dos capitalistas que eles odeiam.  Como demonstrado, os campos de petróleo e os oleodutos das odiadas corporações petrolíferas fornecem o combustível que movimentam os tratores e os caminhões que são essenciais para a produção e a distribuição de comida que os críticos comem.  Os manifestantes atuais e todos os outros que têm ódio dos capitalistas simplesmente odeiam os alicerces de sua própria existência.
O benefício que os meios de produção dos capitalistas trazem aos não-proprietários dos meios de produção se estendem não apenas aos compradores dos produtos fabricados por esses meios de produção, mas também aos vendedores da mão-de-obra que é empregada para trabalhar com esses meios de produção.  A riqueza dos capitalistas, em outras palavras, é a fonte tanto da oferta de produtos que os não-proprietários dos meios de produção compram, como também da demanda pela mão-de-obra que os não-proprietários dos meios de produção vendem.  Donde se conclui que, quanto maior o número e quanto maior a riqueza dos capitalistas, maior será tanto a oferta de produtos quanto a demanda por mão-de-obra.  Consequentemente, menores serão os preços e maiores serão os salários — logo, maior será o padrão de vida de todos.  Nada pode ser mais benéfico para o interesse próprio do cidadão comum do que viver em uma sociedade repleta de capitalistas multibilionários e suas grandes empresas, todos ocupados utilizando sua vasta riqueza para produzir bens que este cidadão irá comprar e para disputar a mão-de-obra que ele irá vender.
Não obstante tudo isso, o críticos do capitalismo desejam um mundo no qual os capitalistas bilionários e suas grandes empresas foram completamente banidos e substituídos por pequenos e pobres produtores, que não seriam significativamente mais ricos do que eles próprios, os críticos — o que significa que todos seriam pobres.  Eles creem que em um mundo com tais produtores, produtores que não possuem o capital necessário para produzir quase nada, muito menos para conduzir a produção em massa dos produtos tecnologicamente avançados do capitalismo moderno, eles irão de alguma forma estar economicamente em melhor situação do que estão hoje.  Obviamente, tais críticos e manifestantes não poderiam estar mais iludidos.
Além de não perceberem que a riqueza dessa ínfima minoria é o pilar do padrão de vida da esmagadora maioria, o que os críticos e manifestantes também não percebem é que a "ganância" daqueles que se esforçam para fazer parte da ínfima minoria — ou que se esforçam para ampliar sua posição dentro dela — é o que faz com que o padrão de vida da esmagadora maioria seja progressivamente aumentado.
A ironia fatal que está destruindo os EUA
A estagnação e o declínio econômico, os problemas do desemprego em massa e a crescente pobreza observada nos EUA nos últimos anos são o resultado de violações da liberdade individual e da busca pelo interesse próprio.  O governo emaranhou o sistema econômico em uma crescente teia de regras e regulamentações paralisantes que proíbem a produção de bens e serviços que as pessoas querem consumir, e ao mesmo tempo obrigam a produção de bens e serviços que as pessoas não querem, fazendo com que a produção de praticamente tudo seja muito mais cara do que deveria ser.  Por exemplo, proibições na produção de energia atômica, petróleo, carvão e gás natural encarecem o custo da energia; e com menos energia disponível para ser empregada na produção, a mão-de-obra humana tem de ser utilizada mais intensamente para produzir uma dada quantidade de bens.  Isso resulta em menos bens disponíveis na economia, o que afeta a remuneração de todos os assalariados.
Gastos governamentais descontrolados e seus concomitantes déficits orçamentários, em conjunto com altos impostos sobre a renda, sobre a propriedade e sobre ganhos de capital, todos incidentes sobre fundos que caso contrário teriam sido amplamente poupados e investidos, destroem o capital do sistema econômico.  Desta forma, eles impedem o aumento tanto na oferta de bens quanto na demanda por mão-de-obra, algo que mais capital nas mãos das empresas teria gerado. 
E há as inúmeras e crescentes regulamentações que aumentam o custo da produção, reduzem sua eficiência e impedem novas acumulações da capital.  E houve também a formação e o estouro de duas bolhas, a do mercado de ações e a imobiliária, ambas geradas pela expansão de crédito orquestrada pelo Banco Central americano e que amplificaram o consumo de capital da economia.  Trilhões de dólares em capital foram destruídos.
Toda essa destruição de capital afeta a capacidade das empresas de produzir e empregar mão-de-obra.  É essa perda de capital que é responsável pelo atual problema do desemprego em massa.
No entanto, não obstante toda essa maciça destruição de capital, o problema do desemprego pode ser eliminado.  Porém, devido a essa perda de capital, para que tal problema seja resolvido seria necessária uma redução nos salários.  Essa redução, entretanto, foi praticamente tornada ilegal em decorrência da existência de leis de salário mínimo e legislações sindicais.  Tais leis impedem que os empregadores ofereçam salários menores, aos quais os desempregados estariam reempregados.
Consequentemente, por mais irônico que seja, o fato é que praticamente todos os problemas dos quais os intelectuais, os críticos do capitalismo e os manifestantes reclamam são resultado justamente da implementação de políticas que eles apóiam e nas quais eles fervorosamente acreditam.  É essa mentalidade, o marxismo incrustado nela, e as políticas governamentais resultantes, que são responsáveis por tudo aquilo de que estão reclamando.  Os críticos e os manifestantes estão, com efeito, na posição de autoflagelantes involuntários.  Eles estão se chicoteando e, como bálsamo para suas feridas, exigem ainda mais chicotadas e algemas.  Eles não veem isso porque não aprenderam a fazer a correlação entre fenômenos básicos.  Eles não entendem que, ao violarem a liberdade de empreendedores e capitalistas, e ao confiscarem e consumirem suas riquezas — isto é, ao utilizarem armas de constrangimento físico e mental contra esse pequeno e odiado grupo —, eles estão destruindo as bases de seu próprio bem-estar.
Por mais que os críticos do capitalismo mereçam sofrer em decorrência dos danos causados pela aplicação de suas próprias ideias, seria muito melhor se eles acordassem para o mundo moderno e passassem finalmente a entender a verdadeira natureza do capitalismo, e então direcionassem sua ira aos alvos que realmente merecem recebê-la.  Caso fizessem isso, eles poderiam, aí sim, trazer alguma contribuição real para o bem-estar econômico, inclusive o deles próprios.

George Reisman Ph.D. é o autor de Capitalism: A Treatise on Economics. (Uma réplica em PDF do livro completo pode ser baixada para o disco rígido do leitor se ele simplesmente clicar no título do livro e salvar o arquivo). Ele é professor emérito da economia da Pepperdine University. Seu website: http://www.capitalism.net/. Seu blogwww.georgereisman.com/blog/.

Tradução de Leandro Augusto Gomes Roque