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sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Estado: ame-o, deteste-o, mas leia este livro: Edward P. Stringham

Não preciso sequer fazer a introdução: está tudo dito abaixo (e subscrevo).
Paulo Roberto de Almeida 
Se você detesta o estado, leia este livro. Se você ama o estado, leia esse livro!
Instituto Ludwig Von Mises Brasil, quinta-feira, 11 de outubro de 2012


[Este artigo foi extraído do prefácio do livro Governo e Mercado: a economia da intervenção estatal, que está sendo lançado hoje pelo Instituto Ludwig von Mises Brasil]

governo_mercado.jpgINSTRUÇÕES PARA USO: Se você detesta o estado, leia este livro.  Se você ama o estado, leia esse livro!  Estudantes, pesquisadores e demais pessoas instruídas poderão se beneficiar com a leitura de Governo e Mercado.  No presente volume, Murray N. Rothbard (1926-1995), usa a teoria econômica para analisar diferentes projetos e propostas visando alterar ou eliminar as soluções de mercado.  Num cenário no qual os partidários da ação governamental apresentam inúmeros motivos pelos quais o governo "precisa" fazer isso ou aquilo, Rothbard põe limites às fantasias políticas.  Ele demonstra como o estado não é uma entidade benigna que poderá facilmente corrigir os problemas no mundo.  Ao contrário, o estado é um aparato imperfeito e inerentemente coercitivo.

O presente livro, após trinta e cinco anos da primeira edição, ainda é a mais sistemática análise da intervenção governamental[1].  Man, Economy, and State [Homem, economia e estado], o principal tratado de Rothbard, descreve as trocas na economia de mercado, ao passo queGoverno e Mercado analisa a economia da intervenção governamental.  Rothbard deixa claro que a economia é desprovida de juízos morais, não oferecendo nenhum julgamento ético final, ao mesmo tempo em que, também, aponta como a ciência econômica pode ser utilizada para criticar determinados posicionamentos morais, da seguinte forma: "Caso a autocontradição e a impossibilidade conceitual de execução de uma finalidade ética possam ser demonstradas, então nitidamente tal fim é um absurdo e deve ser abandonado por todos"[2].  Em certos aspectos, o livro poderia ser considerado um dos primeiros exemplos de economia da escolha pública, porque utiliza o instrumental econômico para analisar governo, e certamente elimina as visões românticas sobre a política.  No entanto, Rothbard diferia dos economistas da escolha pública, tais como James M. Buchanan e Gordon Tullock — e, a esse respeito, de todos os seus contemporâneos —, pois sempre viu o estado como um agente coercitivo, uma instituição que não foi criada para fazer o bem[3].
Os capítulos centrais de Governo e Mercado oferecem uma tipologia e debatem os diferentes tipos de intervenção estatal.  A intervenção binária ocorre quando o estado interfere diretamente num grupo privado (por exemplo, impostos e gastos do governo), e a intervenção triangular ocorre quando o estado interfere na interação de dois grupos (por exemplo, controles de preços ou regulamentos de produtos).  As pessoas estão em melhor situação quando o estado tutela o dinheiro delas contra a sua própria vontade?  As pessoas estão em melhor situação quando o estado gasta o seu dinheiro em algo que você não teria comprado por conta própria?  As entidades privadas se tornam melhores quando são impedidas de se envolver em trocas que consideram mutuamente benéficas?  Dica: A resposta correta é não! Leia os capítulos III, IV e V para ver as análises de Rothbard.
Ao longo desse volume, Rothbard descreve o porquê do governo não ser uma força benigna, como muitos defensores dessa instituição acreditam.  O governo é um aparato de coerção que interfere nas relações voluntárias no mercado.  Apenas para se ter uma ideia de até onde vai a lógica do autor, Rothbard inicia já no capítulo I com uma argumentação sobre o porquê do governo ser desnecessário!  Governo e Mercado é importante pois "é a primeira análise da economia governamental a argumentar que o fornecimento de bens ou serviços não requer a existência de governos".  Antes de Rothbard, até mesmo a maioria dos teóricos do livre mercado, tais como Ludwig von Mises (1881-1973), Henry Hazlitt (1894-1993), Ayn Rand (1905-1982) e Friedrich Hayek (1899-1992) pressupunham simplesmente que os serviços, assim como a aplicação da lei, deveriam ser fornecidos pelo estado.  Rothbard entende que a aplicação da lei deve ser analisada em termos de unidades marginais e, como outros bens, essas unidades podem ser fornecidas por agentes privados.  Ele menciona brevemente alguns exemplos históricos da aplicação privada da lei e, em seguida, especula como um sistema puramente privado poderia funcionar.  A proposta de Rothbard é demasiado utópica? Ele responde:
O conceito apresentado é bem mais funcional do que a ideia verdadeiramente utópica de um governo rigorosamente limitado; uma ideia que nunca funcionou na história. E é muito compreensível, pois o monopólio da agressão e a ausência de freios de mercado inerentes à estrutura estatal, possibilitaram a destruição de quaisquer amarras que indivíduos bem intencionados tentaram aplicar a um governo limitado[4].
O anarquismo libertário de Murray Rothbard influenciou muitos pensadores subsequentes, que, desde então, escreveram vários artigos e livros sobre o porquê do governo ser desnecessário.[5]
Além de desbravar novos caminhos na sua época, o livro é extremamente relevante para a economia política hoje.  Por exemplo, o capítulo final de Governo e Mercado é uma crítica contundente da ética antimercado, que se manteve como resquício de uma visão pré-moderna e que vem ganhando popularidade em nossos dias.  Tomemos como exemplo a visão de muitos economistas comportamentais que argumentam que a sociedade não deve confiar no livre mercado, porque as pessoas nem sempre sabem o que é melhor para elas[6].  Rothbard concorda que muitas vezes as pessoas cometem erros, mas discorda se isso é motivo para a existência do paternalismo.  Se as pessoas não sabem o que é melhor para elas, como podem estar aptas para eleger líderes que tomarão as decisões por elas?[7]  O livro serve para desmitificar a visão popular de muitos economistas da escolha pública que argumentam em favor da aplicação da coerção governamental porque a natureza humana é imperfeita.  Rothbard concorda que os homens não são anjos, mas isso não justifica, para ele, o governo[8].  Se os seres humanos são tão ruins, como podemos esperar que um governo coercitivo composto de seres humanos melhore a situação?[9]  Rothbard adota esses argumentos e muitos mais[10].
Em Governo e Mercado, nenhum aspecto da intervenção governamental é poupado.  Os argumentos de Rothbard podem servir como uma pausa e meio de reflexão para as pessoas que desejam resolver os problemas sociais usando meios políticos.  Para Rothbard, o estado não é perfeito, desejável, ou necessário, é totalmente o oposto!  O estado, em todas as suas formas, é prejudicial para a sociedade civil, e se realmente queremos melhorar o mundo, devemos olhar para além do governo.  Soluções reais não estão no poder político, mas nas forças do livre mercado.


[1] O presente volume foi originalmente escrito como a terceira e última parte do manuscrito de 1.500 páginas de Man, Economy and State.  O tamanho do manuscrito e o fato das conclusões políticas de Rothbard divergirem das visões dominantes sobre a análise do papel do governo na sociedade foram demais para alguns, por isso,Man, Economy, and State Power and Market foram publicados como volumes separados em 1962 e em 1970.  Ver: STROMBERG, Joseph. "Introduction to Man, Economy, and State with Power and Market". In: ROTHBARD, Murray N. Man, Economy, and State with Power and Market: Scholar's edition. Auburn: Mises Institute, 2004. pp. lxv—lxxi.
[2] ROTHBARD. Power and Market. p. 251. Na presente edição, Capítulo VI (primeiro parágrafo).
[3] A visão dos economistas da Public Choice [escolha pública] sobre o governo e a anarquia são apresentados em: STRINGHAM, Edward (Ed.). Anarchy, State, and Public Choice. Cheltenham: Edward Elgar, 2006.
[4] ROTHBARD. Power and Market. p. 9. (Capítulo I).
[5] Ver por exemplo: BARNETT, Randy. The Structure of Liberty: Justice and the Rule of Law. Oxford: Clarendon Press, 1998; BENSON, Bruce. The Enterprise of Law: Justice Without the State. San Francisco: Pacific Research Institute for Public Policy, 1990; BENSON, Bruce. To Serve and Protect: Privatization and Community in Criminal Justice. New York: New York University Press, 1998; HOPPE, Hans-Hermann. Theory of Socialism and Capitalism. Boston: Kluwer, 1989; HOPPE, Hans-Hermann. Democracy — The God That Failed: The Economic and Politics of Monarchy, Democracy, and Natural Order. New Brunswick: Transaction Publishers, 2001; HOPPE, Hans-Hermann. (Ed.). The Myth of National Defense: Essays on the Theory and History of Security Production. Auburn: Mises Institute, 2003; DE JASAY, Anthony. Against Politics: On Government, Anarchy, and Order. London: Routledge, 1997; STRINGHAM, Edward (Ed.). Anarchy, State, and Public Choice. Cheltenham: Edward Elgar Publishing, 2006; e STRINGHAM, Edward (Ed.). Anarchy and the Law: The Political Economy of Choice. New Brunswick: Transaction Publishers, 2006.
[6] THALER, Richard H. & SUNSTEIN, Cass R. "Libertarian Paternalism". American Economic Review, Volume 93, Number 2 (May 2003): 175-79.
[7] ROTHBARD. Power and Market. p. 254. (Capítulo VI).
[8] Ver: McGUIRE, Martin C. & OLSON, Mancur. "The Economics of Autocracy and Majority Rule: The Invisible Hand and the Use of Force". Journal of Economic Literature, Volume 34, Number 1 (March 1996): 72-96. O argumento libertário sobre o ponto de vista dos economistas da escolha pública aparece na já citada obra Anarchy, State, and Public Choice organizada por Edward Stringham.
[9] ROTHBARD. Power and Market. p. 260. (Capítulo VI). Ver também: POWELL, Benjamin & COYNE, Christopher. "Do Pessimistic Assumptions About Human Behavior Justify Government?" Journal of Libertarian Studies, Volume 17 (Fall, 2003): 17-38.
[10] A abrangência de muitos tópicos impediu que Rothbard descesse a minúcias em qualquer um deles. Essa amplitude de tópicos, no entanto, é parte do atrativo do livro.  Desta perspectiva, a obra de Rothbard pode ser vista como um trampolim para o aprofundamento de muitos tópicos do moderno libertarianismo.  Rothbard escreveu: "A argumentação ao longo deste livro é, primariamente, teórica. Não foi feita nenhuma tentativa de enumerar exemplos institucionais de intervenção governamental no mundo de hoje, uma tentativa que, é claro, iria requerer muitíssimos volumes" (Power and Market [1970], p. vii).  A boa notícia é que o salvo-conduto inicial de Rothbard deu aos estudiosos do libertarianismo de hoje oportunidade para ilustrar ou ampliar as ideias teóricas de Governo e Mercado.  Por exemplo, muitos de meus artigos sobre a coercibilidade das regras privadas tentam mostrar exatamente isso: STRINGHAM, Edward. "Market Chosen Law". Journal of Libertarian Studies, Volume 14, Number 1 (Winter, 1998-1999): 53-77; STRINGHAM, Edward. "The Emergence of the London Stock Exchange as a Self-Policing Club". Journal of Private Enterprise, Volume 17, Number 2 (2002): 1-19; STRINGHAM, Edward. "The Extralegal Development of Securities Trading in Seventeenth Century Amsterdam". Quarterly Review of Economics and Finance, Volume 43, Number 2 (Summer, 2003): 321-44; BRYAN, Caplan & STRINGHAM, Edward. "Networks, Law, and the Paradox of Cooperation". Review of Austrian Economics, Volume 16, Number 4 (December 2003): 309-26; STRINGHAM, Edward. "Overlapping Jurisdictions, Proprietary Communities, and Competition in the Realm of Law". Journal of Institutional and Theoretical Economics, Volume 162, Number 3 (September 2006): 516-34.
Edward P. Stringham ocupa a cadeira Lloyd Hackley Endowed de Estudos Sobre o Capitalismo e Livre Iniciativa na Fayetteville State University. Mande um e-mail para ele.

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